Introdução
A adolescência é o período de desenvolvimento humano marcado por transformações físicas, biológicas e psicológicas; nesse período, ocorrem geralmente as primeiras experiências quanto à iniciação sexual e ao contato com álcool e outras drogas, fatores que ampliam a vulnerabilidade entre essa população 1. Nessa fase de intensas mudanças, a identidade pessoal e sexual do adolescente é amadurecida e novas relações sociais são formadas 2.
O despertar da sexualidade entre adolescentes ocorre de forma cada vez mais precoce, tornando-os vulneráveis a infecções sexualmente transmissíveis (ISTS) e à gravidez indesejada; a experimentação cada vez mais precoce da sexualidade e sua possível associação a informações inconsistentes reforçam a importância da educação sexual para esse público, a fim de garantir um bem-estar sexual 3,4.
O Estatuto da Criança e do Adolescente considera a adolescência como o período entre 12 e 18 anos 5. No entanto, para a atenção integral à saúde do adolescente, o Ministério da Saúde do Brasil adota a definição trazida pela Organização Mundial da Saúde, a qual define a adolescência como a segunda década de vida - dos 10 aos 19 anos 6. A falta de um programa de educação sexual consolidado em escolas tem sido apontada como um dos fatores relacionados à iniciação sexual precoce. No contexto brasileiro, a sexarca tem ocorrido, em grande parte, de forma precoce - entre adolescentes com idade menor ou igual a 13 anos 7.
A iniciação sexual precoce está muitas vezes associada a comportamentos de risco, como o uso de drogas lícitas e ilícitas, situações de violência, múltiplos parceiros sexuais, vulnerabilidade às ISTS e ao contato com o vírus da imunodeficiência humana (HIV, em inglês) e à gravidez não planejada, sendo fundamental a adoção de medidas de prevenção entre esse público, como o uso de preservativos 1,8. As taxas de uso de preservativos por adolescentes como método de prevenção em relações sexuais ainda são baixas, o que caracteriza um importante problema de saúde pública que requer atenção imediata 7, visto que a via sexual é a principal forma de transmissão do HIV e de outras ISTS, assim como a infecção pelo papiloma vírus humano (HPV, na sigla em inglês) - principal responsável pelo câncer de colo de útero entre mulheres de todas as idades 9,10.
O perfil epidemiológico de transmissão do HIV passou por significativas mudanças desde sua descoberta, ampliando as estimativas de sua ocorrência em toda população 11; gradativamente, novos grupos foram se tornando vulneráveis - incluindo mulheres, adolescentes, jovens e negros, além de indivíduos com baixos níveis de instrução e socioeconómicos 12.
A adoção de práticas sexuais de risco por adolescentes do sexo feminino pode estar relacionada à desigualdade de gênero e a questões culturais que perpassam a ideia de que o homem apresenta maior poder de decisão na relação, sendo ele o responsável pela tomada de decisão quanto ao uso de métodos de prevenção em relações sexuais 13,14.
Barreiras para uma prática segura entre as adolescentes também podem incluir fatores socioculturais, ambientais e económicos - como relações coercivas e de poder de gênero, ausência de educação sexual abrangente, sexualidade precoce e/ou casamento precoce; fatores individuais - como uso de álcool e outras drogas; fatores relacionados ao serviço de saúde - como orientações equivocadas e profissionais despreparados para a atenção em saúde a esse público 14. A enfermagem desempenha papel primordial no processo de construção do conhecimento e na sensibilização de adolescentes quanto à sexualidade e à adoção de medidas de proteção - como o uso de preservativos -, principalmente por meio de atividades de educação em saúde; para tanto, a criação de ambientes favoráveis ao debate de temas voltados à saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes torna-se imprescindível 15.
Nesse contexto, considerando que o conhecimento dos fatores que interferem na utilização de preservativos entre adolescentes do sexo feminino poderá viabilizar o desenvolvimento de estratégias mais eficazes à prática sexual segura, o presente estudo se conduziu a partir do seguinte questionamento: "Quais fatores levam à não utilização de preservativos por adolescentes do sexo feminino?". A partir disso, estabeleceu-se como objetivo do estudo caracterizar o conhecimento e a prática acerca da utilização de preservativos por parte de adolescentes do sexo feminino, estudantes do ensino médio de uma escola da rede estadual do interior de Sergipe, Brasil.
