Introdução
Os programas, metodologias ou abordagens de melhoria contínua como Lean Manufacturing, Total Quality Management (TQM), Seis Sigma, Kaizen e Total Productive Maintenance (TPM) têm como um de seus principais fundamentos a análise e resolução de problemas fundamentadas na probabilidade e na estatística (Hoerl e Snee, 2010; Goh, 2011; Ghosh, 2013; Ramesh e Ravi, 2013; Montgomery, 2014). Entretanto, a difusão e aplicação dos conceitos e ferramentas estatísticas (FE) encontram barreiras para o uso frequente na tomada de decisões (Makrymichalos, Antony, Antony e Kumar, 2005).
O pensamento estatístico (PEst) deve ser inerente às análises e práticas de gestão da alta gerência (Abrahan, 2005). Ele indica que a variação está presente nos processos e deve ser quantificada e controlada com o apoio de conceitos, métodos e FE (Snee, 1990; Hoerl e Snee, 2010). O PEst constitui um conjunto de conhecimentos e práticas antecedentes para o uso efetivo e consciente das técnicas, métodos e FE (Hoerl e Snee, 2012).
A estatística teve suas aplicações ampliadas no século XXI, em decorrência da difusão de diversas abordagens de apoio à melhoria, que incorporaram nas suas práticas a filosofia do controle estatístico de processos (CEP) e a utilização do PEst e de FE para a identificação, análise, observação e solução de problemas (Goh, 2011; Ghosh, 2013; Ramesh e Ravi, 2013; Lim, Antony e Albliwi, 2014; Montgomery, 2014; Chaurasia, Garg e Agarwal, 2016). Porém, ainda há dificuldades para a implantação, manutenção e continuidade na utilização de PEst e de FE e das abordagens de melhoria que são baseadas nesse uso (Does e Trip, 1997; Antony, Balbontin e Taner, 2000; Grigg e Walls, 2007; Elg, Olsson e Dahlgaard, 2008; Box e Woodall, 2012).
No Brasil, e na literatura, há pouco conhecimento sobre o uso prático no setor industrial dos conceitos e ferramentas estatísticos, principalmente dos conceitos do PEst e dos benefícios operacionais percebidos com esse uso.
Este artigo identifica o nível de utilização do PEST e de FE, bem como os benefícios percebidos na melhoria, análise e controle dos processos, observando associações entre o nível de utilização e fatores como abordagens de melhoria, certificação de sistemas de gestão, investimentos em PEst e em FE, e importância estratégica da qualidade, em empresas da indústria de autopeças do estado de São Paulo, Brasil. Foi realizado um websurvey junto a um universo identificado de 247 plantas produtivas, que representa o total de médias e grandes empresas industriais de autopeças no estado brasileiro mais industrializado: São Paulo (Sindipeças & Abipeças, 2015). É esperado que, nas empresas de maior porte, seja mais provável encontrar abordagens de melhoria implantadas e maior utilização da estatística (tanto do PEst quanto de FE). Durante a pesquisa empírica, não foi possível o acesso e não se conseguiram informações sobre a quem enviar o questionário da pesquisa a cerca de 100 dessas empresas. Assim, a população efetivamente acessada foi inferior ao universo de 247 unidades. A amostra foi de 32 empresas com respostas completas e válidas no questionário aplicado, ou seja, 12,95% do universo objeto deste trabalho.
Dados da Sindipeças & Abipeças (2015) mostram que 67,1% das unidades empresariais (fábricas e escritórios) do setor de autopeças no Brasil estão localizadas no estado brasileiro de São Paulo, o que justifica a representatividade da pesquisa de campo nesse estado. Esse setor compreende a fabricação de componentes para veículos automotores para transporte de pessoas e mercadorias e fabricação de cabines, carrocerias, reboques e semirreboques para veículos automotores. A indústria de autopeças brasileira empregava cerca de 197,4 mil trabalhadores em 2014, sendo 63,8% em empresas no estado de São Paulo (Anfavea, 2016; Sindipeças & Abipeças, 2016).
Na sequência, o artigo apresenta a conceituação sobre PEst e FE, o método de pesquisa, a descrição e análise dos dados da pesquisa de campo e as considerações finais.
Pensamento Estatístico e Ferramentas Estatísticas
Para Hoerl e Snee (2012), as abordagens de melhoria contínua se caracterizam pela visão baseada em processos, pela utilização de dados para a tomada de decisões e pela medição e redução da variação. Essas características são relativas à área de conhecimento da estatística.
Snee (1990) assim como Makrymichalos et al. (2005) e Hoerl e Snee (2012) definem que o PEST é uma abordagem de aprendizado baseada nos conceitos de que:
todo sistema de produção pode ser visto como uma complexa rede de processos;
a variação é inerente aos processos;
a identificação e redução da variação são críticas para a melhoria do desempenho operacional.
Para fins de aplicação prática, o PEst, por ser mais abstrato em comparação às ferramentas, pode ser definido nos seguintes conceitos: medição de dados e características dos processos, avaliação da confiabilidade e origem dos dados, abordagem de problemas baseada em fatos e dados, busca da melhoria de todos os processos, identificação e redução de variação através da análise das causas em materiais, máquinas, métodos, pessoas e medições (Snee, 1990). Esses conceitos devem ser disseminados nos diversos níveis hierárquicos da empresa (Snee, 1990; Abrahan, 2005). Para que a disseminação seja efetiva, a alta gerência precisa estar comprometida, a fim de que haja uma real compreensão e difusão dos conceitos por toda a empresa (Abrahan, 2005).
O PEst, aplicado à melhoria da qualidade de produtos e processos, deve analisar a variação, suas causas e origens, tentando reduzi-la para que o processo entre em um estado de controle estatístico, o que possibilita o controle e melhoria do processo por meio da diminuição da variação (Snee, 1990; Makrymichalos et al., 2005). Porém, muitas vezes, tenta-se controlar as variações sem a correta utilização do PEst e de FE; dessa forma, não são analisadas, de forma sistemática e estratégica, as causas dos problemas que geram efeitos indesejáveis (Makrymichalos et al., 2005).
