Introdução
O solo é um bem natural essencial para a produção de alimentos, entretanto, os processos de degradação já atingem um terço dos solos agrícolas do mundo (FAO 2015), o que fragiliza a soberania alimentar das populações humanas atuais e futuras. A degradação é resultado de um modelo de agricultura baseado em um pacote tecnológico, que incentiva o uso de práticas agrícolas que buscam a maximização da produção e do lucro (Gliessman 2002) e desrespeita as especificidades edafoclimáticas e culturais.
A degradação do solo e de outros componentes do ambiente impõem uma crise ecológica sem precedentes à humanidade. A crise ecológica, pauta emergencial para sustentação da vida na biosfera, é também uma questão política, que essencialmente se desdobra em uma crise ética relacionada às maneiras pelas quais os sujeitos se relacionam com a natureza e entre si, isto é, as vinculações sociais que são inscritas nos ecossistemas de modo a transformá-los (Gonçalves 1984; Paulitsch e Wolkmer 2012).
Um novo paradigma da sustentabilidade, articulado a um novo paradigma tecnológico, faz-se necessário para a superação de tais crises. Isto exige mudanças e uma conscientização coletiva que apontem para a autodeterminação dos povos por meio de democracia autogerenciada em consonância à diversidade étnico--cultural e à biodiversidade (Leff 2002). Contribuindo na construção deste novo paradigma, a agroecologia é resistência e resiliência ao sistema de relações econômicas que se estrutura sob a égide do lucro em detrimento da vida das pessoas e dos seres do planeta, expressada pela agricultura capitalista (Holt-Giménez e Altieri 2013; Jardón Barbolla 2018), é entendida enquanto movimento social político, ciência inovadora e prática ética (ABA 2015). As práticas agroecológicas fomentam a diversificação e a produção ecológica de alimentos, recompondo economias e ecossistemas locais e viabilizando a emancipação dos agricultores familiares (Nyeleni 2015). A popularização destas técnicas de cultivo e manejo da terra pode contribuir para o desenvolvimento de uma agricultura sustentável que sobreponha os valores éticos acima da racionalidade econômica (Almeida 2005).
O uso de tais técnicas exige indicadores e instrumentos que permitam avaliar se as modificações promovidas nos agroecossistemas foram efetivas para a recuperação e/ou conservação dos bens naturais, dentre eles os solos. Os indicadores normalmente utilizados exigem métodos que geralmente são caros e demandam tempo e procedimentos que os tornam inacessíveis aos agricultores familiares, responsáveis pelo uso e manejo dos solos, sendo mais complexos em sistemas agroecológicos devido à sua dinâmica. Os cientistas têm sido os responsáveis pela avaliação da saúde do solo, mesmo não sendo eles e sim os agricultores os principais responsáveis pelo uso e manejo dos solos (Bünemann et al. 2018). A produção de conhecimento e os métodos de investigação para avaliar os sistemas de produção alimentar não deveriam ficar estritamente restritos ao meio acadêmico e este têm sido um dos desafios da ciência agroecológica. No enfoque agroecológico os agricultores, em especial os familiares, deveriam ser os principais usuários dos resultados da avaliação, pois são eles os que podem de fato modificar suas ações para promover a conservação dos solos.
Os cientistas engajados devem, portanto, utilizar metodologias, como preconizada pela agroecologia, participativas para permitir aos agricultores o acesso a indicadores de sustentabilidade que forneçam às comunidades rurais a capacidade de observar, avaliar, tomar decisões e adaptar as tecnologias às condições socioeconómicas e biofísicas de seus agroecossistemas (Machado e Vidal 2006).
As análises convencionais quantitativas que determinam os indicadores de qualidade do solo, se analisados de maneira isolada são insuficientes para uma avaliação integrada das condições do solo, uma vez que tais análises, recorrentemente no meio científico, encontram-se muitas vezes ao serviço da agricultura industrial movida pelo grande mercado de insumos e fertilizantes químicos (Pinheiro 2011). Em contrapartida, a Cromatografia Circular de Pfeiffer - em diante CCP, se destina a uma visão integrativa sobre a vida do solo; o diagnóstico é expresso por uma linguagem visual codificada em cores e desenhos, que expõe as deficiências e as fragilidades do solo e possibilita indicar ações para a melhoria das condições elucidativas de adoecimento do ecossistema. Por se tratar de uma análise com procedimentos metodológicos simples e de baixo custo, é mais acessível, assim permite a participação dos agricultores, o que pode contribuir para a autonomia e empoderamento dos mesmos, promovendo diálogos de saberes. Isto é essencial para o desenvolvimento de uma agricultura verdadeiramente ecológica (Altieri 2012).
A cromatografia sobre superfície circular plana de papel como ferramenta de análise da saúde do solo teve como precursor o bioquímico de origem alemã Ehrenfried Pfeiffer (1899-1961). Apesar dos avanços na avaliação de compostos e solos, Pfeiffer não teve apoio e nem reconhecimento. Isto porque a Lei de Liebig, difundida cientificamente na época em que desenvolvia seus estudos, implicou na adoção de políticas de incentivo à agricultura industrial, que compreende de forma reducionista as necessidades intrínsecas ao desenvolvimento das plantas. Esta necessidade, conforme o pensamento da agricultura industrial é pautada na oferta ou deficiência de nutrientes específicos, sem considerar a saúde integral do agroecossistema, que pressupõe também a saúde do solo.
