1. Introdução
O conhecimento é um fator de grande importância nas organizações, uma vez que é considerado um recurso econômico crucial (Lundvall e Johnson, 1994), promovendo o sucesso organizacional e a vantagem competitiva (Pangil e Nasurddin, 2013; Jannuzzi, Falsarella e Sugahara, 2016; Yao e Juan, 2017). No entanto, é necessário que este seja transferido aos trabalhadores, pois, se não for partilhado, não irá resultar em vantagem (Lundvall e Johnson, 1994; Pangil e Nasurddin, 2013).
O conhecimento é constituído por dois componentes: o explícito e o tácito sendo este último, referente ao conhecimento adquirido através das vivências e das experiências pessoais (Takeuchie e Nonaka, 2008). É crucial perceber como o conhecimento se desenvolve dentro das organizações, em específico o conhecimento tácito, pois é o que garante um maior sucesso (Scurtu e Neamtu, 2013). Como este tipo de conhecimento é adquirido através de processos individuais internos, o indivíduo e as suas vivências são determinantes para a sua partilha (Nonaka e Takeuchi, 1995; Takeuchi e Nonaka, 2008).
Outra variável importante quando nos referimos ao trabalho é o work engagement. Este pode ser descrito como um estado mental persistente, positivo, e de realização profissional (Schaufeli, Salanova, González- Romá e Bakker, 2002), parecendo, por isso, importante compreender se este outro componente interno do indivíduo estaria relacionado com a transferência de conhecimento tácito. Já foi demonstrado, em algumas investigações, uma relação positiva entre o work engagement e a transferência de conhecimento (e.g., Chen, Zhang e Vogel, 2011; Javadi e Ahmadi, 2013; Song, Kim, Chai e Bae, 2014; Kim e Park, 2017) e, em específico, entre o work engagement e a transferência de conhecimento tácito (e.g.,Cao, Xu, Liang e Chaudhry, 2012; Li, 2013; Kim e Park, 2017).
Além do work engagement, a confiança interpessoal é um fator importante para a transferência de conhecimento, tendo sido encontrada uma relação positiva entre estas variáveis (e.g.,Lin, 2007; Rutten, Blaas-Franken e Martin, 2016; Vasin, Gamidullaeva, Wise e Korolev, 2019; Kipkosgei, Kang e Choi, 2020). Assim, quando os indivíduos estabelecem relações de confiança uns com os outros, criam uma atmosfera positiva, que irá promover a partilha de conhecimento tácito (Zhang, Long, Wang e Tang, 2015).
É necessário, também, que haja confiança organizacional, de forma que os indivíduos sintam que existe um ambiente que lhes permite a partilha de ideias e de conhecimentos com os outros (Takeuchi e Nonaka, 2008), sem a existência de represálias ou de consequências negativas. Existe, assim, a evidência de uma relação entre a confiança organizacional e a transferência de conhecimento tácito (e.g., Yoo, Zhang e Yun, 2019).
Neste estudo, pretende-se compreender como ocorre o processo de transferência de conhecimento dentro das organizações, considerando a influência do work engagement e da confiança, nos pares, e na organização. Para tal, foi desenvolvido um modelo de transferência de conhecimento tácito, a ser confirmado ou rejeitado, com base nos resultados obtidos. O modelo propõe a existência de uma relação positiva entre o work engagement e a transferência de conhecimento tácito, tendo a confiança como uma mediadora entre estas variáveis.
Este trabalho possui a seguinte estrutura: na 2ª parte é apresentado o enquadramento teórico, na 3ª parte, a metodologia utilizada, na 4ª parte, os resultados obtidos, e, na 5ª parte, as principais conclusões.
2. Enquadramento teórico
2.1 Conhecimento
Para abordar o tema do conhecimento é necessário distinguir alguns conceitos, sendo eles: os dados, a informação e o conhecimento. Segundo Davenport e Prusak (2003) , os dados são um conjunto de fatos referentes a diversas situações, e são muito importantes, uma vez que constituem a matéria-prima para a criação de informação. No entanto, estes, por si só, não têm significado inerente, pois apenas fornecem parte do que aconteceu e não as suas interpretações.
A informação, por sua vez, segundo os mesmos autores, pode ser entendida como uma mensagem e tem, como finalidade, mudar a perspetiva do seu receptor. Esta circula pela organização através de redes: a rede hard (que apresenta uma infraestrutura definida, e.g., correio, endereço eletrónico, etc.) e a rede soft (que utiliza uma infraestrutura menos formal e menos visível, e.g., um apontamento que alguém deixou num documento). Ao contrário dos dados, a informação tem significado e propósito, sendo que os dados apenas se tornam informação quando lhes damos significado. Por vezes, conhecimento e informação são utilizados como sinônimos. No entanto, existem diferenças entre ambos. A informação pode ser vista como uma corrente de mensagens, e o conhecimento como criado por essa mesma corrente (Nonaka e Takeuchi, 1995; Davenport e Prusak, 2003).
Davenport e Prusak, (2003) afirmam que o conhecimento é uma mistura de experiências, valores, informações e insights, que proporcionam uma estrutura para avaliarmos e incorporarmos novas vivências e informações. Pode ser considerado como algo muito pessoal, e como tal, complexo e imprevisível, pois engloba vários elementos, podendo ser altamente estruturado e facilmente colocado em palavras, ou não. O conhecimento tem-se tornado uma das fontes mais importantes de produtividade e de prosperidade econômica dentro das organizações (Li, 2013; Razak, Pangil, Zin, Yunus e Asnawi, 2016), e é por isso que se torna fulcral compreender como se desenvolve e como é transferido dentro das organizações.
