Introdução
O comportamento adolescente constitui foco de estudos e discussões permeados por concepções diferentes e, às vezes, divergentes. Enquanto a adolescência é cultuada e prolongada por muitas culturas, principalmente a ocidental, em outras, o adolescente é alvo de preconceitos e julgamentos devido à sua dinâmica comportamental, considerada característica dessa fase do ciclo vital.
A juventude e um longo futuro pela frente se contrapõem a comportamentos de risco, impulsividade, labilidade emocional e imediatismo. A imaturidade cerebral do adolescente e as altas taxas de produção hormonal têm sido relacionadas à sua tendência à impulsividade e tendência à impulsividade e dificuldade na tomada de decisões (Winters, 2008) Ademais, a fraca conexão neuronal entre a área do prazer e o sistema inibitório no cérebro contribui para a imaturidade nos adolescentes (Weissman et al., 2015).
O grupo de pares exerce grande influência nas atitudes dos adolescentes. Em sua pesquisa McDonough, Jose e Stuart (2015), testaram a influência dos pares no uso de substâncias psicoativas em 1940 adolescentes de 10-15 anos da Nova Zelandia. O estudo concluiu que a influência negativa dos pares (propiciar oportunidades, servir como modelos de comportamento e de desvio de normas, crenças e atitudes em relação ao uso de substâncias) aumentou o uso em todas as drogas, enquanto a influência positiva não demonstrou causar mudanças (Bahr, Hoffmann, & Yang, 2005; Guo, Hill, Hawking, Catalano, & Abbott, 2002). A falta de monitoramento e proximidade parental colaboram para uma maior vulnerabilidade e exposição aos comportamentos de risco (Chilcoat & Anthony, 1996; Fallu et al., 2010; Hemovich, Lac, & Crano, 2011). Pais com histórico de uso de drogas e comunicação ou relação conflituosa entre pais e filhos são fatores correlacionados com a experimentação de drogas (Butterworth, Slade, & Degenhardt, 2014; Haug, Núñez, Becker, Gmel, & Schaub, 2014).
Estima-se que nos Estados Unidos, 20,5 - 48,9% dos estudantes entre a 8a e a 12a série já experimentaram alguma substância psicoativa (Johnson, O'Malley, Miech, Bachman, & Schulenberg, 2016). O consumo precoce de drogas, como a Cannabis Sativa, tem sido relacionado a prejuízos biopsicos-sociais e ao prognóstico sombrio de agravamento do comportamento aditivo (Silins et al., 2014).
O desenvolvimento cerebral do adolescente apresenta maior vulnerabilidade devido a imaturidade orgânica de áreas relacionadas à regulação do humor e tomada de decisões (National Institute on Drug Abuse, 2014). Além disso, observam-se consequências indiretas, como adição a video games (Coéffec et al., 2015), aumento da criminalidade e da prevalência de patologias orgânicas (Haug et al., 2014) e psiquiátricas (Weissman et al., 2015).
A síndrome de abstinência é considerada o principal motivo para a manutenção do comportamento aditivo. A gravidade do comportamento aditivo é relacionada à ocorrência de sintomas psicológicos e físicos, bem como deterioração de comportamentos sociais saudáveis, onde a busca pela substância ocorre pela necessidade de aliviar esses sofrimentos, colaborando para aumento das chances de recaída (Koob et al., 2014). A literatura apresenta que o índice de recaídas pós-trata-mento ainda é alto (Settles & Smith, 2015).
Do exposto, o planejamento e implementação de abordagens para a proteção à saúde dos adolescentes, minimizando os prejuízos decorrentes do consumo de drogas, apresenta-se como preocupação e desafio. Pesquisadores buscam desenvolver estratégias terapêuticas para lidar com esse público em tratamentos psicológicos e psiquiátricos ao longo das últimas décadas (Garner et al., 2009; Hogue, Dauber, Stambaugh, Cecero, & Lidd-le, 2006; Rounds-Bryant, Kristiansen, & Hubbard, 1999).