Dados são cruciais na análise da variabilidade, já que incorporam incertezas oriundas dos sistemas utilizados para a medição. Esses erros influenciam na análise dos dados e nos resultados dos métodos estatísticos aplicados (Wild e Pfannkuch, 1999; Makrymichalos et al., 2005). Para a incorporação do PEST nos processos, deve haver a certificação de que a mensuração dos dados esteja sendo feita com precisão para garantir a qualidade das análises, o que pode ser realizado com métodos de Análise de Sistema de Medição [Measurement Systems Analysis - MSA] (Hoerl e Snee, 2009).
A análise de dados dos processos permite um entendimento mais profundo e assertivo sobre as fontes de variação a serem controladas para a melhoria do desempenho operacional (Hoerl e Snee, 2010; Santos e Antonelli, 2011). O quadro 1 apresenta os fatores principais a serem considerados para a efetiva implantação do PEst, conforme recomendações de autores que abordam o tema.
Fatores | Fonte |
Treinamento constante e disseminação do uso de conceitos do PEst. | Snee (1990) e Abrahan (2005) |
Apoio da alta gerência na implantação dos conceitos do PEst. | Abrahan (2005) |
Controle estatístico do processo. | Snee (1990) e Makrymichalos et al. (2005) |
Visão de processos interconectados. | Snee (1990), Makrymichalos et al. (2005) e Hoerl e Snee (2012) |
Compreensão sobre a variação de processos e entendimento sobre a criticidade da sua redução. | Snee (1990), Makrymichalos et al. (2005), Hoerl e Snee (2012) |
Compreensão da necessidade de quantificação da variação. | Snee (1990), Makrymichalos et al. (2005) e Hoerl e Snee (2012) |
Qualidade e confiabilidade dos dados utilizados nas análises. | Wild e Pfannkuch (1999) e Makrymichalos et al. (2005) |
Uso de MSA. | Hoerl e Snee (2009) |
Decisões baseadas na análise de dados. | Hoerl e Snee (2012) |
Consideração de causa e efeito para os problemas decorrentes da variação não desejada. | Makrymichalos et al. (2005) |
Fonte: elaborado pelos autores.
O uso de ferramentas estatísticas fortalece o entendimento e prática dos conceitos do PEst na análise de problemas e processos. O PEst deve ser um antecedente do uso dos métodos e FE, uma vez que esses conceitos são de aplicação geral, e as técnicas têm como prerrequisito a compreensão desses conceitos (Britz et al., 2000). A integração entre os conceitos e as FE robustece a capacidade de resolver problemas e impacta diretamente no desempenho da empresa e de seus processos. Para Grigg e Walls (2007) e Coleman (2013), o PEst é imprescindível para a evolução da busca de um maior grau de qualidade nas organizações, com fortes indicativos de que os profissionais que o praticam têm mais ideias inovadoras, ainda que dependam do envolvimento da alta gerência para que elas possam ser colocadas em prática.
O interesse e importância dada à qualidade e à melhoria contínua influencia a utilização do PEST e de FE nas organizações (Hoerl e Snee, 2010). A compreensão e prática do PEst no nível estratégico da organização influenciam mais a racionalidade nas decisões do que o uso isolado dos métodos estatísticos (Hare, Hoerl, Hromi e Snee, 1995; Hoerl e Snee, 2012; Hare, 2012). Considerando a diminuição da variabilidade dos processos, o PE fundamenta a aplicação das ferramentas no nível operacional da organização (Snee, 1990; Hoerl e Snee, 2012).
Os métodos, técnicas e FE possuem três áreas de aplicações distintas (Evans e Lindsay, 2005): aplicação para a coleta, organização e descrição eficiente dos dados (estatística descritiva); uso dos dados para a inferência sobre características de uma população (inferência estatística) e ferramentas e técnicas para projetar e analisar cenários (estatística preditiva).
É possível classificar as técnicas e ferramentas considerando sua complexidade (Evans e Lindsay, 2005): básicas (gráfico de dispersão, tabelas de contagem, diagrama de Ishikawa, estratificação, diagrama ou análise de Pareto, histograma, gráfico sequencial, entre outros); intermediárias (cartas de controle, técnicas e planos de amostragem, análise da capabilidade do processo, inferência estatística, métodos não paramétricos e regressão) e avançadas (análise multivariada, método Taguchi, design de experimentos, entre outros). Outras ferramentas avançadas englobam a Análise de Variância (ANOVA), regressão múltipla e testes de hipóteses (Antony e Banuelas, 2002; Easton e Rosenzweig, 2012).
Alguns fatores podem auxiliar na implantação e utilização do PEst e de FE, como a presença de facilitadores com conhecimento adequado para treinamento em PEst, apresentação de exemplos e experiências anteriores para demonstrar as possíveis aplicações e resultados potenciais, e inclusão de profissionais experientes na estatística em novos projetos de melhoria, como meios de assegurar a aplicação consciente e adequada da estatística (Makrymichalos et al., 2005; Snee, 2005; Hoerl e Snee, 2010).
Para Coleman (2013), o PEst deveria expandir e incluir mais aspectos do pensamento analítico, tornando-se o que o autor chama de "Pensamento Estatístico Amplo", o qual abarca, além dos conceitos e ferramentas tradicionais de tratamento de dados, as ferramentas de coleta e tratamento de dados em tempo real, bem como a utilização de infográficos, webinars e de vídeos no YouTube para a discussão e divulgação de resultados.
Porém, ainda há dificuldades na implantação e utilização do PEst e de FE (Makrymichalos et al., 2005); algumas delas são apresentadas no quadro 2.
Dificuldades para a utilização do do PEst e de FE | Autores |
Falta de cultura para a aplicação do PEst e de FE, que envolve mudanças e novas formas de ação. | Makrymichalos et al. (2005) |
Inexistência de aplicação sistemática de FE, com uso apenas pontual e a partir de exigências de clientes. | Makrymichalos et al. (2005) |
Falta de conhecimento interno adequado por engenheiros e gerentes, que suporte a aplicação sistemática. | Ahmed e Hassan (2003), Makrymichalos et al. (2005), Montgomery (2010), Coleman (2013) |
O conhecimento prévio insuficiente em estatística dificulta a aplicação. | Abrahan (2005) |
Prevalece o ponto de vista da complexidade da estatística. | Makrymichalos et al. (2005) |
Uso de conceitos e FE apenas para apagar incêndios, resolvendo os problemas de forma pontual e não estratégica para melhorar os processos de negócio. Pouca crença de que PEst e FE possuem potencial para resolver problemas. | Makrymichalos et al. (2005) e Firka (2011) |
O PEst e FE são aplicados, principalmente, em nível operacional, e são pouco utilizados em questões gerenciais e estratégicas. | Bjerke e Hersleth (2001) e Makrymichalos et al. (2005) |
Fonte: elaborado pelos autores.
