Os animais de estimação possuem uma acentuada importância devido aos benefícios que sua interação com o ser humano pode trazer. Dentre estes benefícios podemos citar a diminuição dos casos de depressão, do estresse, da ansiedade, a melhoria de humor, o aumento de estimulo para realização de atividades saudáveis, maior socialização de idosos e de pessoas com deficiências físicas e mentais, além de melhorar o aprendizado e socialização de crianças 1.
Devido a este estreitamento de laços, o convívio entre seres humanos e animais tornou-se algo extremamente relevante para a saúde pública, uma vez que os animais são possíveis fontes de infecção, existindo muitas doenças que os mesmos podem transmitir aos seres humanos, chamadas de zoonoses 2. A transmissão destas doenças se agrava quando as condições sanitárias e de infraestruturas são precárias, ocasionando riscos ao ser humano, uma vez que os animais podem eliminar agentes infecciosos sem apresentar sinais clínicos 3.
Dentre as zoonoses mais importantes transmitidas por cães e gatos podemos destacar a raiva, a leishmaniose, a leptospirose, a toxoplasmose e as verminoses. Estas doenças podem ser transmitidas aos seres humanos, tanto pelo contato direto com o animal infectado, como pelo contato com secreções ou excreções que contaminam a água e o ambiente 4.
O risco à saúde pública devido a convivência com estes animais, é ainda maior quando os proprietários desconhecem o modo de transmissão dessas doenças, bem como suas formas de prevenção. Porém, as informações sobre o risco de contrair uma zoonose nem sempre estão ao alcance da população exposta, ou a própria pessoa envolvida não tem interesse em conhecer tais conceitos, por falta de informações, ou por carência de saber onde buscar tais informações 5.
O que fica evidente é a importância da implementação de ações de educação sanitária aliadas a autoridades que trabalhem com saúde e saneamento ambiental, visando disseminar informações e conscientizar a população com intuito de promover e proteger a saúde 5. Assim, estudos que avaliem o nível de conhecimento da população sobre zoonoses para possibilitar o diagnóstico de situação para a aplicação destas condutas educativas, são essenciais 4. Por este motivo, objetivou-se no presente trabalho avaliar o nível de conhecimento sobre zoonoses de proprietários de cães e gatos que frequentam o Hospital Veterinário da Universidade Brasil, Campus de Fernandópolis, São Paulo.
MATERIAL E MÉTODOS
O projeto foi desenvolvido no Hospital Veterinário, localizado na Universidade Brasil, Campus Fernandópolis, São Paulo. O estudo caracterizou-se por ser uma pesquisa quantitativa, descritiva e exploratória, de uma população amostral composta por 100 tutores de cães e gatos que frequentaram o Hospital Veterinário da Universidade Brasil, Campus Fernandópolis, São Paulo, no período de março a junho de 2017.
Os tutores foram abordados na recepção do Hospital veterinário pelo examinador o qual forneceu informações esclarecedoras sobre a pesquisa e os convidou para participar. Após o aceite, a coleta de dados foi realizada com a aplicação de um questionário específico com foco em zoonoses por meio de realização de entrevista. A pesquisa foi iniciada após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Brasil, São Paulo, com número de parecer 1.940.826.
Após realização do diagnóstico de situação, os dados obtidos foram digitalizados e tabulados em planilhas do software Microsoft Office Excel para formar o banco de dados que foi analisado por meio de cálculo de médias simples e de porcentagem de forma quantificável.
RESULTADOS
Participaram da pesquisa 100 tutores de cães e gatos que frequentaram o Hospital Veterinário da Universidade Brasil, Campus Fernandópolis, no período de março a junho de 2017. Destes, 63% eram do sexo feminino e 47% masculino. A faixa etária mais prevalente foi de adultos entre 20 a 59 anos. Com relação a escolaridade, apenas 12% possuíam ensino superior.
Dentre os entrevistados, 77% possuíam cães, totalizando 152 animais, uma relação de 2 cães por domicilio. Com relação aos gatos, 37% dos tutores possuíam um total de 99 animais, ou seja, relação de 2,9 gatos por domicilio.
A população canina presente no domicilio destes tutores possuíam idade média de 4,5 anos e a felina de 3 anos, com predominância de machos na população canina e fêmeas na população felina.