Segundo Nonaka e Takeuchi (1995, 2008), existem duas dimensões do conhecimento, a ontológica (onde o conhecimento é criado pelos indivíduos) e a epistemológica (onde existem dois tipos de conhecimento: o tácito e o explícito). A interação entre eles é a chave para a criação do conhecimento organizacional, que implica um conjunto de conhecimentos pessoais que são partilhados na organização, através do diálogo.
Os indivíduos são elementos muito importantes nas organizações, pois a criação de conhecimento depende também deles, na medida em que, podem optar por partilhar ou não os conhecimentos que têm. Assim sendo, os indivíduos e as organizações não devem ser vistos como pólos opostos, mas sim, como em interação, onde o indivíduo cria os conhecimentos e a organização os amplifica. Desta forma, é fulcral que as organizações estimulem e apoiem os seus trabalhadores, proporcionando ambientes apropriados para a criação e partilha de conhecimentos (Ma, Huang, Wu, Dong e Qi, 2014).
2.2 Tipos de conhecimento
Segundo Nonaka e Takeuchi (1995, 2008) existem dois tipos de conhecimento, o conhecimento explícito, que pode facilmente ser transformado em algo formal e estruturado, tornando a sua partilha simples através do uso de palavras, símbolos ou números, podendo desta forma, ser transformado em bases de dados, manuais, entre outros.
E o conhecimento tácito, que Mohajan (2016) considera ser o recurso estratégico mais importante dentro das organizações, tendo origem nas vivências, perceções e valores pessoais, e estando dependente dos contextos onde o indivíduo está inserido (Nonaka e Takeuchi, 1995; Takeuchi e Nonaka, 2008). Sendo este conhecimento resultado direto da experiência, diálogo e reflexão, atividades que precisam de tempo para acontecerem (Fahey e Prusak, 1998), é ainda mais difícil a sua partilha (Mohajan, 2016) e a codificação em algo formal e estruturado como bases de dados e manuais.
Como é algo muito íntimo e dependente do contexto, pode ser considerado uma fonte de vantagem competitiva, dado que é mais difícil de ser replicado por terceiros (i.e., é difícil que outra empresa consiga obter esse conhecimento e utilizá-lo) (Sobol e Lei, 1994; Baporikar, 2020). Assim, devem ser evitadas perdas de trabalhadores (Wahab e Zakaria, 2017), pois representam perda de conhecimento (Smith, 2001; Li, 2013) e, consequentemente, de vantagem competitiva.
Sendo este um tipo de conhecimento muito pessoal gera ambiguidade, na medida em que as organizações podem não saber da sua existência e não se aperceberem das vantagens desse mesmo conhecimento (Ambrosini e Bowman, 2001). Com o objetivo de reeducar a ambiguidade, a cultura da organização deve permitir o debate de ideias e o entendimento das mesmas, e quanto mais flexível for a estrutura organizacional, maior será a possibilidade dos seus trabalhadores partilharem conhecimento tácito (Lemos e Joia, 2012).
2.3 Transferência de conhecimento
Bartol e Srivastava (2002) definem a transferência de conhecimento como a partilha de informações, ideias, sugestões e experiências relevantes para a organização, sendo esta uma componente chave dos sistemas de gestão do conhecimento. É um processo que envolve pelo menos dois indivíduos, um que inicia o processo de transferência de conhecimento através de métodos de externalização (transmissão). E o outro através de métodos de internalização, absorve os conhecimentos que o primeiro partilha (absorção) (Hendriks, 1999). Logo, a apresentação do conhecimento a outra pessoa não constituí uma transferência. Para isso é preciso que o outro absorva esse conhecimento (Davenport e Prusak, 2003).
A transferência de conhecimento pode proporcionar vários benefícios para a organização, permitindo que a mesma consiga responder mais rapidamente aos problemas, evitando repetir os mesmos erros e capacitando a empresa para desenvolver novas ideias (Cyr e Choo, 2010), conduzindo a um maior desenvolvimento (Li, 2013). Este processo pode ocorrer de maneira formal e intencional (resultado de conferências/palestras) ou de maneira informal e não intencional (através de interações entre os indivíduos) (Marquardt, 1996), sendo a predisposição e a capacidade que o indivíduo possui, a chave para esta partilha (Foos, Schum e Rothenberg, 2006). No entanto, os indivíduos, mesmo tendo capacidade para transferir conhecimento, não o irão fazer se compreenderem que as desvantagens são maiores do que as vantagens (Zhang, Long, Wang e Tang, 2015).
As vantagens referem-se à possibilidade dos indivíduos, ao aprenderem novos conhecimentos, de desenvolverem as suas capacidades e competências, melhorando o seu desempenho (Reychav e Weisberg, 2009) e obtendo mais reconhecimento profissional. Também está relacionado com a possibilidade da existência de benefícios recíprocos, pois, ao partilharem os seus conhecimentos com os outros, os indivíduos esperam que esses partilhem também os seus conhecimentos (Killingsworth, Xue e Liu, 2016).
