INTRODUÇÃO
O período gravídico é um processo que impacta nos domínios afetivo, cognitivo e comportamental da gestante e de todos os envolvidos nesse período. Durante este processo expectativas e idealizações de um parto no tempo fisiologicamente esperado são criadas1,2.
Porém, intercorrências gestacionais podem ser desencadeadas por diversas variáveis, impactando no transcurso gestacional, e a gestante pode acabar vivenciando um trabalho de parto pré-termo ou trabalho de parto prematuro (TPP), rompendo com as suas expectativas, causando impactos psicológicos para com ela e seus familiares, onde são manifestados sentimentos como frustação, culpa, desconforto, agitação, confusão, instabilidade e medo pela possibilidade de desfechos negativos para o concepto2.
A gestação de risco é conceituada como complicações que ocorrem durante o período gestacional com progresso desfavorável tanto para a gestante quanto para o feto, no qual a vida e/ou a saúde dos mesmos pode ser comprometida2. Diante da classificação de alto risco, a sensação é descrita como um prenúncio de perigo real ou imaginário, em que a gestante não encontra meios internos para enfrentar a situação vivida3.
O trabalho de parto prematuro é um dos principais fatores que levam uma gestação a ser considerada como de alto risco, sendo responsável por 75% dos nascimentos prematuros, antes da 37ª semana gestacional4.
O impacto do TPP faz com que este momento, geralmente tão esperado e especial, passe a ser uma situação traumática5. Um estudo realizado em uma maternidade pública, na cidade de Aracaju, Sergipe, relata o medo, susto, insegurança, desespero e culpa como os principais sentimentos e emoções das mães ao rememorarem os momentos que se sucederam ao parto2.
Frente ao susto da prematuridade, pesquisas revelam que os pais, sentem-se impotentes frente à essa situação6. Uma pesquisa realizada com homens que estiveram presentes durante o TPP relata a inexistência de informações ao pai/companheiro e mostra que os mesmos querem ajudar as mulheres, mas não sabem o que fazer ou como lidar neste momento1.
Diante das intercorrências gestacionais que desencadeiam um trabalho de parto pré-termo, a família experiência momentos de instabilidade, imprimidos pelos sentimentos de ansiedade e medo diante das deficiências dos serviços prestadores de saúde, como, por exemplo, diante da dificuldade de encontrar leitos disponíveis na Unidade de terapia intensiva neonatal caso o recém-nascido tenha necessidade de ser internado, demonstrando a fragilidade dos sistemas de saúde frente ao atendimento de urgências e emergências obstétricas e neonatais, o que traz a necessidade da parturiente e seu acompanhante precisar se dirigir de um serviço de saúde a outro em busca de atendimento7.
A literatura nacional é expressiva com relação às vivências das famílias durante o enfrentamento do recém-nascido na UTIN. Entretanto, é incipiente a produção do conhecimento sobre as vivencias da família durante o trabalho de parto pré-termo. Diante disso, interroga-se: como é a vivência da família durante o trabalho de parto pré-termo?
Por isso, esta pesquisa objetivou compreender os significados da vivência da família durante o trabalho de parto pré-termo.
MATERIAIS E MÉTODOS
Pesquisa do tipo qualitativa, descritiva e exploratória, desenvolvida em duas instituições de saúde públicas de Feira de Santana na Bahia, no período de março a julho de 2015.
Participaram deste estudo 23 familiares de mulheres que tiveram TPP, como mãe, marido, irmãos e amigos. Estes familiares foram abordados nas unidades de alojamento conjunto, 24 horas após a ocorrência do parto e receberam informações sobre o objetivo, riscos, benefícios e estratégias para a obtenção de dados.
Adotaram-se os seguintes critérios de inclusão: ter acompanhado a gestação desde o início; ter estado no hospital durante o TPP; ter condições psicológicas para participar das entrevistas. Não foram adotados critérios de exclusão.
