Introdução
Uma das atividades fundamentais para o êxito dos programas nacionais de imunizações (PNI) é a adequada manutenção da cadeia de frio de conservação de vacinas, que constitui medida estratégica para a efetividade desses produtos, por meio de monitoramento adequado 1. A cadeia de frio se caracteriza pelo processo logístico, incluindo etapas de recebimento, armazenamento, distribuição e transporte de forma sistemática para assegurar a apropriada conservação dos imunobiológicos, mantendo suas características imunogênicas, desde a saída do laboratório produtor até a sua administração ao usuário 2,3.
A manutenção da cadeia de frio é considerada um dos principais entraves para os PNI em todo o mundo. Monitorar a cadeia de frio, desde o laboratório produtor até a sala de vacinação, tem exigido crescentes esforços, tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento, a fim de garantir que os usuários, em todo o mundo, recebam vacinas eficazes 4. A exposição das vacinas a temperaturas inadequadas pode ocasionar falta de proteção dos indivíduos contra doenças imunopreveníveis, causar eventos adversos indesejáveis, interferindo na adesão da população à vacinação 5, além de aumentar gastos referentes ao desperdício de vacinas com o descarte dos produtos que sofreram alterações de temperaturas 6.
A infraestrutura necessária para manter essa cadeia em funcionamento inclui equipamentos para armazenamento adequado, logística eficiente e sistemas de informações, para rastrear e coordenar os fluxos de suprimentos necessários, além de recursos humanos capacitados 7. Os recursos humanos que trabalham na sala de vacinação desempenham papel importante na manutenção da cadeia de frio, pois constituem elo entre as vacinas ofertadas e a população a ser vacinada 8.
No Brasil, compete à equipe de enfermagem, no Sistema Único de Saúde, responsabilizar-se pelas atividades na sala de vacinação, incluindo a conservação adequada das vacinas 9. Estudos realizados em regiões do país apontaram erros nesse processo de conservação que podem comprometer a qualidade das vacinas dispensadas à população. Entre as falhas detectadas, destacam-se a insuficiência no processo de supervisão pela não presença constante do enfermeiro responsável técnico na sala de vacinação e pelas lacunas no processo de educação permanente, não abrangendo as reais necessidades cotidianas da equipe de enfermagem e o cumprimento das normas técnicas do PNI 10-14.
A maioria dos estudos de abordagem quantitativa versa sobre as deficiências na manutenção da conservação de vacinas 3-10. Destarte, justifica-se a relevância de estudos de abordagens qualitativas para avançar nas questões relacionadas à subjetividade de quem vivencia o processo de conservação de vacinas e à compreensão, sob a percepção de profissionais que atuam na sala de vacinação, dos fatores que condicionam o processo de conservação.
Diante da necessidade de compreender o processo de conservação de vacinas, apresenta-se a seguinte inquietação: qual o significado da conservação de vacinas e do cuidado na sala de vacinação no cotidiano da equipe de enfermagem? O objetivo deste estudo foi compreender o significado da conservação de vacinas e do cuidado na sala de vacinação para a equipe de enfermagem de unidades de Atenção Primária à Saúde (APS).
Materiais e métodos
Trata-se de pesquisa qualitativa com abordagem da fenomenologia social de Alfred Schütz, que busca a compreensão e a interpretação dos fenômenos humanos vividos por meio das suas experiências concretas do seu cotidiano e permite ao pesquisador ir ao encontro dos sujeitos, com vistas a compreender sua intencionalidade diante da sua vivência e ressaltar a relação social como elemento de interpretação dos significados humanos 15.
Este estudo fundamentou-se em conceitos estabelecidos por Schütz 16, como o de atitude natural, que abrange como os seres humanos reagem de modo espontâneo às questões do dia a dia; o de intersubjetividade, que se refere à compreensão mútua do mundo social a partir da relação de uns com os outros perante o vivido e seus significados, contextualizados nos "motivos porque", para identificar o que levou o indivíduo a praticar tais ações, considerando sua história de vida, as experiências acumuladas e o aprendizado adquirido, e nos "motivos para", que é a significação das ações realizadas e vividas por cada um, na relação social; o de acervo de conhecimentos, que contempla os construtos do senso comum organizados a partir dos dados subjetivos, estabelecendo a estrutura conceitual e conferindo a validade objetiva do fenômeno deste estudo 17-20.
