INTRODUÇÃO
A hospitalização é uma condição na qual a criança encontra-se vulnerável e fragilizada, o que demanda suporte emocional efetivo, sobretudo, o apoio da família1. Porém, este processo também causa estresse, angústia e sofrimento para a família, principalmente, quando diversos procedimentos invasivos e potencialmente dolorosos são realizados na criança.
Dentre estes, destaca-se a cateterização intravenosa periférica (CIP), intervenção mais realizada em unidades pediátricas devido a seu baixo custo, facilidade de manuseio do cateter e tempo para a execução da técnica2-4.
Esta intervenção também é usualmente executada em crianças hospitalizadas para a implementação da Terapia Intravenosa (TIV), objetivando a expansão de volume, infusão de soluções eletrolíticas e glicofisiológicas, medicamentos, nutrientes, contrastes e hemocomponentes, visando sua recuperação clínica ou mesmo coletar amostras sanguíneas para a realização de exames laboratoriais.
Entretanto, no cenário do cuidado pediátrico, a CIP pode não ser bem-sucedida na primeira tentativa de realização, demandando 2 ou mais tentativas, ocasionando dor e estresse para a criança5, reconhecido pelo medo, susto, choro, palidez, transpiração, lábios cerrados, tensão muscular, dentes apertados e abertura intensa dos olhos6, antes e após a intervenção.
Os familiares também são emocionalmente afetados, ficando geralmente nervosos e abalados com as reações de sofrimento apresentadas pela criança, além de se sentirem arrasados perante a situação presenciada7. Ao perceberem o temor e apreensão da criança8durante a CIP, os familiares reagem à situação apresentando medo, ansiedade e irritação, por presenciar o seu sofrimento. Tais sentimentos também decorrem do pensamento de que a criança sentirá dor durante a CIP, querendo estar no lugar dela e ajudá-la a enfrentar o momento8.
As diversas tentativas de CIP, também podem elevar a frequência cardíaca e a pressão arterial dos familiares e, consequentemente, seus níveis de ansiedade9.
Durante a CIP, dependendo do grupo etário da criança, os familiares podem apresentar diversos comportamentos10. Familiares de pré-escolares tranquilizam mais a criança, por meio de informações sobre os passos do procedimento, enquanto ele acontece, como comunicar seu início ou término, momento em que a agulha é inserida e o tipo de sensação prevista. Eles também, afirmam para a criança que o procedimento ou sensações previstas e prováveis não acontecerão. Estes familiares confortam mais a criança, quando comparados aos de escolares. Acompanhantes de crianças em fase escolar, apresentam comportamentos como tocá-la e distraí-la com outros assuntos10.
Uma pesquisa realizada com nove cuidadores de crianças com câncer em tratamento quimioterápico no ambulatório de um hospital especializado no tratamento de doenças crônico-degenerativas11, localizado em Belém-Pará, verificou que a utilização do “Manual de orientação para cuidados de crianças sobre punção venosa”auxiliou o cuidador a ter mais conhecimento sobre esta intervenção e ocorreram mudanças comportamentais em curto prazo, sendo que os cuidadores interagiram mais com a criança durante a cateterização, mas não foi observado efeito de controle sobre o distresse comportamental da criança.
Outras pesquisas observaram que as reações das crianças dependem da forma pela qual seus familiares reagem12-13 a procedimentos invasivos. Destaca-se que a comunicação e o diálogo dos familiares com criança durante a CIP, contribui para a redução do estresse, sendo primordial que ela seja acompanhada durante esta intervenção por pessoas que estão presentes na sua rotina diária, para assim, sentir-se segura1.
Familiares que permanecem com a criança durante a realização de procedimentos hospitalares, a exemplo da CIP, apresentam maior nível de conforto, ficam mais calmos e menos chateados com esta intervenção14, protege a criança15-16 e na sua perspectiva, influencia na qualidade do cuidado16, serão informados sobre o que está ocorrendo, deixando-os mais seguros e confiantes16-17.
No entanto, alguns familiares podem não desejar estar presentes durante a CIP, pois afirmam que o sofrimento manifestado por eles podem ser transmitidos para a criança e atrapalhar o profissional responsável pela intervenção8.
Os sentimentos e comportamentos apresentados pelos familiares, podem ser decorrentes da ausência de conhecimentos sobre a CIP, no que se refere a sua indicação, etapas para a sua realização e como podem colaborar com os profissionais de saúde durante este processo, demandando adequada orientação sobre esta intervenção.
Portanto, é primordial inserir a filosofia do Cuidado Centrado na Família (CCF), nas unidades hospitalares, por reconhecê-la como elemento central na vida da criança e estimulá-la a ser cuidadora durante a hospitalização. Esta filosofia centra-se na parceria entre os prestadores de cuidados de saúde e os membros da família18.