A coleta de dados ocorreu por intermédio de um roteiro de entrevista no qual os participantes foram estimulados a responder à seguinte questão norteadora: “Como foi para você saber que (FALAR O NOME DA PUÉRPERA) iniciou o trabalho de parto antes da hora?”. As entrevistas tiveram duração de 30 a 45 minutos e foram realizadas no conforto da equipe de enfermagem das unidades de alojamento conjunto dos hospitais em estudo por quatro coletadoras devidamente treinadas quanto à obtenção de dados qualitativos por intermédio de entrevistas. Para a finalização da coleta de dados foi utilizada a saturação teórica dos dados, quando nenhum elemento novo foi observado pelas entrevistadoras.
A fim de evitar a perda de dados e possibilitar um melhor diálogo com o familiar, as respostas foram gravadas com auxílio de um gravador e posteriormente transcritas na íntegra destacando-se as expressões emitidas pelos entrevistados.
Os dados foram analisados de acordo com o método de análise temática, que é uma das etapas da Análise de Conteúdo de Bardin8. Através desta, o pesquisador executa o agrupamento dos dados por temas e examina os casos no estudo para certificar-se de que todos os achados de cada tema foram incluídos e comparados8.
Este estudo atende à Resolução nº 466/2012, de 12 de dezembro de 2012, que assegura os princípios éticos que envolvem as pesquisas com seres humanos. Os participantes foram incluídos na pesquisa posteriormente a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e o sigilo destes foram garantidos por meio da substituição dos nomes por códigos (F01 até F23), sendo que “F” refere-se ao nome do familiar e o número a ordem das entrevistas conseguidas.
Esta pesquisa está vinculada à pesquisa multicêntrica “Parto prematuro: estudo dos fatores associados para construção de estratégias de prevenção” e foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande (UFRG) através do Parecer de número 134/2013 e da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), através do Parecer de número 643.668.
Para a elaboração deste artigo foram selecionadas as falas mais representativas de casa uma das subcategorias apresentadas.
RESULTADOS
A interpretação das entrevistas possibilitou analisar as vivências de familiares no decorrer do trabalho de parto pré-termo, identificar as emoções emergidas e os percalços vividos. Diante disso, emergiram quatro categorias: Vivenciando momentos do TPP inicialmente inesperados; Sofrimento durante o trabalho de parto prematuro intra-hospitalar; Demonstração de Fé; Alívio após o parto.
Categoria 1. Vivenciando momentos do TPP inicialmente inesperados
Na análise da primeira categoria, apresentam-se os resultados em seis subcategorias, permitindo a compreensão do fenômeno. As subcategorias identificadas foram: Desconhecimento dos sinais e sintomas do TPP; Buscando a atenção hospitalar diante dos sinais e sintomas apresentados pela gestante; Peregrinando durante a busca por atenção hospitalar; Sendo um evento inesperado para a família; Sentindo-se nervosos e assustados diante do TPP; Sentindo-se tristes e tensos diante do TPP.
Subcategoria 1.1. Desconhecimento dos sinais e sintomas do TPP
A experiência da família durante o TPP iniciou-se quando a gestante de maneira repentina apresentou sinais e sintomas que foram entendidos como intercorrências relacionadas ao período gestacional. Dentre estes, foram destacados a dor, entendida como cólica, a amniorrexe, seguida por perda de líquido amniótico, dentro outros, que não foram associados pelo familiar como sinais de início do TPP, mas como alguma intercorrência gestacional.
[...] no momento do parto foi complicado, porque minha esposa sentiu umas fortes dores em casa, então ela foi ao hospital pra ver só o que tinha acontecido e no momento nós estávamos pensando que era uma cólica normal, mas no caso já era pra ter a criança, então rápido pegamos as coisas dela e trouxemos ela, no meio do caminho ela já entrou em trabalho de parto, já chegou aqui praticamente quase nascida já [...]. (F20)
[...] quando o meu genro me ligou ele não falou que a bolsa tinha rompido, ele falou comigo que tinha saído uma coisinha branca, uma coisinha pouca. Eu falei aguarda um pouquinho e qualquer coisa a leva no médico. [...] nesse momento ela começou a sentir dor [...] (F23)
Desta forma, as falas anteriormente citadas demonstram conhecimento escasso relacionado aos sinais do TPP pelos familiares entrevistados.