Dentre os avanços na abordagem ao adolescente usuário de drogas, destaca-se o reconhecimento da importância da inserção dos pais/cuidadores como corresponsáveis pelo tratamento dessa clientela (Bertrand et al., 2013; Winters & Leitten, 2007). Nas últimas décadas, tem se desenvolvido um maior número de estudos controlados de eficácia e efetividade nos tratamentos de base familiar para adolescentes usuários de drogas. Da mesma forma, tem se ratificado a necessidade de investir em técnicas que mantenham e motivem o adolescente ao tratamento, se evidenciando os ganhos da inclusão dos pais/cuidadores nesse processo (Liddle, 2004).
Levando-se em consideração que a fase da adolescência está permeada pelas características citadas, as intervenções com os adolescentes requerem estratégias específicas. Os tratamentos para o uso de drogas necessitam voltar-se para estas especificidades e os profissionais que lidam com essa temática precisam ter acesso aos investimentos nessa área. A partir disso, o objetivo desse estudo foi compilar estudos sobre tratamento de adolescentes usuários de drogas focados na abordagem familiar, a fim de tratar sobre a eficácia dos protocolos apresentados.
Do exposto construiu-se o questionamento: "Qual a eficácia de protocolos para o tratamento de adolescentes usuários de drogas sob o enfoque da abordagem familiar?". Assim, o objetivo dessa revisão é investigar a eficácia de protocolos para o tratamento de adolescentes usuários de drogas sob o enfoque da abordagem familiar.
Método
Uma revisão sistemática da literatura foi realizada seguindo as recomendações do PRISMA (Moher et al., 2010). Assim, os estudos foram pesquisados nas bases de dados Pubmed, PsycINFO, Cochrane Central Register of Controlled Trials e Scopus. A busca seguiu as regras de cada base de dados utilizada. Os restritores/limitantes escolhidos foram: Randomized, Human, Clinical Trial, Comparative Study, Controlled Clinical Trial, Randomized Controlled Trial, Validation Studies.
Os termos utilizados na pesquisa: ["drug abuse"] AND ["adolescent attitudes" OR "adolescent substance abuse"] AND ["family therapy" OR "parent training"] AND ["intervention" OR "manualized" OR "program" OR "treatment"], foram encontrados no banco de terminologias Thesaurus of Psychological Terms da American Psychological Association - APA (psycnet.apa.org), assim como houve uma complementação de palavras-chave encontradas em artigos de referência no tema.
Aquelas referentes à terapia de base familiar utilizou-se os descritores "family therapy" e "parent training", que foram escolhidos independente da questão teórica, após algumas "buscas-testes".
Foram considerados somente artigos nos idiomas: espanhol, inglês e português. O levantamento de abstracts restringiu-se aos últimos dez anos, uma vez que o tema abordado pelo estudo, abordagem familiar em dependência química, se trata de algo relativamente novo dentro das modalidades de tratamento da área (Payá & Figlie, 2010).
A busca on-line inicial nas bases de dados foi conduzida por dois pesquisadores independentes no mesmo espaço de tempo para evitar vieses. Inicialmente houve a leitura por dois juízes do abstract dos artigos recuperados. Os artigos repetidos nos bancos de dados foram excluídos. Nessa etapa foram incluídos os artigos que seguiam os seguintes critérios de inclusão: a) Estudos que tratassem sobre a temática da adolescência e uso de drogas; b) Foco no acompanhamento de pais de adolescentes usuários de drogas; podendo ter o tratamento combinado com os adolescentes.
Somaram-se ao total de artigos escolhidos na etapa dos critérios de inclusão outros estudos que foram encontrados por meio da busca manual, tanto nas referências dos artigos já selecionado, quanto em buscas assistemáticas do tema. Este recurso foi realizado a fim de encontrar os estudos originais/principais de cada intervenção, assim como algumas intervenções com pais que não foram contempladas na busca sistematizada.
