O Diabetes Mellitus Tipo 2 (DM2) é uma doença de alta prevalência em pessoas idosas e principal fator de risco para diversas doenças, dentre as quais, destacam-se a Insuficiência Renal Crónica 1-3, Infarto Agudo do Miocárdio 4, e Acidente Vascular Encefálico 5. Mundialmente, atinge cerca de 22,8 milhões de pessoas de 65 a 99 anos 6, constituindo-se um importante problema de saúde pública 7. Constata-se que, no Brasil, o diabetes afeta 23,5% das pessoas no grupo etário igual ou superior a 65 anos 8.
Estudos brasileiros e internacionais apontam que os cuidados requeridos por parte dos profissionais de saúde para o controle das doenças crónicas, dentre elas o DM2, são encarados como restrições à vida. Desse modo, os adoecidos "mesclam as normas do saber biomédico com as lógicas do senso comum, seguindo suas tradições, gostos, disposições, escolhas, as quais são simultaneamente singulares e compartilhadas com o grupo social" (9, p22o). Demonstram em suas práticas, portanto, haver coexistência de modelos de cuidados e tendência ao ajuste e flexibilização das prescrições médicas 9-12.
O termo gerenciamento do DM2 se refere às ações, propriamente ditas, empreendidas pelos adoecidos para controlar o diabetes e viver o mais normalmente possível e diferencia-se da adesão por ser esta última, centrada no modelo biomédico, cujo atenção está na submissão plena às regras, normas prescritas e nas ações desviantes 11. O gerenciamento da doença crónica evoca o que realmente é feito para conviver com um problema que afeta a saúde, as estratégias de cuidados utilizadas, quando e como são acessadas, e não apenas o que lhes é recomendado pelos profissionais de saúde.
O diabetes em idosos está associado a comorbidades, prejuízos funcionais e de qualidade de vida e relacionado a um risco maior de morte prematura 13. Não obstante a relevância do gerenciamento do DM2 em idosos, o conhecimento de suas práticas de cuidados e da lógica que os orientam ainda é incipiente e contribui para que muitos deles sejam estigmatizados, rotulados como rebeldes, teimosos, relaxados e relapsos devido seu "comportamento desviante" em relação às orientações emitidas pelos profissionais de saúde 10,11,14.
Focalizar no ponto de vista dos adoecidos permite maior aproximação da realidade de cuidados na velhice com cronicidade e este conhecimento pode ajudar no planejamento de ações mais efetivas com vistas a melhoria da qualidade de vida da pessoa idosa e redução de gastos com o sistema de saúde. Nessa perspectiva, o objetivo desse estudo foi conhecer as práticas de gerenciamento do diabetes mellitus tipo 2 entre pessoas idosas relacionadas ao uso de medicamentos e estilo de vida.
MÉTODOS
Pesquisa qualitativa e descritiva, integrante do projeto mais amplo que buscou identificar os significados e as práticas de cuidados entre pessoas idosas com diabetes residentes em um município do interior da Bahia. Participaram 20 idosos com diagnóstico de DM2, cadastrados e acompanhados pelo programa de prevenção e controle da Hipertensão e Diabetes (HIPERDIA) vinculado a um centro de saúde do município. Os participantes foram abordados principalmente na sala de espera do serviço e convidados a participar da pesquisa. Outros foram localizados a partir da indicação de usuários do programa e de agentes comunitários de saúde.
Adotou-se como critérios de inclusão: ter idade igual ou superior a sessenta anos, possuir diagnóstico médico de DM2 estabelecido por um período mínimo de um ano, serem cadastrados no Serviço de Diabetes e não apresentar déficit cognitivo na avaliação do Mini-Exame do Estado Mental. Visitas domiciliares foram agendadas de acordo com a disponibilidade dos idosos, ocasião em que foram preenchidos um questionário de identificação com questões sociodemográficas e relativas ao diabetes e também realizada entrevista gravada. Os participantes foram estimulados a falar sobre o tema a partir da questão norteadora: conte-me como o(a) Sr(a) cuida de seu diabetes no dia-a-dia.
Realizaram-se 20 entrevistas em profundidade, uma para cada participante, no período de setembro de 2016 a março de 2017. Para análise das informações seguiu-se as etapas da Análise Temática proposta por Bardin 15, desenvolvida nas fases de pré análise, exploração do material, tratamento dos resultados e interpretação dos resultados referentes ao uso de medicamentos e estilo de vida.
Esse estudo obteve aprovação do Comité de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, sob parecer número 1.535.559. Nomes fictícios foram utilizados a fim se manter o anonimato dos participantes.