Subcategoria 1.2. Buscando a atenção hospitalar diante dos sinais e sintoma apresentados pela gestante
Com os sinais e sintomas apresentados pela gestante, a família se mobilizou rapidamente no que se refere à reorganização de sua rotina diária para junto com a parturiente buscar atenção hospitalar por conta própria.
[...] teve que sair de casa correndo para achar uma pessoa para levar ela de carro para o hospital [...]. (F1)
[...] ela sentiu dor, aí a gente arrumou uma pessoa para trazer ela ao hospital, eu fiquei agoniada pensando que podia ser outra coisa, porque você não vai imaginar uma criança nascer de 5 meses não é? [...]. (F6)
Esta mobilização familiar foi decorrente da tentativa de minimizar os sinais e sintomas apresentados pela gestante. Parece que parte das gestantes não foi referenciada para a atenção hospitalar durante o período de pré-natal, demonstrando uma deficiência da rede de atenção à saúde.
Subcategoria 1.3. Peregrinando durante a busca por atenção hospitalar
Ao decidir procurar atenção hospitalar por conta própria a família iniciou um movimento de peregrinação em busca de avaliação da gestante por trabalhadores da saúde atuante nestas unidades. Este processo foi decorrente da ausência de sistemas de referência e contra referência, da falta de vagas hospitalares e da carência dos hospitais, levando os familiares a sentirem-se preocupados, com a situação vivenciada pela gestante, sendo esta experiência inicial traduzida por angustia e medo.
[...] porque primeiro foi no hospital (relata o nome), não atendeu. Disse que não tinha o preparo adequado. Que como era prematuro poderia precisar do balão de oxigênio, como realmente precisou de balão de oxigênio né? Então, levou também no (relata o nome de outro hospital), e disse que não tinha vaga. Então a única alternativa foi trazer pra aqui. E aqui graças a Deus atendeu. Foi onde as portas se abriram para ela, entendeu?[...]. (F10)
[...] fiquei muito preocupada. A preocupação veio através do parto porque quando ela veio e disseram que não tinha leito. O médico disse que não tinha leito. Ele falou que ela iria parir e o filho ficar do lado. [...]. (F23)
Subcategoria 1.4. Sendo um evento inesperado para família
Ao conseguir vaga em uma unidade hospitalar e após avaliação de um profissional médico obstetra a família recebeu o diagnóstico do TPP. Assim, este evento apareceu na experiência da família como algo inesperado para o familiar, que acreditava no nascimento a termo. Assim, neste momento da experiência, a idealização do parto dentro do tempo fisiológico foi desfeita.
[...] a família não teve tempo de se organizar, foi uma surpresa, foi tudo rápido, a gente não estava preparado para ser naquele dia, aí ela já ficou aqui internada [...]. (F20)
Este momento da experiência familiar foi marcado por choque, frustração, desespero e medo das consequências que podem ser desencadeadas pela prematuridade, sentimentos decorrentes, em sua maioria, de conhecimentos insuficientes de que o parto poderia ocorrer de forma prematura, o que mobilizou os familiares a manter a crença de que o recém-nascido prematuro não teria condições de sobrevivência.
[...] quando eu soube que ela entrou em trabalho de parto antes da hora, eu fiquei muito desesperada [...] à pessoa fica assustada, porque a gente só imagina coisas que não deve imaginar, porque uma criança nascer de 5 messes não é brincadeira não! [...] Quando eu soube que ia nascer realmente de 5 meses eu fiquei muito assustada, imaginando besteira, na hora a pessoa não acredita, só quando ver mesmo é que vai acreditar, eu mesmo não estava acreditando que ia nascer [...]. (F6)
Subcategoria 1.5. Sentindo-se nervosos e assustados diante do TPP
As famílias pareceram não dispor de recursos internos para enfrentar a situação de TPP e acabaram sem saber como agir no momento, devido à falta de informação e preparação para essa possibilidade, associado com a preocupação da ocorrência de repercussões negativas para a mulher ou para o recém-nascido, o que os deixou nervosos e assustados.