Materiais e métodos
Pesquisa de corte transversal, realizada em uma escola da rede pública localizada no interior do Estado de Sergipe, Região Nordeste do Brasil. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (mais conhecido pela sigla IBCE), em 2016, o município contava com oito escolas destinadas ao ensino médio, com total de 4.274 estudantes matriculados 16.
A coleta de dados foi realizada no período de fevereiro a março de 2017 na escola com o maior número de adolescentes matriculados do Estado, correspondendo a 1.620 alunos, dos quais 815 eram do sexo feminino. Os critérios de inclusão utilizados foram ser do sexo feminino, ter idade entre 15 e 19 anos e estar regularmente matriculada. A participação estava atrelada à assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido pelos representantes legais para menores de 18 anos e pelos próprios participantes quando idade igual ou maior a 18 anos.
Por amostragem aleatória simples e por conveniência, os questionários foram aplicados com todas as 36 turmas do período diurno e 111 adolescentes responderam à pesquisa. Após a exclusão de 17 respostas por motivo de incompletude, a amostra correspondeu a 94 participantes. O tempo médio de preenchimento foi de 20 minutos; dois acadêmicos de enfermagem treinados realizaram a coleta dos dados na escola.
O questionário com 36 perguntas fechadas foi elaborado pelos pesquisadores, revisado por especialista na área e passado por teste-piloto com 10 adolescentes. Sua versão final foi dividida em três partes: 1a) dados de identificação - idade, série escolar, cor, religião, trabalho, renda familiar, moradia; 2a) hábitos e relacionamentos pessoais - relacionamento amoroso, preferência sexual, filhos, uso de tabaco, álcool e outras drogas, menarca, sexarca, método contraceptivo, uso de preservativo nas últimas relações sexuais; 3a) conhecimento sobre o preservativo feminino e masculino - manejo, utilização, finalidades e acesso.
Os dados foram tabulados no Microsoft Office Excel® (2010) e analisados no software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS IBM®), versão 20 para Windows. Foram utilizadas as técnicas univariada e bivariada para obter a distribuição das frequências absolutas e relativas.
Aspectos éticos e legais da pesquisa foram respeitados e foram garantidos o anonimato e o sigilo das informações, respeitando os preceitos éticos da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde 17. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Sergipe, sob o Parecer 1.917.196 e o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética 62321916.4.0000.5546.
Resultados
Entre as 94 participantes do estudo, a média de idade foi de 17,3 anos (DP = 1,2), com idade mínima de 15 e máxima de 19 anos. A maioria das adolescentes autodeclarou-se parda (62,8 %), sem exercício de atividade remunerada (88,3 %), com renda familiar mensal de até um salário-mínimo (61,3 %) e que viviam com quatro ou mais pessoas na mesma residência (58,5 %). A religião predominante foi a católica (74,5 %). Apenas 4,3 % das adolescentes afirmaram ter filho e uma delas encontrava-se gestante (1,1 %). Dados da Tabela 1 descrevem informações sobre relacionamento afetivo, orientação sexual, etilismo, tabagismo e uso de outras drogas entre as adolescentes.
Iniciação sexual e hábitos de vida
Quanto à iniciação sexual, 48 (51,1 %) das adolescentes afirmaram não ter relação sexual até o momento da pesquisa, enquanto 46 (48,9 %) apresentavam vida sexual ativa; dados apresentados na Tabela 1 retratam que a maioria das que relataram ter vida sexual ativa estava envolvida em relacionamento estável.
Fonte: elaboração própria (2020).
Maior frequência de relações sexuais e uso de preservativo entre as adolescentes foi encontrada entre aquelas que referiram a ingesta de bebidas alcoólicas (40 [42,5 %]; p < 0,05). Entre as adolescentes com vida sexual ativa (46 [48,9 %]), o maior percentual de uso da camisinha nas três últimas relações sexuais foi encontrado entre as participantes que referiram etilismo social.
