1. Introdução
As pequenas e médias empresas (PME) são organi-zações dotadas de características próprias que as dife-renciam das empresas de maior dimensão. Possuem um conjunto de características intrínsecas que as tornam únicas, assim como atrativas para o investimento oriundo do exterior. No entanto, esse investimento pode produzir consequências nesse tipo de empresas que as afetarão a todos os níveis, sendo um destes a rendibilidade.
Sendo esta variável fulcral para o sucesso das em-presas, diversos investigadores debruçaram-se acerca das consequências e influências deste tão importante aspeto na rendibilidade, tendo sido obtidas duas con-clusões distintas que dividem a literatura. Segundo esta, a divisão encontra-se na relevância ou não do capital estrangeiro sobre a rendibilidade das empresas: autores como Azzam, Fouad e Ghosh (2013) , Delios e Beamish (2004) , Greenaway, Guariglia e Yu (2014) , Hintošová e Kubíková (2016) , defendem que esta influência é existente, positiva e significativa, enquanto investigadores como Pacheco (2020) , Barbosa e Louri (2005) , Temouri, Driffield e Higón (2008) , argumentam que esta influência, quando existente, não é suficientemente significativa para merecer destaque.
Nesse contexto, procurou-se neste artigo estudar e dar resposta à questão levantada acima pela literatura, usando o caso português, estendendo a análise para outros aspetos relevantes e diretamente relacionados com essa problemática. Mais especificamente, são obje-tivos do presente artigo: i) investigar se a presença de capitais oriundos do exterior na estrutura de capitais das PME influencia de forma positiva e significativa a ren-dibilidade das mesmas; ii) caso tal se verifique, avaliar se existe uma proporção ótima de capital estrangeiro (ou um intervalo) que proporcione a rendibilidade máxima; iii) verificar que diferenças existem nesta influência entre micro, pequenas e médias empresas e; iv) investigar a existência ou não de outras forças externas à relação entre o capital estrangeiro e a rendibilidade que possam exercer efeitos moderadores naquela relação. Para atingir este conjunto de objetivos, construiu-se uma base de dados com informações relativas a 5.667 micro, pequenas e médias empresas, oriundas dos mais diversos setores de atividade, recolhendo diversas informações de relevo para o período de 2014 a 2018 (inclusive). Com essa amostra, efetuaram-se regressões usando o modelo de efeitos aleatórios, separando as empresas por diferentes características, nomeadamente, em termos de dimensão e setor. Para além disso, foi ainda testada a significância de diversas variáveis de controle, representativas de forças que definem as características intrínsecas das empresas e que intervêm no seu normal funcionamento.
O presente artigo é composto por seis secções. A presente secção referente à introdução, a secção 2 onde se revê a literatura estudada, a secção 3 onde se apre-sentam os dados e a metodologia utilizados, a secção 4 com a seleção do modelo e respectiva análise, a secção 5 referente à discussão dos resultados e, por fim, a secção 6, onde se encontram as conclusões do artigo.
2. Revisão da literatura
A influência do capital estrangeiro nas empresas em que participam revela-se um tema que já foi amplamente estudado e analisado na literatura, comparando os indicadores de desempenho de empresas controladas por capitais estrangeiros e aqueles das empresas puramente nacionais (Narayanan, 2015; Hintošová e Kubíková, 2016; Stouraitis, Mior Harun e Kyritsis, 2017). No entanto, o efeito deste capital é ainda um tema de discussão na comunidade, visto haver opiniões inversas (Azzam, Fouad e Ghosh, 2013). Um primeiro grupo de investigadores afirma que o capital estrangeiro afeta de forma positiva o desempenho das empresas. Um segundo grupo, afirma que este não tem influência suficiente para afetar de forma significativa o desem-penho empresarial, ou que, se tiver uma influência positiva, não será algo generalizável.
2.1 Efeito positivo do capital estrangeiro na rendibilidade
Um dos primeiros artigos sobre este tema deve-se a Yudaeva et al., (2003) . Tendo como objetivo avaliar os efeitos do investimento direto estrangeiro nas empresas russas e possíveis efeitos de spillover das empresas controladas por capitais estrangeiros, os autores utili-zaram dados para o período 1992-1997. Destacam-se aqui duas das suas principais conclusões: i) as empresas controladas por capitais vindos do exterior são mais produtivas que aquelas controladas por capital puramente russo. Ou seja, as empresas controladas por capital estrangeiro possuem competências e vantagens a que as demais não têm acesso, como melhores conhecimentos de gestão e tecnologias mais avançadas; ii) os investimentos por parte de entidades estrangeiras trazem consigo efeitos de spillover nas empresas do-mésticas da região e no setor onde operam.
De modo similar, Harris e Robinson (2003) procuraram corroborar a hipótese de que as empresas controladas por capital estrangeiro são mais produtivas que aque-las controladas domesticamente. Para tal, utilizaram dados de empresas industriais a operar no Reino Unido. Com o desenvolvimento do seu trabalho, conseguiram chegar a algumas conclusões: i) o país de origem do capital estrangeiro a ser investido apresenta-se como um fator determinante. Isto é provado pelo facto de, na generalidade dos setores de atividade, as empresas com capital proveniente dos Estados Unidos apresentarem desempenhos superiores às empresas puramente in-glesas; ii) além disso, o setor de atividade da empresa e o país de origem do capital surgem também como características importantes para determinar a eficácia do capital, em termos de rendibilidade.
Delios e Beamish (2004) estudaram a influência do capital estrangeiro no desempenho e taxa de sobre-vivência de 27.974 joint-ventures japonesas, criadas em 150 países. Esses autores mostraram que joint-ventures com participações equilibradas tendem a apresentar rendibilidades superiores àquelas que exibem parti-cipações muito acentuadas da parte japonesa ou onde a participação maioritária pertence à empresa do país onde se investiu. Isso acontece devido à perda de interesse do parceiro minoritário, que se desinteressa do projeto devido à pouca influência que possui sobre os rumos da empresa. É difícil para a empresa com a participação maioritária manter o apoio e interesse dela, dado essas circunstâncias, havendo desistências mesmo quando a joint-venture revela rendibilidades interessantes.
Douma, George e Kabir (2006) , utilizando dados de empresas indianas no período de 1999 a 2000, evi-denciaram que o capital estrangeiro afetou de forma positiva o desempenho das empresas nas quais inves-tiram. Além disso, a detenção de capital oriundo de instituições financeiras nacionais afetou negativamente o desempenho da empresa, ao contrário do que acontece com os capitais oriundos de instituições financeiras estrangeiras. O desempenho das empresas, quando inseridas num grupo empresarial doméstico, tende a ser menor que aquele revelado por empresas que não estão nessa situação. Segundo os autores, isso acontece devido ao facto de os grupos tradicionais com base em famílias usarem a sua posição como veículos para exercer controlo sobre as empresas e extraírem benefícios pessoais.