RESULTADOS
Dos 20 idosos participantes, 3 (15%) eram do sexo masculino ei7(85%)do sexo feminino, na faixa etária compreendida entre 60 a 86 anos, predominantemente católicos. Evidenciou-se que, 12 (60%) estudaram por um período de um a quatro anos e, 5 (25%) não eram alfabetizados.
Todos residiam com seus familiares: cônjuge, mãe, filhos, irmãos, sobrinhos, nora. 13 (65%) eram aposentados e recebiam em média um salário mínimo por mês equivalente a R$9 3 7,00 no período de coleta dos dados. O tempo de diagnóstico do DM2 variou de 4 a 50 anos, com média de 19 anos, sendo que do total, 8 (40%) já tinham história familiar de DM2.
Emergiram-se duas categorias a partir dos resultados obtidos, denominadas: Gerenciando os "remédios de diabetes" e Gerenciando o estilo de vida: entre rupturas, manutenções e ajustes.
Na categoria Gerenciando os "remédios de diabetes", observou-se que os idosos consideram a administração de antidiabéticos orais fundamental no gerenciamento da doença e recebem informações rotineiras dos profissionais de saúde sobre a importância de manter a regularidade de sua administração.
Além disso, que 13 (65%) utilizavam exclusivamente antidiabéticos orais (ADO) para controlar o controle da doença, 6 (30%) faziam uso de insulina NPH associada com pelo menos um ADO e 1 (5%) controlava a doença apenas com adoção de estilo de vida saudável. Revela-se, ainda, que 14 (70%) eram hipertensos e utilizavam também medicamentos para o controle da hipertensão.
No que se refere à categoria Gerenciando o estilo de vida: entre rupturas, manutenções e ajustes, observou-se que os idosos conhecem os benefícios da atividade física para o controle da doença. No entanto, somente 4 (20%) idosos realizavam caminhada regular como uma atividade planejada. Outros participantes afirmaram que realizam as atividades físicas na dinâmica do dia-a-dia como no trabalho, lazer, e nas tarefas domésticas.
Vale ressaltar que, o centro de saúde em que os idosos estão cadastrados não dispõe de estrutura e nem planejamento para realização de atividades físicas programadas e organizadas. Apesar disso, os profissionais os estimulavam para realização de caminhadas por 150 minutos semanais em locais e horários adequados.
Outro ponto que merece destaque é a dieta para pessoas com DM2. Nesse quesito, os idosos possuem tendência ao cumprimento parcial das prescrições dietéticas do que a rejeição total. Além do mais, poucos os idosos assumiam de forma explícita para os profissionais essas práticas por medo de repreensões.
DISCUSSÃO
Gerenciando os "remédios do diabetes"
O uso de ADO constitui-se um dos cuidados contínuos no cotidiano da pessoa com diabetes. Foi considerado pela maioria dos participantes como uma ação primordial no gerenciamento do DM2, até mesmo porque é sempre enfatizado pelos profissionais de saúde nas consultas a relevância do uso diário. Desse modo, parece que, ao menos teoricamente, os idosos desta pesquisa tenham absorvido esta informação.
Observou-se que, as pessoas idosas entrevistadas, após obterem a receita e adquirirem o medicamento, iniciavam o uso com certa desconfiança, atentos às respostas corporais provocadas pelas novas substâncias ingeridas. Os "remédios de diabetes" como são genericamente chamados, impõem uma rotina de tomadas, em horários prescritos pelos médicos. Na prática, observou-se que, os depoentes não estabelecem horários rígidos de tomadas, mas se orientam pelas principais refeições, se devem utilizar antes, durante ou após as mesmas. Essa estratégia parece auxiliar a conduta diária dos idosos com a polifarmácia.
Na lógica dos entrevistados, a eficácia dos comprimidos era comprovada por sua capacidade de suprimir os incómodos como a fraqueza, visão escurecida, polifagia, polidipsia, poliuria e perda ponderal. Estas manifestações do DM2 fragilizam ainda mais o corpo envelhecido, além de afetar também a vida social e fazer surgir ou acentuar o medo da dependência em virtude das temidas complicações do diabetes. Em algumas situações, a expectativa de melhora com o uso dos remédios de diabetes" foi frustrada em parte ou totalmente, fato este confirmado ao relatarem: "Eu não estava me dando bem".
