INTRODUÇÃO
A Parada Cardiopulmonar (PCR) é uma condição de saúde crítica, caracterizada pela ausência de pulso central palpável, perda de consciência do paciente e apneia ou gasping1 . Para tentar restabelecer a circulação espontânea do paciente, devem ser realizadas manobras de ressuscitação cardiopulmonar (RCP), as quais fazem parte de conjunto de procedimentos que visam manter artificialmente a perfusão arterial de órgãos vitais2 .
Segundo o Centers for Disease Control (CDC), no ano de 2014, ocorreram mais de 350 mil mortes nos Estados Unidos decorrentes de PCR3 . A Sociedade Brasileira de Cardiologia, estima a ocorrência de 200 mil casos de PCR por ano no Brasil. A causa mais comum é a doença isquêmica coronariana e outras doenças como ruptura aórtica, hemorragia subaracnóidea, tamponamento cardíaco e embolia pulmonar maciça4 .
As taxas de sobrevivência e resultados de pacientes após PCR estão diretamente ligados à rapidez com que a RCP é iniciada e a qualidade de sua realização5 . A rápida intervenção na PCR de forma segura, eficaz e de alta qualidade pode dobrar ou triplicar a sobrevida6 . Cada minuto reduz a chance de sobrevivência da vítima em cerca de 7% a 10%7 .
No atendimento as vítimas de PCR, o enfermeiro é participante ativo da equipe multiprofissional. Para que a participação da enfermagem ocorra, é necessário que o profissional possua autoconfiança, conhecimento e habilidade para agir. O conhecimento e habilidade se fazem necessários para que seja possível agregar o “saber” e o “saber fazer” das etapas que integram à assistência à vítima de PCR8 .
O desenvolvimento da autoconfiança é componente chave na tomada de decisões corretas em contextos emergenciais. É vista como indicador da proatividade dos enfermeiros em que, diante de situações de emergência, deve sentir-se autoconfiante para atuar de forma adequada. A baixa autoconfiança pode levar a atrasos no socorro, maiores níveis de ansiedade e maior probabilidade de erros, principalmente relacionados à velocidade e profundidade das compressões9 .
O treinamento para realizar a ressuscitação de alta qualidade, desde a graduação, assegura a melhoria nas taxas de sobrevivência de vítimas de PCR, além de favorecer o desenvolvimento de habilidades cognitivas, comportamentais e psicomotoras necessárias para realizar com sucesso a ressuscitação cardiopulmonar8 .
Nessa perspectiva, o processo de qualificação profissional da enfermagem se inicia desde a formação: nos últimos semestres do curso, o discente encerra suas atividades teóricas e passa a vivenciar a prática clínica no internato. A vivência do internato busca tornar o acadêmico preparado para enfrentar a realidade complexa e dinâmica, o que possibilita a ressignificação dos conhecimentos adquiridos ao longo do curso e fomenta o desenvolvimento da capacidade crítica-reflexiva de identificar problemas, analisar os fatores que compõem a situação vivenciada e propor soluções10 .
Diante o exposto, surgiu o questionamento: Como se encontra a autoconfiança para agir em situações de emergência, o conhecimento e a habilidade acerca da RCP de internos de enfermagem? Existe diferença na autoconfiança, conhecimento e habilidade para RCP, de internos de enfermagem que se encontram nos distintos semestres do internato?
Delinear o preparo técnico-científico e a autoconfiança de internos de enfermagem frente à PCR e o Suporte Básico de Vida (SBV) se fazem necessário, para sumarizar os conhecimentos e habilidades dos futuros enfermeiros, os quais poderão, em sua vida profissional, se deparar com situação de PCR, na qual deverá saber agir de forma rápida, segura e eficiente.
Ademais, tal investigação científica pode favorecer o planejamento de intervenções que objetivem aperfeiçoar o processo de formação em enfermagem a fim de subsidiar a formação de profissionais mais autoconfiantes e com mais conhecimento e habilidade.