Jurajda e Stančík (2012) estudaram o efeito das aquisições de empresas domésticas checas por parte de empresas estrangeiras, aquando da entrada do país na União Europeia. Mais especificamente, o objetivo foi verificar se a entrada desse capital tinha impulsionado positivamente o seu desempenho e provocado mudanças na produtividade e nas condições dos seus funcio-nários. Para responder a estas questões, utilizaram dados empresariais para o período de 1995 a 2005 e evidenciarem que a entrada de capitais estrangeiros influenciou de forma positiva o desempenho das em-presas inseridas em setores com pouca exportação e em setores com pouca importação. Nos casos onde as empresas possuem níveis de abertura ao exterior elevados, os efeitos positivos não são tão relevantes.
Gelübcke (2013) estudou se as empresas industriais alemãs controladas por capitais oriundos do estrangeiro conseguiam obter desempenhos superiores àquelas con-troladas puramente por capital alemão. Para tal, utilizou dados de 2007 e 2008, chegando à conclusão que as empresas controladas por capitais externos à Alemanha conseguem uma produtividade do trabalho anual superior de, em média, 20.000€ per capita. Quando controladas por capital estrangeiro, as empresas alemãs gastam, em média, mais 2.000€ por pessoa em investigação e desenvolvimento e têm, em média, uma percentagem duas vezes maior de trabalhadores dedicados a esta área que as demais empresas. Quanto à origem do capital, empresas controladas por capital oriundo dos Esta-dos Unidos da América revelam maior produtividade e intensidade de exportação, quando comparadas com as empresas domésticas. Aquelas controladas por capital oriundo da União Europeia, tendem a pagar salários mais baixos, em média, aos seus trabalhadores. No geral, as empresas controladas por capital estrangeiro aufe-rem vantagens que lhes permitem obter desempenhos superiores às empresas puramente controladas por capital alemão. No entanto, tal como Jurajda e Stančík (2012) , evidenciam que a magnitude dessa superioridade diminui com o aumento dos níveis de internacionalização da empresa.
Azzam, Fouad e Ghosh (2013) analisaram a relação entre o grau de participação estrangeira e o desempen-ho financeiro das empresas e a sua influência na dívida das mesmas. Os autores utilizaram um painel de 8.185 empresas egípcias, com dados entre 2006 e 2010. Separaram também as empresas por quintis, tendo em conta a percentagem de capital detida por capital estrangeiro. No que toca à dívida, concluíram que a contração de empréstimos é prejudicial à rendibilidade, já que a contração de dívida aumenta o risco associado à empresa, o que poderá influenciar os seus rácios. No entanto, a presença de capital estrangeiro ajuda a mitigar estes factos, já que os contactos e experiência possuídos pelos donos desse capital facilitam o acesso da empresa a melhores fontes de financiamento. No que respeita à rendibilidade, esta é positivamente afetada pela presença de capital estrangeiro, sendo que o seu excesso pode ter efeitos contrários daqueles desejados. Isso acontece porque nessa situação perder-se-iam as especificidades e forças características das empresas nacionais, dando lugar apenas às características intrínsecas às empre-sas estrangeiras. Finalmente, Azzam, Fouad e Ghosh (2013) evidenciaram que as empresas com participação de capital estrangeiro tendem a ter dimensão superior e idade mais avançada e a intensidade do benefício da presença de capitais estrangeiros tende a variar, dependendo do setor de atividade da empresa receptora do capital. Empresas fornecedoras de serviços, in-dustriais ou turísticas tendem a ter benefícios mais explícitos, enquanto empresas construtoras ou agrícolas tendem a ter benefícios muito reduzidos.
Greenaway, Guariglia e Yu (2014) , também discutiram esta questão, estudando a relação entre o grau de participação de capital estrangeiro e o desempenho das empresas chinesas que o receberam. Recolhendo informação de mais de 23.000 empresas chinesas, no período de 2000-2005, concluíram que é possível afirmar que as joint-ventures apresentam níveis de desempenho mais atrativos que empresas meramente controladas por capital estrangeiro, ou empresas domésticas. Esse resultado mostra que o capital estrangeiro aliado ao capital nacional tem efeitos sinérgicos, proporcionan-do vantagens inalcançáveis por empresas constituídas meramente por um tipo de capital. Os primeiros, trazem para a empresa o conhecimento de tecnologias modernas, capital, redes de conhecimento internacionais previamente construídas, conhecimento e capacidades de gestão do negócio. Por outro lado, os segundos, trazem para o projeto os conhecimentos em relação ao mercado nacional (neste caso, chinês), conhecimentos em relação à legislação e normas aplicadas no país e conexões políticas com a administração local. Greenaway, Guariglia e Yu (2014) evidenciam ainda que a relação entre o desempenho e a participação empresarial do capital estrangeiro segue uma tendência muito específica, nomeadamente em U invertido. Isto é, o desempenho cresce em conjunto com o aumento da participação, atingindo um máximo e decrescendo com o aumento da participação. Segundo os autores, este máximo situar-se-ia entre os 47% e os 61%. Isso pressupõe a existência de uma combinação ótima entre o capital estrangeiro e o capital doméstico.
Hintošová e Kubíková (2016) analisam também a relação em termos de desempenho das empresas, com diferentes níveis de participação de capital estrangeiro, no setor industrial da república eslovaca. Para tal, utili-zaram dados para mais de 2.000 empresas, no período de 2004 a 2013. Com a realização da investigação, apontaram alguns resultados interessantes: i) as joint-ventures revelam obter desempenhos superiores que empresas controladas por capitais estrangeiros ou empresas puramente domésticas; ii) existe uma relação em U invertido entre o desempenho e o tipo de capital participante na empresa. Ou seja, o desempenho aumenta por cada aumento de participação de capital estrangeiro, até um ponto máximo, a partir do qual, o desempenho diminui por cada aumento de participação de capital estrangeiro. Os autores situam este máximo entre os 61% e 65% de participação de capital estrangeiro.
Recentemente, Nguyen et al., (2020) mostraram que o rácio de propriedade estrangeira e a dimensão da empresa exercem um efeito positivo na rendibilidade. Por outro lado, o facto da empresa ser gerida por não nacionais tem um impacto negativo sobre a rendi-bilidade. Também Mallinguh, Wasike e Zoltan (2020) evidenciam que, com exceção da propriedade, o setor, a idade, o rácio de propriedade estrangeira e o en-dividamento influenciam de forma significativa o desempenho financeiro.
Portanto, para esse conjunto de autores, o capital estrangeiro tende a exercer um efeito positivo sobre a rendibilidade das empresas, dados os efeitos positivos daquele sobre a produtividade, competências técnicas e humanas e capacidade de financiamento. Relativamente à questão do nível ótimo de presença de capital estran-geiro, a literatura apresenta o resultado interessante da existência de uma relação em U invertido, o que significa que, a partir de certo ponto, tendem a perder-se as especificidades e forças características das empresas nacionais, dando lugar apenas às características intrín-secas às empresas estrangeiras.