Método de pesquisa
A revisão bibliográfica foi utilizada para a identificação de conceitos para a elaboração de um questionário estruturado em quatro partes. A primeira parte possuía questões abertas relacionadas a dados gerais da empresa, como porte, nacionalidade, uso de softwares para análises estatísticas, presença de sistemas de gestão certificados e de abordagens de melhoria da qualidade, também foi questionada a importância da qualidade nas empresas entrevistadas. Ainda com questões abertas, foi questionado sobre treinamento e investimentos realizados pela empresa em PEst e em FE. A segunda parte do questionário é relacionada à presença e uso dos conceitos do PEst. Na terceira, à aplicação de FE básicas e intermediárias conjuntamente e avançadas. E a última está relacionada aos benefícios, operacionais e para a equipe, identificados com a aplicação. Da segunda à quarta parte, continham-se questões com alternativas fechadas numa escala Likert de resposta de concordância de 1 a 5, considerada adequada com indicações de níveis de resposta que facilitam a compreensão prática pelo respondente, para identificar a concordância com as afirmações sobre a utilização de PEst, FE e benefícios.
Foi realizado um pré-teste, em visitas presenciais a quatro empresas, que permitiu ajustes para melhorar a compreensão das questões e o foco do questionário. O pré-teste e a seleção dos respondentes-alvo (gerente de produção, de qualidade ou da área de melhoria) foram ações para a diminuição dos erros de medição. Conforme Dillman (1991) e Couper e Miller (2008), os erros de medição resultam da inabilidade do respondente em responder às perguntas e de dificuldades com o próprio questionário. Foi feita a validação interna preliminar do questionário por meio do cálculo do Alfa de Cronbach com a utilização do software Statistica 8.0, com as quatro empresas em que se realizaram as visitas presenciais, obtendo-se um valor de 0,9018. O Alfa de Cronbach também foi calculado para as 32 empresas amostradas, obtendo-se o valor 0,9749 para o questionário, maior do que o valor de 0,7 estipulado como nível mínimo para o valor do Alfa de Cronbach (Hair, Black, Babin, Anderson e Tatham, 2006). O Alfa de Cronbach indica que os respondentes compreenderam as questões e que as respostas do questionário possuem consistência e coerência interna.
O instrumento utilizado para o levantamento de dados foi o websurvey. A classificação do porte das empresas foi com base no número de funcionários (empresas industriais com até 19 funcionários são microempresas; de 20 até 99 funcionários, pequenas empresas; de 100 até 499 funcionários, médias empresas e, com mais de 500 funcionários, grandes empresas) (Sebrae, 2014). Pequenas e microempresas (menos de 100 funcionários) não foram consideradas como popula-ção-alvo, por ser um ambiente menos provável para encontrar as variáveis investigadas. Para o questionário respondido ser aproveitado, era necessário que a empresa tivesse algum sistema de gestão certificado (por exemplo, ISO 9000 ou TS 16949) e/ou alguma abordagem de melhoria (por exemplo, Lean Manufacturing, Eventos Kaizen, TQM ou Seis Sigma). O websurvey foi escolhido em decorrência do seu baixo custo e por viabilizar o envio do questionário de forma padronizada, com métodos autoadministrados pelos respondentes (Cou-per e Miller, 2008).
Foi identificada uma população-alvo de 247 unidades industriais, de grande e médio porte, porém não foi possível identificar o contato do respondente para toda a população (o contato foi obtido via ligações telefônicas e acesso ao site da empresa). Um convite juntamente com o link do websurvey foi enviado ao respondente; uma segunda onda de e-mails foi enviada duas semanas após a primeira, a fim de aumentar a taxa de resposta. Foram obtidos 32 questionários válidos, ou seja, uma amostra de 12,95 % da população. Esse survey pode ser classificado como exploratório, e não como descritivo e representativo, cujas conclusões poderiam ser extrapoladas para a população.
Para a análise dos dados, foi realizada uma análise descritiva; posteriormente, foi utilizada a análise de cluster para classificar e agrupar as empresas de acordo com a utilização de PEst, FE e benefícios percebidos. Em um segundo momento, foi utilizado o teste de Fisher para identificar a associação entre maior uso de PEst, FE e benefícios e a presença de fatores como abordagens de melhoria, certificação em sistemas de gestão, investimentos em PEst e em FE e importância estratégica da qualidade, fatores esses que mostraram estar relacionados à utilização de PEst e de FE pelo apresentado na revisão bibliográfica. O teste de Fisher visa comprovar ou rejeitar as seguintes hipóteses:
H0: não existe associação entre as variáveis utilizadas para a formação dos clusters (utilização de PEst, FE e benefícios) e os fatores da empresa (por exemplo, presença de fatores como abordagens de melhoria, certificação de sistemas de gestão, investimentos em PEst e em FE e importância da qualidade);
H1: existe associação entre as variáveis.
Foi considerado, para a aceitação de H1, um p-valor menor que 0,05.
Análise dos dados
Características da amostra
A amostra é constituída por 20 (62%) grandes empresas e 12 (38 %) empresas de médio porte do setor de autopeças, situadas em São Paulo, Brasil. Em relação à nacionalidade, 12 (38 %) das empresas são brasileiras, seguidas por 10 (31 %) alemãs, 4 (13 %) americanas e as outras francesas e italianas.
Quanto à certificação de sistemas de gestão, destacaram-se: NBR ISO 9001:2008, NBR ISO 14001:2004 e TS 16949. A ISO 9001 e a 14001 estão presentes em 75% da amostra e a TS em 63%. As empresas também foram questionadas sobre a utilização das seguintes abordagens de melhoria: Melhorias no dia a dia, 5s, Caixa de sugestões, TPM, Seis Sigma, Eventos Kaizen, Lean Manufacturing, Lean Sigma e TQM. As frequências de uso dessas abordagens são mostradas na figura 1.