Já as desvantagens, referem-se à realidade de que, além deste ser um processo que implica tempo e dedicação, normalmente sem qualquer recompensa para o indivíduo, quando este partilha o seu conhecimento, torna-se vulnerável. Sendo algo que implica riscos (Ford, 2004; Mohajan, 2016), tais como a perda de poder e do prestígio (Huang, Davison e Gu, 2011; Rêgo, Filho e Lima, 2013). Existem assim, algumas barreiras que podem influenciar este processo (Lucas, 2005): a predisposição dos indivíduos, a consciência limitada sobre o conhecimento tácito que possuem, as dificuldades em reconhecer a aplicabilidade de um conhecimento tácito específico, de um contexto a outros contextos, e as dificuldades em colocar, por palavras, esse conhecimento (Nonaka e Takeuchi, 1995; Fahey e Prusak, 1998; Stenmark, 2000; Nidumolu, Subramani e Aldrich, 2001; Tonet e Paz, 2006). Neste sentido, as relações podem facilitar, ou não, a partilha (Smedlund, 2008), diminuindo os riscos/barreiras presentes.
Além destes, outro obstáculo na partilha de conhecimento é a linguagem utilizada, pois, muitas vezes, o conhecimento a ser partilhado envolve palavras novas ou que poderão não ser entendidas da forma que o emissor pretendia (Tonet e Paz, 2006). Como Sveiby (1998, p.49) afirma “o significado que uma pessoa expressa nunca é o mesmo que aquele gerado na mente da pessoa que o recebe”.
A gestão do conhecimento organizacional deve ser vista, então, como um fator muito importante, tendo Hansen, Nohria e Tierney (1999) apontado duas estratégias para esta gestão: a codificação e a personalização. Na codificação, todo o conhecimento é padronizado, estruturado e armazenado em sistemas de informação, tendo como foco o conhecimento em si, e a forma como é armazenado em bases de dados. Já na personalização, o interesse está na partilha do conhecimento tácito, através do contacto pessoal (Joia, 2007).
Para compreender melhor a transferência e a criação de conhecimento Nonaka e Takeuchi (1995, 2008) criaram o modelo SECI, que inclui quatro fases: a socialização, a externalização, a combinação e a internalização. A socialização consiste em criar e partilhar, com outro indivíduo, conhecimento tácito através da experiência. A externalização abrange a transformação do conhecimento tácito em explícito, através do diálogo e da reflexão, do indivíduo para com o grupo. A combinação consiste em sistematizar e aplicar a informação e o conhecimento explícito, podendo ocorrer através de documentos ou de reuniões, do grupo, com a organização. E a internalização está relacionada com a aquisição de novos conhecimentos tácitos através da experiência e prática, sendo realizado da organização, para o indivíduo.
2.4 Work engagement
Sendo o engagement uma variável crucial para as organizações obterem vantagem competitiva (Bakker, Schaufeli, Leiter e Taris, 2008; Yao e Juan, 2017; Juan, Ting, Kweh e Yao, 2018) e um importante preditor dos comportamentos de partilha de conhecimento (Chen, Zhang e Vogel, 2011), é útil analisarmos o seu papel no processo de transferência de conhecimento tácito.
O engagement pode ser descrito como um estado mental persistente, positivo, e de realização profissional, associando três caraterísticas principais: o vigor (que implica altos níveis de energia, resiliência e persistência), a dedicação (que inclui sentimentos de entusiasmo, orgulho e inspiração) e a absorção (a capacidade do indivíduo de estar totalmente concentrado e envolvido no seu trabalho) (Schaufeli e Bakker, 2004). É associado a fatores positivos como a saúde física e mental, níveis reduzidos de absentismo e de acidentes no local de trabalho, levando a uma redução dos comportamentos contraprodutivos (Schaufeli, 2016) e ao aumento do desempenho e de produtividade dos trabalhadores (Schaufeli e Salanova, 2007; Bakker, Schaufeli, Leiter e Taris, 2008; Kim e Park, 2017).
É uma variável relevante para a transferência de conhecimento, pois, indivíduos que se sentem mais envolvidos com a tarefa e com a organização, podem partilhar mais os seus conhecimentos (Chen, Zhang e Vogel, 2011). Algumas investigações demonstraram uma relação significativa entre o work engagement e a transferência de conhecimento (e.g., Chen, Zhang e Vogel, 2011; Javadi e Ahmadi, 2013; Song, Kim, Chai e Bae, 2014; Kim e Park, 2017) e em específico, entre o work engagement e a transferência de conhecimento tácito (e.g., Cao, Xu, Liang e Chaudhry, 2012; Li, 2013; Kim e Park, 2017).
Trabalhadores mais engaged apresentam mais intenções, atitudes e comportamentos positivos para com a organização (Saks, 2006), assim como mais intenções de partilhar conhecimento relacionado com o trabalho (Kim e Park, 2017).
2.5 Confiança
A relação estabelecida entre o emissor e o receptor no processo de transferência de conhecimento é muito importante, pois a partilha de conhecimento pode envolver riscos (Ford, 2004; Huang, Davison e Gu, 2011; Rêgo, Filho e Lima, 2013; Mohajan, 2016). Deste modo, a confiança existente na relação, reduz os níveis de risco e de incerteza, associados à transferência de conhecimento (Foos, Schum e Rothenberg, 2006).
A confiança pode ser entendida como o processo em que A confia em B (Costa e Anderson, 2011) e se torna vulnerável às ações de outros, tendo como expectativa que a outra pessoa fará algo importante e significativo para si, e não tentando controlar o comportamento e ações dessa pessoa (Mayer, Davis e Schoorman, 1995).