A pesquisa foi realizada com o objetivo de avaliar autoconfiança para intervenção em emergência, conhecimento e habilidade acerca da ressuscitação cardiopulmonar de internos de enfermagem.
MATERIAIS E MÉTODOS
Estudo descritivo com abordagem quantitativa realizado no período abril a julho de 2018 em Instituição de Ensino Superior (IES) de caráter público da Região Nordeste do Brasil. A referida IES oferece o curso de enfermagem em regime integral, organizado de forma modular, em 10 semestres, com regime conclusivo em cinco anos e carga horária de 5060 horas.
A população-alvo foram os internos de enfermagem do 8º, 9º e 10º semestres do curso da referida instituição. Essa população foi escolhida por pressupor-se que a temática investigada tenha sido abordada de forma integral e recente, o que sinaliza que os internos possuem competências básicas para atuar em situação de emergência durante o internato, uma vez que já concluíram todo conteúdo teórico do curso e estão apenas em atividades de estágio supervisionado. Dos internos de enfermagem matriculados, 80 possuíram disponibilidade para participar e, assim, compuseram a amostra do estudo. Os internos foram divididos em grupos (7º, 8º e 9º semestre) e cada grupo foi comparado entre si.
Os critérios de inclusão adotados foram: idade igual ou superior a 18 anos; estar devidamente matriculado no referido curso; em regime de internato I, II ou III (que corresponde ao 8º, 9º e 10º semestres). Os critérios de exclusão foram ser bombeiro ou estudantes com curso técnico em enfermagem que atuavam em serviços de saúde, que acarretaria viés ao estudo, diante do preparo prévio; e se encontrar afastado das atividades acadêmicas devido à licença saúde ou maternidade. Após a aplicação dos critérios, foram excluídos dois internos de enfermagem por atuar em unidade de emergência coronariana.
Para coleta de dados ocorreu à aplicação de questionário com variáveis organizadas em três partes: a primeira com oito questões referentes ao perfil dos graduandos; a segunda com 24 questões objetivas, que contemplavam a identificação do agravo, o acionamento por ajuda e a realização da RCP para teste de conhecimento sobre a temática11 adaptado pelas pesquisadoras conforme a American Heart Association (AHA)12 .
A terceira parte composta pela escala de autoconfiança para intervenção em emergências, que possui 12 itens de respostas tipo likert de 5 pontos, onde 1 representa nada confiante; 2 pouco confiante; 3 confiante; 4 muito confiante e 5 extremamente confiante. As médias de autoconfiança foram calculadas por turma de internato, e foram consideradas autoconfiança baixa as médias de 1,0 a 2,99, autoconfiança moderada as de 3 a 3,99 e alta autoconfiança pontuada de 4,0 a 5,013 .
Após o preenchimento do questionário, os internos foram solicitados a realizar prática de PCR e conduzidos individualmente a uma sala em que duas monitoras estavam presentes e apresentaram caso clínico de paciente irresponsivo. A prática da habilidade de ressuscitação cardiopulmonar foi realizada em manequim adulto Little Anne®, que se trata de boneco com proporção anatômica e resistência torácica semelhante à humana e que possui função sonora de “click” que sinaliza a profundidade correta das compressões.
As práticas foram filmadas com Smarthphone Samsung Galaxy J5 e os rostos dos participantes não foram filmados. Cada interno foi identificado na filmagem com uma numeração. Os vídeos foram avaliados por uma doutora em enfermagem e dois especialistas em urgência e emergência, com expertise na temática, por meio de modelo padrão de avaliação da prática de ressuscitação cardiopulmonar sob a forma de checklist.
Os dados foram tabulados no Excel 2016 e analisados no programa estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 25. A análise estatística descritiva das variáveis categóricas foi apresentada em frequências absolutas e relativas e, para as variáveis contínuas, utilizou-se média e desvio-padrão. Utilizou-se o Teste de Kruskal-Wallis para comparação entre os grupos e o Qui-Quadrado de Pearson nas comparações das variáveis categóricas. O nível de significância adotado foi 5% com intervalo de confiança de 95%.