O estudo foi realizado em uma cidade da região do Campo das Vertentes, estado de Minas Gerais, Brasil, composta por 17 unidades de APS e um centro de referência técnica em imunização. Foram cenário da pesquisa cinco unidades da APS e o centro de referência técnica em imunização. De posse da lista dessas unidades, fez-se contato telefônico com os profissionais de enfermagem que executavam atividades na sala de vacinação com o objetivo de convidá-los a participar deste estudo. Foi adotada como critério de inclusão a atuação na sala de vacinação por pelo menos seis meses.
Dos 37 profissionais, 11 participaram da pesquisa, uma vez que ocorreu a saturação conceitual na 11a entrevista. O número de participantes não foi identificado a princípio, sendo evidenciada a busca pelo aprofundamento, pela abrangência e pela diversidade no processo de compreensão dos participantes 21. A quantidade de participantes foi definida por meio do adicionamento progressivo de novos profissionais até a saturação do fenômeno, alcançando a compreensão pelo seu desvelamento 16 e atingindo o objetivo proposto neste estudo.
Os depoimentos foram obtidos após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, por meio de entrevistas abertas, realizadas individualmente, em sala privativa nas unidades de saúde. O tempo médio de duração das entrevistas foi de 15 minutos.
As entrevistas foram orientadas pelas seguintes questões: 1) Como você desenvolve suas atividades, na sala de vacinação, relacionadas à conservação de vacinas? 2) Qual o significado da conservação de vacinas para você? 3) O que você espera com a conservação de vacinas? Realizou-se pré-teste do roteiro da entrevista com profissionais de outros dois municípios.
As entrevistas foram gravadas e transcritas pela própria pesquisadora, com garantia da privacidade, do anonimato e da confidencialidade das informações fornecidas. Assim, as entrevistas foram encerradas por saturação conceitual e tipificação concretizada pela significação do fenômeno abstraída da realidade, isto é, quando os discursos dos enfermeiros e dos técnicos de enfermagem mostraram convergência dos "motivos porque" e dos "motivos para", o que possibilitou a constituição do tipo vivido para compreender o significado da conservação de vacina para a equipe de enfermagem.
Os depoimentos foram analisados segundo as etapas da fenomenologia social 16,20. Após a leitura cuidadosa das entrevistas, fez-se o recorte das unidades de significados considerando a tipificação conceitual da ação, segundo Schütz 16,20. Foram identificados os núcleos de pensamento sobre a compreensão e a vivência do significado do fenômeno vivido, a conservação de vacinas, na perspectiva de enfermeiros e técnicos de enfermagem em atuação/referência técnica em sala de vacinação, expressos nos "motivos para" e nos "motivos porque". Após a análise dos aspectos significativos da conservação de vacinas para os participantes da pesquisa, emergiram as categorias Manter a conservação de vacinas é cuidar da qualidade e da segurança, Agir no presente e pensar no futuro e Sala de vacinação ideal. A discussão das categorias foi realizada com base na literatura temática, tendo como fio condutor a fenomenologia social 20.
Esta pesquisa respeitou os aspectos éticos da Resolução do Conselho Nacional de Saúde do Brasil, n.° 466, de 12 de dezembro de 2012. As entrevistas foram realizadas após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São João del-Rei, sob o Parecer n.° 4.384.650.
Resultados
Dos 11 participantes, quatro eram enfermeiras e sete, técnicas de enfermagem. Todos do sexo feminino, com idades entre 35 e 48 anos, e com tempo de atuação na sala de vacinação de dois a 14 anos. Todas as enfermeiras tinham especialização.
Após a análise dos depoimentos, emergiram categorias conceituais, compostas por meio da compreensão da conservação de vacinas para a equipe de enfermagem, desvelando o significado da realização dessa ação no cotidiano. O anonimato dos participantes foi mantido por meio da adoção da letra "E", de entrevistado, seguida de número sequencial conforme a ordem de realização. Dos resultados, surgiram as três categorias apresentadas a seguir.
Manter a conservação de vacinas é cuidar da qualidade e da segurança
Ao refletir sobre a experiência vivida, a equipe de enfermagem relatou a necessidade de um trabalho pautado na responsabilidade em manter a cadeia de frio de conservação de vacinas. Isso revela a importância de estar sempre vigilante nas temperaturas por meio de um olhar atento, da observação contínua e do cumprimento das normas técnicas para a realização de um trabalho sistematizado na sala de vacinação.