Segundo Costa (2000) , existem dois tipos de confiança: a confiança organizacional, que se refere às relações estabelecidas com o sistema formal, tendo a sua base em leis e regulamentos da organização; e a confiança interpessoal que se refere à confiança entre os indivíduos, com base nas relações face a face e nas percepções pessoais em relação ao motivo pelo qual os outros estabeleceram essas relações. A confiança interpessoal é um preditor significativo para o processo de transferência de conhecimento (Foos, Schum e Rothenberg, 2006; Ding, Xue e Yuan, 2015), sendo que, quando esta não está presente, este processo não ocorre, pois, o medo e a preocupação impedem o indivíduo de partilhar (Ford, 2004). Sempre que uma pessoa não é percecionada como confiável, o conhecimento que esta possui e a partilha podem ser mais facilmente desafiados pelos outros indivíduos (Szulanski, 1995).
Verifica-se, assim, uma relação positiva entre a confiança e a partilha de conhecimento, em específico com a confiança interpessoal (e.g., Lin, 2007; Rutten, Blaas-Franken e Martin, 2016; Vasin, Gamidullaeva, Wise e Korolev, 2019; Kipkosgei, Kang e Choi, 2020) e com a confiança organizacional (e.g., Rêgo, Filho e Lima, 2013; Yoo, Zhang e Yun, 2019).
Mayer, Davis e Schoorman (1995) propuseram um modelo de confiança organizacional baseado em três aspetos: competência, benevolência e integridade. Podemos entender a competência como o conjunto de habilidades, competências e caraterísticas que uma pessoa possui para realizar determinada tarefa. Esta é importante, porque o trustee (pessoa em quem se confia) pode ser competente a nível técnico, fazendo com que a pessoa confie na sua capacidade para realizar determinadas tarefas, embora possa não ter competências e capacidades noutras áreas.
A benevolência pode ser entendida como a crença de que o trustee quer fazer bem ao trustor (pessoa que se dispõe a confiar), sem a existência de um motivo de benefício próprio, aspeto que sugere a existência de uma ligação entre o trustee e o trustor. Já a integridade, envolve a perceção que o trustor tem de que o trustee adere a um conjunto de princípios e valores que o trustor considera aceitáveis, sendo esta, muito importante na formação da confiança no início da relação (Mayer, Davis e Schoorman, 1995).
No modelo de Costa, Roe e Taillieu (2001) , a confiança é apresentada como uma variável com múltiplos componentes: a propensão para confiar, a confiabilidade percebida e os comportamentos de confiança. Podemos entender a propensão para confiar como a disposição que os indivíduos possuem para confiar uns nos outros. A confiabilidade percebida refere-se à avaliação que o trustor faz, das várias caraterísticas e ações do trustee. Já os comportamentos de confiança são divididos em comportamentos cooperativos e de monitorização. Comportamentos cooperativos referem-se à identificação de até que ponto os membros de uma equipe comunicam abertamente sobre o seu trabalho, aceitam a influencia dos outros, e sentem-se pessoalmente envolvidos com a equipe. E os comportamentos de monitorização, referem-se à necessidade que os membros de uma equipe sentem, de controlar e vigiar o trabalho desenvolvido pelos seus colegas.
Tendo em conta a complexidade do tema da transferência de conhecimento tácito, foi analisada a seguinte questão de investigação: Q1 - “Como é realizada a transferência de conhecimento tácito dentro das organizações?”. E, com base na literatura consultada, surgiram as seguintes hipóteses: H1 - Existe uma relação positiva entre o work engagement e a transferência de conhecimento tácito. H2 - A confiança é um mediador entre o work engagement e a transferência de conhecimento tácito.
Foi desenvolvido um modelo de transferência de conhecimento tácito a ser confirmado ou rejeitado com base nos resultados. Este, demonstra a existência de uma relação positiva entre o work engagement e a transferência de conhecimento tácito, pois, ao sentirem o seu trabalho como uma experiência positiva, e ao estarem dedicados no desempenho das suas funções, as pessoas tendem a partilhar mais o conhecimento que possuem. No entanto, para existir esta partilha é necessário ter em conta qual o tipo de relações que a pessoa estabeleceu. Assim, a variável “confiança” irá atuar como uma mediadora, porque, mesmo que a pessoa seja dedicada ao seu trabalho e o veja como algo positivo, só irá partilhar as informações que tem, quando as relações com os colegas e com a própria organização permitam essa partilha, ou seja, quando existe confiança.
3. Método
3.1 Procedimentos
Este projeto foi aprovado pela Comissão de Ética da Universidade das pesquisadoras. A coleta de dados decorreu entre novembro de 2019 e janeiro de 2020. Depois de recolhidos e analisados, foram introduzidos na base de dados, considerando o seguinte critério: ter mais de 90% dos itens respondidos. Nenhum questionário foi excluído.
Depois da análise quantitativa foi desenvolvida a entrevista de exploração dos resultados obtidos, para aprofundamento das conclusões. Para tal, quando foram distribuídos os questionários, foi solicitado o contato dos indivíduos dispostos a realizar a entrevista, e, depois, foram selecionados, considerando a sua função na organização. As entrevistas foram audiogravadas, e posteriormente destruídas, após as respetivas transcrições.
3.2 Instrumentos
Foram adaptados três instrumentos. Inicialmente foi realizada a tradução das escalas de confiança nos colegas de Adams, Waldherr e Sartori (2008) e de confiança na organização de Robinson e Roseau (1994) , do inglês para o português, pelo pesquisador principal. Posteriormente, foi feita a retroversão, para garantir a equivalência de conteúdo e do significado dos questionários, por duas pessoas com domínio da língua inglesa, e discutida essa retroversão em conjunto com um grupo de pesquisadores. Não foram encontradas diferenças significativas nos significados e conteúdos dos itens da retroversão e do original, pelo que foi aceita a versão utilizada neste estudo.