Tal filosofia de cuidado potencializa uma atmosfera de respeito mútuo, comunicação aberta e colaboração, diminuindo a intensidade do estresse e ansiedade familiar, aumentando a sua satisfação e o relacionamento com os profissionais de saúde18-19.
No contexto da CIP em crianças hospitalizadas, os profissionais de saúde podem fundamentar sua prática clínica diária nas premissas do CCF, com destaque para a dignidade e respeito, compartilhamento de informações, participação e colaboração20, utilizando cartilhas educacionais como estratégias de envolvimento do familiar no cuidado, por ser de baixo custo e de fácil acesso.
A utilização destes recursos educacionais na prática clínica diária pode contribuir com a educação em saúde dos familiares, proporcionando informações adequadas sobre a CIP. Também, recursos educacionais impressos podem ser lidos em qualquer momento da hospitalização da criança, conforme necessidade do familiar por informações e sua motivação.
Para a utilização destes recursos educacionais impressos é preciso realizar o processo de validação por profissionais com experiência na temática, a fim de verificar a confiabilidade do conteúdo apresentado, certificando-se da compreensão do material21-22. Entretanto, no contexto brasileiro, é incipiente a produção do conhecimento sobre a elaboração e validação de cartilhas contendo informações sobre a CIP em crianças, para uso de familiares.
Isso posto, questionou-se: como elaborar uma cartilha para familiares acompanhantes de crianças com necessidade de CIP? Quais são as propriedades psicométricas desta cartilha, no que se refere ao conteúdo e à aparência, segundo avaliação de juízes especialistas?
Por isso, esta pesquisa objetivou elaborar e validar o conteúdo e a aparência da cartilha intitulada “Punção venosa periférica para família” junto a juízes especialista da área pediátrica.
MATERIAIS E MÉTODOS
Tratou-se de pesquisa metodológica, descritiva e exploratória, do tipo elaboração e validação de cartilha, que ocorreu no período de outubro de 2014 a junho de 2016. Para a construção da cartilha foram utilizadas as seguintes etapas: diagnóstico situacional, levantamento bibliográfico, seleção e sumarização do conteúdo, elaboração do texto, criação das imagens e diagramação23, 24.
A etapa “diagnóstico situacional” foi realizada no período de outubro a dezembro de 2014 com 13 familiares de crianças hospitalizadas em unidade de clínica cirúrgica de um hospital pediátrico da Bahia, selecionados mediante os seguintes critérios de inclusão: acompanhar crianças de 6 a 10 anos de idade; ter presenciado duas ou mais CIP na criança na hospitalização atual; ter condições para desenhar e compreender as perguntas da entrevista.
Não foram incluídos nesta etapa familiares acompanhantes de crianças em condições de isolamento ou de crianças que agravaram o quadro clínico durante a coleta dos dados. Nenhum dos participantes selecionados foram excluídos da pesquisa.
Nesta etapa inicial, os dados foram coletados por meio da utilização da técnica projetiva do desenho-estória com tema e de entrevista semiestruturada. No primeiro momento, foi solicitado para os participantes realizar um desenho livre para facilitar a aproximação do pesquisador e a seguir, foi solicitada a realização de um desenho que mostrasse uma criança sendo submetida a CIP e a reação de seu acompanhante.
Em seguida foi solicitado que ele contasse uma estória sobre o desenho e colocasse um título para ambos. Nesta etapa utilizou-se um roteiro para nortear a execução do desenho-estória25.
No segundo momento, foi realizada a entrevista com auxílio de um roteiro que continha os seguintes elementos: dados de identificação do entrevistado (código, idade, sexo, raça/cor, grau de parentesco com a criança) e as seguintes questões norteadoras: como você se sente ao presenciar a punção venosa da criança que você acompanha? O que o (a) senhor (a) faz para apoiá-la e diminuir o estresse dele e do (a) senhor (a) durante este procedimento? O que você gostaria de falar para os familiares de outras crianças que serão submetidas à punção venosa periférica? As entrevistas foram analisadas à luz da Teoria Fundamentada nos Dados (TFD)26-27.
Ao analisar as entrevistas, emergiu-se o fenômeno central denominado “Sofrendo durante a punção intravenosa: um sentimento que fortalece e mobiliza a família para ajudar a criança”. Neste movimento, a experiência do familiar que acompanhou a CIP foi representada por três categorias analíticas denominadas: sofrendo durante a CIP, estando junto com o filho e aliviando o sofrimento durante a CIP, interligadas às suas subcategorias, para melhor explicação das causas e consequências do fenômeno central.