[...] quando eu soube que ia nascer antes da hora eu fiquei nervosa, sem saber o que fazer porque ninguém esperava que fosse nascer antes não [...]. (F4)
[...] um parto de risco [...] e também pra neném, então a preocupação é grande [...]. (F15)
[...] quando ela começou o trabalho de parto antes da hora eu me senti assustado [...] eu fiquei meio assustado, pode ter as consequências, né? (F21)
Subcategoria 1.6. Sentindo-se tristes e tensos diante do TPP
Diante da ausência de recursos internos para enfrentar o processo de hospitalização para o parto prematuro e por não ter vivenciado anteriormente esta experiência no núcleo familiar, a família perde suas forças inicialmente, sentindo-se impotentes para ajudar à parturiente e retomar o controle da situação.
Este momento foi marcado por intensa pressão emocional e também pelas próprias crenças familiares, consideradas como restritivas e capazes de afetar a estrutura comportamental da família o que gerou mais sofrimento para os familiares ao acompanharem o TPP intra-hospitalar sendo esta experiência marcada por intensa tensão e tristeza pela quebra de todas as suas expectativas de uma gestação a termo e frente à preocupação das possíveis consequências que evento poderia acarretar para a parturiente/puérpera ou para o feto/recém-nascido.
Ao entrar no hospital à médica falou que minha esposa teria que ficar internada, e eu não sabia que ela iria precisar ficar, pensei então que ela ia perde o bebê e fiquei triste. [...]. (F1)
[...] assim, eu não sei nem te dizer meu filho, porque, quando uma mãe engravida a gente arruma tudo né? Faz o enxoval todo completo e espera de nove mês [...]. (F10) [...] Então eu esperava que fosse de nove, então eu fiquei assim chocada, traumatizada. [...]. (F10)
Categoria 2: Sofrimento durante o trabalho de parto prematuro intra-hospitalar
Na análise da segunda categoria, os resultados são apresentados em quatro subcategorias, que foram denominadas da seguinte maneira: Medo de complicações com a parturiente; Medo de complicações com o recém-nascido; Medo da morte da parturiente e Medo da morte do recém-nascido.
Subcategoria 2.1. Medo de complicações com a parturiente
Os familiares relataram ter vivenciado medo de complicações para a gestante durante o TPP, o que fora acentuado por complicações ocorridas durante o processo gestacional que os fez pensar em uma gestação de alto risco.
[...] quando eu recebi a notícia o sentimento foi de medo, porque o parto dela já estava complicado, desde o terceiro que ela já tinha apresentado 09 convulsões na hora do parto, e o médico disse que era de risco se ela fosse ter de novo, aí a gente ficou com medo de ela ter convulsão [...]. (F4)
[...] quando eu soube que minha sobrinha ia parir antes da hora, ah eu fiquei preocupada, com medo. Sei lá, com medo de acontecer alguma coisa com ela [...]. (F19)
Subcategoria 2.2. Medo de complicações com o recém-nascido
Os familiares demostraram preocupação com o feto/recém-nascido frente a sua imaturidade orgânica, associando esta condição à possibilidade de complicações, o que gerou incertezas na experiência do familiar, acarretando em medo de morte ou complicações fetais/neonatais.
[...] eu fiquei nervosa, preocupada porque se ia nasce antes da hora à criança podia ter complicação, eu fiquei muito nervosa, porque tem criança que quando nasce antes do tempo, os órgãos ainda não estão completamente formados, pode ter problema de saúde como realmente ela teve problema respiratório, o pulmão dela não estava completamente formando [...]. (F4)
Subcategoria 2.3. Medo da morte da parturiente
A família associou o TPP à possibilidade de morte da gestante, o que intensificou a vivência do medo, susto, preocupação e insegurança, pois, para a mesma, este não seria o momento esperado e planejado para hora do parto, pois a parturiente não estava pronta para a ocorrência da experiência do parto.