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Estadual Vale do Acaraú, sob parecer de n°2.529.077/2018, seguiu as recomendações da Resolução n.º 466/12, do Conselho Nacional de Saúde, e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
RESULTADOS
Os internos possuíam como principais características o predomínio do sexo feminino com 62 mulheres (77,5%) e média de idade de 22,7 anos (±2,8) no internato I (8º semestre), 25,7 anos (±6,9) no internato II (9º semestre) e 23,8 anos (±2,3) no internato III (10º semestre).
Em relação à autoconfiança para intervir em situação de emergência ( Tabela 1 ), os resultados demonstram que os internos de enfermagem do 10º semestre apresentaram maiores médias, seguidos pelo 9º semestre. Verificou-se que a dimensão que apresentou melhores médias de autoconfiança foi àquela relativa aos cuidados relacionados à respiração do cliente em situação de urgência e a dimensão menos pontuada foi a dos cuidados relacionados às emergências psiquiátricas. Nota-se que em apenas quatro itens, pelo menos uma turma se perfilhou confiante. Não houve registro de itens com autoconfiança alta.
VARIÁVEIS | Média (DP) | p-valor† | ||
---|---|---|---|---|
Internato I (8º semestre) | Internato II (9º semestre) | Internato III (10º semestre) | ||
Emergências cardíacas | ||||
1. Autoconfiança em reconhecer sinais e sintomas de evento cardíaco | 2,36 ±0,621 | 3,07 ±0,799 | 3,11 ±0,950 | 0,002 |
2. Autoconfiança em ser capaz de avaliar com precisão um indivíduo com dor torácica | 2,32 ±0,548 | 2,53 ±0,516 | 2,78 ±0,760 | 0,009 |
3. Autoconfiança em ser capaz de intervir apropriadamente num indivíduo com dor torácica | 2,14 ±0,651 | 2,53 ±0,640 | 2,67 ±0,926 | 0,022 |
4. Autoconfiança em ser capaz de avaliar a eficácia das suas intervenções num indivíduo com dor torácica | 2,18 ±0,548 | 2,47 ±0,516 | 2,56 ±0,735 | 0,067 |
Emergências respiratórias | ||||
5. Autoconfiança em reconhecer sinais e sintomas de evento respiratório | 2,50 ±0,509 | 3,13 ±0,743 | 3,06 ±0,955) | 0,007 |
6. Autoconfiança em ser capaz de avaliar com precisão um indivíduo com dispneia | 2,82 ±0,723 | 2,87 ±0,352 | 3,50 ±0,737) | 0,000 |
7. Autoconfiança em ser capaz de intervir apropriadamente num indivíduo com dispneia | 2,43 ±0,634 | 2,60 ±0,737 | 3,11 ±0,854) | 0,004 |
8. Autoconfiança em ser capaz de avaliar a eficácia das suas intervenções num indivíduo com dispneia | 2,36 ±0,621 | 2,73 ±0,594 | 2,97 ±0,609) | 0,001 |
Emergências psiquiátricas | ||||
9. Autoconfiança em reconhecer sinais e sintomas de evento neurológico | 2,18 ±0,476 | 2,53 ±0,640 | 2,61 ±0,688 | 0,020 |
10. Autoconfiança em ser capaz de avaliar com precisão um indivíduo com alteração do estado mental | 2,82 ±0,670 | 2,60 ±0,507 | 3,11 ±0,820 | 0,066 |
11. Autoconfiança em ser capaz de intervir apropriadamente num indivíduo com alteração do estado mental | 2,14 ±0,591 | 2,07 ±0,458 | 2,61 ±0,645 | 0,002 |
12. Autoconfiança em ser capaz de avaliar a eficácia das suas intervenções num indivíduo com alteração do estado mental | 2,14 ±0,591 | 2,07 ±0,458 | 2,72 ±0,701 | 0,000 |
Fonte: Próprio Autor
† Teste de Kruskal-Wallis para comparação entre os grupos.