Assim, os "remédios de diabetes" foram avaliados primeiramente pela capacidade de fazer sentir-se bem, fazer dissipar desconfortos e não provocar efeitos colaterais, e de modo secundário, pelo controle glicêmico. O primeiro aspecto foi determinante para a continuidade do tratamento medicamentoso, pois, sentir-se mal com o comprimido resultou em negociação com os profissionais de saúde, abandono imediato do uso ou autoajuste. Nesse sentido, obser-va-se o corpo e as sensações corporais como mediadores na adesão dos ADO, como relatado pelos participantes:
Esse daqui [mostrando a metformins] ele [o médico] mandou eu tomar 3 vezes por dia, mas me fazia mal. Aí de manhã eu tomava metade e depois do almoço tomava metade, mas ele não tava me fazendo bem não. Eu sentia gastura no estômago. Aí o doutor falou que não é pra parar não, mas eu parei. (Dona Arlete)
Agora esse Glucobay eu não tô tomando mais não porque não me dei bem. Senti que minha barriga cresceu, cresceu... Todo mundo perguntava: o que é que tu tem que tá com esse barrigão desse jeito? E toda hora fazendo vento, toda hora, toda hora, soltando gases. Aí eu fui pra doutora e ela disse: -Ah, mas é assim mesmo! Tem que tomar o remédio. Aí eu disse: - Mas doutora como é que eu vou ficar tomando o remédio que não tô sentindo bem? Aí eu cheguei por conta própria e tirei. Assim que eu tirei, acabou. (Dona Ivone)
As comorbidades na velhice contribuem para polifarmá-cia. Uma grande quantidade de comprimidos ingeridos diariamente foi vista com desconfiança e julgamento sobre a eficácia do tratamento proposto. O sentido ambíguo dos medicamentos foi também descrito e discutido em estudo realizado entre usuários do Programa Hipertensão e Diabetes em Juiz de Fora, Minas Gerais. As pesquisadoras identificaram que a obrigação diária em virtude da necessidade de uso contínuo dos AD o e anti-hipertensivos foi avaliado negativamente pelos usuários 16.
Nesta pesquisa, os idosos, a partir de suas próprias experiências e também do saber coletivo de seu grupo de pertença concluíram que a interação dos vários fármacos utilizados produzia sensações corporais indesejáveis, deixando emergir a complexidade que envolve o uso dos medicamentos no cotidiano, conforme pode-se notar na fala deste participante:
E foi tanto remédio, remédio, remédio... Tava me fazendo mal e eu parei. Fiquei quase 2 anos sem remédio. (Sr.Adriano)
Não se trata apenas da percepção do uso excessivo de medicamentos, mas de realidade para alguns dos idosos que ingeriam de uma a duas dezenas de comprimidos diariamente. Com certa frequência, a dose do fármaco disponível na farmácia do centro de saúde é inferior a prescrita, necessitando dobrar o número de tomadas dos comprimidos para alcançar a dose prescrita. Além disso, efeitos colaterais, como o excesso de gazes e sua eliminação pública perturba a rotina, além de ser um comportamento proscrito nas regras de sociabilidade, por isso podem se tornar intoleráveis para os adoecidos e favorecer o abandono do tratamento.
Desse modo, quando prescritos os ADO, os usuários devem ser orientados quanto aos possíveis efeitos colaterais, esclarecendo-os que muitos destes desconfortos estão limitados às primeiras semanas de uso. Caso permaneçam os desconfortos, o médico deve ser comunicado e a dose ajustada ou substituído o medicamento. Mas, quando a queixa não é valorizada e o acesso à consulta médica é dificultado, existe grande chance de abandono do tratamento por parte do usuário, como pode-se notar nos depoimentos anteriores.
Existiram também, em menor proporção, relatos de pessoas idosas com DM2 e outras comorbidades, bem adaptadas aos medicamentos e cumprindo fielmente à prescrição médica, obtendo resultados positivos na funcionalidade. Mostraram que também é possível, com persistência, transpor a difícil iniciação e adaptação aos fármacos:
Problema de pressão alta, tireóide, diabetes(...) eu sou cheia de coisa! Mas isso não empata eu fazer minhas coisas não.