2.2 Efeito negativo ou não significativo do capital estrangeiro na rendibilidade
Um segundo grupo de autores defende a ideia contrária, ou seja, que o capital estrangeiro não afeta de todo o desempenho das empresas ou, se o afeta, é em níveis não significativos.
Barbosa e Louri (2005) propuseram-se a investigar se as empresas multinacionais a operar em Portugal e na Grécia revelavam desempenhos diferentes que aquelas sediadas em cada país. Para além disso, interessaram-se em perceber se o investimento direto estrangeiro teria um papel enquanto promotor de spillovers e se, para todas essas questões, haveria variações consoante às empresas se estivessem em Portugal, ou na Grécia. Com dados referentes ao período de 1992 a 1997, os autores evidenciam que a origem dos capitais que con-trolam a empresa, no caso português, não apresenta relevância no que toca à influência no desempenho das empresas. Isso acontece, segundo os autores, porque as empresas multinacionais têm de ultrapassar o facto de serem externas ao país e, por isso, desconhecerem as realidades e especificidades associadas ao mercado português. No caso grego, as empresas multinacionais revelam desempenhos superiores às empresas nacionais, mas apenas quando é utilizada como medida de desempenho a rendibilidade do ativo (bruta). Quando é utilizada como medida os lucros líquidos, a diferença torna-se irrelevante.
Temouri, Driffield e Higón (2008) procuraram com-preender se existem diferenças de produtividade e desempenho entre as empresas alemãs e aquelas controladas por capitais oriundos do exterior. Para tal, utilizaram a base de dados Amadeus, retirando dados compreendidos entre os anos de 1995 e 2004 e chegaram às seguintes conclusões: i) apesar de se registarem, de facto, diferenças de produtividade entre as multinacionais e as empresas domésticas alemãs, essas não são suficientemente grandes para serem significativas; ii) as empresas alemãs revelam diferenças significativas de produtividade e desempenho consoante se situadas no oeste alemão ou no leste alemão. As empresas situadas na primeira região revelam números superiores aqueles registados na segunda região; finalmente, iii) as empresas do leste alemão, controladas por empresas da região oeste, são mais produtivas e revelam desempenhos superiores àquelas que se situam na mesma região, controladas por outras empresas do leste alemão.
Pacheco (2020) investigou se o grau de controlo e participação do capital estrangeiro influenciava a rendibilidade das pequenas e médias empresas por-tuguesas. Para além disso, questionou se existiam diferenças neste efeito consoante à idade, dimensão, montante de dívida e orientação às exportações. Ques-tionou, por último, se o nível de desenvolvimento ins-titucional dos países onde o capital estrangeiro tem origem tem influência na rendibilidade das pequenas e médias empresas portuguesas. Para cumprir com esse objetivo, utilizou dados referentes ao período de 2010 a 2017, retirados do Sistema de Análise de Balanços Ibéricos (SABI), onde juntou uma amostra de 5.722 PME de todos os setores industriais. Através da análise desses dados, conseguiu encontrar os seguintes resultados: i) o facto de a empresa ser controlada por capitais oriundos do estrangeiro não tem uma influência significativa na sua rendibilidade. Alguns fatores que podem explicar essa afirmação são, segundo o autor, a falta de conhecimento em relação ao mercado português e a relação existente entre empresas, os seus gestores e os seus donos, que é inimitável pelas empresas controladas por capital estrangeiro; ii) além disso, empresas controladas por capital oriundo de países institucionalmente menos desenvolvidos mostram desempenhos inferiores àque-las controladas por capital oriundo de países mais institucionalmente desenvolvidos. Segundo o autor, isto acontece devido à falta de recursos, tecnologias, capa-cidades de gestão e capacidades de networking a nível internacional.
Com a leitura e análise dos artigos considerados como base para o trabalho a desenvolver, deparamo-nos com um impasse, caracterizado pela dúvida acerca dos efeitos causados no seu desempenho pela entrada de capital estrangeiro na estrutura de capital das empresas nacionais.
2.3 Algumas conclusões e hipóteses
Como vimos na secção 2.1, um primeiro grupo de autores concluiu que o capital estrangeiro surte efeitos positivos no desempenho das empresas, apontando várias razões para esse facto. Delios e Beamish (2004) argumentam que as experiências passadas de investimento e gestão de empresas nessas condições dão às empresas estrangeiras ferramentas que lhes permitem, em investimentos futuros, assegurar uma gestão mais eficaz e proporcionarlhes melhores desem-penhos. Greenaway, Guariglia e Yu (2014) defendem que os desempenhos superiores atingidos pelas em-presas estrangeiras têm como base o conhecimento de tecnologias modernas, capital, redes de conhecimento internacionais previamente construídas, conhecimento e capacidades de gestão do negócio. Yudaeva et al., (2003) apontam como razões para os benefícios deste tipo de capital os melhores conhecimentos de gestão e a posse de tecnologias mais avançadas.
No entanto, o segundo grupo de autores referidos considera que esta ligação não é válida, dado um conjunto de fatores que podem enviesar os resultados obtidos. Refira-se que, a definição de desempenho é um fator que pode ser determinante para o resultado a encontrar, já que pode alterá-lo significativamente. A origem do capital é outro desses fatores, dado que o nível de desenvolvimento institucional é importante para determinar o nível de desempenho acrescido que a empresa irá experienciar. Segundo Pacheco (2020) , o capital oriundo de países institucionalmente desenvolvidos provoca melhorias de desempenho muito mais elevadas que aquele vindo de países institucionalmente menos desenvolvidos. Para além disso, as empresas estrangeiras passam uma série de dificuldades aquando da entrada num mercado novo, que justifica os acréscimos de desempenho irrelevantes. Segundo Pacheco (2020), no caso do mercado português, as empresas com capital estrangeiro não conseguem imitar a relação existente entre a empresa nacional, os seus gestores e os seus donos. Para além disso, a falta de conhecimento em relação ao mercado português será uma dificuldade difícil de ultrapassar. Barbosa e Louri (2005) afirmam que as especificidades dos mercados, desconhecidas para as empresas estrangeiras, serão um fator inibidor, que justifica a irrelevância dos acréscimos de desempenho nas empresas.
Tendo estes factos em conta, e apesar da evidência empírica para o caso português parecer indicar a não significância daquela relação, a questão permanece: será que os capitais estrangeiros influenciam realmente o desempenho das empresas, de uma forma positiva e relevante? Tendo em conta a literatura analisada, é possível formular as seguintes hipóteses, para o caso das micro, pequenas e médias empresas em Portugal:
Hipótese 1: O capital estrangeiro influencia de forma positiva e estatisticamente relevante a rendibilidade das micro, pequenas e médias empresas portuguesas.
Hipótese 2: Existem diferenças entre micro, pequenas e médias empresas, no que toca à influência deste capital.
Hipótese 3: Existem outros fatores que possam exercer efeitos moderadores sobre a relação entre a rendibilidade e a origem estrangeira do capital.