Desse movimento resultou a crescente produção de fertilizantes químicos e a tentativa de invisibilização dos conhecimentos como a Cromatografia de Pfeiffer, por seu potencial de transgredir o novo circuito econômico estabelecido na agricultura desde então, por meio do fortalecimento da proposta da Agricultura Biodinâmica, onde Pfeiffer foi seu grande precursor no continente americano. Apesar da difusão de seus conhecimentos entre agricultores biodinâmicos, apenas recentemente o método tem sido divulgado e aplicado por outros agricultores com estilos de agricultura de base ecológica e se adentrou no meio acadêmico. Neste meio, diversos autores reconhecem a necessidade de sua difusão e maior aprofundamento em sua utilização (Siqueira, Marques e Franco 2016; Pilon, Cardoso e Medeiros 2018; Costa e Figueiredo 2019).
O objetivo da pesquisa foi então avaliar o estado da saúde do solo utilizando métodos qualitativos e quantitativos de avaliação da saúde do solo como a Cromatografia Circular de Pfeiffer e indicadores físico-químicos convencionalmente utilizados.
Materiais e métodos
Área de estudo
A pesquisa foi realizada no Assentamento Horto Bela Vista, localizado no município de Iperó, mesorregião de Sorocaba, São Paulo. O assentamento foi criado em 1998 como projeto de assentamento estadual em decorrência de processos de luta no final da década de noventa na região de Sorocaba, possui 31 lotes distribuídos em uma área total de 887,88 ha. A história do assentamento Bela Vista registra início em um acampamento em George Oeterer, bairro próximo à Fazenda Ipanema. Posteriormente o acampamento se mudou para as proximidades da antiga fazenda Horto Bela Vista, pertencente à Ferrovia Paulista S.A. (FEPASA), onde houve a implementação do assentamento (Lino 2014) e os assentados têm buscado sua manutenção na área desde então.
Diversos autores (Branco 2012; Lino 2014; Oliveira 2016; Almeida 2019) registram experiências de transição agroecológica no Assentamento Bela Vista. Há no assentamento um Organismo de Controle Social (OCS) responsável pela certificação orgânica de 34 produtores chamada de Unidos Venceremos - Assentamento Bela Vista - Iperó/sp. Enquanto no município, existem 62 agricultores cadastrados no Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos; 20 desses são agricultores com certificação por Organismo Participativo de Avaliação da Qualidade Orgânica (OPAC) pela Associação Brasileira de Agricultura Biodinâmica. Por apresentar particularidades interessantes aos objetivos da pesquisa, optou-se por trabalhar no lote do Sítio Mãe Terra.
O sítio possui aproximadamente sete hectares e desde sua conquista em 1998 tem sido desenvolvido por meio dos princípios agroecológicos e biodinâmicos; possui produção diversificada, voltada para o autoconsumo da família assentada e para o abastecimento de mercados de circuitos curtos como Comunidade Sustenta Agricultura (CSA) com apoio do Armazém Terra Viva. A produção do sítio é certificada, com o selo Demeter Biodinâmico, pela Associação Brasileira de Agricultura Biodinâmica, um Organismo Participativo de Avaliação por Conformidade (OPAC) e integra o Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos.
Caracterização das áreas amostrais
No sítio Mãe Terra, foram amostrados solos em três diferentes usos, e próximo ao sítio amostrou-se em área de preservação permanente (App) do rio Sarapuí, pertencente à bacia hidrográfica do rio Sorocaba conforme o mapa da Figura 1.
Para cada um dos usos foram delimitadas cinco parcelas circulares de 100 m2 (raio de 5,64 m), sendo que em cada parcela 10 amostras simples deformadas de solo foram coletadas, na profundidade de 0-5 cm, que foram misturadas para compor uma amostra composta de solos, totalizando então em 5 amostras compostas de solo por uso. Para amostras indeformadas uma trincheira de 25x25x10 cm foi aberta em cada uma das parcelas. Em cada parcela, na profundidade de 5 cm, coletaram-se solos utilizando dois anéis de Kopec com capacidade de 50 cm3 na mesma profundidade, totalizando 10 repetições por uso.
As coletas aconteceram nos meses de junho e julho de 2019 e foram utilizadas as mesmas amostras de solo para a realização dos diferentes métodos de análise.
Conforme o mapa pedológico do Estado de São Paulo (Oliveira et al. 1999) os solos predominantes no município de Iperó são solos vermelhos-amarelos e latossolos vermelhos-amarelos. Considerando o Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (SBCS) os solos das áreas amostrais são latossolos vermelho-amarelos distróficos em áreas de declividade baixa e gleissolos na margem do rio Sarapuí, que correspondem, respectivamente, aos Ferralsols e Gleysols segundo a World Reference Base for Soil Resources (WRB).
As áreas de solo amostrados no assentamento pertenciam à área da antiga fazenda da Ferrovia Paulista S/A (FEPASA) que cultivava espécies de eucaliptos para fabricação dos dormentes que eram utilizados nas ferrovias da região de Sorocaba. A partir dos relatos dos assentados e observação no lote, foi possível confirmar que atualmente ainda há presença de resíduos das plantações em áreas específicas do lote. As consequências do uso intensivo do solo para esse tipo de atividade certamente repercutem na qualidade do solo.