Quando analisados sobre a postura de posse responsável, 80% dos tutores informaram que levam o animal ao médico veterinário apenas quando o mesmo adoece. Com relação a transmissão de doenças por cães e gatos, todos afirmaram que os mesmos transmitem, porém quando indagados sobre o que é zoonose, 74% não sabiam do que se tratava e 80% disseram nunca ter recebido esclarecimentos sobre tal assunto.
As doenças mencionadas pelos tutores que podem ser transmitidas aos seres humanos pelos cães e gatos, estão descritas na Figura 1.
Dentre as zoonoses, a raiva foi a mais referida (39%), seguida pela leishmaniose (23%) e toxoplasmose (21%).
Alergia e cinomose também foram citadas nesta pesquisa. A verminose foi mencionada por apenas 5% dos entrevistados.
Atualmente a raiva, leishmaniose, leptospirose, toxoplasmose e esporotricose são consideradas as principais zoonoses transmitidas por cães e gatos. No presente projeto, foi questionado aos tutores quem são os transmissores, como ocorre a transmissão e como pode ser realizada a prevenção destas doenças.
Com relação a raiva, todos os entrevistados disseram conhecer ou pelo menos já ouviram falar da doença. Como transmissor, 94% disseram ser o cão, e apenas 29% relacionaram outros mamíferos, dentre eles o gato e o morcego. A forma de transmissão da raiva mencionada por 90% dos tutores foi a mordida, e 14 % disseram que por meio de lambedura e arranhadura também podem contrair a doença. Como método preventivo, 88% citou a vacinação de cães e gatos, e 4% afirmaram que o animal deverá ser tratado.
A leishmaniose também é uma zoonose de grande importância para a saúde pública, 90% dos entrevistados relataram conhecer a doença ou pelo menos ter ouvido falar. Embora os tutores relataram conhecer a doença, apenas 45% disseram que a mesma é transmitida por picada de mosquito e 34% não souberam responder. Além disso, 20% dos tutores sugeriram que a transmissão é realizada pelo cão.
Sobre sua prevenção, o uso de coleiras repelentes (22%) foi o mais recomendado pelos tutores, seguido pelo controle de criadouros do mosquito (15%), o restante (63%) não sabiam como prevenir a doença.
A Leptospirose demonstrou ser uma doença bastante conhecida pelos tutores, pois 92% deles disseram conhecer ou já ter ouvido falar da doença. Ninguém o citou o cão como potencial transmissor, apenas 57% mencionou o rato e o restante (43%) não conheciam o potencial transmissor.
Muitas informações incorretas ou confusas sobre a doença foram relatadas com relação ao seu modo de transmissão e prevenção. As fezes foram citadas por 22% dos tutores, seguido por urina (12%) e água contaminada (9%). Já as medidas profiláticas citadas foram: controle de roedores (19%), armazenamento correto de alimentos (9%) e consumo de água tratada (6%).
Outra zoonose importante analisada foi a toxoplasmose. Os tutores (92%) disseram conhecer ou ter ouvido falar da doença. Relacionado ao transmissor, o gato foi citado por 59% dos entrevistados, seguido pelo cão (9%) e pelo rato (2%). A transmissão pelas fezes do felino foi citada por 26% dos entrevistados, 8% disseram ser transmitida pela mordedura/arranhadura e 7% pela urina. A forma de prevenção mais comentada foi a higiene pessoal e da casa (25%) e a utilização de vacina (6%).
A zoonose que despertou mais preocupação com relação ao conhecimento dos tutores foi a esporotricose, pois apenas 9% dos entrevistados disseram conhecer ou já ter ouvido falar da doença. Dentre os que possuíam conhecimento, 80% possuem ensino superior. Apenas 7% dos entrevistados disseram que sabiam o transmissor da doença e citaram o gato. A arranhadura foi referida por 6% como forma de transmissão, o restante não soube responder, assim como apenas 3% disseram que sabia como prevenir, mas na realidade disseram que a prevenção seria o tratamento do animal doente.
DISCUSSÃO
De acordo com os resultados obtidos, notou-se que o nível de escolaridade dos tutores entrevistados no Hospital veterinário da Universidade Brasil, Campus de Fer-nandópolis, diferiu da pesquisa realizada em Bom Jesus, PI, que demonstrou que 42,1% dos tutores do Município possuem ensino superior 6.