Foi também adaptado o questionário de conhecimento tácito de Lemos e Joia (2012) , que estava em português do Brasil e necessitou de reformulação frásica para garantir a compreensão dos respondentes e a equivalência de significado. O investigador principal fez a reformulação inicial, que foi discutida com um grupo de pesquisadores, onde foi sugerida a reformulação de um item (“Eu tenho tempo e oportunidade para partilhar e receber conhecimento de outras pessoas”) que foi decomposto em dois itens (“Tenho tempo e oportunidade para partilhar conhecimento com outras pessoas” e “Tenho tempo e oportunidade para receber conhecimento de outras pessoas”).
Antes de aplicar os instrumentos, foi feito um pré-teste em cinco indivíduos, onde foi realizada a reflexão falada destas escalas, para verificar se conseguiam compreender todos os itens. Tendo em conta as informações recolhidas durante este processo, foram efetuadas novas adaptações aos instrumentos, como, por exemplo, a reformulação de dois itens (“Tenho tempo e oportunidade para partilhar conhecimento com outras pessoas” e ”Tenho tempo e oportunidade para receber conhecimento de outras pessoas”) no questionário de conhecimento tácito de Lemos e Joia (2012) , que foram decompostos em quatro itens (“Tenho tempo para partilhar conhecimento com outras pessoas”/”Tenho oportunidade para partilhar conhecimento com outras pessoas”/”Tenho tempo para receber conhecimento de outras pessoas”/”Tenho oportunidade para receber conhecimento de outras pessoas”).
Foi aplicado um questionário sociodemográfico para caraterizar a amostra. Com o objetivo de avaliar o work engagement, foi utilizado o questionário Utrecht Work Engagement Scale, versão reduzida (UWES - 9), de Schaufeli, Salanova, González-Romá e Bakker (2002) , adaptado para Portugal por Martins (2013) . A transferência de conhecimento tácito foi avaliada com o questionário de Lemos e Joia (2012) . A confiança na organização foi medida com o instrumento desenvolvido por Gabarro e Athos (1976) e adaptado por Robinson e Roseau (1994) . E, para avaliar a confiança nos colegas, foi utilizado o instrumento Trust in Teams Scale, desenvolvido por Adams, Bruyn e Chung-Yan (2004) , e adaptado por Adams, Waldherr e Sartori (2008).
A entrevista de exploração de resultados, foi desenvolvida pelo pesquisador principal, tendo em conta os resultados obtidos na análise quantitativa, e apresentou uma estrutura semiestruturada. É composta por nove questões, distribuídas por cinco temas: “Importância do conhecimento” (e.g., “Considera que ter conhecimento é algo valorizado na sua empresa?”); “Partilha de conhecimento” (e.g., “A empresa incentiva a partilha de conhecimento entre os colaboradores? De que forma?”); “Work engagement” (e.g., “Acha que quando se sente mais entusiasmado e envolvido no seu trabalho tem vontade de partilhar conhecimento com as outras pessoas?”); “Confiança” (e.g., “Sente que partilha mais conhecimento com os colegas em quem confia mais?”); e “Trabalhar em equipe” (e.g., “Considera que o fato de fazer parte de uma equipe influencia a partilha de conhecimento? Como?”).
3.3 Participantes
A amostra deste estudo é constituída por 202 trabalhadores de uma empresa de transportes públicos de passageiros na Ilha da Madeira, Portugal, como podemos verificar na tabela 1. Esta organização foi selecionada tendo como critério a facilidade de acesso aos seus trabalhadores. Obteve-se uma taxa de resposta de 42,26%.
N | % | |
---|---|---|
Sexo | ||
Masculino | 175 | 86,6 |
Feminino | 27 | 13,4 |
Nacionalidade | ||
Portuguesa | 197 | 97,5 |
Outra | 5 | 2,5 |
Grupo Profissional | ||
Quadros Superiores | 10 | 5,0 |
Técnicos Superiores/Informáticos | 18 | 8,9 |
Armazém | 4 | 2,0 |
Fiscais/Expedidores/Vendedores | 11 | 5,4 |
Oficinas | 21 | 10,4 |
Motoristas | 103 | 51,0 |
Administrativos | 33 | 16,3 |
Formadores | 2 | 1,0 |
Habilitações Literárias | ||
4ª classe | 22 | 10,9 |
6º ano | 30 | 14,9 |
9º ano | 56 | 27,7 |
12º ano | 67 | 33,2 |
Ensino superior | 27 | 13,4 |
Total | 202 | 100 |
Fonte: elaboração própria.
A idade dos participantes varia entre - 24 e + 65 anos, existindo uma grande concentração entre as idades de 35 a 54 anos, constituindo 69,7% da amostra. A antiguidade dos participantes na empresa varia entre - 5 e + 30 anos, tendo uma média que corresponde à antiguidade entre os 16 e os 20 anos.
Foram realizadas entrevistas com sete trabalhadores, distribuídos por diferentes grupos profissionais: (3) motoristas, (2) técnicos superiores/informáticos, (1) administrativos e (1) oficina. O número de entrevistas teve como critério a saturação da informação recolhida, e apresentaram uma duração média de 10 minutos. Foram transcritas apenas informações relacionadas com o estudo (exemplo não considerado: “além de ser motorista desta empresa, também sou voluntário, sou escuteiro, […], também participo na cruz juvenil de Santa Cecília na minha paróquia, (…)”).