A categoria “sofrendo durante a CIP” formou-se subcategorias: “Sentindo medo da CIP”, “Sentindo-se triste durante a CIP”, “Chorando com a criança”, “Chorando a dor da criança”, “Vendo o sofrimento da criança”. “Estando juntocom o filho” emergiu das subcategorias “Tendo fé em Deus”, “Confiando no profissional” “Reconhecendo a importância do procedimento”. As subcategorias “Dando carinho para a criança”, “Fiando calma durante a CIP” formaram a categoria “Aliviando o sofrimento durante a CIP”.
Esses dados permitiram compreender a experiência do familiar que presencia a realização da CIP na criança, extraindo-se os sentimentos e as estratégias utilizadas para amenizar o seu desconforto, e desse modo, embasaram-se a elaboração do roteiro para a construção da cartilha.
Após a análise diagnóstica, realizou-se, no período de janeiro a junho de 2015, a coleta de artigos científicos sobre a experiência de familiares durante a CIP em crianças, no que se refere a seus sentimentos e estratégias utilizadas para aliviar o estresse durante a intervenção. Foram consultadas as bases de dados Science Direct, Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), National Library of Medicine (PubMed) e Web of Science, utilizando os seguintes descritores de saúde: enfermagem pediátrica, criança hospitalizada, relações familiares, cateterismo periférico e infusões intravenosas. Na referida busca, não foi estabelecido recorte temporal para a seleção dos artigos científicos, sendo encontrados e lidos integralmente 16 artigos.
Foram consultados, também, livros textos da área de enfermagem pediátrica, objetivando encontrar informações sobre o conceito, indicações da CIP e como é realizado o procedimento propriamente dito.
No período de julho a dezembro de 2015, foi elaborada a primeira versão da cartilha, com apoio dos relatos de familiares da fase de diagnóstico situacional e das informações extraídas dos artigos científicos selecionados. O conteúdo da cartilha, apresentado na seção resultados, foi elaborado pelos autores e as ilustrações foram criadas por um profissional de design e aprovadas pelos pesquisadores. A estruturação da cartilha foi realizada por meio do programa CorelDraw 15.0.
Após a construção da cartilha, iniciou-se a etapa de validação de conteúdo e aparência, no período de fevereiro a junho de 2016, utilizando a técnica Delphi com juízes selecionados por meio dos seguintes critérios de inclusão: ser profissional envolvido na gerência, ensino, pesquisa e assistência em enfermagem pediátrica; ter experiência mínima de um ano e ter experiência na inserção de cateteres venosos periféricos em crianças hospitalizadas. Utilizou-se o método de amostragem não probabilística e intencional, consultando o currículo Lattes dos prováveis juízes especialistas, conforme critérios de elegibilidade estabelecidos.
Os participantes foram convidados via correio eletrônico, sendo enviadas cartas-convites explicando o desenvolvimento da cartilha, o método adotado para a avaliação de seu conteúdo e aparência, além do objetivo da pesquisa e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Foram convidados 44 especialista da temática, dos quais sete concordaram em participar da pesquisa, não sendo realizado o cálculo amostral. A realização do estudo com esse quantitativo de juízes, pode-se justificar que, ao verificar pesquisas nacionais relacionadas a elaboração e/ou validação de recursos educacionais, viu-se que o número de juízes especialistas variavam de 5 a 3321-23,28-37, no entanto, para uma boa avaliação necessita-se observar a qualidade dos avaliadores, não havendo quantidade pré-estabelecida pela literatura38.
Mediante aceitação em participar da pesquisa foram encaminhados via correio eletrônico: a cartilha e o instrumento de validação. O instrumento de coleta de dados continha dados sobre a caracterização dos juízes especialistas (sexo, idade, titulação acadêmica, tempo de formação, tempo de atuação em pediatria e áreas de atuação) e os seguintes critérios para a validação da cartilha: conteúdo (05 itens), linguagem (03 itens), ilustração (05 itens), layout (07 itens), motivação (03 itens), cultura (02 itens) e aplicabilidade (05 item)28,30-31.
Na avaliação de cada um destes critérios, os juízes poderiam emitir as seguintes respostas: concordo fortemente, concordo, discordo, discordo fortemente e não sei. O instrumento continha espaço para os juízes acrescentarem suas sugestões para aprimorar a cartilha.
Os dados foram tabulados no software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 22.0, sendo analisadas as frequências absolutas e relativas referentes a caracterização dos juízes participantes. Calculou-se o Índice de Validação de Conteúdo (IVC) através de duas equações matemáticas denominadas: o I-CVI (item-level content validity índex) e o S-CVI/Ave (scale-level content validity index)39.