O 5s está presente em todas as empresas amostradas seguido pelo programa Melhoria no dia a dia, presente em 91°% da amostra, ambas as iniciativas são de compreensão mais simples, que possibilitam e motivam o envolvimento da área produtiva. Já o Lean Sigma não é adotado em 53% das empresas, possivelmente por ser um programa mais recente e complexo. Os demais programas são utilizados em número considerável de empresas da amostra. A presença do Seis Sigma em 69% das empresas, do TPM em 72%, do TQM em 66% e de Eventos Kaizen em 78% das empresas pode indicar uma maior facilidade de as empresas do setor evoluírem para o estabelecimento e difusão do PEst.
Ao serem questionadas sobre o grau de importância da qualidade para a empresa, 88% indicaram que esse grau é alto, apenas 6% indicaram importância média e baixa. Isso justificaria a utilização mais ampla de abordagens de melhoria nessas empresas.
Quanto ao uso de softwares de gestão da produção e integrada: 88 % da amostra utiliza o Enterprise Resource Planning (ERP), aproximadamente 22% usam Gestão do Ciclo de Vida do Produto ou Product Life-Cycle Management (PLM), 13% o Customer Relationship Management (CRM) ou Gerenciamento do Relacionamento com o Cliente e 3% o Warehouse Management Systems (WMS) (ou Sistemas de Gerenciamento de Armazém), como disposto na figura 2. O uso de softwares como o ERP permite acesso a um grande volume de dados, que podem, caso tenham confiabilidade, ser entradas potenciais para o uso mais extensivo de FE.
Quando questionadas sobre os recursos utilizados para a análise de dados por meio de FE, 59% responderam que usam o programa Minitab, 13% declararam não utilizar nenhum programa específico e o restante se distribui no uso de outros programas como o Qs-Stat (16%), Excel (6%) e os programas Statística, PC-Factory e Action, que são usados por 3 %, conforme figura 3.
Utilização do Pensamento Estatístico
Na amostra, 50% das empresas não realizam ações de treinamento sistemático e disseminação do PEst e de FE a todos seus funcionários. Dos outros 50%, metade realiza treinamento sistemático e difusão do PEst ou FE há menos de cinco anos e os outros 25% realizam há pelo menos cinco anos (figura 4).
O investimento em treinamento na estatística tem aumentado pouco em 50% das respondentes, e não tem aumentado em 34%. Esse investimento tem aumentado significativamente em apenas 16% das empresas amostradas (figura 5).
Para que fosse possível identificar a utilização de conceitos do PEst nas empresas analisadas, foram aplicadas 13 questões referentes à importância da identificação e análise da variabilidade do processo, ao tratamento de dados e ao sistema de medição existente. Os dados obtidos (tabela 1) indicam que o treinamento continuado em conceitos de PEst (item 1) não ocorre frequentemente em 78% das empresas e, em 50%, o treinamento continuado em conceitos do PEst ocorre raramente ou nunca. Por outro lado, observa-se que práticas relacionadas ao controle estatístico do processo, filosofia bastante difundida em empresas desse segmento, como, por exemplo, a compreensão sobre a variabilidade dos processos (item 7), compreensão da necessidade de quantificação da variação (item 8), uso de MSA (item 10) e considerações de relações de causa e efeito (item 12) são aplicadas frequentemente em cerca de 50%, 50%, 47% e 75% das empresas, respectivamente. Essas práticas estão associadas ao controle da variação.
Itens do PEst | Nunca/ Raramente | Algumas vezes | Frequentemente/ Sempre |
1. Treinamento frequente de conceitos do PEst. | 50% | 28% | 22% |
2. Apoio da alta gerência na implantação dos conceitos do PEst. | 28% | 22% | 50% |
3. O uso de conceitos do PEst é disseminado na produção. | 38% | 41% | 22% |
4. O processo principal está sob controle estatístico. | 31% | 13% | 56% |
5. Existência de visão de processo entre supervisores e gestores. | 19% | 19% | 63% |
6. Existência de visão de processos entre operadores. | 28% | 47% | 25% |
7. Compreensão sobre variação dos processos. | 19% | 31% | 50% |
8. Compreensão da necessidade de quantificação da variação. | 22% | 28% | 50% |
9. Questionamento dos dados a serem utilizados. | 25% | 41% | 34% |
10. Uso de [VISA. | 28% | 25% | 47% |
11. Tomada de decisões baseada em fatos e dados. | 28% | 22% | 50% |
12. Consideração de relações de causa e efeito. | 16% | 9% | 75% |
13. Entendimento sobre a criticidade da diminuição da variação. | 28% | 6% | 66% |
Fonte: pesquisa empírica.
O apoio da alta e média gerências na implantação do PEst (item 2) não ocorre frequentemente em 50% das empresas. Essa relativa falta de apoio indica dificuldades na utilização e disseminação do pensamento estatístico, como já apontado anteriormente por Montgomery (2010). Esse fato implica dificuldades na disseminação dos conceitos do pensamento estatístico (item 3). A disseminação desses conceitos ocorre com frequência ou sempre em apenas 22% das empresas, o que é similar ao verificado em outras pesquisas, por exemplo, Ahmed e Hassan (2003).
Ao analisar os itens 5 e 6 da tabela 1, é possível observar que conceitos do PEst estão presentes nas empresas em sua maioria no uso por supervisores e gestores (63% dos respondentes das empresas consideram que o nível de supervisores e gerentes frequentemente/sempre possuem a visão de processos), e com uso bem menos intenso no nível de operadores (25%).
Decisões fundamentadas em fatos e dados (item 11 da tabela 1) são pouco executadas ao se considerar o esperado, principalmente nesse setor, tradicionalmente reconhecido como o de maior maturidade em relação à preocupação com a qualidade e sua gestão, e com forte presença de unidades, no Brasil, pertencentes a grandes corporações multinacionais. Metade da amostra não toma decisões frequentemente baseadas em dados e fatos (item 11), e, em 66% das empresas da amostra, não há questionamento frequente sobre os dados a serem utilizados e sua qualidade (item 9).