Na etapa seguinte, o total de artigos foi analisado a partir dos critérios de exclusão. Assim, foram desconsiderados os artigos que apresentassem: a) Uma intervenção clínica não baseada em um protocolo; b) Propostas de tratamento que não focassem na importância da participação dos pais no tratamento do filho adolescente usuário de substância psicoativa; c) Os pais somente para coleta de informações; d) A mesma intervenção, mas que não fosse o principal estudo clínico controlado randomizado.
Os artigos que permaneceram após a aplicação dos critérios de exclusão, também foram analisados por sua qualidade metodológica pela Escala JA-DAD cinco pontos (JADAD score on a 5-point scale;Jadad et al., 1996). Esse instrumento foi escolhido porque é de fácil e rápida aplicação e é um dos recursos mais utilizados para avaliar a qualidade de ensaios clínicos randomizados (Berger & Alperson, 2009). A escala JADAD é dividida em duas partes. A primeira tem pontuação máxima de três pontos, através de respostas dicotômicas (sim - 1 ponto; não - 0 ponto) para os seguintes critérios: (1) randomização, (2) duplo-cego; (3) perdas (dropouts). Na segunda parte, há a pontuação adicional para mais dois critérios: (4) método de randomização adequado e (5) cegamento adequado. Estudos que pontuam dois ou menos são considerados de má qualidade, e superior a dois são avaliados com qualidade excelente (Jadad et al., 1996). Assim, foram excluídos artigos que não atingiram a pontuação de qualidade excelente.
Resultados
Na busca sistemática foram localizados quatro artigos e foram incluídos 10 por meio da busca manual. No final do processo restaram seis artigos. Aqueles desconsiderados pelos critérios de exclusão foram retirados por: estar incompleto (1); se tratarem de estudos com outras faixas etárias, que não adolescentes (2); estudo sem intervenção com pais (1); estudos com outros delineamentos (3); estudos que repetiram a mesma intervenção (5) e estudos de má qualidade (3). A Figura 1 apresenta o fluxograma do método utilizado.
Qualidade Metodológica dos Estudos
A média da qualidade dos seis estudos selecionados nessa revisão sistemática foi 3,0, indicando que os mesmos atentaram para questões importantes para a realização de um ensaio clínico randomizado (randomização, duplo-cegamento e perdas) e podem ser considerados estudos de qualidade excelente. Observa-se que, dos itens apontados como fundamentais na qualidade dos estudos (Jadad et al., 1996), todos os artigos fizeram uso do método de randomização e a maioria (n = 5) descreveu o procedimento. As perdas foram apresentadas em todos os estudos. Entretanto, apenas dois estudos foram duplo cego.
Todos os estudos avaliaram o impacto de suas intervenções por meio do follow-up, foi empregada em todos os estudos que fazem parte dessa revisão sistemática. O tempo de latência entre o pós-teste e o follow-up variou entre seis e 22 meses. Para melhor sintetizar as informações relacionadas aos estudos, estas foram compiladas na Tabela 1.
Note.*ADI - Adolescent Diagnostic Interview (Winters & Henly, 1993); APQ - Alabama Parenting Questionnaire (Shelton, Frick, & Wooten, 1996); BDI - Beck Depression Inventory (Beck et al., 1961); CBCL - Child Behavior Check list (Achenbach & Rescorla, 2001); CDISC - Computerized Diagnostic Interview Schedule for Children (Shaffer, 1992); CTS - Conflict Tactic Scale (Straus, 1979); DISC - Diagnostic Interview Schedule for Children (Shaffer et al., 1996); Family Environmental Scale (Moos & Moos, 1986); FES - Family Environment Scale (Moos & Moos, 1986); FORM 90 - (Miller & DelBoca, 1994); Health Risk Questionnaire (Ashworth et al., 1992); NYSDS - National Youth Survey Delinquence Scale (Elliot, Huizinga, & Ageton, 1985); Parenting Practices Questionnaire (Gorman-Smith, Tolan, Zelli, & Huesmann, 1996); PBI -Parental Bonding Instrument (Parker, Tupling & Brown, 1979); PEI - Personal Experience Inventory (Henly & Winters, 1988); POSIT - Problem Oriented Screening Instrument for Teenagers (Rahdert, 1991); Problem-Soving Questionnaire (Latimer, Winters, D'Zurilla, & Nichols, 2005); SOCRATES - The Stages of Change Readiness and Treatment Eagerness Scale (Miller & Tonigan, 1996); TLFB - Timeline followback (Sobell & Sobell, 1996); TSR- Treatment Services Review (Winters & Stinchfield, 2000); VSDI - Vermont Structured Diagnostic Interview (Hudziak et al., 2004); YSR - Youth Self-Report (Achenbach & Rescorla, 2001).