Dentro do grupo de autores que afirma que o capital oriundo do estrangeiro surte efeitos positivos e significativos no desempenho das empresas onde é in-vestido, existe um conjunto de investigadores que dão um passo mais alargado, afirmando que não só a premissa original é verdadeira, mas também existe um ponto ótimo de estrutura de capital, dado que a partir desse ponto, o capital estrangeiro deixa de proporcionar efeitos marginais positivos. Segundo Azzam, Fouad e Ghosh (2013) , apesar de os capitais estrangeiros afetarem de forma positiva o desempenho das empresas nacionais, o seu excesso pode surtir um efeito contrário, já que se perderiam as especificidades e forças características das empresas nacionais. Existirá assim um equilíbrio ent-re as capacidades destas empresas, e as capacidades e forças proporcionadas pelas empresas estrangeiras, de forma a provocar sinergias inimitáveis por empresas controladas por só um tipo destes capitais. Como vimos, Hintošová e Kubíková (2016) apoiam esta ideia, avançando que este ponto ótimo poderá estar localizado entre os 61% e 65% de participação de capital estrangeiro. Já Greenaway, Guariglia e Yu (2014) apontam para um intervalo entre os 47% e os 61% de participação de capital estrangeiro.
Tendo isto em conta, será um objetivo deste artigo encontrar uma relação sinérgica entre o capital estran-geiro e doméstico, encontrando um intervalo ótimo, onde se possam conjugar as forças destes dois tipos de capital de uma forma eficaz.
Hipótese 4: Existe um intervalo onde uma determinada estrutura de capital permite a máxima rendibilidade das pequenas e médias empresas portuguesas, ina-tingível quer por empresas com capitais pura-mente domésticos, quer por empresas com capitais puramente estrangeiros.
3. Dados, metodologia e variáveis
3.1 Dados e metodologia
A base de dados SABI (Sistema de Análise de Balanços Ibéricos) foi selecionada como fonte de informação principal para a elaboração deste artigo. Para a obtenção de informação complementar, foram utilizadas outras fontes, como os Relatórios de Desenvolvimento Humano do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas como fonte de dados relativos ao PIB per capita; a ferramenta online distance calculator para o cálculo das distâncias entre países; e a base de dados Index Mundi para a remanescente informação complementar.
Após a conclusão da seleção da base de dados e a especificação das variáveis a utilizar, importa clarificar os critérios de seleção dos dados recolhidos, respetivos a Portugal.
Uma das primeiras questões a abordar é a da seleção do período de análise. Como foi possível observar na revisão de literatura, foram vários os períodos adotados pelos investigadores. No entanto, destaca-se a utilização de um período de 5 anos, por ser curto o suficiente de forma a não provocar constrangimentos e dificuldades na hora de busca da informação, e por conter uma amostra suficiente de dados que permita uma avaliação eficaz das variáveis acima mencionadas. Tendo isso em conta, foi selecionado o período de 2014 a 2018. Autores como Barbosa e Louri (2005) , Greenaway, Guariglia e Yu (2014) , Yudaeva et al., (2003) e Pacheco (2020) decidiram também selecionar esta extensão temporal.
Da base de dados SABI, retiraram-se informações referentes às empresas, nomeadamente os seus no-mes, Códigos de Atividade Económica (CAE - Rev. 3), rendibilidades do ativo, acionistas com o controlo da sociedade, países de origem dos mesmos, percentagens do capital social detidas, totais do ativo, datas de constituição dass sociedades, passivos de curto prazo, passivos de médio e longo prazo, totais de vendas, totais de vendas para o mercado comunitário, totais de vendas para o mercado extracomunitário e taxas de variação das vendas. Selecionaram-se apenas empresas que apresentam dados completos para todo o período considerado e, desses dados, retiraram-se o 1º e 99º percentil, de forma a eliminar potenciais outliers. Das fontes complementares, retiraram-se dados para o PIB per capita, tendo em conta a paridade do poder de compra, e a distância geográfica (em km) entre Portugal e o país de origem do acionista com controlo da sociedade. Outro fator de relevo prende-se com al-guns territórios ultramarinos autônomos. Devido à sua pequena dimensão, não foi possível encontrar dados relativos aos seus PIBs per capita. Logo, foram utilizados os dados dos seus países soberanos. As ilhas Bermudas, Caimão, Virgens e o território de Gibraltar tiveram a si associados os dados referentes ao Reino Unido. As ilhas Curaçao integraram os números dos Países Baixos e ao Liechtenstein foram associados os números referentes à Suíça.
Tendo como base essa abordagem, foi recolhida uma amostra final balanceada de 5.667 empresas, onde 2.738 são microempresas, 2.002 são pequenas empresas e 927 são médias empresas (utilizando a definição de PME constante da Recomendação 2003/361/CE da Comissão, de 6 de maio de 2003). Sob controlo de capitais estran-geiros, ou seja, uma percentagem superior a 50%, estão 1.144 empresas e sob controlo de capitais domésticos encontram-se 4.523 empresas.
A Tabela 1 apresenta a distribuição das empresas na amostra pelos diferentes setores de atividade:
Classificação de Atividade Económica (CAE - Rev.3) | N |
---|---|
Agricultura, produção animal, caça, floresta e pesca (CAE 1-3) | 191 |
Indústrias extrativas (CAE 5-9) | 59 |
Indústrias transformadoras (CAE 10-33) | 2.041 |
Eletricidade, gás, vapor, água quente e fria e ar frio (CAE 35) | 6 |
Captação, tratamento e distribuição de água; saneamento gestão de resíduos e despoluição (CAE 36-39) | 74 |
Construção (CAE 41-43) | 265 |
Comércio por grosso e a retalho; reparação de veículos automóveis e motociclos (CAE 46-47) | 2.208 |
Transportes e armazenagem (CAE 49-53) | 49 |
Alojamento, restauração e similares (CAE 55-56) | 258 |
Atividades de informação e de comunicação (CAE 58-63) | 109 |
Atividades financeiras e de seguros (CAE 64-66) | 1 |
Atividades imobiliárias (CAE 68) | 21 |
Atividades de consultoria, científicas, técnicas e similares (CAE 69-75) | 98 |
Atividades administrativas e dos serviços de apoio (CAE 77-82) | 105 |
Educação (CAE 85) | 30 |
Atividades de saúde humana e apoio social (CAE 86-88) | 45 |
Atividades artísticas, de espetáculos, desportivas e recreativas (CAE 90-93) | 61 |
Outras atividades de serviços (CAE 94-96) | 46 |
Total | 5.667 |
Fonte: elaboração própria.
É de se notar a predominância na amostra de determinados setores de atividade, como as indústrias transformadoras e o comércio por grosso e a retalho e reparação de veículos automóveis e motociclos, com 2.041 e 2.208 empresas respetivamente. É também de realce a fraca presença de empresas das CAE 35 e 64-66, respetivamente com seis e uma empresas, e a ausên-cia de empresas de áreas como a administração pública e defesa - segurança social obrigatória, atividades das famílias empregadoras de pessoal doméstico e atividades de produção e atividades dos organismos internacionais e outras instituições extraterritoriais.