Porém, as empresas mostram-se preocupadas com o aprimoramento dos sistemas de medição e seu uso mais frequente, bem como com a aplicação de conceitos do PEst no ambiente operacional, o que pode ser visto como um passo à frente na evolução da aplicação de conceitos do PEst nessas empresas, dado que o entendimento sobre a criticidade da diminuição da variabilidade dos processos (item 13) e o apoio da alta gerência na implantação dos conceitos do PEst (item 2) estão frequentemente ou sempre presentes, respectivamente, em 66 % e 50 % das empresas.
Uso de Ferramentas Estatísticas
Conforme a revisão bibliográfica, para a difusão de PEst e de FE no âmbito operacional, faz-se necessário aumentar a alocação, em projetos de melhoria da qualidade e controle de processos, de especialistas nesse conhecimento que possibilitem colocá-los em prática e incentivar e orientar os demais colaboradores para o uso correto, estimulando o uso rotineiro e continuado (Snee, 1990; Makrymichalos et al., 2005). Os dados da figura 6 demonstram que raramente ou nunca há o uso de facilitadores em 38% das empresas. A disponibilização de exemplos claros de aplicação para a difusão de PEst e de FE é raramente ou nunca praticada em 41°% das empresas. A inclusão de profissionais com experiência prévia na estatística em grupos de melhoria é nunca ou raramente realizada em 35% das empresas. Essas ações são sempre ou frequentemente realizadas em 41, 31 e 28% das empresas amostradas, respectivamente. Esses resultados podem sinalizar a falta de estratégia para o uso evolucionário e continuado da estatística nessas empresas, principalmente pelo pessoal de nível operacional. Como um dos principais obstáculos na utilização do PEst e de FE é a ausência de conhecimento pela equipe da empresa, ações como as apresentadas na figura 6 poderiam fomentar o uso mais abrangente e constante destes.
Avaliou-se a frequência em que as empresas aplicam as FE básicas e intermediárias em contraposição com a aplicação das avançadas (tabela 2). As ferramentas básicas e intermediárias são mais utilizadas (uma média de 50% das empresas faz uso frequente de pelo menos alguma dessas técnicas). As avançadas são utilizadas em intensidade significativamente menor (uma média de 14% das empresas faz uso frequente de alguma dessas técnicas). A diferença no uso conforme a complexidade da técnica já foi apontada em outras pesquisas de campo, como em Grigg e Walls (2007).
Considerando as ferramentas de baixa e média complexidade, destaca-se o uso frequente de diagrama de Ishikawa (75 % das empresas), medição e análise da capabilidade do processo (69%), carta de controle (63%) e planos de amostragem (59%). Algumas ferramentas possuem baixa frequência de uso, como regressão e diagrama de correlação (gráfico de dispersão), que são usados sempre ou frequentemente por 16 e 19% das empresas; esse fato pode ocorrer porque, apesar de terem sido consideradas, na pesquisa, como ferramentas básicas e intermediárias, podem ser vistas como complexas do ponto de vista dos usuários.
Quanto às ferramentas avançadas, destaca-se o uso mais frequente apenas de MSA (56% das empresas), que, como observado na análise do uso do PEst, pode ter esse nível de uso por estar relacionada com o controle estatístico do processo de uso comum e tradicional nessa indústria. Além disso, o uso de MSA é recomendado na norma ISO TS 16949 e normalmente é exigido pelas montadoras automotivas, para assegurar a confiabilidade e origem dos dados e medições dos produtos e processos das autopeças. As técnicas avançadas como simulação de processos (15%) e de testes de hipótese (12%) são as outras com maior uso frequente (tabela 2).
Além de a maior parte das ferramentas básicas/intermediárias ser a mais utilizada, vê-se que a porcentagem de empresas que não utiliza as técnicas avançadas é elevada. À exceção da de Análise do Sistema de Medição, as demais técnicas não são utilizadas por pelo menos 66% da amostra. A regressão múltipla, por exemplo, apresenta grau de nenhuma ou rara utilização em 84% da amostra, e nenhuma empresa (0%) a utiliza sempre ou frequentemente.
Foi questionado se a unidade aplica sistematicamente FE para controle, gestão e melhoria da qualidade de processos: 14 empresas (44%) responderam que não. A tabela 3 mostra as razões apontadas para o não uso sistemático das FE. Um dos motivos principais é a inexistência de cultura organizacional para a aplicação (50%) e o fato de aplicarem de forma esporádica devido a exigências de clientes ou de organismos de homologação e certificação (50%).
Motivos | Concordância |
Ausência de cultura organizacional para a implantação. | 50% |
Aplicação esporádica decorrente de exigências de clientes ou de auditorias externas. | 50% |
Ausência de conhecimento de equipes da empresa para orientar o uso rotineiro. | 43% |
O desconhecimento dos colaboradores dificulta o uso. | 29% |
Visão de que a utilização é complexa. | 21% |
Descrença no potencial de resultados que podem ser gerados pela estatística. | 21% |
Não se percebe a utilidade do uso rotineiro. | 14% |
A alta gerência sente o pensamento e as fe como ferramentas para uso pontual (para "combater incêndios") | 0% |
A alta gerência sente que a estatística é mais adequada ao nível operacional e pouco relevante para problemas estratégicos. | 0% |
Fonte: pesquisa empírica.
A tabela 3 também apresenta como motivo que leva as empresas a não utilizarem as FE a falta de conhecimento para a aplicação sistemática (43%), o que parece coerente com o mostrado na figura 6, sobre o baixo incentivo ao uso de facilitadores de PEst e de FE, o baixo uso de exemplos de aplicação e ao pouco uso da prática de alocar pessoas especialistas em projetos de melhoria.
Benefícios da aplicação de PEst e FE
Para identificar e analisar os benefícios que resultam do uso da estatística, foram aplicadas 15 questões. Os resultados mais relevantes (percepção alta ou muito alta do benefício na empresa) percebidos foram a melhoria nos índices de Cp e Cpk (capabilidade) do processo (53% da amostra), a diminuição no índice de produtos não conformes internos (50%) e a melhora na satisfação dos clientes (50%). Porém, a diminuição do tempo de ciclo e a diminuição dos custos de produção não foram benefícios percebidos em cerca de 34% e 31% das empresas, respectivamente. Os benefícios operacionais são apresentados na tabela 4.