Caracterização dos protocolos de intervenção dos Estudos selecionados
O número de sessões nas condições de tratamento avaliadas variou entre três e 16 encontros. As intervenções designadas com grupo-controle foram: avaliação no pré e pós-teste, tratamento usual de adolescentes usuários de drogas, intervenção padrão da escola, terapia cognitivo-comportamental e serviço padrão oferecido em abrigos para crianças e adolescentes que fugiram de casa.
O estudo de Winters, Fahnhorst, Botzet, Lee e Lalone (2012) propôs um protocolo de intervenção com ênfase na participação dos cuidadores: Brief Intervention Adolescent - Parent (BI-AP). As duas primeiras sessões são destinadas ao adolescente. A primeira sessão foca a psicoeducação sobre o uso de drogas e suas consequências, a motivação para mudança e os objetivos do tratamento. A segunda sessão objetiva avaliar o progresso dos objetivos, identificar as situações de risco para uso de drogas e discutir estratégias para lidar com essas situações e negociação de metas de longo prazo. A terceira sessão trabalha a entrevista mo-tivacional com os pais/responsáveis, a conscientização do problema do filho e a importância do papel deles no tratamento.
Robbins e colaboradores (2011) propõem testar a intervenção Brief Strategic Family Therapy (BSFT), a qual está descrita em um manual e envolve múltiplos membros da família. Ela integra a Teoria e Terapia Familiar Estratégica Estrutural e técnicas de intervenção para trabalhar as interações sistêmicas/relacionais associadas ao uso de drogas por adolescentes. Tem como objetivo reduzir os comportamentos problemáticos do adolescente no momento em que se trabalha com a interação entre os membros familiares e outros sistemas importantes que exercem influência sobre o comportamento do adolescente, como o grupo de pares e a escola.
Koning et al. (2009) testaram três modalidades de intervenção. A primeira foi o grupo de pais, realizado em três sessões e com foco nas regras aplicadas aos adolescentes. A segunda foi o grupo de estudantes, que acontecia em quatro sessões e trabalhou as atitudes dos adolescentes quanto ao consumo de bebidas alcoólicas. E a terceira foi o grupo combinado, em que se executaram ambas as intervenções.
Stanger, Budney, Kamon e Thostensen (2009) propuseram testar uma intervenção que combinava manejo de contingências baseado na abstinência (Abstinence-based contingency management) para os adolescentes usuários de drogas e o manejo familiar (Family management) para os pais/responsáveis desses adolescentes. Na intervenção com os adolescentes, os mesmos recebiam incentivos em dinheiro quando, após o teste laboratorial de urina, relato dos pais e resultados de escalas de autorrelato, comprovassem a abstinência de maconha. O valor em dinheiro ia aumentando conforme a duração do tempo em abstinência.
Já a intervenção com os pais tinha como tópicos principais identificar e monitorar os comportamentos do adolescente, combinar incentivos e consequências para a mudança de comportamento do uso de drogas do adolescente, definir limites e habilidades sociais.