3.4 Análise de dados
Para realizar a análise dos dados quantitativos, foi utilizado o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 26 (para windows). Na análise dos dados qualitativos, foi utilizada a Template Analysis de King (2020) , uma técnica para organizar e analisar estes dados, através da identificação de temas no texto, e que envolve o desenvolvimento de um template (Brooks e King, 2012), apresentada na tabela 7.
Inicialmente foi realizada uma análise fatorial aos questionários adaptados. Todas estas análises obtiveram um teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) superior a 0,05, e um teste de esfericidade de Bartlett inferior a 0,05, bons indicadores para continuar a análise fatorial (Field, 2009).
4. Resultados
O questionário de confiança na organização, presente na tabela 2, apresentou apenas uma comunalidade abaixo de 0,5, o que está dentro do esperado. Os dados indicam a existência de dois fatores (Fator 1: Confiança; Fator 2: Desconfiança), ainda que no estudo original apresente um fator.
Item | Comunalidades | Fator 1 | Fator 2 |
---|---|---|---|
1 | 0,69 | 0,13 | 0,82 |
2 | 0,76 | 0,86 | 0,13 |
3 | 0,83 | 0,88 | 0,22 |
4 | 0,84 | 0,88 | 0,26 |
5 | 0,69 | 0,30 | 0,77 |
6 | 0,73 | 0,11 | 0,85 |
7 | 0,46 | 0,67 | 0,09 |
Fonte: elaboração própria.
A análise fatorial ao questionário de confiança nos colegas, presente na tabela 3 apresentou apenas uma comunalidade abaixo de 0,5, o que está dentro do esperado. Apresentou também dois fatores (Fator 1: Suporte dos colegas; Fator 2: Competência dos colegas), o que difere do estudo original, onde foram obtidos quatro fatores.
Item | Comunalidades | Fator 1 | Fator 2 |
---|---|---|---|
1 | 0,59 | 0,70 | 0,32 |
2 | 0,72 | 0,79 | 0,32 |
3 | 0,73 | 0,81 | 0,28 |
4 | 0,76 | 0,78 | 0,39 |
5 | 0,65 | 0,79 | 0,18 |
6 | 0,81 | 0,80 | 0,41 |
7 | 0,82 | 0,82 | 0,38 |
8 | 0,85 | 0,87 | 0,32 |
9 | 0,83 | 0,85 | 0,33 |
10 | 0,80 | 0,83 | 0,35 |
11 | 0,63 | 0,70 | 0,37 |
12 | 0,39 | 0,62 | 0,07 |
13 | 0,70 | 0,78 | 0,30 |
14 | 0,85 | 0,83 | 0,40 |
15 | 0,70 | 0,78 | 0,28 |
16 | 0,83 | 0,37 | 0,83 |
17 | 0,78 | 0,27 | 0,84 |
18 | 0,82 | 0,38 | 0,82 |
19 | 0,80 | 0,14 | 0,88 |
20 | 0,69 | 0,47 | 0,69 |
Fonte: elaboração própria.
Já relativamente ao questionário de conhecimento tácito, quando realizada esta análise, presente na tabela 4, apresentou três fatores (Fator 1: Causas Idiossincráticas; Fator 2: Estratégia Organizacional de Gestão de Conhecimento; Fator 3: Contexto Organizacional), como no estudo original, mas com saturações em itens diferentes.
Item | Comunalidades | Fator 1 | Fator 2 | Fator 3 |
---|---|---|---|---|
1 | 0,74 | 0,82 | 0,24 | 0,11 |
2 | 0,68 | 0,81 | 0,16 | - 0,06 |
3 | 0,65 | 0,77 | 0,23 | - 0,02 |
4 | 0,63 | 0,77 | 0,20 | 0,05 |
5 | 0,60 | 0,72 | 0,18 | 0,21 |
6 | 0,41 | 0,46 | 0,35 | 0,28 |
7 | 0,50 | 0,46 | 0,54 | 0,04 |
8 | 0,41 | 0,38 | 0,51 | 0,12 |
9 | 0,66 | 0,23 | 0,78 | - 0,02 |
10 | 0,77 | 0,15 | 0,86 | 0,04 |
11 | 0,72 | 0,14 | 0,83 | 0,12 |
12 | 0,35 | 0,21 | 0,53 | 0,15 |
13 | 0,59 | - 0,15 | - 0,03 | 0,75 |
14 | 0,53 | 0,19 | 0,22 | 0,67 |
15 | 0,58 | 0,15 | 0,71 | 0,22 |
16 | 0,40 | 0,38 | 0,23 | 0,46 |
Fonte: elaboração própria.
Apresentou também quatro comunalidades abaixo de 0,5, o que significa que esses itens não apresentam um nível aceitável de explicação e que devem ser retirados (Hair, Black, Babin, Anderson e Tathan, 2009). Foram mantidos os itens, sendo que, todas as análises realizadas, utilizaram o score total de todas as escalas, e não os seus fatores. Devido a isto, as conclusões retiradas sobre o conhecimento tácito foram exploradas nas entrevistas objetivando validar a qualidade do estudo.
Neste estudo todos os de Cronbach são superiores a 0,8 (tabela 5), o que é considerado um resultado de “bom” a “excelente” (Hill e Hill, 2002).