[...] sentir também medo de perde minha esposa e agonia. [...]. (F1)
[...] como a médica mesmo falou podia nem a criança nem a minha filha sobreviver, aí eu fiquei assustada, porque disse que minha filha não tinha condições de parir e ela acabou parindo [...]. (F6)
Subcategoria 2.4. Medo da morte do recém-nascido
O familiar sentiu medo diante do TPP por associa-lo a possibilidade de óbito do feto/ recém-nascido frente a sua imaturidade orgânica e decorrente da falta de informações pregressas à experiência sobre a sobrevida de bebês prematuros, associado a informações negativas acerca do TPP.
[...] quando soube que minha nora ia ter o bebê antes da hora... Fiquei preocupada, porque eu acho assim, uma criança de 5 mês nascendo, não ia ter possibilidade de viver, então eu fiquei muito preocupada [...]. (F17)
Eu tive minhas filhas e nunca tive isso de parto prematuro e sempre me falavam que era de risco, que os bebês não sobreviviam [...] uns disseram que era arriscado à menina morrer [...]. (F23)
Categoria 3: Demonstração de Fé
A fé foi o recurso mais utilizado pelos familiares das mulheres em TPP, o que forneceu tranquilidade e segurança frente à situação inesperada do TPP. O familiar acreditou que a sobrevivência da parturiente e seu recém-nascido prematuro dependiam da vontade de um Ser Superior e que nesta condição o desfecho da situação seria bem-sucedido.
[...] está na mão do senhor! Deus sabe o que vai fazer e vai dar tudo certo. Entreguei a Deus, aliviei como a gente pega um filho e entrega a Deus, foi o que fiz com ele. Entreguei o filho dela a Jesus. Entreguei a Deus e fiquei tranquila [...]. (F23)
Categoria 4: Alívio após o parto
Durante a espera de notícias do lado de fora do centro obstétrico, o familiar imaginou consequências ruins para o recém-nascido e para a parturiente durante ou após o parto.
Ao saber da ocorrência do nascimento em boas condições, a sensação vivenciada foi de alivio, como se aquela situação traumática estivesse chegado ao fim. O familiar relatou que na condição de morte do recém-nascido a situação seria muito pior.
Porém, ao saber que o prematuro estava vivo após o parto e que o mesmo teria condições de sobreviver, os familiares sentiram-se mais tranquilos e confiantes diante da situação.
[...] quando eu soube que nasceu eu fiquei bem, livrou mais o coração. Senti um alivio, porque na hora do parto a pessoa lá do lado de fora fica imaginando besteira [...]. (F6)
[...] mas depois do parto, a gente chega aqui no hospital e já vê que fica tudo beleza [...] fiquei bastante aliviado, porque eu vi que ele tá bem. (F13)
DISCUSSÃO
Este estudo encontrou como limitação a ausência de publicações relacionadas à vivência dos familiares durante o TPP, evidenciando que a temática em questão possui um potencial de investigação a ser explorado. Por isso, foram utilizados para a discussão deste artigo dados de estudos que abordavam outras temáticas como gestação de alto risco, com enfoque para as síndromes hipertensivas especificas da gestação, vivências da prematuridade, direitos a acompanhante durante o trabalho de parto e parto, experiência de mulheres durante o trabalho de parto e parto, dentre outros, mas que abordavam alguns aspectos de como ocorre à experiência durante o TPP.
A vivência familiar iniciou-se com a ocorrência de alguns sinais e sintomas manifestados pela parturiente, a exemplo de dor e rompimento da bolsa das águas, entendido pelos familiares não como o inicio do trabalho de parto, mas como sinal de alguma intercorrência gestacional.
Esta escassez de conhecimento sobre os sinais e sintomas indicativos do TPP pode ter sido decorrente da falta de orientações dirigidas aos familiares e as gestantes na atenção básica, durante as consultas de pré-natal e da ausência de uma avaliação eficiente de risco obstétrico durante o curso gestacional pelos profissionais de saúde presente nesse setor.