3.2 Variáveis
Foram utilizadas várias variáveis na construção do modelo que será trabalhado e analisado em prol da resposta às hipóteses anteriormente colocadas. Para facilitar a consulta e explicação das variáveis indicadas a seguir, as mesmas são apresentadas e caraterizadas na Tabela 2. Como variável dependente, foi utilizado o Return on Assets (ROA), ou seja, a rendibilidade do ativo. Como variável independente, foi utilizado o Foreign Ownership (FO), ou seja, a percentagem do capital da empresa detida por estrangeiros. Como variáveis de controlo, utilizaram-se as variáveis DIST, AGE, SIZ, STD, LTD, GRO, EXP e PIB, descritas na tabela. A variável PIB foi incluída no modelo como proxy da diferença entre Por-tugal e os países de origem dos capitais estrangeiros, no que toca à qualidade das suas instituições, tendo igualmente sido testadas as diferenças em termos de desenvolvimento humano, medidas pelo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), embora essa variável não se tenha revelado significativa. Segundo Trapczynski e Banalieva (2016) , Chari e Shaikh (2017) e Pacheco (2020) , para além da distância física, as variáveis refe-ridas são tradicionalmente representativas deste con-ceito de distância institucional, fazendo referência a componentes que estão diretamente relacionadas com o desenvolvimento institucional, como o desenvolvimento económico e social.
Variável | Designação | Forma de cálculo | Presença na literatura |
---|---|---|---|
ROA | Return on assets (rendibilidade do ativo) | Resultado líquido do período / Ativo total | Azzam, Fouad e Ghosh (2013) , Barbosa e Louri (2005) , Greenaway, Guariglia e Yu (2014) , Pacheco (2020) , Douma et al., (2006) , Jurajda e Stančik (2012) , Gu, Cao e Wang (2019) , Nguyen et al., (2020) , Kuntluru, Muppani e Khan (2008) , Wang et al., (2019) |
FO | Foreign Ownership (Capital sob propriedade estrangeira) | Assume o valor 0 no caso de a entidade com controlo da sociedade ser oriunda de Portugal. Toma o valor 1 caso se verifique o contrário. | Azzam, Fouad e Ghosh (2013) , Barbosa e Louri (2005) , Greenaway, Guariglia e Yu (2014) , Pacheco (2020) , Hintošová e Kubíková (2016) , Kuntluru, Muppani e Khan (2008) |
DIST | Distância geográfica | Número de quilômetros entre a capital do país de origem do capital estrangeiro e a capital portuguesa. | Chari e Shaikh (2017) , Pacheco (2020) |
AGE | Idade | Logaritmo (base 10) da diferença entre o ano em análise e o ano de fundação da empresa. | Barbosa e Louri (2005) , Harris e Robinson (2003) , Douma et al., (2006) , Pacheco (2020) , Nguyen et al., (2020) |
SIZ | Dimensão | Logaritmo (base 10) dos ativos totais. | Azzam Fouad e Ghosh (2013) , Greenaway, Guariglia e Yu (2014) , Pacheco (2020) , Alonso-Bonis e Andrés-Alonso (2007) , Bamiatzi et al., (2016) , Nguyen et al., (2020) |
STD | Endividamento de curto prazo | Divisão entre o passivo de curto prazo e os ativos totais. | Pacheco (2020) , Barbosa e Louri (2005) |
LTD | Endividamento de longo prazo | Divisão entre o passivo de longo prazo e os ativos totais. | Pacheco (2020) , Barbosa e Louri (2005) |
GRO | Crescimento | Média da taxa de crescimento das vendas dos últimos 5 anos (a contar do respectivo ano de análise). | Barbosa e Louri (2005) , Kuntluru, Muppani e Khan (2008) |
EXP | Experiência internacional | Divisão entre a soma das vendas para os mercados comunitário e extracomunitário, e as vendas totais. | Pacheco (2020) |
PIB | Diferença de PIB per capita | Diferença entre os valores de PIB per capita do país de origem do capital estrangeiro e Portugal. | Trapczynski e Banalieva (2016) , Pacheco (2020) |
Fonte: elaboração própria.
Segundo Li, Vertinsky e Li (2014) , aquela componente é importante, já que permite incluir as diferenças no que toca às práticas institucionais, regulamentação, crenças e assunções que guiam as relações empresariais. Estas diferenças, segundo os autores, aumentam os custos de transação e afetam a legitimidade das relações en-tre a empresa estrangeira investidora e a empresa doméstica receptora do capital.
Após a apresentação das variáveis, a Tabela 3 apresenta as respetivas estatísticas descritivas e ma-triz de correlações.
Na Tabela 3, destacam-se os seguintes aspetos. Na variável FO, notamos a grande preponderância na amostra de empresas com capital português, dado o valor da média de apenas 0,20. Verifica-se uma elevada dispersão na distância de origem dos capitais. No que toca à variável AGE, observamos que as empresas têm em média um valor de 1,29, ou seja, aproximadamente 19 anos de existência. A variável SIZ apresenta valores médios de 6,32, o que corresponde aproximadamente a 2 milhões de euros, refletindo a grande presença de micro e pequenas empresas na amostra. As variáveis STD e LTD apresentam médias de 0,47 e 0,18, o que significa que grande parte das empresas da amostra tem uma percentagem reduzida de dívida de longo prazo, em comparação com a dívida de curto prazo. A variável EXP apresenta uma média de 0,16, o que demonstra uma presença reduzida da generalidade das empresas portuguesas no exterior e, finalmente, a variável PIB diz-nos que, em média, os países de origem do capital estrangeiro possuem níveis de PIB per capita superior ao português. No entanto, convém notar a existência de uma elevada dispersão nos valores desta variável. Relativamente às correlações, destaca-se a correlação superior a 0,6 entre as variáveis FO e DIST e FO e PIB, a qual se deve ao facto de o capital estrangeiro ser maioritariamente oriundo de países relativamente distantes e com níveis de PIB per capita mais elevados.
Média | desvio padrão | FO | DIST | AGE | SIZ | STD | LTD | GRO | EXP | PIB | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
ROA | 0,09 | 0,93 | 0,045 (***) | 0,034 (***) | 0,023 (***) | 0,132 (***) | -0,114 (***) | -0,121 (***) | 0,033 (***) | 0,021 (***) | 0,028 (***) |
FO | 0,20 | 0,40 | 1 | 0,630 (***) | -0,057 (***) | 0,279 (***) | 0,119 (***) | -0,037 (***) | -0,004 | 0,146 (***) | 0,642 (***) |
DIST | 527,1 | 1663,6 | 1 | -0,005 | 0,212 (***) | 0,062 (***) | -0,042 (***) | -0,010 (*) | 0,095 (***) | 0,388 (***) | |
AGE | 1,29 | 0,29 | 1 | 0,227 (***) | -0,106 (***) | -0,034 (***) | -0,158 (***) | 0,037 (***) | -0,007 | ||
SIZ | 6,32 | 0,59 | 1 | -0,127 (***) | -0,092 (***) | -0,012 (**) | 0,216 (***) | 0,193 (***) | |||
STD | 0,47 | 0,49 | 1 | 0,209 (***) | 0,010 (*) | -0,034 (***) | 0,094 (***) | ||||
LTD | 0,18 | 0,49 | 1 | -0,003 | -0,017 (***) | -0,018 (***) | |||||
GRO | 7,77 | 23,00 | 1 | 0,016 (***) | 0,004 | ||||||
EXP | 0,16 | 0,29 | 1 | 0,076 (***) | |||||||
PIB | 3583,5 | 11101 | 1 |
* se p < 0,10; ** se p < 0,05; *** se p < 0,01.