Em relação ao conhecimento, observa-se, na Tabela 2 , que em quatro itens os grupos foram semelhantes em relação aos acertos e diferiram estatisticamente seis itens. Houve proporção de acertos maior que 70% em 12 itens, dentre eles, os com maiores acertos foram itens referentes à avaliação da responsividade da vítima, local para verificar pulso, posicionamento da vítima para compressões e principais fármacos utilizados na PCR. Já os itens nos quais os acertos se apresentaram mais baixos foram sobre o momento de iniciar as compressões e elos da corrente de sobrevida.
QUESTÕES | ACERTOS | p-valor† | ||
---|---|---|---|---|
Internato I | Internato II | Internato III | ||
N (%) | N (%) | N (%) | ||
1. Definição de PCR | 26 (92,9) | 14 (93,3) | 31 (83,8) | 0,427 |
2. Verificar a responsividade da vítima desacordada | 27 (96,4) | 14 (93,3) | 37 (100) | 0,341 |
3. Local para verificar pulsação da vítima | 28 (100) | 15 (100) | 36 (97,3) | 0,555 |
4. Quando iniciar as compressões | 12 (42,9) | 08 (53,3) | 11 (29,7) | 0,245 |
5. Elos da corrente de sobrevida | 09 (32,1) | 07 (46,7) | 09 (24,3) | 0,287 |
6. Como agir ao detectar irresponsividade da vítima | 23 (82,1) | 13 (86,7) | 36 (97,3) | 0,117 |
7. Cuidados na utilização do DEA | 23 (82,1) | 03 (20,0) | 11 (29,7) | 0,000 |
8. Posicionamento das mãos e braços durante RCP | 14 (50) | 09 (60,0) | 19 (51,4) | 0,807 |
9. Posição da vítima | 28 (100) | 14(93,3) | 36 (97,3) | 0,408 |
10. Número de compressões por minuto | 18 (64,3) | 14 (93,3) | 32 (86,5) | 0,031 |
11. Número de compressões e respirações de emergência | 25 (89,3) | 14 (93,3) | 25 (67,6) | 0,034 |
12. Compressão do tórax em centímetros | 16 (57,1) | 10 (66,7) | 25 (67,6) | 0,664 |
13. Momento de troca para que outra pessoa faça a compressão | 23 (82,1) | 12 (80,0) | 34 (91,9) | 0,390 |
14. Nível de força durante a compressão | 23 (82,1) | 10 (66,7) | 25 (67,6) | 0,365 |
15. Quando parar as compressões | 22 (78,6) | 10 (66,7) | 31 (83,8) | 0,393 |
16. Conceito de DEA | 27 (96,4) | 15 (100) | 33 (89,2) | 0,265 |
17. Sequência de utilização do DEA | 20 (71,4) | 09 (60) | 23 (62,2) | 0,669 |
18. Primeira preocupação ao atender uma vítima desacordada | 25 (89,3) | 15 (100) | 34 (91,9) | 0,438 |
19. Vias de administração de fármacos durante a PCR | 22 (78,6) | 15 (100) | 36 (97,3) | 0,012 |
20. Fármacos mais utilizados durante a PCR | 24 (85,7) | 15 (100) | 37 (100) | 0,020 |
21. Finalidade dos fármacos utilizados | 20 (71,4) | 13 (86,7) | 32 (86,5) | 0,256 |
22. Responsável por checar o carrinho de parada | 25 (89,3) | 13 (86,7) | 36 (97,3) | 0,304 |
23. Medidas para ventilar a vítima de PCR | 19 (67,9) | 14 (93,3) | 35 (94,6) | 0,007 |
24. Ritmos de PCR passíveis de choque | 17 (60,7) | 12 (80) | 21 (56,8) | 0,284 |
Fonte: Próprio Autor
† Qui-quadrado de Pearson
Na avaliação da habilidade, houve diferenças significativas estatisticamente em relação à prática dos internos de enfermagem em seis itens, dos 15 avaliados. Observa-se que duas questões apresentaram índice de acertos superiores a 70% em todas as turmas de internato, relacionadas à sobreposição das mãos para realizar a compressão e início das compressões após checar responsividade Table3.