Benefícios operacionais | Nenhum/pequeno | Moderado | Grande/muito grande |
Melhora nos índices Cp e Cpk. | 22% | 25% | 53% |
Diminuição no índice de produtos defeituosos internos (na planta) | 22% | 28% | 50% |
Melhora na satisfação de clientes. | 28% | 22% | 50% |
Diminuição dos custos de falha (internamente e externamente) | 28% | 25% | 47% |
Diminuição de produtos defeituosos no mercado. | 25% | 31% | 44% |
Diminuição do tempo de ciclo. | 34% | 31% | 34% |
Diminuição dos custos produtivos. | 31% | 38% | 31% |
Melhoria da produtividade. | 28% | 41% | 31% |
Fonte: pesquisa empírica.
Adicionalmente a esses dados, obtiveram-se informações acerca de benefícios para a equipe, observados com o uso do PEst e de FE, conforme a tabela 5.
Benefícios para a equipe com o uso do PEst e de FE | Nunca/ esporadicamente | Ocasionalmente | Frequentemente/ sempre |
Crescimento da preocupação em relação à medição e compreensão da variação. | 25% | 19% | 56% |
Utilização do PEst e de FE para a consolidação das abordagens de melhoria. | 28% | 19% | 53% |
Melhoria da compreensão sobre o processo e sobre a resolução dos problemas. | 31% | 19% | 50% |
Mudança para uma cultura voltada à qualidade. | 19% | 31% | 50% |
Diminuição da variação e aumento da capabilidade dos processos (Cpk). | 28% | 34% | 38% |
Satisfação dos supervisores e gestores com a aplicação do PEst e de FE. | 28% | 38% | 34% |
Os operadores se sentem motivados para usar a estatística. | 44% | 38% | 19% |
Fonte: pesquisa empírica.
O uso do PEst e de FE estimulou de forma frequente o aumento da preocupação com a medição e compreensão da variação em 56% da amostra. A contribuição para a consolidação das abordagens de melhoria contínua foi relatada como frequente por 53% das empresas. A melhoria na compreensão sobre o comportamento do processo, da competência para a resolução de problemas e a mudança da cultura da qualidade foram relatadas como resultados frequentes para 50% das empresas (tabela 5).
Como benefícios para a equipe menos percebidos, ao se considerar a soma das duas alternativas com concordância mais enfática (sempre/frequentemente), destacam-se "a satisfação de supervisores e gestores com o uso do PEst e de FE" (34% da amostra) e a "percepção de que as equipes de chão de fábrica (operadores) se sentem motivadas para a aplicação", observada em apenas 19%. A percepção sobre a motivação dos funcionários operacionais para usarem PEst e FE foi o único resultado cuja frequência nas alternativas "nunca/esporadicamente" foi superior às alternativas "frequentemente/sempre", evidenciando que ainda não se atingiu um estágio em que esses funcionários se sentem motivados a usarem rotineiramente essas técnicas e método de raciocínio como parte das atividades do trabalho diário.
Essas duas percepções menos positivas podem ser decorrentes da dificuldade de capacitação no uso do PEst e de FE e da falta de suporte (facilitadores), o que impossibilita o uso correto e a obtenção de resultados satisfatórios pelos operadores e, consequentemente, não motiva o uso como parte da rotina de trabalho.
Análise de subgrupos e associação entre variáveis
Para analisar se há grupos de empresas dentro da amostra com comportamentos distintos para o uso de PEst, de FE e de benefícios percebidos, foi utilizada a técnica de agrupamento hierárquico, conforme recomendações de Johnson e Wichern (1992). Para a formação de grupos, primeiramente foi utilizado o método de Ward, para identificar quantos agrupamentos são formados. Após a definição do número de grupos (clusters), foi realizado um ajuste pelo método não hierárquico k-means, com 10 iterações, o qual permite que o indivíduo, no caso a empresa de autopeças, mude de cluster considerando as iterações e formação dos grupos, que observam a proximidade de comportamento entre as variáveis.
Para a análise dos clusters, foram consideradas 18 variáveis: a média do uso do PEst (as 13 variáveis da tabela 1), a média do uso das FE básicas/intermediárias (tabela 2), a média do uso das FE avançadas (tabela 2) e as 15 variáveis de benefícios operacionais e para a equipe (tabelas 4 e 5).
Os grupos formados inicialmente por meio do método de Ward (figura 7) podem ser identificados por duas possibilidades de corte para a formação de agrupamentos: dois grupos (traçando uma linha horizontal na distância 20) e três grupos (linha horizontal na distância 10). Optou-se pela formação de três clusters para verificar a possível existência de grupos com baixo, médio e alto grau de uso do PEst e de FE e de percepção de benefícios.
Após a identificação de três clusters, foi aplicada a técnica k-means para a separação das empresas em três agrupamentos.
O cluster 1 foi formado por 9 empresas, o cluster 2 por 14 e o terceiro cluster por 9. Em seguida, foi feita uma análise sobre a média de cada um dos grupos para as 18 variáveis investigadas. A figura 8 mostra a distribuição das médias das variáveis. Observa-se que o cluster 1 é formado por empresas que relativamente usam menos PEst, FE básicas e avançadas e que percebem benefícios relativamente inferiores aos demais grupos. O cluster 2 reúne as empresas com níveis intermediários, e o cluster 3 reúne as empresas com maior intensidade de uso de PEst e de FE e percebem benefícios superiores aos demais agrupamentos.
Fonte: elaboração própria. PEst: Pensamento Estatístico; FE B/I: Ferramentas estatísticas básicas/intermediárias; FE AV: Ferramentas estatísticas avançadas; BE 1 a 8: Benefícios operacionais; BE 9 a 15: Benefícios para a equipe. Nota.http://www.aulete.com.br/nota
Considerando a escala de intensidade de 1 (nunca) a 5 (sempre) e as médias formadas nessa escala (que poderiam variar de 1 a 5), observa-se que a utilização do PEst é menos intenso que o de FE, e que o uso de ferramentas mais avançadas é bem menos intenso que o do PEst e de FE básicas/ intermediárias. E, aparentemente, quanto maior a intensidade desse uso, maiores são os resultados percebidos.