Fonte: elaboração própria.
De qualquer modo, os valores apresentados pelos coeficientes de correlação permitem assumir, na gene-ralidade, a ausência de eventuais problemas de multi-colineariedade. Não obstante, a utilização conjunta de certas variáveis explicativas será efetuada de forma cuidadosa ao longo das regressões seguintes, por forma a não enviesar os resultados por estas apresentados.
4. Seleção do modelo e resultados
Com a amostra definida e explicitada no ponto anterior, concerne agora a escolha do modelo adequado à amostra, assim como a sua análise posterior.
Para a realização deste processo, foram selecionados três diferentes modelos, nomeadamente POLS (pooled ordinary least squares), efeitos fixos e efeitos aleatórios. Para a seleção do modelo mais adequado, foram rea-lizados os testes de Breusch-Pagan, para selecionar entre POLS e efeitos aleatórios, e de Hausman, para selecionar entre efeitos fixos e efeitos aleatórios. O teste de Breusch-Pagan (1971,22: p-value = 0) leva-nos a rejeitar a hipótese nula e a aceitar o modelo de efeitos aleatórios como o mais adequado para a amostra. O teste de Hausman (133,515; p-value = 0) leva-nos a não rejeitar a hipótese nula e a aceitar o modelo de efeitos aleatórios como o mais adequado à amostra em estudo. Tendo em conta a análise efetuada, é possível concluir que o modelo mais adequado para a amostra selecionada é o modelo de efeitos aleatórios. Este será, portanto, o modelo a ser utilizado para as regressões efetuadas.
4.1 Modelo de efeitos aleatórios
A Tabela 4 apresenta os resultados da amostra com-pleta e da sua separação entre empresas nacionais e estrangeiras e entre micro, pequenas e médias empresas. Na mesma tabela, apresentam-se os resultados obtidos, considerando os dois maiores setores que compõem a amostra (Indústria transformadora e Comércio por grosso). Desta forma, procura-se detetar possíveis diferenças no que toca à influência das variáveis selecionadas sobre a rendibilidade das empresas.
Variáveis | Amostra completa (n = 5667) | Empresas nacionais (n = 4523) | Empresas estrangeiras (n = 1144) | Micro empresas (n = 2738) | Pequenas empresas (n = 2002) | Médias empresas (n = 927) | Indústria transform. (n = 2041) | Comércio por grosso (n = 2208) |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | 6 | 7 | 8 | |
Const | -0,815 (***) | -0,646 (***) | -2,101 (***) | 0,265 | -0,006 | -6,156 (***) | -0,959 (***) | -1,781 (***) |
FO | 0,065 (*) | 0,005 | 0,006 | 0,221 | 0,246 (**) | -0,083 (**) | ||
DIST | -0,000 | 0,000 | -0,000 (***) | -0,000 | -0,000 | 0,000 | ||
AGE | -0,032 | -0,069 (***) | 0,036 | -0,061 (***) | -0,031 (**) | 0,011 | -0,023 | -0,074 (**) |
SIZ | 0,168 (***) | 0,142 (***) | 0,352 (***) | -0,002 | 0,020 | 0,909 (***) | 0,181 (***) | 0,326 (***) |
STD | -0,210 (***) | -0,151 (***) | -0,148 (***) | -0,272 (***) | -0,066 (***) | 0,079 | -0,116 (*) | -0,076 (***) |
LTD | -0,183 (**) | -0,070 (***) | -0,431 (***) | -0,159 (*) | -0,114 (**) | -0,732 (***) | -0,189 (***) | -0,146 (***) |
GRO | 0,001 (***) | 0,001 (***) | 0,002 (*) | 0,001 (***) | 0,001 (***) | 0,003 (**) | 0,001 (**) | 0,001 (***) |
EXP | -0,031 | -0,072 (***) | 0,096 | -0,013 | -0,015 | -0,063 | -0,065 | -0,180 (***) |
PIB | -0,000 | 0,000 | 0,000 (***) | -0,000 | -0,000 | 0,000 | ||
Overall R2 | 4% | 3% | 6% | 4% | 1% | 2% | 2% | 4% |
Notas: Variável dependente ROA. Robust standard errors (HAC).
* se p < 0,10; ** se p < 0,05; *** se p < 0,01.
Fonte: elaboração própria.
Numa visão geral (colunas 1, 2 e 3), verificamos que as variáveis que mais influenciam a variável dependente são as variáveis SIZ, STD, LTD e GRO. Ou seja, a dimensão da empresa, o seu endividamento de curto e longo prazo e a taxa de crescimento das empresas mostram exercer influência significativa sobre a rendibilidade e com os sinais esperados.
Para além disso, há variáveis que, apesar de em menor grau, também influenciam a variável dependente. Falamos das variáveis EXP e FO que apresentam significância para um intervalo de confiança de, respetivamente, 90% e 95%. Isto significa que a origem do capital estrangeiro exercerá uma influência positiva na rendibilidade das empresas (coluna 1), ao passo que a experiência internacional exer-cerá uma influência negativa (coluna 2).
Distinguindo pela dimensão, relativamente às micro-empresas (coluna 4), notamos que são várias as variáveis que se mostram significativas para o intervalo de confiança de 99%, nomeadamente AGE, STD e GRO. Isso significa que a idade da empresa, o seu endividamento de curto prazo, assim como a sua taxa de crescimento são relevantes e determinantes para a sua rendibilidade. É notável uma diferença entre os resultados apresentados na coluna 4 e na coluna 1, nomeadamente em relação à idade. Esta não tinha qualquer relevância, quando aplicado o modelo a todas as empresas, mas quando aplicado a microempresas, mostrou-se muito significativa. Nota-se também a não significância da variável EXP, o que pode dever-se ao facto deste tipo de empresas estar maioritariamente orientada para o mercado interno. Considerando agora apenas as pequenas empresas (coluna 5) notamos que, das variá-veis explicitadas, quatro revelam significância para um intervalo de confiança de 99% e duas para um intervalo de 95%. Estas são, respetivamente, DIST, STD, GRO, PIB e AGE e LTD. A distância geográfica entre o país de origem do capital e Portugal, até agora não significativa, surge agora como significativa para as pequenas empresas. A variável representativa da idade, também não significa-tiva no modelo geral, mostra-se significativa, marcando mais uma diferença entre este tipo de empresas e a generalidade. Importa também referir que as variáveis EXP e FO, representativas da experiência internacional e da natureza externa dos capitais, não se apresentam como significativas.