Estar sempre atento aos termômetros, verificar se não está havendo queda de temperatura, defeito no refrigerador. (E1)
Porque se a gente não ambientar esses gelox, tirar pra suar, ele não consegue atingir a temperatura desejada de +2 °C a +8 °C. (E9)
A partir do momento que a gente segue uma nota técnica, que a gente tem o respaldo na nossa mão, a gente faz um serviço legal... procura trabalhar com a consciência limpa, sabe]. É tudo mantido na forma que vem pra gente do Ministério da Saúde e nós procuramos manter essa cadeia aqui embaixo [...] a qualidade, o bom armazenamento da vacina desde o produtor até o transporte, até chegar pra gente aqui na unidade. (E4)
Nos relatos da equipe, a conservação de vacinas é considerada uma etapa essencial no processo de imunização, pois falhas podem comprometer a segurança e o objetivo da vacinação, qual seja, o de prevenir as doenças imunopreveníveis. Daí a relevância em manter o elo da cadeia de frio em todas as instâncias, principalmente na instância local, onde o ato de vacinar acontece.
Eu compreendo que é essencial, se você não armazena, não conserva de maneira correta, dentro da temperatura correta o seu trabalho foi em vão, você compromete a saúde pública, compromete a saúde das pessoas. (E7)
A conservação é a parte mais importante, porque não adianta nada eu fazer uma vacina se ela não está bem conservada. E isso para mim é primordial. (E3)
Porque se você não cuida dessa cadeia de conservação da vacina, você não vai ter um efeito eficaz [...] a gente precisa ter todo o cuidado certinho com a vacina, para que esta vacina seja administrada e tenha efeito nos pacientes. (E2)
Agir no presente e pensar no futuro
Os depoimentos expressam os objetivos que se pretendem atingir agora e em longo prazo, com a adequada manutenção da cadeia de frio, e projetam nesse cuidado empático a responsabilidade de prevenir doenças imunopreveníveis, preservando o poder imunogênico das vacinas. Expressam a consciência de sempre dar o melhor e fazer o melhor.
Porque o que eu quero para o meu filho, eu quero para o filho dos outros, entendeu? Para a mãe chegar aqui e saber que eu estou fazendo uma coisa direita no filho dela [...] e não só para ela, para nós também, porque, conforme a criança está sendo imunizada, nós também estamos sendo. (E3)
Porque se perdeu a temperatura você vai estar fazendo água na criança, não vai estar imunizando, então eu acho que todo mundo tem que ter essa consciência, que tem que estar cuidando da temperatura para estar fazendo a vacina. (E8)
Assim eu acho uma responsabilidade muito grande [...] porque o que acontece se você perder a estabilidade da vacina? Você vai dar água para criança pequena... jamais eu deixaria acontecer alguma coisa para eu dar água para criança ao invés da vacina, eu faço é com muito carinho, eu faço como se fosse para os meus filhos. (E5)
Sala de vacinação ideal
A equipe de enfermagem considera importante a aquisição de equipamentos para melhorar a estrutura física e, consequentemente, a manutenção da cadeia de frio. Melhorias estruturais são apontadas como fundamentais para prover as condições de conservação dos imunobiológicos.
Eu acho que seria importante ter outra câmara aqui, para gente poder estar dividindo mais as vacinas. (E11)
Se tivesse o gerador de energia facilitaria muito, porque quando há chuvas fortes e há queda de energia, a gente tem que se locomover muito rápido para estar colocando essas vacinas em temperaturas adequadas. (E9)
Porque aí a gente tem que montar, colocar tudo dentro da caixa, esperar chegar a temperatura da geladeira à tarde, para voltar os imunobiológicos, então se tivesse outra geladeira seria excelente no dia de limpar a geladeira que é uma vez por mês. (E8)
Então isso é um dificultador, não ter uma caixa de vacina grande, é simples, mais é primordial. (E7)
O participante da entrevista constrói um acervo de conhecimentos adquiridos ao longo do tempo que o leva a lançar expectativas para melhorias futuras.
Quando eu entrei na vacinação, eu não sabia muita coisa a respeito de vacina, mas assim, o que eu pude aprender no decorrer do tempo, sabe, melhorou bastante o serviço, e com isso a gente está tentando, cada dia, ficar melhor. (E9)
Discussão
Os depoimentos trazem vivências ricas de significado, devido ao fato de os participantes enfermeiros e técnicos de enfermagem integrarem a mesma categoria profissional com ideias e experiências convergentes. Destarte, neste estudo, são oferecidas contribuições relevantes para compreender o significado da conservação de vacinas à equipe de enfermagem e para a reflexão diante dessa prática.