Menarca, sexarca e uso de métodos contraceptivos
A média de idade para menarca foi de 12,2 anos (DP = 1,2) e apresentou correlação positiva com o início da vida sexual e o uso de preservativo nas últimas três relações (p < 0,05). Observou-se maior percentual de vida sexual ativa entre as participantes que referiram menarca com idade ≤ 12 anos (55,2 %; p = 0,05).
Entre as adolescentes sexualmente ativas, a sexarca ocorreu em média aos 15,6 anos (DP = 1,2) e, com relação ao uso de métodos contraceptivos na sexarca, 40,4 % das participantes referiram não ter feito uso. O uso mais frequente foi observado entre as que possuíam renda familiar ≥ 1 salário-mínimo (73,9 %; p < 0,05).
Os métodos contraceptivos utilizados na primeira relação sexual entre as adolescentes foram a camisinha (92,8 %) e a contracepção hormonal oral de emergência (7,2 %). Nas três últimas relações sexuais, o uso da camisinha foi mais frequente entre as que estavam em um relacionamento estável (37,3 %; p < 0,05).
As principais causas para a não utilização do preservativo nas relações sexuais habituais foram a utilização de anticoncepcionais hormonais orais (19,6 %), a existência de parceiro fixo (15,2 %) e a recusa à utilização (6,5 %) - seja pela não aceitação do parceiro (2,2 %), seja por escolha da própria adolescente (4,3 %).
Uso do preservativo feminino e masculino
A Tabela 2 traz a descrição do conhecimento e da prática sobre o uso de preservativos entre as adolescentes. Sobre o conhecimento, os dados demonstram que 87 (92,6 %) das adolescentes conheciam e já haviam tido contato com o preservativo masculino, enquanto apenas 59 (62,8 %) conheciam e tinham tido contato com o feminino.
Fonte: elaboração própria (2020).
Sobre a utilização do preservativo feminino, 41,5 % das adolescentes não sabiam qual o melhor momento para sua inserção; 6,4 % afirmaram que deveria ser iniciada a relação sexual sem o preservativo, inserindo-a na vagina para a finalização do ato sexual; 52,1 % responderam afirmando que a camisinha feminina deve ser inserida quando for iniciar a relação sexual ou até oito horas antes do coito.
Entre as adolescentes, 51,1 % não conheciam a forma de introdução da camisinha feminina no introito vaginal e apenas 23,4 % relataram a forma correta de uso; quanto à aceitação do preservativo por parte dos parceiros, apenas 25 % referiram que seus parceiros aceitavam o uso. O conhecimento do uso da camisinha masculina entre as participantes foi mais bem observado (92,6 %); apesar disso, 28,3 % das adolescentes com vida sexual ativa referiram nunca ter utilizado.
Quanto à inserção do preservativo masculino, a maioria das participantes (73,4 %) afirmou que o melhor momento é antes de iniciar a relação sexual, quando o pênis estiver ereto. Entre as adolescentes com vida sexual ativa, 38 % referiram a exigência do uso da camisinha masculina em todas as relações sexuais, enquanto 34 % exigiam o uso do preservativo eventualmente e 28 % não exigiam seu uso.
Ademais, o maior percentual de conhecimento sobre a forma de utilização da camisinha masculina foi encontrado entre as adolescentes com companheiro (80,4 %; p < 0,05) e entre aquelas com idade ≥ 18 anos (87,6 %; p < 0,05). Não foi observada associação significativa entre o conhecimento sobre a utilização da camisinha feminina e a presença de parceiro ou outras variáveis do estudo (p < 0,05).
Discussão
Conhecimento frágil sobre o uso de preservativos em práticas sexuais foi observado entre as adolescentes do estudo, principalmente a respeito do preservativo feminino. O déficit de conhecimento identificado salienta a presença de prática sexual insegura entre as adolescentes do estudo e a necessidade da adoção imediata de medidas educativas, a fim de disseminar princípios que visem à promoção de uma vida sexual segura entre as adolescentes.