É fundamental que as gestantes sejam orientadas a cerca dos sinais e sintomas mais comuns do trabalho de parto prematuro, sendo estes: “aparecimento de contrações uterinas regulares, mesmo que indolores, sensação de peso no baixo-ventre, dor lombar persistente e alteração no fluxo vaginal” 9.
Parece não haver um monitoramento e vigilância dos sinais e sintomas característicos do TPP por esses profissionais e o empoderamento familiar para colaborar com este processo, sendo a atenção pré-natal centralizada apenas nas demandas da gestante, parece assim que a família não fora considerada como uma unidade de cuidado da gestante.
Os achados nessa pesquisa corroboram com os resultados de um estudo qualitativo realizado em uma maternidade que afirma a importância da rede básica de saúde para prevenir a ocorrência de nascimentos pré-termos e a necessidade do repasse de informações e orientações às gestantes e seus acompanhantes, o que poderia facilitar no reconhecimento dos sinais e sintomas de um trabalho de parto pré-termo6.
Na presença das manifestações obstétricas os familiares se articulam para ajudar a parturiente na procura por atendimento hospitalar para solucionar os sinais e sintomas vividos pela mulher, iniciando assim, um movimento de peregrinação por atendimento obstétrico.
A desarticulação do sistema de referência e contra referência entre a atenção primária e hospitalar, bem como a inadequada estrutura hospitalar, no que se refere à indisponibilidade de leitos obstétricos e de unidades de atenção ao recém-nascido com necessidade de hospitalização, emergiu como causa da peregrinação da gestante e de sua família por diversas unidades hospitalares, causando preocupação, medo, e incertezas diante da situação, até então não traduzida pela família como um TPP. Esta situação poderia ter acarretado eventos adversos tanto para a gestante quanto para o concepto, com possibilidade de desfechos negativos para o momento.
Diante da falta de informação no pré-natal, a primeira opção da maioria das mulheres no momento em que percebem qualquer sinal indicativo de um TPP, costuma ser a procura por amigos e familiares, antes dos serviços de saúde. Os profissionais de saúde devem estar atentos a isto e, assim orientar as mulheres a procurarem assistência imediata6.
Depois de ter conseguido disponibilidade de leito obstétrico para a internação da parturiente e de ter sido identificado que estava ocorrendo um trabalho de parto pré-termo, o familiar vivencia a quebra da sua idealização de um parto a termo, conforme estava esperando, o que lhe causa uma perturbação cognitiva, desencadeando sentimentos de medo do desconhecido, susto, culpa, angústia, frustação, impotência, insegurança e sofrimento psíquico.
Tais sentimentos podem ser causados pela quebra de expectativas de uma gestação a termo, que rompe com o planejamento familiar e traz aos mesmos uma sensação de perda5,10. Diante do diagnóstico médico de trabalho de parto pré-termo, a família vivencia uma outra etapa de acompanhamento do TPP, quando ao se encontrar em uma instituição hospitalar lida com a sensação de vulnerabilidade.
A vulnerabilidade familiar durante a vivência de enfermidade e internação hospitalar de um filho desencadeia um sentimento de risco a sua autonomia, em decorrência do grande número de necessidades que surgem nesses acontecimentos, o que dificulta a sua atuação diante dessas situações, acarretando em sentimentos de dúvida, limitação e medo do que pode acontecer. Como resultado a família vivencia um momento de dualidade onde por vezes não consegui agir e em outros momentos tenta resgatar sua autonomia11.
Parece que nas unidades estudadas predominam o modelo de cuidado baseado na doença e na invisibilidade da família no contexto hospitalar, como constante na vida da gestante em TPP. Sendo assim, as forças da família não são identificadas pelos trabalhadores da saúde como estratégias fortalecedoras das experiências familiares, o que implica ainda mais na ausência de sua participação quanto à tomada de decisões relacionada à situação da gestante e o seu sentimento de vulnerabilidade.