Instrumentos | Cronbac | |
---|---|---|
Estudo original | Este estudo | |
UWES - 9 | 0,89 | 0,89 |
Transferência de Conhecimento Tácito | 0,74 | 0,88 |
Confiança na Organização | 0,93 | 0,83 |
Confiança nos Colegas | 0,97 | 0,97 |
Fonte: elaboração própria.
Para testar o modelo de transferência de conhecimento tácito (figura 1) foi utilizado o PROCESS, um procedimento computacional combinado com o SPSS, que executa a análise de mediação (Hayes, 2012). Esta é utilizada para verificar como uma variável independente (X) afeta uma variável dependente (Y), quando na presença de uma variável mediadora (M) (Prado, Korelo e Silva, 2014; Hayes, 2018), sendo, neste caso, uma mediação paralela.
Como podemos verificar na figura 1, existem relações positivas e significativas do work engagement para com a confiança nos colegas (a1) e com a confiança na organização (a2), pressuposto inicial para a mediação, pelo que, quanto mais work engagement o trabalhador experienciar, mais confiança terá nos colegas e na organização. É também possível observar uma relação positiva e significativa entre as variáveis mediadoras e a transferência de conhecimento tácito (b1, b2), ou seja, quanto maior a confiança nos colegas e na organização, maior é a transferência de conhecimento tácito.
Constatamos a existência de uma relação positiva e significativa entre o work engagement e a transferência de conhecimento tácito antes (c) e depois (c1) das variáveis mediadoras serem inseridas no modelo, corroborando, assim, a primeira hipótese (H1 - Existe uma relação positiva entre o work engagement e a transferência de conhecimento tácito). Deste modo, podemos concluir que as variáveis de confiança são mediadoras, pois quando incluídas no modelo, diminuem a relação entre X e Y (Abbad e Torres, 2002), o que corrobora a segunda hipótese (H2 - A confiança é um mediador entre o work engagement e a transferência de conhecimento tácito).
O efeito indireto obtido nas duas variáveis mediadoras foi de d1 = 0,05,95% CI [0,02,0,09] e d2 = 0,06, 95% CI [0,03,0,09], e como ambos os intervalos de confiança se encontram acima de 0, podemos afirmar que existe um efeito indireto entre X e Y através destas duas variáveis. Neste modelo, foi obtido um R2 de 0,42, o que significa que o modelo explica 42% da variância presente na transferência de conhecimento tácito.
Verificou-se o coeficiente de correlação Eta, entre a variável nominal “fazer parte de uma equipe” e as restantes variáveis para verificar a relação entre elas. É possível verificar na tabela 6 que existe alguma relação entre as variáveis, apesar de um pouco baixas, sendo, a mais baixa, a relação com a transferência de conhecimento tácito (0,07) e, a mais alta, a relação com a confiança nos colegas (0,25). No entanto, fazer parte de uma equipe influencia as restantes variáveis.
Variáveis | Valor Eta |
---|---|
Work Engagement | 0,11 |
Transferência de Conhecimento Tácito | 0,07 |
Confiança nos Colegas | 0,25 |
Confiança na Organização | 0,11 |
Fonte: elaboração própria.
Na tabela 7 é possível verificar que os dados relativos à Importância do Conhecimento (1.1) agruparam-se em torno dos seguintes subtemas: 1.1.1 Trocar ideias (“(…) valoriza a troca de ideias (…)” E1); 1.1.2 Melhorar a comunicação e a tomada de decisão (“(…) o conhecimento faz melhorar as comunicações entre as pessoas e tomar melhores decisões (…)” E2); 1.1.3 Desenvolvimento individual (“(…) ajuda também no desenvolvimento da atividade laboral.” E6); 1.1.4 Desenvolvimento organizacional (“(…) se não tivermos conhecimento das coisas, […] a empresa não andava para a frente.” E2).
1. Conhecimento | 1.1 Importância do | 1.1.1 Trocar ideias | |
---|---|---|---|
Conhecimento | 1.1.2 Melhorar a comunicação e a tomada de decisão | ||
1.1.3 Desenvolvimento individual | |||
1.1.4 Desenvolvimento organizacional | |||
1.2 Partilha de Conhecimento | 1.2.1 Formas de partilha | 1.2.1.1 Nível individual | |
1.2.1.2 Nível organizacional | |||
1.2.2 Obstáculos | |||
1.2.3 Objetivo da partilha | |||
1.2.4 Work engagement | |||
1.2.5 Confiança nos colegas | |||
1.2.6 Confiança na organização | |||
1.2.7 Trabalho em equipa |
Fonte: elaboração própria.
O conhecimento, como Lundvall e Johnson (1994) afirmam, é uma mais-valia para a organização, pois origina troca de ideias, e melhora a comunicação entre os indivíduos. Promovendo o desenvolvimento individual e uma vantagem competitiva para as organizações (Jannuzzi, Falsarella e Sugahara, 2016; Yao e Juan, 2017).
Ao nível da Partilha de Conhecimento (1.2) foram encontrados 2 níveis: 1.2.1.1 Nível individual (“(…) normalmente faço por e-mail ou envio algumas informações extra ou documentos (…)” E4) e 1.2.1.2 Nível organizacional (“(…) nós temos várias reuniões e partilhamos sempre várias ideias antes de concluir qualquer tarefa.” E1). Estes níveis demonstram o papel importante que, tanto os indivíduos como a própria organização, têm, em fomentar a partilha de conhecimento.