No estudo de Liddle, Dakof, Turner, Henderson e Greenbaum (2008), foi testado empiricamente a Family-based Treatment, Multidimensional Family Therapy (MDFT), que se trata de um protocolo de intervenção descrito em um manual. O domínio do adolescente usuário de drogas tem como objetivo incentivá-los a se engajarem no tratamento, na comunicação efetiva com os pais e outros adultos, desenvolver coping, auto-regulação e resolução de problemas e melhorar a competência no âmbito social, nos estudos e no trabalho, além de pensar em alternativas para o uso de drogas e para os delitos. O domínio dos pais tem como foco engajar os mesmos na terapia, aumentar seu envolvimento com o adolescente e suas habilidades, especialmente o monitoramento, auxiliar o filho a definir suas expectativas, impor limites e consequências, e responsabilizá-los com relação a sua função e papel frente ao adolescente. E, por último, o domínio interacional, que propõe diminuir os conflitos familiares e aumentar a ligação emocional, a comunicação e a resolução de problemas.
A intervenção testada por Slesnick e Prestopnik (2005) trata-se da Ecologically Based Family Therapy (EBFT). Proposta em um manual e dividida/ organizada em quatro partes. Na primeira parte, são explicados e descritos aos adolescentes e seus pais os objetivos e procedimentos do tratamento. Na segunda parte, se estabelece os temas comuns entre a díade (pais-filhos) para o tratamento. A terceira parte subdivide-se em quatro sessões, em que se trabalha a prevenção do HIV e pode acontecer em encontros individuais. Na quarta parte, os pais e os adolescentes são incentivados a tratarem sobre seus objetivos e problemas. Existem sessões apenas com os pais, em que os mesmos são ajudados a desenvolver uma nova forma de interação com os filhos e novas estratégias. Nas sessões em conjunto, pais e adolescentes aprendem juntos técnicas de comunicação e resolução de problemas.
Sobre a eficácia das intervenções testadas
A intervenção BI-AP (Winters et al., 2012) demonstrou resultados significativamente melhores (p < 0,05) do que a outra condição de tratamento (somente com adolescentes) em relação à periodicidade do uso de cannabis e a sintomas de abuso e de dependência de cannabis. Da mesma forma, o follow-up demonstrou resultados semelhantes no percentual de tempo de abstinência após seis meses em relação ao uso de álcool e cannabis, sintomas de abuso e dependência de álcool e cannabis.
A BSFT (Robbins et al., 2011) apresentou-se mais significativamente efetiva do que a outra condição testada em comprometer e manter os participantes em tratamento. Sobre o consumo diário de drogas pelo adolescente, o número médio de dias de uso de drogas referidos pelos adolescentes foi significativamente maior na condição controle do que na BSFT.
Koning e colaboradores (2009) comprovaram que, no Grupo Combinado (Adolescentes e pais), em 10 meses, um número significativamente menor de adolescentes iniciou o consumo semanal pesado de álcool (meninos - 4 ou mais doses; meninas - 3 ou mais doses) quando comparado ao número do Grupo Controle. Tanto em 10 meses quanto em 22 meses, no Grupo Combinado o número de adolescentes que passou a ter um consumo semanal de álcool foi menor, comparado ao número do Grupo Controle. Entretanto, em 22 meses não houve diferenças significativas entre os grupos em relação ao consumo pesado de álcool.
Os participantes da intervenção combinada (Abstinence-based contingency management + Family management) proposta por Stanger e colaboradores (2009), em média, tiveram períodos mais longos de abstinência de maconha durante o tratamento do que os participantes do grupo controle. No pós-tratamento, os adolescentes que receberam a intervenção testada apresentaram maior prevalência de abstinência de maconha e também demonstraram uma melhora significativa nos relacionamentos mãe-filho.