Foi realizada uma análise de associação dos clusters com as variáveis: importância estratégica da qualidade para a empresa; investimento para a capacitação em PEst e em FE; certificações de Sistemas de Gestão e existência de abordagens de melhoria. Serão apresentadas as associações que foram estatisticamente significativas (p < 0,05) pelo teste de Fisher. Esse teste foi utilizado porque o número de empresas em cada cluster é pequeno, com valores esperados menores que 5.
Foi verificado que existe associação entre a variável importância da qualidade e as variáveis utilizadas para a formação dos clusters; o mesmo ocorre para a variável investimento para a capacitação em PEst e de FE (tabelas 6 e 7). Em relação à variável importância da qualidade, é possível visualizar que todas as empresas dos clusters 3 e 2 a consideram alta, enquanto apenas 55% das empresas do cluster 1 têm a mesma opinião. Algo semelhante ocorre em relação ao investimento para a capacitação em PEst e em FE. Nenhuma empresa do cluster 1 afirmou que o investimento para isso tem aumentado significativamente, o que não ocorre nos demais agrupamentos. A maior parte das empresas do cluster 1 (77,8 %) indicou que o investimento não tem aumentado.
Importância estratégica da qualidade para a competitividade da empresa | Grupo 1 | Grupo 2 | Grupo 3 |
Alto | 5 (55,5 %) | 14 (100 %) | 9 (100 %) |
Médio | 2 (22,2 %) | 0 (0 %) | 0 (0 %) |
Baixo | 2 (22,2 %) | 0 (0 %) | 0 (0 %) |
p-valor | 0,007008 |
Fonte: pesquisa empírica.
Investimento para a capacitação do PEST e de FE | Grupo 1 | Grupo 2 | Grupo 3 |
Não houve aumento (investimento inicial e manutenção) | 7 (77,8 %) | 4 (28,6 %) | 0 (0 %) |
Pouco aumento | 2 (22,2 %) | 8 (57,1 %) | 6 (66,7 %) |
Aumento significativo | 0 (0 %) | 2 (22,2 %) | 3 (33,3 %) |
p-valor | 0,006506 |
Fonte: pesquisa de campo.
Assim, não há evidências para refutar a H0 para os fatores importância da qualidade e investimento em PEst e em FE.
No que se refere às abordagens de melhoria, foi observada associação com significância estatística para as seguintes variáveis: utilização de Eventos Kaizen e TQM (tabela 8). Na análise dessas variáveis, pode haver menos empresas em cada cluster, porque havia a opção para o respondente não informar sobre a utilização de uma abordagem específica. Para Eventos Kaizen, uma parcela significativa das empresas dos clusters 2 e 3 utiliza esse tipo de evento, o que não ocorre com uma porcentagem alta de empresas do cluster 1. Observando-se o TQM, visualiza-se que apenas uma empresa (12,5 %) do cluster 3 não usa o TQM. Exatamente o contrário ocorre no cluster 1, o que evidencia associação entre o uso do TQM e as variáveis utilizadas para a formação do cluster. Assim, não há evidências para refutar a H0 para os fatores Eventos Kaizen e TQM.
Eventos Kaizen | Grupo 1 | Grupo 2 | Grupo 3 | TQM | Grupo 1 | Grupo 2 | Grupo 3 |
Não possui | 4 (57,1 %) | 1 (7,1 %) | 2 (22,2 %) | Não possui | 6 (85,7 %) | 4 (28,6 %) | 1 (12,5 %) |
Possui | 3 (42,9 %) | 13 (92,9 %) | 7 (77,8 %) | Possui | 1 (14,3 %) | 10 (71,4 %) | 7 (87,5 %) |
p-valor | 0,03679 | p-valor | 0,010689 |
Fonte: pesquisa empírica.
Também houve uma razoável associação (tabela 9), mas não estatisticamente significante ao nível de 5 %, do uso do Seis Sigma (p-valor 0,063968). Grande parte das empresas do cluster 3 (87,5 %) utiliza essa abordagem, o que não ocorre com as empresas do cluster 1. Não foi identificada associação, ao nível de 5 % de significância, com a variável sobre o uso da abordagem Lean Manufacturing; as empresas que possuem ou não a abordagem não se distribuem de forma significativamente diferente entre os grupos. O mesmo ocorre com outras abordagens como 5s, Melhoria no dia a dia, TPM, Lean Sigma e Programa de sugestões. Ou seja, essas últimas abordagens devem estar inseridas nas empresas de forma pouco associada com o uso de PEst e de FE. Assim, não se pode concluir que haja associação entre o uso de PEst, FE e resultados percebidos com os fatores: Seis Sigma, Lean Manufacturing, 5s, Melhoria no dia a dia, TPM, Lean Sigma e Programa de sugestões.
Seis Sigma | Grupo 1 | Grupo 2 | Grupo 3 | Lean | Grupo 1 | Grupo 2 | Grupo 3 |
Não possui | 5 (71,4 %) | 4 (28,6 %) | 1 (12,5 %) | Não possui | 4 (57,1 %) | 3 (21,4 %) | 1 (12,5 %) |
Possui | 2 (28,6 %) | 10 (71,4 %) | 7 (87,5 %) | Possui | 3 (42,9 %) | 11 (78,6 %) | 7 (87,5 %) |
p-valor | 0,063968 | p-valor | 0,173946 |
Fonte: pesquisa empírica.
No que se refere à associação dos grupos com certificações de Sistemas de Gestão, observou-se que não houve associação com certificações ISO 9001 e TS 16949 (tabela 10). Isso possivelmente se deve ao fato de essas certificações serem praticamente obrigatórias para a atuação nesse mercado, fazendo com que empresas de todos os agrupamentos as tenham. Além disso, essas certificações, na prática, acabam induzindo pouco ao uso de PEst e de FE por não serem priorizadas nas auditorias. No que tange às hipóteses, conclui-se que não há associação com as certificações ISO 9001 e TS 16949.
Considerações finais
Síntese da análise dos dados
Apesar de haver indicação de concordância da maior parte das empresas em relação à compreensão do conceito de variabilidade e ao entendimento de que sua diminuição e controle são cruciais para a melhoria do desempenho dos processos, observa-se que apenas uma pequena parte (15,62%, ou 5 em 32 empresas) investe significativamente para ampliar a compreensão, disseminação e uso dos conceitos do PEst capacitando os funcionários e investindo na melhoria da confiabilidade e na análise de dados de processos de manufatura.