O sistema agroflorestal possui área de aproximadamente 0,2 há, implantada em 2016, com produção diversificada entre espécies arbóreas (frutíferas: exóticas e nativas da mata atlântica) e hortaliças. O cultivo de banana com adubação verde foi plantado em 2017 e também possui área de aproximadamente 0,2 ha. As espécies adubadeiras inclusas no consórcio são: feijão guandu e crotalária juncea. Antes do plantio da banana houve incorporação da massa seca do feijão guandu que estava plantado na área por sete anos. A área considerada como pousio possui 0,1 há. Anteriormente houve plantação de cana-de-açúcar orgânica e atualmente se observa ainda a presença de cana e capim braquiária (sem manejo desde 2016). O rio Sarapuí possui mata ciliar em praticamente todo seu curso, e para amostragem foi escolhida a área de fácil acesso mais próxima ao Sítio Mãe Terra. Trata-se de um remanescente de Floresta Estacional Semidecidual, do bioma Mata Atlântica, que sofreu alterações e intervenções antrópicas.
Análises laboratoriais
As análises químicas foram encaminhadas ao laboratório da Faculdade de Ciências Agronômicas da UNESP/ Botucatu, realizadas segundo os métodos propostos por Raij et al. (1996). As análises físicas foram realizadas no Laboratório de Geologia e Pedologia da UNESP/Ourinhos, onde se determinou a densidade do solo pelo anel volumétrico, densidade da partícula pelo método do balão volumétrico e análise granulométrica pelo método da pipeta segundo Camargo et al. (2009).
As análises de cromatografia foram realizadas no Laboratório de Sementes da Associação Brasileira de Agricultura Biodinâmica, em Botucatu/sP, seguindo o método proposto por Restrepo e Pinheiro (2011) com adaptações, percorrendo os seguintes procedimentos metodológicos em campo e laboratório: (i) amostragem do solo para a análise; (ii) identificação das amostras; (iii) secagem das amostras ao ar; (iv) coagem, macera-ção e peneiragem das amostras; (v) pesagem de 5 g de solo; (vi) preparação da solução de hidróxido de sódio (NaöH) com adição de NaOH a 1 % em água destilada; (vii) preparação da solução de nitrato de prata (AgNo3) com adição de AgNo3 a 0,5 % em água destilada; (viii) preparação dos papéis filtros circulares: utilizaram-se na pesquisa papéis filtros circulares de numeração 4, de 150 mm de diâmetro da marca Whatman®. O papel foi marcado em três locais: no centro, e 4 cm e 6 cm do centro. O centro foi perfurado com orifício de 2 mm e os pontos 4 e 6 com uma agulha; (ix) elaboração dos rolos de papel: quadricularam-se com lápis alguns papéis filtro com quadrados de 2 cm x 2 cm. Os quadrados foram recortados, enrolados formando rolos de papel e utilizados no orifício dos filtros como capilares para impregnação dos papéis com as soluções; (x) impregnação das soluções: a impregnação dos filtros com AgNo3 se deu por meio dos rolos de papéis colocados no centro do filtro, utilizando dois recipientes em que o menor foi colocado dentro do maior centralizado com a solução de nitrato de prata. No menor foi colocado 0,4 ml da solução, aguardou-se que fosse impregnado até os 4 cm previamente marcados e se esperou que secassem sem contato com a luz; (xi) dissolução da amostra de solo com hidróxido de sódio (NaOH): a amostra de solo de 5g foi dissolvida em 50 ml da solução, agitou-se de forma circular por seis vezes para a direita e para esquerda, descansando por quinze minutos, e agitou-se novamente por seis vezes, repetindo o mesmo procedimento após meia hora e uma hora. Realizado o procedimento a solução descansou por seis horas; (xii) a impregnação com NaOH foi após às seis horas de descanso da solução e da secagem do papel impregnado com AgNO3, e foi realizada a impregnação da amostra no papel filtro. Com uma pipeta foram retirados 1,25 ml do sobrenadante da solução, que foi colocada sobre um recipiente de vidro menor dentro de um maior, onde um novo rolo de papel foi colocado no centro do papel impregnado com nitrato de prata para que a solução de solo fosse impregnada até a marca dos 6 cm. Após desse processo, o rolo foi retirado e o filtro foi colocado para secar e revelar as informações sob luz difusa. O processo de revelação durou aproximadamente uma semana; (xiii) arquivamento dos cromatogramas: após a revelação dos cromatogramas por meio de escâner as imagens foram digitalizadas. Para apresentação dos resultados dos cro-matogramas foi necessário o tratamento das imagens - como recorte e aplicação de filtros - realizado através do Software Livre GIMP 2.10.12.
Para cada uma das cinco parcelas amostrais foram realizados quatro cromatogramas utilizando a mesma solução de solo para verificar a repetitividade dos padrões. Assim, foram vinte cromatogramas para cada uso, resultando em um total de 100 cromatogramas.
Interpretação da cromatografia de Pfeiffer
Os cromatogramas foram interpretados qualitativamente a partir de padrões vinculados aos indicadores da saúde do solo. O cromatograma é uma imagem formada em um papel de filtro circular, onde a solução de solo se distribui por capilaridade formando zonas. Estas zonas se vinculam aos indicadores de qualidade. A zona central indica a condição de aeração; a zona interna, a condição nutricional; a zona intermediária avalia aspectos relacionados à matéria orgânica; e a zona externa, às enzimas e aos microrganismos do solo. O cromatograma com as características reveladoras de um solo saudável apresenta a zona central com a coloração creme integrada ininterruptamente à zona interna, indicando desta forma boa aeração e estrutura. Se a ligação gradual se mantém entre a zona interna e a zona intermediária, pode-se afirmar a presença de atividade biológica benéfica associada à matéria orgânica. Por fim, se a integração permanece com a zona externa formando nuvens ou ondas, com os caminhos em formato de penas desde a zona interna se encerrando nas bordas do croma, indica-se que a microbiologia do solo, a matéria orgânica e os nutrientes encontram-se em bons estados e o solo em questão é saudável e propício para produção sustentável de alimentos (Restrepo e Pinheiro 2011).
