A obesidade é uma doença classificada pelo IMC superior a 30kg/m2 em adultos jovens, sendo sua etiologia multifatorial 1. Ela se caracteriza pelo acumulo excessivo de gordura que geram implicações para saúde 2 e atualmente estima-se que existam mais de 6oomilhões de obesos no mundo 3 e que no Brasil corresponde a 15 % da população brasileira 4.
Como a gordura corporal está associada a diversas alterações metabólicas é de grande importância que seja realizada uma avaliação da composição corporal, permitindo o conhecimento do estado dos componentes constituintes da massa corporal total de um indivíduo e consequentemente a sua análise para uma melhor prescrição e acompanhamento nutricional 5 e físico. Com a dificuldade de mensuração da gordura essencial e a de reserva, opta-se por fazer a divisão corporal em compartimentos, sendo que o método de bioimpedância (BIA) que começou a aparecer após a descoberta da dispersão de corrente В (beta) por Hoeber, em 1911 e a Lei de Ohm por Thomasset em 1960, permitiu determinar a resistência do tecido corporal 6 e analisar a composição corporal de forma compartimentada, além de ser um método não invasivo, indolor, livre de radiação, rápido, de baixo custo 6,7. É considerado um método duplamente indireto, pois grande parte dos dados é estimada através de derivações estatísticas e comparação com outros métodos indiretos de alto padrão de confiabilidade 8, além de possuir equações específicas que levam em consideração: o sexo, etnia, idade, massa corporal total, estatura, nível de atividade física e presença de obesidade 6. Com isto, o objetivo do estudo foi analisar um perfil da composição corporal de mulheres com obesidade grau III, através do método de bioimpedância multipolar.
MATERIAIS E MÉTODOS
Amostra: Foram avaliadas 13 mulheres com obesidade grau III, com idades entre 20 e 40 anos e que não realizavam exercício físico, atendidas pelo Programa de Obesidade Mórbida do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro - RJ. O estudo foi de cunho descritivo dos dados quantitativos dos indivíduos 9, tendo como variável independente a obesidade mórbida.
Instrumentos e Protocolos: A estatura foi expressa em metro (m) e coletada com auxílio de um estadiômetro da marca SANNY® com escala de 0,1 centímetros. A mensuração ocorreu para o cálculo do IMC e a classificação da paciente quanto ao grau de obesidade. A paciente foi colocada em posição ortostática, descalça e sem meias, braços estendidos ao longo do corpo, cabeça posicionada paralelamente ao solo com pés unidos e de costas para a escala do estadiômetro, sempre o mais próximo possível do instrumento.
Foi mensurada a massa corporal total e a composição corporal com auxílio de uma balança de bioimpedância multipolar da marca INBODY® modelo 230. As pacientes foram avaliadas descalças e trajando o mínimo de roupa possível. Foram inseridos na balança os valores relacionados à idade, a estatura e o sexo. Para avaliação todas as participantes seguiram o protocolo para avaliação da bioimpedância que constava em: não ingerir alimento e água quatro horas antes do exame, álcool ou cafeína até 12 horas antes, não fazer exercício físico intenso 12 horas antes do exame, comunicar aos avaliadores se estiver ingerindo medicação diurética, não fazer o exame no período menstrual, retirar todos os objetos metálicos, urinar no mínimo 30 minutos antes do exame e usar roupas leves. Os resultados demonstrados pela balança Inbody 230 e utilizados no estudo foram: a massa corporal total (MC) expressa em quilogramas (kg), o índice de massa corporal (IMC) expresso em quilograma por metro ao quadrado (kg/m2), o percentual de gordura corporal (G%) e da massa livre de gordura (%MLG), o percentual da massa muscular expressos em percentual (%) e a massa muscular em (kg). Para avaliação da massa muscular foi utilizada formula proposta por Janssen et. al. (2000): Índice de massa muscular IMM (kg) = massa muscular (kg) / estatura (m).
Tratamento Estatístico: Aplicou-se a estatística descritiva para as variáveis coletadas, organizado as medidas de tendência central (média), valores mínimos, máximos e variabilidade (desvio padrão) em tabelas.
Aspectos Éticos: O presente trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal do Rio de Janeiro - RJ, protocolo n° 12520413.6.0000.5257. Todas as participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), autorizando a realização da pesquisa conforme a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde do Brasil.
RESULTADOS
Os resultados da composição corporal e caracterização da amostra estão Tabela 1 abaixo e em seguida expressos os resultados da composição corporal segmentar na Tabela 2.
Item | Média | Mín | Máx |
Idade (anos) | 34,7±5,0 | 25,0 | 40,0 |
Massa Corporal (kg) | 118,3±17,7 | 92,6 | 151,6 |
Estatura (m) | 1,59±0,1 | 1,50 | 1,72 |
IMC (kg/m2) | 46,5±3,8 | 40,3 | 53,5 |
% G | 51,9±1,5 | 50,1 | 55,5 |
% MLG | 48,1±1,5 | 44,5 | 49,9 |
% MM | 27,1±0,9 | 25,3 | 28,5 |
MG (kg) | 61,4±9,5 | 47,4 | 77,0 |
MLG (kg) | 56,9±8,6 | 44,6 | 74,6 |
MM (kg) | 32,1±5,01 | 24,9 | 42,4 |
IMM (kg/m2) | 12,7±1,0 | 11,1 | 14,5 |
IMC: Índice de massa corporal; %G: Percentual de Gordura Corporal; % MLG: Percentual de Massa Livre de gordura; % MM: Percentual de massa muscular; MG: Massa Gorda; MLG: Massa Livre de Gordura; MM: Massa Muscular; IMM: índice de Massa Muscular.