Ter um acompanhante durante o transcurso do trabalho de parto é compreendido como um indicador de segurança e qualidade da assistência e de garantia dos direitos das parturientes nesse momento. As gestantes que foram acompanhadas por um familiar ou por uma pessoa da sua confiança sentem que tiveram seus direitos respeitados pelos trabalhadores da saúde e relataram menor violência durante a hospitalização12.
Em decorrência da falta de informações de como esta sendo o trabalho de parto, ou como está à saúde da parturiente e/ou do concepto, os familiares começam a pensar que coisas ruins possam estar ocorrendo, e ressalta-se o medo de complicações obstétricas ou neonatais ou até mesmo da possibilidade de óbito, onde emergem emoções como susto, nervosismo, tensão, tristeza e desespero.
Diante de tanta pressão emocional, a crença em um Ser Supremo é um dos principais meios de suporte utilizado pelos familiares, que lhes traz conforto e esperança de que essa situação terá um desfecho positivo, sem complicações para a mulher ou para a criança.
A religiosidade, independente do tipo de crença do individuo, é muito significante na vivência dos familiares que estão com algum parente internado em uma unidade hospitalar. A fé em um Ser Supremo traz sentimentos de conforto, alivio força, esperança e segurança diante deste momento difícil onde as pessoas tornam-se vulneráveis13.
Quando o familiar não consegue permanecer no centro obstétrico para acompanhar a parturiente durante o trabalho de parto, a espera do lado de fora é considerada um momento dramático, onde os mesmos relatam não receber noticiais do que esta acontecendo e suporte dos profissionais de saúde, que muitas vezes demostram despreparo e hostilidade no modo em que os tratam.
A Lei nº 11.108, promulgada em 7 de abril de 2005, opõem-se a esse tipo de atitude dos profissionais de saúde, e garantem o direito a parturiente em possuir um acompanhante de sua preferência na atenção pré-natal e em todas as fases de trabalho de parto, parto e pós-parto14.
O familiar como acompanhante da mulher em TPP pode ser uma estratégia fortalecedora da experiência, pois este membro do núcleo familiar poderá apoiar à parturiente e ser copartícipe do cuidado oferecido no ambiente hospitalar.
Após vivenciar um período de turbulência emocional, a família inicia um novo movimento na experiência do TPP. Esta nova etapa é iniciada com a noticia de que a parturiente estar saudável e o recém-nascido, mesmo as vezes precisando ficar internado na Unidade de Terapia Intensiva, estava vivo, dando lugar a sensação de alivio do momento vivenciado.
O nascer de uma criança é tão imprevisível, que o momento do parto é marcado por uma fusão de sentimentos e emoções como alivio, bem-estar e euforia, marcando o fim da dor e do medo vividos nesse momento15.
CONCLUSÕES
Diante do exposto nesse estudo, torna-se evidente uma incipiência de informações das redes de saúde para com os familiares, demonstrando o quanto é importante uma assistência qualificada e sensível, devendo os familiares serem entendido como clientes chaves, já que são estes a primeira unidade básica de atenção aos seus membros em momentos de enfermidade.
Cabe assim, aos profissionais das unidades básicas, responsáveis pelo acompanhamento do pré-natal das gestantes, prestarem atenção qualificada aos familiares visando-os como clientes potenciais. É necessário também reforçar a articulação entre a atenção primária e a terciaria no município e garantir leitos obstétricos suficientes para demandas espontâneas bem como estruturas físicas que garantam a prestação da assistência.
Entender os significados da vivência de um trabalho de parto pré-termo para a família, bem como compreender as emoções emergidas nessa experiência, suas redes de apoio e suporte, suas necessidades e potencialidades, é necessário para que os profissionais de saúde identifiquem possíveis alterações afetivas, cognitivas e comportamentais e possam intervir.
Tornou-se notório a necessidade de mais publicações sobre esta temática, para que o papel da família como principal meio de suporte e apoio, juntamente com a fé, para as gestantes/parturientes, seja ressaltado no enfrentamento do trabalho de parto pré-termo.