Considerando esses mesmos aspectos os croma-togramas foram quantificados por meio da chave de interpretação proposta por Siqueira (2018), considerando atributos relacionados as características de cor, forma e integração para cada uma das quatro zonas reveladas nos papéis circulares (central, interna, intermediária e externa) conforme descrito na Tabela 1.
Cada um dos atributos analisados nas zonas resultou em uma nota de 1 a 3, sendo 1 para condição não ideal, 2 com condição regular e 3 para condição ideal, conforme exemplificado no esquema da Figura 2.
O somatório das notas atribuídas as zonas formam um valor de Índice de Qualidade do Solo - em diante IQS, que consiste na nota final do cromatograma, organizados em uma tabela de notas. Sendo assim para cada cromatograma a nota máxima possível seria de doze pontos, como no total foram cinco pontos de amostragem resultando em cinco cromatogramas que passaram por quatro repetições, o IQS geral por sistema teria como nota final máxima de 48 pontos.
Havendo a sistematização dos dados para elaboração do IQS geral foram consideradas a média e o desvio padrão do resultado das somas por sistema analisado e para cada uma das zonas dos sistemas. Com a média e o desvio padrão geral, realizou-se um IQS ordinal, sendo que x̅ representa a média, e o o desvio padrão conforme apresentado na Figura 3.
Desta maneira, foi possível ordenar os diferentes sistemas em uma escala de condição de solo: ótimo, bom, regular, ruim e péssimo, o que permitiu comparações e inferências sobre os manejos dos agroecossistemas.
Resultados e discussões
Avaliação visual da saúde do solo através da CCP
Através da interpretação visual da cromatografia é possível observar que na área da mata ciliar a zona central obteve um desenvolvimento satisfatório, com aspectos esperados para solos aerados, bem estruturados e com matéria orgânica abundante, que é coloração branco cremosa com reentrâncias nas zonas sequenciais (Restrepo e Pinheiro 2011). Na área do sistema agroflorestal o desenvolvimento da zona central foi limitado, com coloração mais escura e tamanho menor, o que indica limitações nos atributos físicos do solo. Tanto a área da banana como a área de pousio apresentaram situação intermediária. A zona central teve um bom desenvolvimento, coloração creme, o que indica sinais de aeração.
Avaliando visualmente a zona interna, que revela as condições químicas dos solos, vê-se que no sistema agroflorestal houve a formação da zona com cor escura estendida até as outras zonas sem interrupções, característica desejável. Na área da banana e do pousio, a zona formada demonstrou um desenvolvimento comprometido. Observa-se que é bem delimitada indicando pouca integração com a matéria orgânica e os nutrientes, isto indica que o solo está empobrecido quimicamente. Na mata, foi observado que a zona teve pouco desenvolvimento, havendo também uma linha a delimitando da zona posterior. Apesar disso é possível observar que ela foi maior e suas cores se apresentaram mais integradas com a zona seguinte.
As características visuais das zonas intermediárias e externas indicam as condições de presença da matéria orgânica, a ação dos microrganismos e a atividade enzimática na análise de CCP. No sistema agroflorestal a zona intermediária apresentou integração com as demais zonas, com terminações irregulares, caracterizando assim presença de matéria orgânica na forma de húmus. Houve ainda a formação de dentes e terminações que se iniciam desde a zona intermediária que seguiram até a zona externa. Este tipo de padrão visual significa estoque de matéria orgânica no solo em forma de húmus com intensa atividade microbiológica (Restrepo e Pinheiro 2011). Na área da banana nota-se que a zona intermediária apresentou radiação em formas de flechas, com terminações pontiagudas que pouco se conectam com a zona seguinte, que se revelou na imagem com tamanho grande e com desenhos mais achatados, poucas nuvens e poucas manchas, o que indica pouco acúmulo de húmus. Na área da mata a zona intermediária apresentou terminações irregulares com presença de radiação em formas de penas, sendo possível a observação de manchas que indicam o acúmulo de húmus em praticamente todos os pontos de conexão com a zona externa, o que evidencia forte atividade biológica e enzimática em cooperação com o processo de decomposição da matéria orgânica (Restrepo e Pinheiro 2011). Na área do pousio a zona intermediária revelou forte radiação em forma de flechas com terminações curtas que não se conectam diretamente com a zona externa, o que indica pouco acúmulo de húmus e baixa atividade microbiológica.
As interpretações descritas foram realizadas para cada umas zonas a partir das observações dos cromatogramas de cada um dos usos estudados que estão expostos na Figura 4.
Por meio da avaliação visual que permite uma análise qualitativa, pode-se constatar que os cromatogramas das áreas de banana com adubação verde e de pousio se aproximam em seus aspectos visuais: formação de anéis marcados que separam as zonas e maior distância entre a zona externa e as bordas. Em contrapartida, os croma-togramas das áreas de mata e do sistema agroflorestal são mais similares entre si. Em ambos há a formação de radiações sinuosas que se estendem até as margens dos cromatogramas com integração entre elas e poucas ou apenas tênues demarcações separando-as. A Figura 5 permite vislumbrar tais inferências.
Avaliação da saúde do solo através da chave de interpretação da CCP
Os valores dos cromatogramas foram quantificados por meio da chave de interpretação proposta por Siqueira (2018), que considerou para cada uma das quatro zonas três critérios: forma, cor e integração, com pontuação de 0 (ausência da zona), até três para condição ideal. Somados, resultam num índice de qualidade do solo (IQS).