A MDFT (Liddle et al., 2008) foi comparada a Terapia Cognitivo-comportamental, e ambas as intervenções reduziram o uso de substâncias, o uso de maconha dos últimos 30 dias e tiveram uma pequena tendência a reduzir o consumo de álcool. Os adolescentes da MDFT reportaram uso de substâncias significativamente menor do que aqueles da TCC, nos follow-ups de seis meses e de 12 meses. Da mesma forma, a MDFT mostrou-se significativamente mais eficaz que a TCC na redução do consumo de outras drogas e do uso de drogas (comparando o número de adolescentes que usou uma droga somente uma vez ou que se manteve abstinente).
E em geral, os adolescentes que receberam a EBFT (Slesnick & Prestopnik, 2005) mostraram uma redução maior na frequência do uso e na variedade usada de drogas do que aqueles que receberam a intervenção controle. Ambas as intervenções causaram melhoras no funcionamento psicológico e familiar.
Discussão
Com o objetivo de discutir sobre a eficácia de protocolos de tratamento de adolescentes usuários de drogas focados na abordagem familiar, esta revisão sistemática selecionou estudos que tinham o objetivo de avaliar os resultados de uma intervenção que contemplava os pais/responsáveis de adolescentes usuários de drogas em comparação com outra(s) condição(ões), o que demonstrou que o método de busca utilizado abrangeu o tema escolhido. Contudo, é importante considerar algumas limitações no método.
A busca de artigos não priorizou bancos de dados que abrangessem prioritariamente estudos latinoamericanos, e aqueles recuperados na primeira busca não contemplaram os critérios de inclusão ou exclusão. Ainda sobre os bancos de dados, observa-se o baixo número de artigos encontrados na Pubmed devido a não utilização dos termos de seu banco próprio de terminologias. O que protege os resultados dessa revisão sistemática em detrimento do não uso do MeSH da Pubmed foram as "buscas-teste", que demonstraram que o total de artigos recuperados estava diretamente ligado aos critérios de inclusão e, portanto, convencionou-se pela string utilizada.
Entretanto, pode-se observar nessa revisão sistemática, a dificuldade em se encontrar estudos que contemplassem itens essenciais para um ensaio clínico randomizado de qualidade em pesquisas com intervenção psicológica. Entende-se que estes quesitos ainda são itens pouco utilizados em intervenção psicológica, pois esta área de estudo comumente enfrenta algumas limitações no método. Uma dessas dificuldades enfrentadas é o acesso aos participantes que, além de aceitarem, devem aderir ao processo por um longo período. Ademais, é necessária a permissão dos locais para o acesso a amostra na maioria das situações. No caso dos estudos selecionados, ainda havia a condição da participação dos pais. Todas estas questões dificultam o processo de randomização, visto que para se realizar esse processo é necessário que os participantes sejam alocados de forma aleatória nas condições de tratamento (Moher et al., 2010). Além de contribuírem para as perdas dos participantes ao longo do processo, os referidos dropouts (Eysenbach, 2005).
Outro item importante, mas que tem sua utilização limitada nesse tipo de estudo, é o cegamento, no inglês blinding ou masking. Esse processo diz respeito ao não acesso das pessoas envolvidas na pesquisa às informações sobre as intervenções, minimizando a influência que o conhecimento das informações causaria - os conhecidos vieses na pesquisa (Wood et al., 2008). A maior dificuldade são os processos em que ambos, pesquisador e participante, desconhecem a intervenção (duplo-cego/double-blind), pois é esperado que os terapeutas recebam um treinamento para a aplicação da intervenção e, portanto, tenham conhecimento sobre a condição experimental. Pode ser observado nos estudos selecionados que os avaliadores (pré e pós-teste) puderam ser cegados quanto à condição de tratamento dos participantes avaliados, o que protegeu esses resultados de possíveis interferências relacionadas às expectativas dos pesquisadores (Robbins et al., 2011; Winters et al., 2012).