VARIÁVEL | ACERTOS | p-valor† | ||
---|---|---|---|---|
Internato I | Internato II | Internato III | ||
N (%) | N (%) | N (%) | ||
1. Posiciona as mãos nos ombros da vítima e a movimenta | 16 (57,1) | 11 (73,3) | 31 (83,8) | 0,058 |
2. Emite som para chamar pela vítima | 19 (67,9) | 12 (80,0) | 31 (83,8) | 0,304 |
3. Chamou ajuda | 19 (67,9) | 06 (40,0) | 28 (75,7) | 0,047 |
4. Observa tórax e abdome da vítima em busca de movimentos respiratórios | 15 (53,6) | 09 (60,0) | 24 (64,9) | 0,655 |
5. Posicionou-se ao lado/próximo ao ombro da vítima | 18 (64,3) | 14 (93,3) | 34 (91,9) | 0,007 |
6. Sobrepôs suas mãos | 20 (71,4) | 14 (93,3) | 27 (73,0) | 0,224 |
7. Posicionou a região hipotenar da mão de baixo no centro do tórax da vítima | 17 (60,7) | 11 (73,3) | 24 (64,9) | 0,710 |
8. Posicionou seus ombros a 90° com o tórax da vítima | 18 (64,3) | 15 (100) | 28 (75,7) | 0,032 |
9. Iniciou as compressões torácicas | 22 (78,6) | 15 (100) | 33 (89,2) | 0,118 |
10. Manteve braços retos (sem flexionar cotovelos) durante compressões torácicas | 17 (60,7) | 15 (100) | 28 (75,7) | 0,018 |
11. Movimentou seu tronco para aplicação da força nas compressões | 15 (53,6) | 13 (86,7) | 27 (73,0) | 0,062 |
12. Realizou as compressões torácicas na profundidade mínima de cinco cm | 07 (25) | 09 (60) | 19 (51,4) | 0,039 |
13. Realizou as compressões torácicas na velocidade correta (100 a 120/min) | 08 (28,6) | 07 (46,7) | 11 (29,7) | 0,428 |
14. Permitiu retorno do tórax a posição anatômica de repouso entre as compressões | 18 (64,3) | 13 (86,7) | 20 (54,1) | 0,086 |
15. Não interrompeu as compressões | 14 (50,0) | 12 (80,0) | 21 (56,8) | 0,154 |
Fonte: Próprio Autor
† Qui-quadrado de Pearson.
DISCUSSÃO
Os resultados provenientes do desempenho dos estudantes nesta pesquisa apontam que houve déficits, tanto de autoeficácia, verificado pelos resultados da escala de autoconfiança para intervir em emergências, como teórico, testado pela avaliação do conhecimento, e motor, verificado pela avaliação da habilidade (prática), frente às manobras de ressuscitação cardiopulmonar.
No presente estudo, internos de enfermagem do 10º semestre apresentaram maiores médias de autoconfiança para intervir em situações de emergência. A dimensão de emergências respiratórias apresentou melhores médias de autoconfiança e a menos pontuada foi acerca de emergências psiquiátricas. Em quatro itens, houve registro de autoconfiança moderada, porém, não houve registro de itens com autoconfiança alta.
Tais resultados são semelhantes com estudo realizado em Portugal que identificou média de autoconfiança baixa dos acadêmicos para intervir em situações de emergências cardíacas, respiratórias e psiquiátricas9 .
A autoconfiança em situações de emergência é relevante, pois poderá repercutir em melhores resultados para os pacientes, além de desempenho eficaz do profissional que poderá ofertar assistência física ou psicológica com qualidade e agilidade ao se sentir capaz de reconhecer e interver diante de um agravo clínico, seja ele cardiológico, respiratório ou neurológico.