Na avaliação dos cromatogramas, a média total foi de 26,62 e o desvio padrão de 3,82. A Figura 6 apresenta a escala adotada para esse estudo.
Realizada a classificação numérica ordinal baseada na Figura 3, os diferentes usos analisados foram categorizados. A única área estudada classificada com IQSO bom foi a mata ciliar. O sistema agroflorestal ficou com índice regular, a área da banana com adubação verde como ruim e o pousio classificado com iqso péssimo. Os índices estão dispostos na Tabela 2.
Nota: BAN (banana com adubação verde), MAT (mata ciliar), Pou (pousio), SAF (sistema agroflorestal), MED (média), DP (desvio padrão) e iqso (Índice de qualidade do solo ordinal).
Especificando a avaliação dos resultados através da avaliação pela chave de interpretação, conclui-se que o único uso que teve valores baixos na zona central foi o pousio, em razão da forma circular com borda lisa definida e da ausência de integração com a zona interna. Reflete-se que caso o critério de avaliação considerasse o tamanho da zona, os cromatogramas do sistema agroflorestal teriam tido valores menores na zona central. Para a zona interna, a mata se destacou acima dos outros usos, por apresentar coloração marrom, com forma circular irregular e presença de radiações em forma de penas. Na zona intermediária, a mata também se destacou por apresentar forma circular com borda externa de pontas irregulares e distância de pelo menos 1,5 cm dos vales da borda e por apresentar radiação em forma de penas, enquanto as áreas de banana e de pousio apresentaram forma circular com borda externa pontiaguda, cenário que aponta má condição para esta zona. Para a zona externa, as variações ocorreram em razão da coloração marrom muito clara ou amarelada com manchas marrom claro bem definidas e das variações das formas irregulares que surgiram nas áreas de mata e do sistema agroflorestal. A presença de bolhas conforme às apresentadas nas imagens de referências presentes na chave de interpretação não foram notadas na zona externa em nenhum dos cromatogramas, o que não permitiu nota máxima (9) para nenhum dos usos nessa zona, já que para esse atributo todos os sistemas pontuaram 1. Os box plots (Figuras 7, 8, 9, 10 e 11) apresentam as variações de valores máximos, mínimos e de média dos valores totais para cada sistema analisado e para cada uma das zonas.
Dados: elaborado por Barros (2021) no Software R.
Nota: sendo SAF (sistema agroflorestal), BAN (banana com adubação verde), MAT (mata ciliar), Pou (pousio), ZC (zona central), ZI (zona interna), ZINT (zona intermediária) e ZE (zona externa).
Na aplicação do mesmo método de quantificação dos cromatogramas, gerando um IQSO, Siqueira (2018) trabalhou com a escala de péssimo, regular, médio, bom e ótimo, e encontrou os seguintes resultados: plantio de milho convencional transgênico obteve qualidade péssima; área de bananal, pastagem e lichia, com qualidade médio; sistema agroflorestal com qualidade regular (no atual critério adotado, o sistema agroflorestal ficaria como ruim); e assim como na presente pesquisa, o único sistema com qualidade boa foi a mata ciliar. Nota-se que a metodologia de quantificação dos cromatogramas permitiu a avaliação dos sistemas e a compreensão da saúde dos solos, sendo sensíveis aos atributos do solo. A chave de interpretação serviu para padronizar a identificação dos diagnósticos revelados, direcionando e facilitando a leitura dos resultados.
Avaliação da saúde do solo através de indicadores químicos e físicos
Por intermédio dos resultados da análise química depreende-se que o solo do sistema agroflorestal se encontra com acidez muito baixa segundo estabelecem Raij et al. (1996). Certamente esse resultado ocorre em razão da calagem realizada antes da implantação do sistema agroflorestal. A matéria orgânica é um componente fundamental para o funcionamento dos sistemas agroflorestais, que acaba inclusive determinando seu potencial produtivo (Vilela e Mendonça 2013). No sistema agroflorestal analisado a matéria orgânica totalizou 31,60 g/dm3, alto teor segundo (Raij et al. 1996). Verifica-se que o manejo agroflorestal é eficiente no aporte de matéria orgânica, aumentando o reservatório de nutrientes no solo quando comparado aos manejos convencionais (Silva, Sena e Silva Júnior 2007; Silva et al. 2014; Cogo et al. 2012).
Sabe-se por relato dos agricultores que diversas fontes foram utilizadas para aumentar a fertilidade da área, como esterco de gado curtido, composto biodinâmico sólido, biofertilizantes biodinâmicos, além de coquetéis de adubação verde. Sabe-se também que a adubação verde com o coquetel com sementes de girassol, milho, mucuna preta, feijão de porco, feijão guandu, crotalá-ria e leucena propicia o maior acúmulo de nutrientes no solo e sua decorrente disponibilização às plantas, aumentando o teor de N, K, CA, MG e P no solo. Assim, supre-se e/ou complementa-se a adubação nitrogenada, reduzindo os custos produtivos e os impactos ambientais (Barroso et al. 2009; Viola et al. 2013). O resultado da análise química confirma a eficácia do manejo de adubação orgânica através dos valores encontrados para matéria orgânica e para os valores de P, K, CA e MG.