A relação cão por domicilio encontrada foi semelhante à da pesquisa do IBGE, que detectou uma proporção de 1,8 cães por domicílio brasileiro 7, porém, difere da encontrada em Jaboticabal que foi de 2,6 8. Já os gatos, a relação por domicilio está acima da citada pelo ibge que foi de 1,9 gatos por domicílio 7, e abaixo da encontrada em estudo realizado por Lages 8 que foi de 12 gatos por domicílio.
A população canina e felina presente no domicilio dos tutores possuíam idade e sexo semelhantes aos encontrados por Magnabosco 9 na cidade de São Paulo, que determinou a idade da população canina em 4,3 anos e da felina 3,4 anos, também com predominância de machos na população canina e fêmeas na população felina.
Relacionado a posse responsável, os tutores demonstraram não compreender a importância da prevenção de doenças em seus animais, procurando auxílio médico veterinário apenas na presença de sinais clínicos. Diferente do que foi encontrado em outras pesquisas realizadas que detectaram índices mais baixos, 57%, 49,1% e 45% 6,8.
Com relação a transmissão de doenças por cães e gatos, o conceito de zoonose parece não ser bem entendido. Estudos realizados por Lages 8 e Izola 10, 83% e 89,4% dos entrevistados afirmaram que cães e gatos transmitiam doenças. É importante lembrar que a convivência com cães e gatos exige a adoção de medidas preventivas, pois quando as mesmas não são cumpridas, podem propiciar a disseminação de zoonoses 11.
Neste trabalho, as zoonoses mais citadas foram raiva, leishmaniose e toxoplasmose. Em estudo realizado por Faria 12, os entrevistados listaram como principais zoonoses transmitidas por cães e gatos a leptospirose, raiva, cisticercose e leishmaniose. Algumas doenças citadas não eram zoonoses, demonstrando a falta de conhecimento dos tutores com relação a transmissão de algumas doenças. A verminose foi mencionada por poucos, dado extremamente preocupante, deixando claro a deficiência de conhecimento sobre verminoses como doença zoonótica verificada na população do estudo. Langoni 4, já havia mencionado ser alarmante o fato de que 42,4% das pessoas entrevistadas em sua pesquisa não sabiam o que é verminose.
Os animais de estimação podem transmitir ao ser humano diversos agentes infecciosos. De acordo com West-garth 11, cães e gatos podem albergar de 30 a 40 agentes zoonóticos. Atualmente a raiva, leishmaniose, leptospi-rose, toxoplasmose e esporotricose são consideradas as principais zoonoses transmitidas por cães e gatos. No presente projeto, foi questionado aos tutores quem são os transmissores, como ocorre a transmissão e como pode ser realizada a prevenção destas doenças.
Com relação a raiva, esta doença continua sendo a zoonose mais importante por ser fatal. Apesar do controle da raiva urbana, o cão ainda é o principal transmissor da doença ao ser humano, principalmente nas regiões em desenvolvimento, porém, o gato e outros animais selvagens (principalmente morcegos) assumiram importância como transmissores 8. Os tutores citaram os cães como transmissores, deixando evidente a falta de informação da população pesquisada com relação aos outros potenciais transmissores da doença.
A forma de transmissão e prevenção correta da raiva foi bastante mencionada, assim como em estudo realizado por Izola 10, 92,61% e 93,61% que relataram, respectivamente, os modos de transmissão e prevenção corretos da doença. Acredita-se que a raiva por ser uma zoonose bastante divulgada pelos meios de comunicação e também durante a campanha de vacinação de cães e gatos, os tutores, assim como a população em geral, possuem um maior grau de conhecimento sobre a mesma.
A leishmaniose também é uma zoonose de grande importância para a saúde pública e os tutores relataram conhecer a doença ou pelo menos ter ouvido falar. Este fato pode estar relacionado a trabalhos educativos realizados com a população, que com o passar do tempo, consequentemente vem aumentando seu conhecimento sobre o tema. Já em outros estudos, os entrevistados demonstraram desconhecimento maior sobre a existência da doença, 21,7% e 43% 10,13. Azevedo 13, também relatou baixo conhecimento dos entrevistados com relação a transmissão da doença, pois apenas 21,3% afirmaram ser por meio da picada de um mosquito, e 70% não souberam responder. A ideia errônea de que o cão e gato transmite a doença ao ser humano por meio de contato também ficou evidente nesta pesquisa.