O significado da manutenção da conservação de vacinas esteve sistematizado no cumprimento das normas técnicas do PNI, como a verificação contínua da temperatura. A equipe da sala de vacinação reconhece o papel fundamental que exerce na vigilância das temperaturas recomendadas para a conservação das vacinas. Esse olhar atento remete ao conceito estabelecido por Schütz como atitude natural e intersubjetividade, em que o ser humano reage de modo espontâneo às questões do cotidiano e compartilha o mesmo tempo e espaço em uma relação de uns com os outros, por meio da compreensão mútua 17. Com isso, os profissionais da equipe de enfermagem dão significado à manutenção da conservação de vacinas como algo inerente à sua prática e responsabilidade diárias.
Em um scoping review, para examinar os resultados de estudos de monitoramento mais recentes sobre temperaturas de congelamento, dentro da cadeia de frio, evidenciou-se a importância do monitoramento contínuo de temperatura em comparação com o controle menos rigoroso 22.
Sabe-se que é de extrema importância manter a cadeia de frio devido à possibilidade de congelamento ser uma ameaça real à integridade das vacinas 23 e, com isso, a exposição de vacinas a temperaturas abaixo das recomendadas e sua administração à população podem estar associadas à presença de surto de doenças 22. Estudo identifica que a exposição frequente das vacinas a temperaturas abaixo de zero durante o transporte,juntamente com a conduta pouco frequente sobre o teste de agitação por parte dos profissionais, aumenta a chance de utilização de vacinas com menor potência 24.
Percebe-se que a equipe de enfermagem, a partir do acervo de conhecimento, busca nas suas experiências e no seu conhecimento adquirido, ao longo de sua trajetória, o auxílio para suas condutas diárias. As trocas de experiências no cotidiano de trabalho aumentam a bagagem de conhecimentos da equipe e evidenciam a importância do aprendizado uns com os outros, além do conhecimento adquirido por meio de manuais e normas técnicas, para um respaldo legal das atividades desempenhadas diante da conservação das vacinas.
A partir dos depoimentos da equipe de enfermagem, foi evidenciando-se a importância da cadeia de frio para manter o poder imunogênico das vacinas e, assim, conferir imunidade às pessoas:
A gente tem que procurar vacinar a pessoa e imunizar. (E9)
Nesse sentido, a enfermagem estabelece seu papel diante da ação social de cuidar das pessoas por meio de uma relação social efetiva 25, manifestada pelo desejo de ofertar aos pacientes vacinas na sua máxima potência. A equipe de enfermagem desenvolve as ações de conservação de vacinas com empatia, ao querer, para o filho do outro, o que vislumbra para o seu. A relação social permite que uma pessoa atinja, por meio da experiência direta com o outro e do compartilhamento do mesmo tempo e espaço, a consciência mútua entre esses indivíduos 17.
Os entrevistados fazem uma analogia da vacina malconservada com a água, representando a perda do poder imunogênico e, consequentemente, o comprometimento da imunização futura. As vacinas são produtos biológicos, sensíveis às alterações de temperaturas, sendo necessária a manutenção adequada da cadeia de frio, pois o não cumprimento dessa prática pode comprometer a imunização do paciente e, como consequência, o controle das doenças imunopreveníveis 1, além de causar eventos adversos. Além disso, vacinas malconservadas não são identificadas por alterações nas suas características físicas. Isso indica que, em muitos casos, a diminuição da potência desses produtos pode passar despercebida, quando a monitorização contínua não for realizada 22, e comprometer a proteção das doenças às quais se destinam, quando administradas aos pacientes 26.
Em estudo realizado nos Estados Unidos, no qual se pesquisou o banco de dados do Vaccine Adverse Event Reporting System, de 2008 a 2012, sobre notificações de vacinas mantidas fora das temperaturas recomendadas, identificaram-se 476 relatos, sendo que a maioria (96 %) deles descreveu o envolvimento de vários pacientes que receberam essas vacinas potencialmente comprometidas. Além disso, foram relatados 32 eventos adversos, sendo dois relatos de pacientes que contraíram doenças após serem vacinadas, o que indica possível falha na vacina 6.
O armazenamento e o manuseio adequados de vacinas representam responsabilidade coletiva, o que requer manejo atento desde o ponto de fabricação até a administração da vacina ao paciente 6. Nesse sentido, os motivos relacionados com as expectativas (motivos para) foram evidenciados pela preocupação em oferecer vacinas de qualidade para manter a imunidade coletiva:
Porque, na medida em que a criança está sendo imunizada, nós também estamos sendo. (E3)
A vacinação, além de fornecer proteção individual, fornece proteção indireta à população, reduzindo o grupo de indivíduos suscetíveis, o que é conhecido como efeito rebanho ou imunização coletiva. Entretanto, para que isso ocorra, é crucial o alcance de altas coberturas vacinais, além da boa efetividade da vacina 27, a qual é garantida pela manutenção da temperatura de acordo com o fabricante.