Foram encontrados obstáculos (1.2.2) para a partilha de conhecimento, sendo estes focados nos próprios indivíduos e na forma como se relacionam (“(…) têm medo de perder o controlo das situações.” E4). Constatando o que é relatado por Ford (2004) , Huang, Davison e Gu (2011) , Rêgo, Filho e Lima (2013) , e Mohajan (2016) sobre as dificuldades em partilhar conhecimento e o risco que os indivíduos sentem nesse processo.
O objetivo da partilha (1.2.3) aprofundou as razões para os indivíduos partilharem conhecimento (“(…) trocarmos ideias e estarmos […] sempre atualizados.” E1/ “(…) perceber outras alternativas (…)” E3/”(…) facilitar o serviço.” E5).
Além destes subtemas, foram encontrados outros relacionados com o modelo desenvolvido e onde foram obtidas respostas que o suportam. Foi abordado o work engagement (1.2.4), que, na opinião geral, foi identificado como tendo uma relação positiva com a partilha de conhecimento (“(…) a motivação é essencial para que haja uma maior partilha de conhecimento.” E1/ “(…) estou mais entusiasmado […] tenho mais vontade de partilhar (…)” E7).
Os entrevistados manifestam confiança nos colegas (1.2.6) no que diz respeito à sua relação com a transferência de conhecimento (“(…) Quanto mais confias mais partilhas (…)” E4). E têm confiança na organização com quem estabelecem uma relação positiva no que diz respeito à transferência de conhecimentos (“(…) ao […] acreditarmos no fundo, nos objetivos da empresa, […] faz com que a pessoa tenha mais incentivos para partilhar o conhecimento.” E1).
Também foi abordado na entrevista, o trabalho em equipe que se apresentou como a última categoria (1.2.8) e através do qual pudemos verificar a existência de uma relação positiva entre este, e a transferência de conhecimento (“(…) parte-se do princípio que se nós somos um grupo […] vamos estar sempre mais suscetíveis a ouvir o que os outros dizem” E3). Desta forma, como Costa e Anderson (2011) afirmam, a confiança dentro das equipes promove um clima partilhado pelos seus membros, o que influencia os indivíduos, e que origina comportamentos de confiança, tais como a partilha de conhecimento tácito.
Com a realização destas análises, pudemos confirmar que os dados obtidos no seu conjunto correspondem à realidade dos indivíduos e permitem-nos inferir sobre o ajustamento teórico do modelo.
5. Conclusão
O principal objetivo deste estudo foi compreender se o work engagement e a confiança influenciavam o processo de transferência de conhecimento tácito. Pretendeu-se explorar a presença de um modelo de mediação entre o work engagement, a confiança e a transferência de conhecimento tácito. Desta forma, tentou-se promover uma melhor compreensão sobre como a transferência de conhecimento tácito ocorre dentro das organizações, e se o work engagement e a confiança organizacional e interpessoal influenciam este processo.
Com base nos resultados, tanto dos dados quantitativos como dos dados qualitativos, encontramos uma relação positiva e significativa entre o work engagement e a transferência de conhecimento tácito. Estes resultados vão ao encontro do que a literatura tem vindo a referir, uma vez que apresentaram relações positivas e significativas entre estas variáveis (e.g., Kim e Park, 2017)
Foi encontrada uma relação positiva e significativa entre as variáveis de confiança e a transferência de conhecimento tácito (e.g., Rutten, Blaas-Franken e Martin, 2016; Vasin, Gamidullaeva, Wise e Korolev, 2019; Yoo, Zhang e Yun, 2019; Kipkosgei, Kang e Choi, 2020). Foi, ainda, possível apurar a existência de um processo de mediação com a utilização das variáveis de confiança.
Organizações que queiram aumentar a partilha de conhecimento tácito entre os seus trabalhadores, devem promover um ambiente de confiança, para que estes se sintam seguros em partilhar os conhecimentos que possuem. Além disso, organizações com trabalhadores mais engaged transferem mais facilmente o seu conhecimento tácito.
Este estudo, apresenta algumas limitações, nomeadamente os questionários não validados para a população portuguesa, em específico o questionário de transferência de conhecimento tácito que apresentou algumas comunalidades, o que pode ter resultado numa avaliação grosseira da variável. Outra limitação é a de que o estudo incide apenas sobre uma organização, de um único setor, inserida num contexto específico, não existindo a possibilidade de generalizar os resultados, nem realizar comparações.
No seguimento destas limitações, os estudos futuros poderão ter em conta as seguintes sugestões: a validação dos questionários de confiança e de transferência de conhecimento tácito para a população portuguesa, pois, apesar deste último apresentar algumas limitações neste estudo, parece ser um instrumento que merece mais atenção da comunidade científica e a replicação do estudo, abrangendo outras organizações, de outros setores, proporcionando a generalização dos resultados e conclusões. Para estudos futuros, também seria importante verificar qual a relação entre a confiança dentro das equipes, e a transferência de conhecimento tácito, já que foi um aspeto abordado no decorrer das entrevistas realizadas, e que se mostrou importante para os indivíduos.
Este estudo apresentou um carater de inovação, sendo que, apesar destas variáveis já terem sido estudadas, ainda não tinham sido estudadas em conjunto. Com a realização desta investigação, foi possível desenvolver um modelo de transferência de conhecimento tácito que poderá, no futuro, ser um modelo trabalhado na comunidade científica e organizacional.
Os resultados do presente estudo são importantes, uma vez que o conhecimento tácito aumenta a competitividade das organizações, sendo fundamental identificar quais os fatores que influenciam a transferência de conhecimento tácito para que as organizações possam promover e aumentar essa partilha.