Em relação à avaliação do conhecimento teórico, as três turmas de internato responderam corretamente sobre a detecção de PCR, com percentual de acertos superior a 97%. Estudo realizado com acadêmicos do 10º semestre de enfermagem de universidade em Belo Horizonte identificou que 100% dos participantes sabiam detectar a PCR14 . Esse resultado se mostra favorável ao sucesso do atendimento, uma vez que somente com o reconhecimento correto e precoce da PCR, é possível instituir as demais etapas do atendimento e elevar a chance de sobrevivência da vítima.
Após o reconhecimento do agravo é necessário acionar ajuda e, posteriormente, iniciar as compressões torácicas. No presente estudo, menos da metade dos participantes dos internatos I e III responderam corretamente a questão sobre o momento adequado de iniciar as compressões torácicas. Estudo realizado na Arábia Saudita demonstrou que 49% dos acadêmicos estavam cientes de que as compressões torácicas devem ser iniciadas imediatamente ao pedir ajuda e logo após o choque15 .
Esse dado merece destaque, pois as compressões devem ser ofertadas no momento correto, no intuito de garantir a perfusão de tecidos vitais até o restabelecimento espontâneo da circulação, o que possibilita a prevenção de sequelas irreversíveis. Porém, é importante o acionamento por ajuda previamente a realização da RCP devido à necessidade de trabalho efetivo em equipe.
No que tange ao conhecimento dos discentes sobre a cadeia de sobrevida recomendada pelas diretrizes da AHA, observou-se que o número de acertos nas turmas de internatos foi inferior a 50%, o que diverge de pesquisa realizada em universidade pública da Bahia, em que 84,4% dos graduandos de enfermagem do 9º e 10º semestres responderam corretamente sobre a cadeia de sobrevida16 . Quando o enfermeiro/socorrista não possui conhecimento suficiente acerca da sequência correta de atendimento (cadeia de sobrevivência), o diagnóstico de PCR e as ações subsequentes podem ocorrer de maneira errônea, tardia ou em ordem errada.
Conforme as diretrizes da AHA, a sequência correta deve contemplar a identificação imediata da PCR e ativação de serviços de emergência/urgência/acionamento de ajuda e solicitação do DEA, realização das compressões torácicas, suporte avançado de vida e cuidados pós-PCR12 .
O internato II obteve maiores acertos referente ao conhecimento de posicionamento correto do socorrista durante as manobras de compressões torácicas. Estudo realizado na Índia identificou que 77,2% dos internos sabiam o posicionamento correto das mãos e braços durante a RCP17 . Isso reforça a necessidade de maior qualificação teórica e prática dos internos, pois a localização correta da região hipotenar da mão sobre o esterno, no centro do tórax da vítima é fundamental para RCP efetiva.
No tocante aos ritmos cardíacos, observou-se que 80% dos graduandos do internato II conheciam os que são chocáveis na PCR. Pesquisa realizada em universidade privada de Florianópolis verificou que 85,7% dos participantes identificaram corretamente os ritmos cardíacos chocáveis18 . Em casos de fibrilação ventricular ou taquicardia ventricular com ausência de pulso, o tempo de realização da desfibrilação eleva a sobrevivência, diante da efetividade para restabelecimento da circulação espontânea19 . A identificação do ritmo e o conhecimento acerca dos casos nos quais existe indicação de desfibrilação são importantes para aumento de sobrevida.
Quanto ao conhecimento acerca dos fármacos utilizados na parada, finalidade e vias de administração, observou-se elevado índice de acertos. Pesquisa realizada com enfermeiros de hospital público de alta complexidade em Pernambuco constatou que 77,7% tinham conhecimentos sobre fármacos utilizados na PCR e as vias de administração20 . A administração de medicamentos integra o suporte avançado de vida e é indicada diante da ação farmacológica de droga vasoativa ser associada a melhores desfechos12 . Portanto, o conhecimento dos acadêmicos de enfermagem é relevante, pois aponta para futuros profissionais que detém o conhecimento científico.