Nesse sentido, um ponto que pode ter contribuído para o asseguramento dos resultados, mediante a dificuldade do método, foi a realização do follow-up. No que diz respeito aos estudos selecionados, esse recurso metodológico, que é condição fundamental para ensaios clínicos, demonstrou que quanto mais tempo a intervenção manteve o adolescente abstinente e/ou motivado a mudar suas atitudes em relação às drogas, mais eficaz ou efetiva ela comprovou ser (Koning, van den Eijnden, Verdurmen, Engels, & Vollebergh, 2013; Winters, Lee, Botzet, Fahnhorst, & Nicholson, 2014).
Vale salientar aspectos que pontuaram a favor dos estudos selecionados. O primeiro foi a utilização de intervenções breves, propostas por todos os estudos, que já têm sua superioridade comprovada em relação a tratamentos usuais mais longos para essa clientela (Winters, Leitten, Wagner, & Tevyaw, 2007). Um segundo aspecto são os instrumentos e medidas de avaliação utilizadas para medir os resultados. Aqueles utilizados nos estudos selecionados, em sua maioria, são instrumentos reconhecidos internacionalmente por sua fidedignidade, como é o caso do BDI (Beck, Ward, Mendelson, Mock, & Erbaugh, 1961), CBCL (Achenbach & Rescorla, 2001), SOCRATES (Miller & Tonigan, 1996), TLFB (Sobell & Sobell, 1996) e YSR (Achenbach & Rescorla, 2001).
Um terceiro aspecto importante foi a utilização de protocolos de intervenção descritos em manuais. A maioria dos estudos relatou a preferência por esse modelo de intervenção, destacando-se o estudo de Liddle e colaboradores (2008), que utilizou também no grupo controle uma intervenção eficaz e manualizada baseada na Terapia Cognitivo-Comportamental.
E, por último, contemplando os objetivos dessa revisão sistemática, está a condição de tratamento do adolescente usuário de drogas com abordagem familiar. Viu-se por meio da busca que há um investimento em estudos que contemplem a intervenção com os pais no tratamento do adolescente, deixando-se em destaque os benefícios que esta participação propicia. Os resultados dos estudos citados corroboraram com uma questão que vem sendo relatada na literatura sobre o tema, demonstrando que com a participação dos pais conquistam-se resultados efetivos na terapia dos filhos (Liddle, 2004). Visto que os adolescentes têm uma tendência a impulsividade, pouca capacidade de inibição e julgamento que prejudicam seu envolvimento com o tratamento (Winters, 2008), os resultados dos estudos apresentados parecem indicar que a participação de pais/responsáveis no tratamento do adolescente usuário de drogas pode contribuir para a adesão e engajamento do adolescente no tratamento (Liddle, 2004).
Consideracões Finais
Esta revisão sistemática proporcionou a construção de um panorama de tratamentos ao investigar a eficácia de protocolos de tratamento de base familiar para adolescentes usuários de drogas. Observou-se que as intervenções que permitiam a participação ativa dos pais ou responsáveis se mostraram mais eficazes na maioria das variáveis selecionadas. A presença dos pais/ responsáveis no tratamento contribuiu na redução da frequência e na gravidade do uso da substância psicoativa, no tempo de abstinência, no engajamento do adolescente no tratamento e na melhora do funcionamento familiar.
Os protocolos testados empiricamente comprovaram a maior eficácia das intervenções com participação ativa dos pais. Reitera-se que se seguiu o rigor metodológico dos instrumentos e protocolos de pesquisa com a intenção de agregar argumentos para as discussões de ensaios clínicos rando-mizados, principalmente, para sumarizar estudos com intervenções de qualidade excelente na realidade latino-americana e brasileira.
Os achados do presente estudo apontam para a importância da inclusão dos pais/responsáveis no tratamento do adolescente envolvido com drogas. Além de subsidiar reflexões em torno da práxis profissional de cuidado a essa clientela e estimular novas pesquisas. Salienta-se, também, que a inserção dos pais/responsáveis no tratamento do abuso e dependência química constitui uma dificuldade e um desafio para a equipe interdisciplinar de saúde.