Além disso, os agricultores relatam que o termofosfato yoorin (50g/m2) foi aplicado duas vezes por ano para manter a fertilidade do solo, sendo incorporado principalmente nos sulcos abertos para o plantio, o que pode explicar os altos valores de fósforo amostrado no sistema agroflorestal. Por meio dos dados apresentados, é possível afirmar que a adubação realizada com frequência proporciona os elevados níveis de nutrientes presentes no solo. Para os teores de micronutrientes, S e B estão com teores médios e CU, ZN e FE com teores muito altos. O único elemento deficiente é MN segundo estabelecido por Raij et al. (1996).
Os solos sob plantio de banana com adubação verde demonstram condição de acidez, resultado foi previsto tendo em vista que não foi realizada calagem na área antes do plantio. O teor de matéria orgânica encontrado na área foi médio. Certamente tal cenário é reflexo do histórico da adubação verde por feijão guandu, espécie leguminosa que esteve crescendo no solo por pelo menos sete anos e que foi incorporada na área para o plantio das bananeiras. Cardoso et al. (2014) confirmam o potencial de incorporação de matéria orgânica no solo e o aumento da produtividade promovidos pela adubação com guandu. Considerando os critérios estabelecidos por Raij et al. (1996) para culturas perenes, os teores encontrados de CA e MG foram muito altos; de potássio (K), médios, e de fósforo (P) foram baixos. Verifica-se também baixos teores de S e ZN, e teores médios para B e CU, estando MG e FE com altos teores (Raij et al. 1996). De acordo com os valores encontrados, propõem-se práticas de adubação que promovam a incorporação desses nutrientes, visando o aumento da produtividade e da fertilidade do solo. Rayol e Alvino-Rayol (2012) estudaram o potencial de adubação verde do guandu e encontraram concentrações de macronutrientes (N: 38,01 g/ Kg; P: 4,89 g/Kg; K: 15,06 g/Kg) e micronutrientes (CU: 25 mg/kg; MN: 63 mg/kg; FE: 271 mg/kg e ZN: 58 mg/kg) contidas na matéria seca durante a floração da espécie. Pelo guandu se tratar de uma espécie leguminosa, possui a capacidade de fixar nitrogênio atmosférico, quando em simbiose com bactérias do grupo conhecido genericamente como Rhizobium (Borges et al. 2018). Como no sistema estudado o guandu já está consorciado com a banana, prevê-se que com sua incorporação no solo os nutrientes sejam disponibilizados e haja uma melhora nos atributos químicos da área.
Na área de mata ciliar do rio Sarapuí foi encontrada situação de acidez muito alta no solo. A acidificação é um processo natural decorrente do intenso intempe-rismo ao qual são submetidos os solos de ecossistemas tropicais em razão do regime de alta precipitação que resulta na lixiviação carregando os íons de CA2+ e o MG2+ para as camadas inferiores contendo CO2, sendo substituídos nos coloides pelos íons H+ (Ronquim 2010; Lepsch 2011). O solo se encontra com valor alto de saturação por alumínio (49,8 %). Quanto aos ma-cronutrientes P, K, CA, MG, foram encontrados altos teores (Raij et al. 1996). Essas características decorrem do intenso acúmulo de materiais orgânicos na área que favorece a ciclagem dos nutrientes. O teor de matéria orgânica encontrado é considerado muito alto. O valor está acima de 60 g/DM3, o que indica acúmulo de matéria orgânica no solo. Observa-se dificuldade de decomposição possivelmente pelo fato de as áreas serem alagadas em períodos de cheias, influência da sazona-lidade do rio Sarapuí (Smith e Nascimento 2016), cuja morfologia é meandrante. Os teores de micronutrientes encontrados na mata apontam que os diferentes materiais orgânicos depositados através da serapilheira têm promovido intensa ciclagem de nutrientes associada a diversa fauna edáfica. O resultado é teor alto para S, CU, FE, MN e ZN e teor médio para B, segundo estabelecido por Raij et al. (1996).
O solo na área de pousio se encontra com acidez alta, com baixo teor de P e S, médio de K e alto de CA e MG, segundo estabelecem Raij et al. (1996). A matéria orgânica apresentou teor mais baixo que o verificado em qualquer um dos outros usos estudados, situação que decorre da baixa incorporação de resíduos orgânicos na área. Ainda assim, segundo estabelecido para recomendações agrícolas por Raij et al. (1996), o teor de matéria orgânica é considerado médio. Segundo relatos dos agricultores há sete anos foi realizada calagem a lanço nos sulcos abertos para o plantio de cana-de-açúcar. Desde então a área não teve manejo. Quanto aos micronutrientes da área de pousio, observa-se teor baixo em ZN e médio em B, CU e MN. O único micronutriente encontrado com alto teor foi o FE, que em solos de regiões tropicais geralmente é abundante em razão do forte intemperismo dos materiais parentais que aumenta os óxidos e hidróxidos de ferro no solo.
À luz dos parâmetros analisados, pode-se inferir que os sistemas em que houve intervenções intencionais para melhoria da fertilidade do solo, como através da incorporação de resíduos orgânicos e o plantio de adubação verde, obtiveram os melhores resultados nos atributos químicos, como as áreas de banana e do sistema agroflorestal. Este desempenho se relaciona com o aumento da capacidade de acúmulo de nutrientes que retornam ao sistema edáfico através da ciclagem de nutrientes com colaboração da fauna edáfica e em razão da fixação biológica de nitrogênio (Barroso et al. 2009). A frequência do manejo também contribuiu para a saúde dos solos, e a utilização das entrelinhas do sistema agroflorestal para a produção de hortaliças exigiu a incorporação de matéria orgânica constante, influenciando diretamente nos resultados das análises químicas. A Tabela 3 apresenta detalhadamente os valores dos indicadores químicos dos sistemas avaliados.