Em relação às habilidades dos internos de enfermagem, os resultados desta pesquisa apontam diferença significativa entre desempenho teórico e prático. Investigação realizada na Índia identificou que acadêmicos de enfermagem tiveram bom desempenho no teste teórico sobre RCP, porém, habilidades de ressuscitação encontraram-se deficientes17 .
Estudo na Etiópia identificou que maioria dos enfermeiros tinham habilidades deficientes em Suporte Básico de Vida21 . A esse respeito, ressalta-se a relevância do treinamento das habilidades em SBV dos graduandos de enfermagem para prestar assistência adequada e de qualidade, a fim de evitar sequelas e minimizar as taxas de mortalidade.
Na habilidade de comprimir o tórax na profundidade mínima de cinco centímetros, 25% dos internos do 8º semestre realizaram as compressões na profundidade mínima estabelecida, e 29,7% dos internos do 10º semestre realizaram as compressões torácicas na velocidade correta (100 a 120/min). Pesquisa com acadêmicos de enfermagem da Índia identificou que 16,2% tinham habilidade para efetivar a profundidade correta da compressão torácica22 .
Estudo realizado em hospital público da Bahia identificou déficit dos profissionais de enfermagem nas manobras de SBV, incluindo a profundidade correta da compressão torácica23 . Tais achados apontam para a necessidade de preparo dos internos, na busca de solidificar suas habilidades, com o propósito de qualificar o atendimento às vítimas, prover um melhor prognóstico e o aumento da chance de sobrevida com sequelas mínimas.
O atendimento adequado da PCR exige organização, autoconfiança e rápida ação dos envolvidos no atendimento. O enfermeiro deve possuir conhecimentos e habilidades para estabelecer imediatamente as medidas terapêuticas para manter a oxigenação dos órgãos vitais. O nível de conhecimento e habilidade de futuros enfermeiros sobre PCR é algo que precisa ser considerado e aprimorado por meio de políticas de educação continuada para garantir que a equipe de saúde tenha conhecimento atualizado e esteja preparada, na teoria e na prática, para evitar complicações e desfechos fatais em situações de emergência13 .
Diante deste panorama, se faz pertinente resgatar que houve baixa média geral de acertos pelas três turmas de internatos, o que ressalta a relevância da consolidação do conhecimento e habilidade acerca das manobras de ressuscitação cardiopulmonar, os quais se apresentam escassos conforme os dados do estudo, e avigoram a primordialidade do aperfeiçoamento dos internos de enfermagem (futuros enfermeiros), o que irá impactar consequentemente em maiores níveis de autoconfiança para intervir apropriadamente em situações de emergência.
Há necessidade de treinamentos periódicos e educação contínua para capacitar os futuros enfermeiros para atendimento rápido, seguro e eficaz, dentro do que é preconizado pelas diretrizes internacionais, além de repetir as habilidades em intervalos regulares, para garantir a sustentabilidade nas habilidades de ressuscitação cardiopulmonar24 .
Na realização desta pesquisa, apontamos como limitações a ausência de treinamento, com pré e pós-teste teórico e prático e a não contemplação de estudantes de instituições privadas de ensino. Sugere-se que novos estudos possam ser realizados, com comparação de resultados entre universidade pública e privada, aliado a programas e estratégias de ensino, para assim, elencar e comparar novos dados e evidências nesta temática.
CONCLUSÕES
Os achados do estudo permitem inferir que os internos se perfilharam com médias de autoconfiança majoritariamente baixas. Houve diferenças entre o conhecimento e habilidades dos acadêmicos, dos variados semestres do internato, com déficits no conhecimento e nas habilidades em ressuscitação cardiopulmonar.
Este estudo poderá contribuir com docentes de enfermagem, envolvidos na formação dos discentes, para que atentem à relevância da autoconfiança para intervir em situação de emergências, associada ao conhecimento e habilidade dos acadêmicos que vivenciam o internato.