De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (peNSE), em 2015, 86,6 % dos escolares incluídos em estudo não trabalhavam ou exerciam atividade remunerada 18. O exercício de atividades remuneradas por adolescentes é um importante fator a ser considerado, visto que a pobreza familiar pode representar um importante fator de risco à saúde sexual dos adolescentes 19.
A maioria das adolescentes do estudo possuía renda familiar mensal de até um salário-mínimo (61,3 %) e 58,5 % conviviam com quatro ou mais pessoas na mesma residência. Baixas condições socioeconómicas podem estar atreladas a maiores riscos de atividade sexual insegura (com exposição a ISTS e ao HIV), à gravidez indesejada e ao início precoce de uma vida sexual 9.
A iniciação sexual precoce também está atrelada a influências do meio em que o indivíduo está inserido, devido à necessidade de se sentir pertencente a ele; diante disso, informações deficientes e/ou equivocadas por familiares ou profissionais e por mídias sociais podem elevar a vulnerabilidade dos adolescentes em práticas sexuais 20.
Informações disseminadas no contexto familiar podem favorecer diretamente a iniciação sexual precoce e insegura, por meio da disseminação de informações precárias, da falta de apoio familiar ou ante a dificuldade de comunicação entre as partes, sendo este um fator a ser considerado em conjunto a outras variáveis que influenciam a iniciação sexual precoce e a prática insegura entre adolescentes 21.
Entre as adolescentes do estudo, 74,5 % eram católicas; e, embora a religiosidade esteja historicamente associada ao controle da sexualidade feminina, com o passar do tempo, tem ocorrido uma crescente desvinculação da atividade sexual com o casamento e a reprodução, conferindo à adolescente maior liberdade sexual 9. A religiosidade ainda constitui elemento de proteção para a sexarca precoce 7; no entanto, culturas conservadoras, em que a mulher deve corresponder às necessidades do homem, podem favorecer a falta de educação sobre a saúde sexual e a consequente exposição a riscos devido à prática sexual desinformada 22.
A média de idade do primeiro intercurso sexual no estudo foi de 15,6 anos. Estudo realizado com 937 adolescentes, dos quais 507 eram do sexo feminino, encontrou média de idade da iniciação sexual feminina de 15,8 anos, assemelhando-se aos dados encontrados 9. Ao passo que estudo com dados sobre o comportamento sexual de adolescentes da Astúrias e da Espanha nos anos de 2006 e 2014 evidenciou média de idade da primeira relação sexual de 15,4 (2006) e 15,0 (2014) anos entre australianas, e 14,7 (2006) e 14,4 (2014) anos entre espanholas, 4 e estudo realizado em 2019 identificou média de 18,1 anos para a sexarca entre adolescentes do sexo feminino 23.
Em diferentes culturas, a iniciação sexual feminina pode relacionar-se ao casamento precoce 13. Essa realidade tende a restringir o acesso das adolescentes à educação e a outras oportunidades, além de aumentar a probabilidade de gravidez na adolescência e a possível associação a vícios, como consumo de álcool e outras drogas 7.
O uso do contraceptivo na sexarca foi relatado por 40,4 % das adolescentes, uma porcentagem maior que a encontrada em outro estudo, em que apenas 11,3 % das adolescentes fizeram uso do preservativo em sua primeira relação sexual 9. No Quênia, as adolescentes identificaram a falta de planejamento e de discussão sobre medidas de prevenção como barreiras para o uso de proteção na sexarca, sendo este um momento de vulnerabilidade que requer a adoção imediata de estratégias de prevenção 24.
A camisinha é o método contraceptivo mais importante na relação sexual entre adolescentes, realizando dupla proteção - ISTS e gravidez 25,26 - e foi o método de maior utilização entre as participantes do presente estudo. No entanto, o uso da contracepção hormonal oral de emergência também esteve presente (7,2 %), o que constitui risco para as adolescentes.
O uso da contracepção hormonal de emergência é cada vez mais frequente entre adolescentes, no entanto o conhecimento sobre seu uso é insatisfatório, principalmente quanto a seus riscos, o que favorece a uma prática sexual insegura 27.