Em 66% das empresas amostradas, não ocorre questionamento frequente sobre a confiabilidade dos dados utilizados e 50% não tomam decisões frequentemente baseadas em dados (itens 9 e 11 da tabela 1). Embora tais constatações indiquem um paradoxo entre a importância atribuída ao PEst e as práticas efetivas para a aplicação dos conceitos desse pensamento, as empresas pesquisadas mostram-se preocupadas com o aprimoramento dos MSA e seu uso mais frequente, o que pode ser visto como um passo à frente no uso do PEst nessas empresas, dado que há uma percepção de que o entendimento sobre a criticidade da diminuição da variação do processo e o apoio gerencial estão presentes nas empresas (tabela 1).
Quanto às FE, acima da metade da amostra reconhece a necessidade de seu uso para melhoria da qualidade e dos processos, e, de fato, uma parcela considerável as aplica de forma sistemática. O uso de ferramentas básicas/intermediárias e avançadas ocorre, aparentemente, por necessidade operacional, sendo que o uso de ferramentas menos complexas é significativamente mais frequente em relação às ferramentas mais complexas.
Apenas uma pequena parte das empresas inclui, frequentemente, profissionais com conhecimento e experiência prévia em FE em novas iniciativas e equipes de melhoria, utiliza exemplos demonstrativos práticos e de agentes facilitadores para aumentar a utilização do PEst e de FE (13 e 9% das empresas, respectivamente). A prática de adoção desses recursos -disponibilização de exemplos, facilitadores e participação de pessoas com experiência - é apontada, nas publicações internacionais, como indispensáveis para a consolidação e continuidade na aplicação de conceitos e FE. O que indica que, para fomentar a aplicação, esses recursos deveriam ser adotados, o que reduziria as dificuldades na consolidação do uso.
A análise de clusters e de associação permitiu constatar que, na amostra, o comportamento das empresas, em relação ao uso de PEst e de FE, e percepção de benefícios, não é homogêneo.
Foram identificados grupos com comportamentos distintos na intensidade das variáveis investigadas. O grupo de empresas com maiores intensidades no uso de PEst e de FE básicas/ intermediárias e de FE avançadas também possui maior intensidade nas variáveis de benefícios percebidos, mostrando um comportamento de tendência positiva entre maior uso e resposta percebida com esse uso. Também foi possível identificar que há associação entre variáveis como importância estratégica da qualidade, investimento em PEst e em FE, uso de abordagens de melhoria, como TQM e Eventos Kaizen, e os clusters formados. O cluster com maior uso de PEst e de FE e maior intensidade nas variáveis de benefícios também possui mais empresas que consideram alta a importância da qualidade, que alocam maior investimento em PEst e em FE e que mais adotam abordagens de melhoria, como TQM e Eventos Kaizen. Não foram identificadas associações entre a presença das certificações ISO 9001 e TS 16949 e a formação dos agrupamentos.
Conclusões
A pesquisa empírica permitiu conhecer em que nível o PEst e as FE estão sendo utilizados em uma amostra de empresas da indústria de autopeças, do estado brasileiro de São Paulo. Os resultados da pesquisa evidenciam que essas empresas, de modo geral, ainda não consolidaram em nível satisfatório os conceitos e FE, o que demonstra que há oportunidades para melhorar o desempenho de suas operações por meio da utilização desses conceitos e ferramentas.
As empresas da amostra indicam, conforme a tabela 3, que esse uso enfrenta dificuldades pela falta de uma cultura organizacional compatível com a estatística, por aplicarem os conceitos e ferramentas de forma esporádica, possivelmente, em função de exigências de montadoras e de outros clientes, e devido à falta de conhecimento que implica menor uso.
A difusão do PEst nessas empresas ocorre, principalmente, por meio de conceitos como o da compreensão das relações de causa e efeito dos problemas, o da percepção de processos interconectados, o da necessidade de compreensão, quantificação e diminuição da variação. Porém, ainda há dificuldade no treinamento e uso dos conceitos do PEst na análise de dados. Sobre o uso das FE, observou-se deficiência no uso das ferramentas avançadas, com exceção da MSA, que seria mais usada em função da relevância das medições realizadas nas peças e sistemas fornecidos às montadoras.
O uso de abordagens de melhoria não parece suficiente para maior compreensão, implantação e uso do PEst e de FE, uma vez que apenas para algumas abordagens (por exemplo, Kaizen e TQM) há associação com maior intensidade de uso e de benefícios percebidos. Contrariando um senso comum, o uso do Seis Sigma, originalmente com maior embasamento estatístico, diferenciou pouco as empresas quanto ao uso de PEst e de FE, provavelmente pelo aparente foco prioritário em abordagens de melhoria mais tradicionais e em conceitos e FE mais básicas. Ou, provavelmente, que nessas empresas o Seis Sigma ainda estaria em consolidação e mais focado na metodologia de resolução dos problemas (por exemplo, o DMAIC) do que no uso de FE como suporte.
A capacitação de pessoal interno e a busca de suporte externo em universidades e consultorias, para uma efetiva e eficaz implantação do PEst e de FE nas decisões estratégicas, de gestão e de melhoria da produção, são exemplos de atividades imprescindíveis para a busca, manutenção e efetivação da melhoria do desempenho operacional dessas empresas. Entidades de representação e coordenação do setor estudado em associação com universidades poderiam atuar em conjunto nesse sentido, iniciando pela realização de workshops de discussões sobre o tema e pela definição de demandas das empresas, para a disseminação e consolidação desses conceitos e técnicas.
Como trabalhos futuros, podem ser planejadas pesquisas de estudo de caso, a fim de aprofundar a compreensão do tema (usos, motivações, dificuldades, resultados, ações para consolidação, entre outros) em empresas consideradas bem-sucedidas e com boas práticas na utilização do PEst e de FE. As experiências positivas podem ser compartilhadas e adequadas a outras empresas que necessitam evoluir sua maturidade no uso e resultados da estatística. Outro tema para pesquisa futura seria a identificação e comprovação de fatores críticos de sucesso que permitam a elaboração de roteiros que orientem o planejamento e acompanhamento da implantação do PEst e de FE.