Apesar do reconhecimento da importância das atividades para manter a cadeia de frio, a equipe reconhece a necessidade de uma adequada estrutura para alcançar uma efetiva conservação das vacinas. Muitos dos equipamentos, em uso nas cadeias de abastecimento de vacinas, foram projetados há décadas, sendo questionadas sua confiabilidade e eficiência, pois, mesmo estando em funcionamento, seu desempenho é limitado 7,28. Os entrevistados revelaram projetos e expectativas diante da aquisição de equipamentos para melhorar a estrutura física das salas de vacinação, o que beneficiaria as condições de conservação e armazenamento dos imunobiológicos.
Melhorias estruturais são essenciais para a adequada conservação das vacinas. Assim como em outros estudos, no município estudado e em vários países, a geladeira tipo doméstica ainda é o equipamento utilizado para a conservação das vacinas nas salas de vacinação, por serem mais baratas, amplamente disponíveis e facilmente adquiridas 1,28. Entretanto, o uso desse equipamento, ao invés da câmara refrigerada, está associado a maior ocorrência de congelamento devido às oscilações de temperaturas 1,29.
Os resultados de estudos anuem à recomendação da substituição do refrigerador tipo doméstico por câmaras refrigeradas em todas as salas de vacinação 23,30. No Brasil, desde 2013, há recomendação para que haja, em menor tempo possível, a substituição da geladeira tipo doméstica por câmara refrigerada nas salas de vacinação 2. As tecnologias modernas oferecem mais confiabilidade com menores custos de operação e manutenção ao longo da vida útil dos equipamentos 7.
Um estudo realizado em Gojam, na Etiópia, evidencia que a maioria das câmaras refrigeradas em uso nas unidades de saúde tem capacidade insuficiente, e os equipamentos de uso diário nas salas de vacinação são incompletos. Porém, elas são de extrema necessidade para manter a cadeia de frio segura e eficaz, mantendo a qualidade dos imunobiológicos administrados pelos profissionais 31.
Cabe ressaltar que a aquisição de equipamentos traduz as expectativas dos profissionais na melhoria do serviço no cotidiano de trabalho na sala de vacinação e do serviço prestado à população 8. A necessidade percebida pelos entrevistados deste estudo encontra-se na ação social e pode ser interpretada como uma conduta humana estabelecida de forma intencional e autoconsciente, derivada da subjetividade, conduzindo ações de melhoria da realidade cotidiana 18.
Condicionalmente, a possibilidade de abertura a novos problemas e a construção de conhecimentos 18, em atuação na sala de vacinação, oferece graus de rigidez e é menos flexível, devido às normativas estabelecidas para a manutenção da cadeia de frio e a preservação da capacidade de imunogenicidade das vacinas. Assim, o mundo vivido na sala de vacina é repleto de rotinas, normas e ações sistematizadas para promover a condição segura tanto do profissional quanto do usuário.
O estudo apresenta como limitação a amostra intencional conferida pela participação de profissionais de um cenário, o qual foi selecionado de forma intencional pela proximidade de locomoção da pesquisadora para a coleta de dados.
Conclusões
A equipe de enfermagem tem um olhar atento à conservação de vacinas e percebe a importância de manter a cadeia de frio de conservação das vacinas, em todas as instâncias, e ressalta a necessidade do trabalho sistematizado, pautado na responsabilidade e na cumplicidade entre a equipe. O cuidado empático apresenta-se como ferramenta indispensável do profissional de enfermagem, ao se colocar no lugar do outro para, assim, ofertar vacinas e realizar a imunização com qualidade, a fim de prevenir doenças.
Por se tratar de abordagem compreensiva, que se apropriou da fenomenologia social, este estudo traz valiosas contribuições para a enfermagem ao desvelar que a conservação de vacinas se significa e ressignifica em sua implementação no cotidiano dos profissionais pela "consciência" dessa manutenção para a efetividade da vacinação. Aponta que fragilidades estruturais podem comprometer a manutenção dessa cadeia de frio, como evidenciado na problematização da introdução deste artigo.
Os aspectos levantados devem subsidiar ações para a construção de estratégias que modifiquem essa realidade e promovam melhores condições de trabalho e consequente melhoria na conservação dos imunobiológicos nas unidades de APS.