Item | Média | Mín | Máx |
MG Tronco (kg) | 26,2±2,9 | 22,7 | 31,9 |
MM Tronco (kg) | 26,3±3,6 | 22,3 | 33,6 |
MG MI (kg) | 9,0±2,3 | 6,4 | 15 |
MG MS (kg) | 7,6±2,1 | 4,7 | 11,3 |
MM MI (kg) | 8,8±1,8 | 6,4 | 12,5 |
MM MS (kg) | 3,3±0,5 | 2,7 | 4,5 |
MG MID (kg) | 9,1±2,4 | 6,4 | 15,1 |
MG MIE (kg) | 9,0±2,3 | 6,4 | 14,8 |
MG MSD (kg) | 7,5±2,1 | 4,6 | 11,2 |
MG MSE (kg) | 7,6±2,1 | 4,7 | 11,4 |
MM MID (kg) | 8,6±1,5 | 6,3 | 11,2 |
MM MIE (kg) | 8,2±1,3 | 6,4 | 10,9 |
MM MSD (kg) | 3,3±0,5 | 2,7 | 4,5 |
MM MSE (kg) | 3,3±0,6 | 2,6 | 4,4 |
MG: Massa Gorda; MM: Massa Magra; MI: Membro Inferior; MS: Membro superior; MSD: Membro Superior Direito; MSE: Membros Superior Esquerdo; MID: Membros Inferior Direito; MIE: Membro Inferior Esquerdo.
DISCUSSÃO
A inatividade física e a inadequação alimentar são fatores determinantes para o acumulo do tecido adiposo e redução da massa muscular 4,10 e podem ter gerado os resultados encontrados nas pacientes pesquisadas, as quais tinham em média 34,7±5,07 anos, massa corporal total de 118,3±17,76 kg, estatura de 1,59±0,07 m e IMC de 46,5±3,81 kg/m2, sendo classificada de acordo com a OMS como obesidade grau III ou mórbida.
O método de bioimpedância, o qual vem sendo bastante utilizado para avaliação da composição corporal, foi comparado com a pesagem hidrostática em oitenta e sete adultos obesos por Séres et.al. 11 e encontraram boa correlação, permitindo a confiabilidade na análise dos dados coletados neste estudo, o qual encontrou um %G de 51,9±1,50 que representa uma massa gorda de 61,4±9,55 kg. Além disso, Leal et. al. 12 que também verificaram elevado percentual de gordura em mulheres obesas mórbidas, constataram uma correlação positiva entre o percentual de gordura pelo método de bioimpedância com o índice de massa corporal, circunferência da cintura e variáveis bioquímicas.
O acúmulo de gordura corporal ou o %G elevado pode promover infiltração lipídica em tecidos que não são estocadores de gordura, como é o caso do musculo esquelético 11, porém o mais importante para avaliar o risco do acumulo excessivo de gordura para a saúde é a forma que a gordura está distribuída no corpo, pois a gordura abdominal em excesso se relaciona a maiores danos metabólicos 13. Com isto, a análise compartimentada ou por segmento permiti verificar onde estão as maiores concentrações, tanto de massa magra como massa gorda. Neste estudo, observou-se que na região do tronco havia 26,3±3,62 kg e 26,2±2,91 kg respectivamente, seguido de membros inferiores 9,1±0,06 kg e 8,4±0,14 kg e membros superiores 3,3±0,02 kg e 7,6±0,01 kg. Não houve diferença entre os lados: os segmentos do lado direito (membros superior e inferior, respectivamente) tiveram 3,3±0,57 kg e 8,6±1,52 kg de massa magra e 7,5±2,13 kg e 9,1±2,43 kg de massa gorda. Enquanto que do lado esquerdo os valores foram 3,3±0,6 kg e 8,2±1,32 de massa magra e 7,6±2,15 kg e 9,0±2,34 de massa gorda (Tabela 2).
Em relação à massa muscular, as pacientes apresentaram 32,1±5,08 kg de massa muscular e um índice de massa muscular de 12,7±1,05 kg/m2, como se pode observar na tabela 1. A baixa massa muscular juntamente com grandes quantidades de gordura em indivíduos obesos é caracterizada como o um quadro de obesidade sarcopênica (OS) 14,15 que pode acarretar uma maior fragilidade e estão associados a fatores como: declínio na massa corporal magra, da força, da resistência e do equilíbrio gerando grande impacto sobre as atividades de vida diária 14,16. Não existem pontos de corte para avaliação de obesidade sarcopênica em mulheres obesas grau iii jovens, entretanto considerando valores para classificação em mulheres obesas idosas: sarcopênica grau I (IMM >5,75 e ≤6,75 kg/m2 e grau ıı para IMM ≤5,75 kg/m2) 17 não foi possível verificar a presença da mesma nesse grupo de mulheres. O excesso de peso e atividades laborativas pode explicar o índice de massa muscular mais elevado, principalmente em membros inferiores, porém pode se suspeitar de sarcopênia em membros superiores por desuso, apesar de ainda não haver mecanismos comprobatórios.
Com isto, conclui-se que o perfil de composição corporal encontrado em mulheres com obesidade grau iii foi de elevado %G, com o esperado, com maior acumulo de gordura na região do tronco seguido de membros inferiores e superiores. Já a massa muscular total estava aparentemente preservada não sendo verificada a obesidade sarcopênica nesse grupo de mulheres. Porém, como é um grupo de pessoas que ainda é pouco estudado, apesar do crescimento mundial e no Brasil, é necessária uma maior investigação sobre o perfil genético, físico e do gasto calórico em repouso e em exercício