Sobre sua prevenção, o uso de coleiras repelentes foi o mais recomendado pelos tutores. Izola 10 relataram que em sua pesquisa 55% dos entrevistados conheciam pelo menos uma medida preventiva contra a doença, já Azevedo 13 relatou que 88,3% não conheciam as medidas profiláticas que deveriam ser adotadas. O uso de coleiras impregnadas por inseticidas é preconizado como medida profilática para esta doença, embora sejam poucos os tutores que utilizam em seus animais.
A Leptospirose, demonstrou ser uma doença bastante conhecida pelos tutores, assim como em estudo realizado por Cardoso 14, onde todos os entrevistados afirmaram conhecer a doença, e por Izola 10, 95,7%. Em um estudo realizado em uma comunidade de Quilombolas, apenas 53,3% relataram ter conhecimento sobre a doença, deixando evidente a importância da realização de trabalhos de educação em saúde para a população 15.
Quando se relaciona prevenção com transmissão da lep-tospirose, nota-se a clara vinculação ao rato, e a exclusão dos demais animais transmissores. Isso pode ocorrer devido à falta de informação nas campanhas de controle da doença que não incluem o cão como reservatório, mas sim apenas a intensa vinculação da leptospirose ao rato 16. Em um estudo realizado em Jaboticabal, São Paulo, 92,53% dos entrevistados conheciam ao menos um modo de transmissão e 79,57% um modo para sua prevenção 10.
Outra zoonose importante analisada foi a toxoplasmo-se, onde a maioria dos tutores disseram conhecer ou ter ouvido falar da doença, assim como 82,6% informaram conhecer a doença em estudo realizado em Jaboticabal, São Paulo 10. Relacionado ao transmissor e forma de contágio, os entrevistados demonstraram pouco conhecimento. Izola 10 relatou que 51,06% dos entrevistados conheciam medidas profiláticas da doença, já Arrais-Silva 17 em pesquisa realizada com alunos do ensino médio, detectou que 44,74% dos mesmos não conheciam medidas preventivas contra a doença. Para Lima 18 a percepção do parasitismo é um importante fator de aumento do conhecimento da doença pela população. Por isso, apesar da toxoplasmose ser muito prevalente, a baixa morbidez confirma a falta de conhecimento específico dessa zoonose.
A zoonose que despertou mais preocupação com relação ao conhecimento dos tutores foi a esporotricose, pois poucos entrevistados disseram conhecer ou já ter ouvido falar da doença. Em estudo realizado por Cardoso 14, detectou-se uma correlação positiva entre o nível de escolaridade e maior conhecimento sobre o transmissor das doenças analisadas, assim como neste estudo. Em um estudo realizado em Pelotas, RS, 44,17% dos estudantes da cidade e 26,51% dos profissionais da área da saúde do Município tinham conhecimento sobre a doença, mesmo a cidade sendo considerada área endêmica para a doença 19. Assim notou-se a importância de uma maior divulgação e informação sobre a doença para a população.
A prevenção das zoonoses começa com a conscientização da população e dos profissionais da saúde pois nem sempre o conhecimento sobre estas doenças alcança a população exposta aos riscos constantes. Este trabalho deve ser realizado por meio de ações de educação sanitária, dentre elas execução de projetos educativos sobre posse responsável e transmissão de doenças, além da instituição de medidas de vigilância epidemiológica 12,20.
Para que estas ações sejam efetivas, é imprescindível que seja intensificada a capacitação dos profissionais da saúde e que as mesmas sejam direcionadas para as reais necessidades da população. Para isso, é necessário o apoio das autoridades relacionadas ao sistema de saúde e ao saneamento ambiental. A educação ainda é a maneira mais eficaz para informar e transformar pessoas em difusoras de conhecimento e vigilantes atuantes. Portanto, o conhecimento e a educação formam a base para qualquer programa de prevenção, controle e erradicação de doenças 8.
O presente estudo permitiu identificar que a população estudada, tutores de cães e gatos, apresentaram carências de informações relacionadas ao conhecimento das principais zoonoses transmitidas por cães e gatos estudadas, especialmente sobre esporotricose.
Este estudo poderá ser utilizado para delineamento de estratégias de ação educativas que poderão ser aplicadas no próprio hospital veterinário para aos tutores que o frequentam, visando sanar as deficiências elencadas pela pesquisa para prevenir a ocorrência de possíveis danos à saúde humana e animal