O grupo seguinte a analisar são as médias empresas. O modelo, quando aplicado a estas (coluna 6) demonstra que as variáveis SIZ e LTD são significativas para um intervalo de confiança de 99%. A variável GRO é relevante num intervalo de 95%. Comparando com o modelo original, notamos que existe a perda de significância estatística por parte da variável STD. Importa também referir que, tendo em conta os outros tipos de empresas, para as médias empresas é relevante a sua dimensão, enquanto uma característica como a idade, importante para as micro e médias empresas, deixa de ser relevante.
Relativamente aos resultados apresentados nas colunas 7 e 8, destaca-se o facto da variável FO ser signi-ficativa, embora com sinal negativo no setor do comércio por grosso. Esse resultado evidencia que o potencial efeito positivo do capital estrangeiro sobre a rendibilidade pode ser específico a determinados setores. Nomeadamente, tais efeitos poderão verificar-se mais na indústria do que nos serviços, por exemplo, distinguindo-se entre setores mais ou menos capital intensivos (Pacheco, 2020).
Como podemos observar na coluna 1, a variável FO_AGE é significativa para um intervalo de confiança de 99%, o que evidencia que existe um efeito moderador entre estas duas variáveis, que afeta a relação de FO com a rendibilidade. Ou seja, empresas mais velhas tendem a sentir uma influência negativa na rendibilidade, por parte da presença de capital estrangeiro na sua estrutura de capitais. Relativamente à variável SIZ (coluna 2), vemos que existe igualmente um efeito moderador da dimensão da empresa sobre a relação negativa entre FO e a rendibilidade. Nas colunas 3 e 4 podemos observar que, mais uma vez, se confirma a presença de efeitos moderadores das variáveis associadas ao endividamento sobre a relação entre FO e ROA. Finalmente, no caso da variáveis GRO (coluna 5) e EXP (coluna 6), não existe evidência da presença de efeitos moderadores. Portanto, esses resultados sugerem que a influência negativa do capital estrangeiro sobre a rendibilidade será menos acentuada nas empresas mais velhas e de maior di-mensão. Pelo contrário, empresas mais endividadas, que apresentam menores níveis de rendibilidade, registam um efeito amortecedor nessa relação negativa quando há uma maior participação de capital estrangeiro. Em resumo, as potenciais vantagens na rendibilidade deri-vadas da presença de capital estrangeiro far-se-ão sentir mais fortemente em empresas mais velhas, de maior dimensão e mais endividadas.
5. Discussão dos resultados
Após todo o processo de recolha, seleção e análise dos dados, podemos apresentar as principais conclusões, discutindo a sua semelhança com resultados expostos na literatura estudada e, ao mesmo tempo, responder às questões de investigação e às hipóteses colocadas atrás.
Começando pela variável independente, foreign ownership (FO), notamos que esta tende a não ser significativa, quer no modelo geral, quer nos modelos aplicados a micro, pequenas e médias empresas. Isso significa que a origem do investidor que domina na com-posição de capital da empresa, isto é, se o investidor e respectivo capital são nacionais ou não, não apresenta uma influência clara sobre a sua rendibilidade. Essa conclusão coaduna-se com as de outros investigadores já mencionados, nomeadamente Temouri, Driffield e Higón (2008) , Barbosa e Louri (2005) e Pacheco (2020) , estes dois últimos também em estudos com empresas portuguesas. Algumas razões que podem justificar esse resultado têm em conta a dificuldade de entrada e adaptação ao mercado nacional, assim como a inca-pacidade por parte dos capitais estrangeiros, e dos seus investidores, em imitarem as relações existentes entre as empresas, os gestores e os donos (Pacheco, 2020). Para além disso, o mercado português apresenta especificidades próprias que são a priori desconhecidas pelos investidores externos, dificultando o processo de geração de valor e de criação de riqueza (Barbosa e Louri, 2005).
Prosseguindo para as variáveis representativas da distância e qualidade das instituições, nomeadamente a distância geográfica e a diferença do PIB per capita entre o país de origem do capital e Portugal, notamos que, no modelo geral, a sua influência na rendibilidade é pouco significativa. Quando focado apenas em microempresas, a sua importância não é significativa, algo que não acontece na variável de distância geográfica aplicada às pequenas empresas, que surge como muito significa-tiva. Quando observadas apenas as médias empresas, tais variáveis apresentam resultados não significativos. Esse resultado pode ter uma explicação naquilo que é o tipo e a natureza da atividade a desenvolver. Segundo Doms e Jensen (1998) , as empresas multinacionais têm tendência a manter a parte de inovação intensiva do negócio em terras nacionais, optando por exportar para outros países as partes do negócio mais intensivas em força de trabalho, de forma a aproveitar os reduzidos custos da mão-de-obra pouco qualificada residente no país de destino.
A idade da empresa mostra-se não significativa no que concerne a sua influência na rendibilidade das PME, no modelo geral, assim como quando aplicado às médias empresas. No entanto, quando analisada à luz das micro ou pequenas empresas, notamos que a sua influência passa a ser muito significativa. Logo, é visível uma tendência decrescente na importância da idade da empresa, à medida que esta aumenta a sua dimensão. Essa tendência pode ser justificada pelo facto de, se-gundo Barbosa e Louri (2005) , as empresas mais velhas (tendencialmente de dimensão superior) não estarem a sofrer um intenso processo de autoaprendizagem no que concerne à sua forma de operar e gerir o negócio em mãos, uma característica que lhes permite obter desempen-hos superiores e atrair investimento estrangeiro de uma forma mais eficaz. Por outro lado, empresas mais novas têm que atravessar esse processo de autoaprendizagem e sofrer as consequências a estas inerentes, tornando-se este fator de idade mais relevante para empresas mais novas (e tendencialmente de dimensão mais reduzida).
A dimensão da empresa mostra-se, no modelo geral, muito significativa, o que nos diz que essa variável exerce uma forte influência na rendibilidade das PME. No entanto, quando comparada, à variável só em micro, médias ou pequenas empresas, notamos que é apenas muito significativa nas médias empresas. Isso acon-tece devido à crescente necessidade de aproveitar o seu tamanho de forma a poder compensar os custos burocráticos que advém daí (Barbosa e Louri, 2005; Bamiatzi et al., 2016), através do aproveitamento das suas capacidades superiores de gerar economias de escala e de gama (Azzam, Fouad e Ghosh, 2013), do seu acesso mais facilitado ao financiamento externo (Greenaway, Guariglia e Yu, 2014), do seu poder de negociação e da sua capacidade de levantar barreiras à entrada de nova concorrência no mercado (Pacheco, 2020).