Nota: BAN (banana com adubação verde), MAT (mata ciliar), Pou (pousio), SAF (sistema agroflorestal), MED (média), DP (desvio padrão).
Quanto aos atributos físicos, o sistema agroflorestal possui solo de textura franco arenoso. Para a densidade do solo, o valor foi de 1,47 g/cm3, abaixo do considerado crítico para solos franco arenosos (Reichert, Reinert e Braida 2003). Porém, foi maior que o encontrado na literatura consultada para a mesma classe textural em Silva, Pauletto e Silva (2020) para a camada de 0-20 cm e de 0-5cm em sistemas agroflorestais (Carvalho et al. 2013; Mattos, Bertolino e Bertolino 2017). Assim, esperava-se encontrar valores menores de densidade. Sabe-se que a densidade apresenta relação inversa com a porosidade (Reichert, Suzuki e Reinert 2007), o que resultou em porosidade total inferior a 50 % na área. O uso anterior de plantio de eucalipto que exigia o trânsito intensivo de máquinas para corte e transporte de madeira, pode ter colaborado para os valores altos de densidade e baixa porosidade total, não havendo tempo suficiente para que os benefícios do sistema agroflorestal nas propriedades físicas do solo fossem auferidos.
Tratando-se de solos francos, os valores de densidade encontrados na área da banana com adubação verde não indicam situação crítica de restrição para crescimento das espécies ou compactação (Reichert, Reinert e Braida 2003, Brady e Weil 2013). O histórico de plantio de feijão guandu como adubação verde pode ter influenciado esses resultados, já que essa espécie possui sistema radicular bem desenvolvido, o que permite rompimento de camadas compactadas (Sagrilo, et al. 2009). Estudos sobre o plantio direto sob argissolo vermelho confirmaram a eficiência do guandu na manutenção das condições físicas do solo na camada de 0-10 cm de profundidade (Alvarenga et al. 1995; Lanzanova et al. 2010). O guandu se classifica como uma das leguminosas utilizadas para cobertura vegetal com maior capacidade de penetração de raízes em profundidade no solo, além da produção de biomassa aérea e imobilização de nutrientes. O valor da densidade e de porosidade total na área da mata indicam situação de aeração nos solos amostrados em condição natural decorrente da ação da fauna e do alto teor de matéria orgânica. O solo da área da mata é argiloso, e os valores encontrados para sua densidade foram inferiores aos encontrados por Guidolini (2015) na profundidade 0-20 cm em Floresta Estacional Semidecidual e próximos aos de Barreto et al. (2006) que coletaram anéis em profundidade de 0 - 10 cm (1,07).
A área de pousio possui solo de textura franco-argilo-arenosa. Brady e Weil (2013) apontam que, para essa classe textural, valores acima de 1,50 g/dm3 em densidade do solo já apresentam condição de compactação, o que dificulta o crescimento radicular de plantas e a presença da fauna do solo que atua positivamente nos atributos físico-químicos. A área apresentou valores próximos ao parâmetro citado, com baixo volume de poros, o que nos leva afirmar que a área de pousio possui restrições físicas. Por ser área de pousio em que ainda há a presença de cana-de-açúcar e braquiária, a incorporação do material vegetal ao solo, o plantio de espécies de cobertura e o preparo do solo com subsolagem poderiam trazer benefícios para as propriedades físicas da área.
Síntese da avaliação da saúde do solo pelos métodos propostos
A eficácia dos métodos adotados nos permitem afirmar que os solos mais saudáveis foram da área de mata ciliar e do sistema agroflorestal. Os padrões de integração nos cromatogramas foram sensíveis à fertilidade química, mas observa-se que não conseguiram diferenciar a acidez dos solos estudados, uma vez que na área de mata o solo apresentou condição de acidez e no SAF apresentou pH neutro, corroborando com os resultados encontrados por Graciano (2018) e Kokornaczyk et al. (2016), que não observaram influência da acidez nos padrões cromatográficos, o que faz crer que foram os teores de matéria orgânica associado aos teores de macros e micronutrientes que promoveram a integração manifestada nos cromatogramas.
Em relação aos atributos físicos dos solos foi possível encontrar coerência nos padrões desenvolvidos. Os valores de densidade do solo e de volume total de poros contribuíram para que a zona central da área da mata e da banana tivessem condições de desenvolvimento mais próximos aos esperados para solos aerados. Graciano et al. (2020), adotando critérios como tamanho e coloração para a zona central, encontraram correlação negativa com resistência à penetração, e Bezerra et al. (2020) afirmaram que foi possível encontrar semelhanças entre os solos que apresentaram bons padrões de desenvolvimento da zona central com maior macroporosidade e maior diâmetro médio ponderado, consolidando assim as confluências existentes entre a zona central dos cromatogramas com atributos físicos do solo como compactação e porosida-de. Além dos atributos físicos, Razera (2021) encontrou correlação positiva entre zona central com a matéria orgânica e umidade do solo. Sabe-se que a matéria orgânica tem contribuição positiva na estruturação do solo reduzindo a densidade do solo e aumentando a capacidade de retenção de água, o que pode explicar tal correlação.
Considerando os atributos químicos e biológicos, Graciano et al. (2020) encontraram forte correlação da zona interna das análises de cromatografia com carbono orgânico total (COT) para cromatogramas que relevaram radiações bem-marcadas nessa zona, coloração marrom e interação com as demais zonas. O mesmo pode ser observado através dos cromatogramas e dos resultados das análises químicas. As melhores notas atribuídas à zona interna correspondem as áreas que apresentaram os maiores teores de matéria orgânica. Domingues et al. (2018) evidenciam que essa zona revela a condição da atividade biológica do solo, como a integração e a harmonia entre os componentes minerais e biológicos.