Condutas de adolescentes no primeiro intercurso sexual merecem atenção, pois ditam a adoção de hábitos para a vida sexual contínua. Isso pode ser constatado no presente estudo, no qual 47,8 % das participantes referiram não ter utilizado preservativo nas três últimas relações sexuais. Esse índice é superior ao descrito em outro estudo, no qual apenas 15,5 % dos adolescentes referiram não utilizar preservativo, dos quais 58,2 % eram do sexo feminino 26.
Pesquisa realizada com 4.325 adolescentes, ao investigar o uso do preservativo na última relação sexual, identificou que apenas 17,9 % das adolescentes entrevistadas não utilizaram 1. Revisão sistemática realizada evidenciou uso inconsistente de preservativos na última relação sexual; identificando, adicionalmente, diferenças entre gêneros, com índice feminino menor quanto ao uso de preservativos, quando comparado a seus pares masculinos 22. Entre adolescentes portugueses, foram identificados 88 % de uso de preservativo na última relação sexual 28.
O contexto pessoal em que as adolescentes estão inseridas pode influenciar diretamente a utilização de preservativos. Neste estudo, 78,2 % das adolescentes com vida sexual ativa estavam em algum envolvimento afetivo e, destas, 15,2 % afirmaram não ter feito uso do preservativo nas últimas três relações por ter parceiro fixo.
A existência de relação afetiva pode comprometer o uso do preservativo; no entanto, para a promoção de uma prática sexual segura, é fundamental que seja trabalhada e compreendida a responsabilidade de ambos os envolvidos na relação para a prevenção de ISTS/HIV e gravidez precoce, condições associadas à prática sexual insegura 29.
Em relações monogâmicas, a prevenção das ISTS ou do HIV toma um caráter secundário, tendo como maior preocupação a prevenção da gravidez, o que pode favorecer a substituição do preservativo pelo uso de pílula do dia seguinte ou pelos anticoncepcionais. Em um estudo, 27,6 % dos adolescentes justificaram o uso do preservativo na última relação para prevenir ISTS, ao passo que 45,3 % alegaram a prevenção da gravidez como principal motivação 30.
Importante fator que pode estar relacionado à não utilização dos preservativos é a dificuldade de negociação com o parceiro 31; no entanto, esse fato se contrapõe aos dados encontrados no presente estudo, uma vez que o percentual de adolescentes que afirmam não usar o preservativo por recusa própria é superior ao das que não utilizaram ante a recusa do parceiro (4,3 % e 2,2 %, respectivamente).
A orientação sexual também é um dos fatores associados ao uso da camisinha. Neste estudo, 8,5 % das adolescentes referiram apresentar comportamento bissexual ou homossexual. Este é um dado superior ao percentual encontrado em estudo realizado com 3.195 estudantes do setor público e privado, em que 3 % dos adolescentes referiram comportamento bissexual e homossexual 32.
Diferenças comportamentais e de adoção de práticas de risco são encontradas entre gêneros e orientações sexuais, a exemplo disso, estudo demonstrou que mulheres homossexuais são mais propensas a fumar e beber 33. Diferenças entre gêneros devem ser consideradas, ao passo que estas podem, adicionalmente, favorecer a adoção de práticas sexuais inseguras, como o não uso de preservativos.
Na população estudada, 42,5 % referiram etilismo social, e a maioria destas tinha vida sexual ativa (65 %), o que corrobora com estudo que investigou comportamentos de risco para a iniciação da vida sexual entre adolescentes e que, apesar de não encontrar fortes associações entre idade e maior exposição a todos os riscos, identificou que o consumo de álcool foi elevado entre os participantes sexualmente ativos (52,3 %) 21.
O consumo de álcool e outras drogas vem sendo associado ao início sexual precoce, o que representa risco aumentado para as relações desprotegidas e para o uso inconsciente de métodos anticoncepcionais, com maior risco de gravidez, ISTS e HIV, arrependimentos, depressão e ideação suicida 7.
Apesar disso, o maior percentual de uso da camisinha nas três últimas relações sexuais entre as participantes do presente estudo foi encontrado entre as que referiram a ingesta de bebidas alcoólicas (37,5 %), fator que merece análises posteriores quanto aos aspectos socioculturais aos quais podem estar associados.