Tomo meus remédios direitinho. (Dona Edna)
O remédio que o médico passou, Glimeperida é forte. Quando eu tomava baixava demais, eu tremia, suava, tinha que almoçar mais cedo. Mas depois me acostumei. (Dona Mônica)
Neste estudo, dos fármacos dispensados para o controle do DM2 o mais conhecido pelos idosos foi a Metformina, recomendado pela Sociedade Brasileira de Diabetes como de primeira escolha para o tratamento do diabetes 17. Os idosos apelidavam de "o grandão", em virtude da apresentação do medicamento. O conhecimento relativo aos efeitos produzidos de emagrecimento e diarreia foi de natureza prática, mas também socialmente partilhado. Em alguns casos a perda excessiva de peso foi associada não apenas ao uso da Metformina, mas também a dieta rigorosa, culminando no abandono do tratamento:
A doutora passou um remédio pra mim (Metformine) que quase eu morro, minhas roupas estavam tudo folgada. Aí eu fiz uma dieta que ela passou e comecei a perder peso. Porque me falaram que esse remédio é pra tomar pra emagrecer. E eu emagreci mesmo! Ai eu parei de tomar e eu não voltei mais na doutora. (Dona Sofia).
Após testar e avaliar a eficácia dos medicamentos os idosos tomavam a decisão de abandonar o uso ou mantê-lo. Neste último caso, quase na totalidade, com adaptações na prescrição médica. Observou-se que mais da metade dos entrevistados ajustavam as prescrições, demonstrando a não passividade diante do tratamento prescrito. A frequência das doses e horários foram autoajustados, influenciados por múltiplos fatores de ordem biológica, so-ciocultural e económica. Lapso de memória foi reportado como um fator responsável pela adaptação dos horários, conforme descreveu a depoente:
Às vezes eu esqueço de tomar esse [Metformins] meio dia, ai tomo à noite pra não ficar sem tomar. (Dona Laura)
Vale ressaltar que no curso prolongado da doença deixar de tomar o "remédio de diabetes" pode ser uma atitude eventual, transitória ou permanente. Um estudo 18, revela que, embora a perspectiva biomédica dê suporte para as ações e os serviços de saúde que envolvem os medicamentos, seus conhecimentos muitas vezes não são suficientes quando se deseja que as intervenções promovam a adesão e o uso racional, por exemplo. As diferentes ideias e concepções de saúde, doença e cura afetam as maneiras pelas quais os medicamentos e remédios são usados e avaliados pelos indivíduos.
Gerenciamento do estilo de vida entre pessoas idosas com DM2: vivenciando rupturas, manutenções e ajustes
Viver com uma doença crónica exige mudança de comportamentos adquiridos ao longo do curso da vida. Abandonar antigos modos de levar a vida e adotar outros, considerados inicialmente não prazerosos e diferentes do modo de viver de uma pessoa "normal" (não adoecida), é uma tarefa avaliada como difícil pelos entrevistados. Para alterar o comportamento é necessário, inicialmente, a informação e a adoção de escolha pessoal consciente, estabelecer metas e prioridades. Nesse estudo, o estilo de vida saudável foi relacionado às práticas de atividade física e ao consumo alimentar, analisados na dinâmica da vida e no curso da doença.
As teorias de estilo de vida saudável sugerem que as orientações para a saúde são moldadas por importantes fatores sociais, culturais, económicos, históricos e políticos 19. Em pessoas com DM2, comportamentos desviantes dos recomendados pelas instituições biomédicas 6,17 são reconhecidos como fatores de risco para doenças cardiovasculares, as quais representam a principal causa de morte entre os adoecidos por DM2, O que justifica a ênfase na necessidade da adoção dos hábitos saudáveis.
O centro de saúde em que os idosos eram atendidos não dispunha de atividade física ou exercício físico como atividade programada ou organizada. No entanto, informaram que, durante as consultas os profissionais recomendavam e estimulavam a realização de caminhada por 150 minutos semanais, em horário e local adequado, respeitando os devidos cuidados com a alimentação, hidratação, vestuário e calçado. Portanto, ao menos no campo discursivo havia uma preocupação em combater o sedentarismo e estimular uma vida fisicamente ativa.