Para a zona intermediária e zona externa, Graciano et al. (2020) encontraram correlação com o carbono de biomassa microbiana do solo para padrões de forma de picos irregulares e coloração marrom. Melo et al. (2019) afirmam que a interação da zona intermediária com as demais zonas reflete o teor de matéria orgânica. Para zona externa, Graciano et al. (2020) observaram correlação positiva dos padrões de formação de nuvens e colorações claras com as enzimas fosfatase ácida e arilsulfatase, resultado da atividade dos microrganismos presentes na matéria orgânica. Isto que corrobora com os resultados da análise química para os pontos amostrais que tiveram os maiores valores encontrados através da análise qualitativa da cromatografia que foram nos usos de mata e do sistema agroflorestal
No que concerne a qualidade do solo, Kokornaczyk et al. (2016) analisaram os resultados dos padrões dos cromatogramas e concluíram que os cromatogramas que manifestaram formações radiais com coloração intensa indicaram boa qualidade do solo expresso pelo alto teor de matéria orgânica, fósforo e nitrogênio, enquanto os que apresentaram formações concêntricas indicaram solos com baixa qualidade. Os padrões concêntricos foram mais ostensíveis nas áreas de banana e de pousio, que de fato apresentaram os menores teores de P e matéria orgânica.
Apesar das similaridades entre as análises aqui apresentadas, existem ressalvas a serem realizadas, pois cada autor utilizou critérios próprios para averiguar as correlações. No trabalho de Graciano et al. (2020) os critérios foram tamanho, cor, a relação e a transição entre as zonas para atribuir as notas dos cromatogra-mas. Siqueira (2018) adotou critérios mais qualitativos e descritivos de leitura das informações relevadas no papel filtro. Kokornaczyk et al. (2016) adotaram análise quantitativa, atribuindo parâmetros baseados na mensuração das zonas em mm, avaliação visual e análise computadorizada de textura das imagens. A análise proposta neste trabalho, que foi baseada em Siqueira (2018), adotou cor, forma e integração para mensurar as zonas dos cromatogramas que pode ser replicado por agricultores, sem a necessidade de softwares facilitando a interpretação dos cromatogramas. Constata-se que a adoção pela comunidade científica por um critério mais homogêneo permitiria comparações mais consistentes, e propõe-se que os próximos autores que forem trabalhar com o tema tomem essa consideração.
Repetitividade
Faz-se necessário destacar que a repetição adotada para interpretação dos cromatogramas mostrou que o método é acurado, dado que no método de interpretação adotado os critérios analisados não apresentaram variações que fossem significativas para os resultados. Na maioria dos casos, as repetições obtiveram a mesma nota, não influenciando na média do ponto amostral, conforme expressam a Figura 12 e a Tabela 5.
Nota: ZC (zona central), zi (zona interna), ZINT (zona intermediária), ZE (zona externa), C (cor), F (forma), I (integração), P1 (ponto 1), R (repetição) e IQS (índice de qualidade do solo).
Ainda assim, é importante que ao replicarem a metodologia as repetições sejam realizadas. O método exige adoção de procedimentos simples, mas criteriosos e falhas técnicas podem afetar no resultado, por isso, deve-se acrescentar ainda que por ser uma proposta de baixo custo, repetições do método não oneram os custos.
Conclusões
Esta pesquisa realizou a avaliação do estado da saúde dos solos de quatros diferentes usos da terra em sítio agroecológico e biodinâmico através da Cromatografia de Pfeiffer. Por se tratar de uma ferramenta que abarca visão integrativa sobre a vida do solo, os resultados permitiram uma análise sobre os diferentes atributos do solo como fertilidade química, presença da matéria orgânica, vida no solo e estrutura deste, através dos padrões revelados sobre a superfície de papel, possibilitando a compreensão das limitações e potencialidades das áreas do estudo, o que concede a proposição de mudanças que possam diminuir os impactos negativos sobre o solo e sobre o agroecossistema como um todo. Seja por meio de avaliação estritamente qualitativa ou quantitativa, por meio da Cromatografia de Pfeiffer, evidenciou-se a mata ciliar do rio Sarapuí, Iperó/SP como sistema com solo saudável, considerada na pesquisa como área de referência. O agroecossistema mais saudável foi o sistema agroflorestal, seguido da banana com adubação verde e pousio.
Crê-se que ao apontar o estado geral do solo e o resultado do seu manejo, sem para isso apontar milimétricamente os elementos em solução no solo, a cromatografia é uma ferramenta com grande potencial para manejos agroecoló-gicos. Haja vista que em sistemas mais diversos, a matéria orgânica e os nutrientes são devolvidos ao solo através de materiais que dependem o mínimo possível de insumos externos como podas, compostos e biofertilizantes, uma recomendação com precisão em números, pode não ser tão efetiva. A análise através de uma imagem, como uma fotografia do estado da saúde do solo, pode promover e despertar no agricultor um sentido de observação e percepção sobre seu agroecossistema, permitindo uma avaliação sobre o manejo que foi empregado.
Sendo então a cromatografia sensível às variações de desenho de agroecossistemas tropicais, com procedimentos metodológicos simples, uso de poucos equipamentos, de baixo custo e fácil de ser interpretada, tem potencial de ser aplicada permitindo análise autocrítica sobre a prática de cultivo de alimentos promovendo autonomia e empoderamento dos agricultores familiares.