Ademais, o conhecimento insuficiente quanto ao uso de métodos contraceptivos, como a camisinha feminina, é um importante fator a ser considerado na ocorrência de relações desprotegidas. Entre as participantes do presente estudo, o conhecimento sobre o uso da camisinha feminina foi baixo e estudo realizado apontou que, mesmo ante a existência de conhecimento sobre o preservativo feminino, seu uso ainda é incipiente e apresenta resistência por parte das próprias mulheres, além da pouca disponibilidade ainda encontrada em postos de saúde 34.
Nesse contexto, apesar de o uso da camisinha feminina estar associado a maior autonomia e maior poder de decisão, existem barreiras para seu uso que podem relacionar-se à sua aparência, a diferenças socioculturais entre homens e mulheres e ao alto custo do preservativo feminino 35.
Abordagens efetivas junto aos adolescentes são necessárias, promovendo oportunidades para a troca de conhecimento e de informações claras e precisas em seus ambientes de relacionamento; adolescentes interagem diariamente com outras pessoas e formam relações sociais em casa, na escola e na comunidade e, nesse sentido, a escola tem representado um importante local a ser considerado para a abordagem da saúde sexual do adolescente, na promoção de práticas sexuais seguras 36.
A peNSE 2015 evidenciou que 88,4 % das adolescentes afirmam receber informações sobre a ISTS e HIV, e 82 % delas sabem como prevenir uma gravidez 18. Contudo, os achados do presente estudo reforçam a necessidade de intervenções educativas, a fim de estimulá-las quanto ao uso consciente do preservativo e à prática sexual segura.
Estudo conduzido para avaliar indicadores relacionados à educação sexual abrangente no México evidenciou que 84,4 % das adolescentes têm atitude positiva com relação ao preservativo 37. Nesse sentido, é imperativo que se utilize de estratégias de ensino sobre a importância da prática sexual segura, com educação abrangente e informações facilitadoras e debates sobre riscos e práticas de prevenção que permitirão ao adolescente desenvolver habilidades e competências para vivenciar uma sexualidade saudável e segura 38,39.
Salienta-se que, apesar de este estudo não ter abordado jovens adolescentes do sexo masculino, é importante destacar que a repressão feminina atrelada à liberdade masculina desde a infância causam impactos consideráveis no comportamento sexual das adolescentes; a cultura construída pela sociedade denomina papéis distintos para homens e mulheres no que diz respeito à vivência plena e saudável da sexualidade, e essas imposições podem afetar a adoção de práticas sexuais inseguras, tornando essa população mais vulnerável aos riscos de contrair HIV, ISTS e da gravidez precoce 38,40.
As limitações do estudo estão relacionadas ao tamanho reduzido da amostra, em virtude de ter sido realizado no final do período letivo e em uma única escola. No entanto, os dados do presente estudo são fundamentais para a triagem do comportamento e dos hábitos sexuais das adolescentes, servindo como base orientadora para a realização de novas pesquisas comparativas e analíticas sobre a temática com um número maior de participantes, bem como a tomada de condutas em saúde e no âmbito escolar.
Conclusões
Identificou-se que as participantes do presente estudo apresentam conhecimento frágil sobre preservativos, com a adoção de prática sexual insegura. Apesar de a maioria das participantes afirmar conhecer os métodos de dupla proteção na relação sexual, não houve estreita ligação entre conhecimento e prática, evidenciando fragilidades na qualidade das informações que elas possuem sobre os métodos de proteção.
Ademais, a evidência encontrada de que as adolescentes apresentaram maior percentual de recusa ao uso do preservativo do que seus parceiros salienta a importância do conhecimento sobre o impacto da influência de mudanças em representações sociais de gênero e o aumento da autonomia feminina na adoção de práticas sexuais inseguras por adolescentes.
Dessa forma, o desenvolvimento de estratégias de educação sexual associada ao desenvolvimento de habilidades e competências positivas para a saúde sexual é fundamental, a fim de possibilitar às adolescentes o desfrutar e expressar de sua sexualidade de forma positiva, informada e segura, sendo o ambiente escolar um local favorável para o desenvolvimento de ações educativas por parcerias entre os ministérios da saúde e da educação.