Os idosos entrevistados neste estudo estavam conscientes da relevância de uma vida ativa para o controle do diabetes, porém, somente 4 (20%) idosos realizavam caminhada regularmente como uma prática planejada. Alguns participantes inseriam a atividade física na dinâmica da vida, em circunstâncias de trabalho, lazer, transporte e nas tarefas domésticas, com ajustes nas recomendações biomédicas:
Ando catando latinha. Faço isso por trabalho e necessidade, o salário não dá. Mas não ando de dia não por causa do sol, vou à noite. Saio sete horas da noite ou meia noite, chego sete horas da manhã, oito horas. E isso já é uma atividade física, andando a noite toda. (Sr. Adriano)
Faço atividade física uma vez por semana no grupo da terceira idade, toda terça-feira (Dona Marta) Eu ando muito, vou pra rua não sei quantas vezes. (Dona Sofia)
Faço caminhada de segunda a sexta uma hora por dia. (Dona Mileide)
Outros 6 (30%) relataram que não realizavam atividade física por apresentar limitações decorrentes dos problemas de saúde "ossos fracos", artrose, algia, acidente vascular encefálico, doenças cardíacas e condições climáticas desfavoráveis:
Eu faço fisioterapia, pois quando tive o derrame paralisou a perna direita. Hoje já consigo andar, mas com dificuldade. (Sr. veríssimo)
Não faço atividade física porque eu sofro um 'negócio de artrose' e meu joelho não me ajuda, dói. Até comprei o simulador de caminhada, mas quando eu já caminho ou qualquer coisa assim já dói. (Dona Fátima)
Não faço atividade física por causa da perna que eu fiz cateterismo. Mas antes da cirurgia eu ia fazer caminhada todos os dias. (Sr.Pedro)
Caminhar como, se eu não consigo ficar em pé? Minhas coisas, minha comida quem faz sou eu. Mas, eu sento na cadeira pra fazer alguma coisa porque não aguento ficar em pé. (Dona Arlete)
Olha, é difícil eu fazer! Só quando eu ando daqui pra lá. Eu tava com as pernas travadas de dor. A médica disse que meus ossos estão muito fracos. Aí eu sentia muitas dores nas pernas e não podia andar. (Dona Edite)
Além da prática de atividade física, o seguimento de um plano alimentar é de extrema importância para o controle glicêmico. Para tanto, as pessoas com diabetes recebem orientação nutricional por parte da nutricionista, cujos aspectos são reforçados pelos demais membros da equipe de saúde. A alimentação saudável embora do ponto de vista biomédico, seja uma opção terapêutica benéfica, para os idosos investigados, as restrições dietéticas trouxeram impacto muito negativo, e é neste campo que as queixas são muito frequentes:
É difícil, pois tem coisa que a gente tem vontade, e não pode. (Dona Arlete)
A comida perde o sabor. (Dona Almira) Quem disse que faz uma dieta certinha, mente. (Dona Mileide)
No gerenciamento da dieta é possível notar que os idosos possuem tendência ao cumprimento parcial das prescrições dietéticas do que rejeição total a estas. Poucos dos entrevistados tem coragem frente ao profissional de saúde de assumir de forma explicita os ajustes cotidianos relacionados a alimentação, por medo das possíveis atitudes repressoras dos profissionais e serem vistos como teimosos, sujeitos a "castigos", repressões e ameaças.
Não sigo rigorosamente. No início segui muito, mas depois comecei a falhar um pouco. (Dona Elvira) Abusar eu não abuso não, agora de vez em quando dou uma puladinha, assim em um negócio diferente, a gente dá uma roubada e 'vapo' (risos). (Sr. Veríssimo)
Eu também dei uma relaxada, comi de tudo e por isso subiu mais um pouquinho porque eu tava lá na roça, comendo banana da terra, jaca dura (risos), ai ela subiu, foi pra 180. (Sr. Adriano)
Portanto, o que ficou evidente é a inexistência de um padrão fixo de comportamento e não ficou evidenciada "conversão definitiva" a um estilo de vida saudável, mas flexibilização. Os idosos entrevistados distanciaram-se das prescrições homogeneizantes e seguiram em direção às práticas mais individualizadas.
Os resultados da pesquisa mostram que no período da trajetória da doença em que se encontravam, os idosos entrevistados eram ativos no sentindo de que empreendiam ações com o objetivo de melhorar sua condição de saúde. No entanto, os cuidados adotados pelas pessoas idosas não representaram necessariamente o cumprimento rigoroso das prescrições dos profissionais de saúde, mas flexibilização destas, de acordo com o contexto so-ciocultural, económico, psicológico e do acesso a serviços e recursos necessários para o controle.
Os resultados deste estudo permitiram concluir que os idosos adotam atitudes flexibilizadoras no cuidado ao DM2. Constatou-se que o uso de antidiabéticos orais constitui-se um dos cuidados contínuos no cotidiano dos idosos. No entanto, a maioria dos participantes não são adeptos ou aderem parcialmente a outras orientações como pouca prática regular de atividades físicas e adesão parcial à dieta prescrita. Desse modo, compete aos profissionais da equipe de saúde implementar abordagens de cuidado centrada na pessoa e apoiar os usuários na tomada de decisão sobre os cuidados com a sua saúde, trabalhando na perspectiva de redução de danos ᴥ