No que toca à dívida, quer seja ela de curto ou longo prazo, mostra-se muito significativa, com sinal negativo, o que implica que estas forças influenciam fortemente a rendibilidade. Isso pode ser explicado pelo facto de o nível de dívida ditar a dependência da empresa para com o setor financeiro e o seu poder negocial aquando da negocia-ção do financiamento (Barbosa e Louri, 2005), o que afeta os custos inerentes à operação e, posteriormente, a rendibilidade empresarial. Comparando esse resultado com a análise por tipo de empresa, observamos que, para as micro e pequenas empresas, a tendência se mantém igual, o que não acontece no caso das médias empresas, dado que aí a dívida de curto prazo se torna não significativa.
Seguindo para a taxa de crescimento, observamos que, no modelo geral, a variável GRO é muito significativa. Tal tendência mantém-se para as micro e pequenas empresas, sendo que para as médias empresas essa variável é moderadamente significativa. Tal significa que a taxa de crescimento afeta de uma forma substancial a rendibilidade do tipo de empresas em estudo. Tal vai ao encontro do resultado apresentado por Barbosa e Louri (2005) .
Por último, avaliando a experiência internacional, é possível concluir que essa variável não é significativa no modelo geral. Quando aplicada por tipo de empresa, é possível verificar que também não é significativa nos três tipos de empresas.
Relativamente aos possíveis efeitos de interação e moderadores, foram quatro as variáveis para as quais se registaram tais efeitos, nomeadamente a variável representativa da idade (AGE), a variável representativa da dimensão (SIZ) e as duas variáveis representativas do endividamento de curto e longo prazo (STD e LTD). Ou seja, possíveis vantagens na rendibilidade derivadas da presença de capital estrangeiro tenderão a surgir nas empresas mais velhas, de maior dimensão e mais endividadas. Porventura, esses resultados estarão associados a cenários de reestruturação de PME, nas quais se verifica a entrada de novo capital proveniente do exterior.
Após essa análise, é possível responder às questões de investigação e hipóteses colocadas no início deste artigo. No que toca à Hipótese 1 (H1), é possível responder que a origem (estrangeira ou nacional) do capital não exerce influência significativa na rendibilidade das micro, pequenas e médias empresas portuguesas. Debruçando-nos sobre a H2, podemos também res-ponder que, segundo os dados obtidos, a influência da origem do capital é não significativa nos casos dos três tipos de empresas. Logo, não existe qualquer diferença relevante. No entanto, existem diferenças no que toca às variáveis de controlo, como já foi explicitado acima. Relativamente a H3, podemos afirmar que, segundo a amostra estudada, existem três aspetos que influen-ciam a relação foreign ownership - return on assets, nomeadamente a idade, a dimensão e as dívidas de curto e longo prazo. Finalmente, sobre H4, infelizmente, não foi possível definir tal intervalo, já que para o definir, seria necessário encontrar uma relação significativa no que toca à influência do capital estrangeiro na rendibilidade das PME portuguesas. Logo, podemos concluir que essa hipótese se torna irrelevante nos termos dos dados apresentados.
6. Conclusões
Com este artigo pretendeu-se analisar o impacto da influência do capital estrangeiro na rendibilidade das micro, pequenas e médias empresas portuguesas. Inicialmente, foi possível observar que existia uma di-visão na literatura acerca da extensão dos efeitos desta variável já que, em certos casos, seria relevante para o desempenho financeiro e noutros, seria não significa-tiva. Para além disso, fazia-se referência à possibilidade de, no caso de ser relevante, existir uma estrutura de capital ótima (ou um intervalo ótimo) que permitiria a maximização da rendibilidade supramencionada. Para dar resposta a estas questões, recolheu-se uma amos-tra de 5.667 micro, pequenas e médias empresas de origens setoriais diferenciadas. Com esta amostra, foram efetuadas diversas regressões usando o modelo de efeitos aleatórios, de forma a testar a influência da origem (externa ou nacional) do capital na rendibilidade das empresas em questão, assim como a influência de diversas variáveis de controlo, representativas de diversas características intrínsecas das empresas. Para além do modelo base, foram separadas as empresas por tipo (micro, pequena e média empresa) para avaliar de forma mais pormenorizada as influências descritas acima. Em suma, foi possível concluir que, no caso das PME portuguesas, a origem do capital não exerce qualquer influência significativa na rendibilidade das empresas. O mesmo é verdade quando as empresas são analisadas por dimensão. Na medida em que a influência descrita não se verificou, não foi possível analisar uma eventual estrutura ou intervalo de estrutura de capital estrangeiro ótima para a maximização da rendibilidade das micro, pequenas e médias empresas portuguesas, ficando esta questão específica sem resposta.
No entanto, os resultados encontrados não podem ser considerados como definitivos, dado que existiram limitações no desenvolvimento do trabalho que, de certa forma, podem ter exercido influência nos resultados. Uma dessas limitações foi a variável dependente. O ROA é apenas uma forma de medição da rendibilidade, quantificando-a numa perspetiva meramente financeira, descurando outras óticas fundamentais, como a eco-nómica ou a de mercado. No futuro, outras medidas de rendibilidade podem ser utilizadas de forma a expandir este trabalho e ampliar a análise efetuada.
Outra grande limitação prendeu-se com a amostra. Neste caso, foram utilizadas empresas de diversos setores de atividade distintos, cada um com as suas características e diferenças próprias, que produziriam resultados certamente diferenciados, caso fossem ana-lisados individualmente. Por exemplo, os resultados encontrados para o setor da indústria transformadora, em que FO exerce um efeito positivo sobre a rendibilidade, criam o interesse em aprofundar a análise para esse setor em particular. Tal abordagem setorial não é um dos objetivos neste artigo, mas pode motivar trabalhos futuros. A metodologia de análise dos dados utilizada, nomeadamente o modelo de efeitos aleatórios, consti-tuiu também uma limitação, já que os pressupostos que utilizou, assim como as suas fórmulas de cálculo, certamente provocaram resultados que seriam ligeira-mente diferentes, caso tivessem sido analisados com outros modelos econométricos, como o modelo Gene-ralized method of moments (GMM). Este caminho de adoção de diferentes modelos econométricos pode ser um fio condutor para trabalhos futuros.
A diferenciação do tipo de investimento para qual foram utilizados os capitais estrangeiros, e não só a diferenciação entre capitais nacionais ou detidos por entidades externas, tornou-se também uma limitação, já que cada tipo de investimento necessita de recursos específicos e estratégias de ação diferenciadas, que se podem refletir nos resultados apresentados pelos modelos que analisaram a amostra. Seria interessante em trabalhos futuros diferenciar entre joint-ventures, investimentos pontuais e empresas detidas totalmente por capital estrangeiro. Outro ponto de limitação que po-deria ser expandido seria também a extensão temporal da análise, já que daria a oportunidade de incorporar mais dados na amostra, tornando-a mais rica em informação. Não obstante as limitações acima apresentadas, com a realização deste artigo, foi possível compreender de forma mais aprofundada a composição e funcionamento desse tipo de empresas, assim como os diversos fatores endógenos e exógenos que influenciam uma das suas principais constituintes, a sua rendibilidade.