O I-CVI (Índice de Validação de Conteúdo) foi realizado para calcular os índices de cada item das categorias avaliadas pelos juízes (conteúdo, linguagem, ilustração, layout, motivação, cultura e aplicabilidade) por meio da divisão entre as respostas concordo mais concordo fortemente pelo número total de participantes. Outro índice calculado foi o S-CVI/Ave que correspondeu a média dos I-CVI dos itens que compõem cada categoria. Também, realizou o S-CVI Global (Índice Global de Validação de Conteúdo), o qual consiste na soma de todos os I-CVI dividido pelo número total de itens avaliados33.
Para a validação da cartilha, considerou-se como índice desejável para cada tipo de IVC avaliado (I-CVI, S-CVI/Ave e S-CVI Global), valores iguais ou superiores a 0,8040, alcançando-o na primeira rodada de avaliação.
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética na Pesquisa da Universidade Estadual de Feira de Santana (CAEE de número 34172014.7.0000.0053 e Parecer número 841612).
RESULTADOS
A cartilha foi intitulada “Punção venosa periférica para família” (Figura 1) e sua primeira versão foi organizada em 19 páginas. Foram criados cinco personagens para a apresentação do conteúdo da cartilha, sendo dois familiares, duas crianças e uma enfermeira.
Em suas partes iniciais, a cartilha possui capa, apresentação do material e mensagem para os familiares leitores. Nas páginas seguintes, é apresentado o seu conteúdo propriamente dito, contendo a conversa dos familiares sobre suas experiências durante a CIP nas crianças (páginas 03 à 05), conversa da enfermeira com os familiares (páginas 06 à 08), orientação da enfermeira aos familiares sobre veia, cateter e motivos da realização da CIP (páginas 09 à 11), orientações da enfermeira sobre as etapas da CIP (páginas 12 à 13) e estratégias para minimizar o estresse do familiar durante a CIP (páginas 14 à 17). No final da cartilha foi disponibilizado um espaço para os familiares desenharem e/ou escreverem seus sentimentos vivenciados durante a CIP realizada na criança hospitalizada.
Após a sua construção, o material foi submetido a validação de conteúdo e aparência. Participaram do grupo de experts sete juízes, todos foram do sexo feminino, enfermeiras, sendo cinco mestres, uma doutora e uma especialista, que atuavam no campo do ensino, assistência, pesquisa e extensão da área pediátrica. O tempo máximo de formação foi de 19 anos e o mínimo um ano. A média de tempo de atuação na área pediátrica foi de 5,33 anos (DP= 3,4), sendo a mínima de 1 ano e a máxima de 24 anos.
A média de idade dos participantes do estudo foi de 32,4 anos (DP = 6,1), a mínima foi de 26 anos e a máxima de 42 anos. A média de tempo de formação profissional dos especialistas foi de 7,86 anos (DP = 6,5), tendo como tempo mínimo de formação profissional 1 ano e no máximo 19 anos.
Nas Tabelas 1 e 2, estão representados os valores do I-CVI e o S-CVI/Ave de cada critério validado. A cartilha foi validade quanto ao seu conteúdo e aparência na primeira rodada de avaliação¸ obtendo S-CVI global de 0,98.
Variáveis | Páginas 03 e 05 | Páginas 06 à 08 | Páginas 09 à 11 | Páginas 12 à 13 | Páginas14 à 17 | S-CVI/Ave** |
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|
||||||
I-CVI* | I-CVI* | I-CVI* | I-CVI* | I-CVI* | ||
Conteúdo | 0,98 | |||||
O conteúdo está correto cientificamente | 1,0 | 1.0 | 1,0 | 1,0 | 1,0 | |
O conteúdo está apropriado ao público-alvo | 1,0 | 1.0 | 1,0 | 1,0 | 1,0 | |
O conteúdo é suficiente para atender às necessidades do público-alvo | 1,0 | 1,0 | 1,0 | 0,85 | 1,0 | |
A sequência do texto é lógica | 1,0 | 0,85 | 1,0 | 1.0 | 0,85 | |
A apresentação do conteúdo favorece a aprendizagem da temática | 1,0 | 1,0 | 1,0 | 1.0 | 1,0 | |
Médias dos I–CVI para conteúdo | 1,0 | 0,97 | 1,0 | 0,97 | 0,97 | |
Linguagem | 1,0 | |||||
O estilo da redação é compatível com o público-alvo | 1,0 | 1,0 | 1,0 | 1,0 | 1,0 | |
A escrita utilizada é atrativa | 1,0 | 1,0 | 1,0 | 1,0 | 1,0 | |
A linguagem do texto é clara e objetiva | 1,0 | 1,0 | 1,0 | 1,0 | 1,0 | |
Médias dos I–CVI para linguagem | 1,0 | 1,0 | 1,0 | 1,0 | 1,0 | |
Ilustração | 0,99 | |||||
As ilustrações são pertinentes com o conteúdo do material e elucidam o conteúdo | 1,0 | 1,0 | 1,0 | 0,85 | 1,0 | |
As ilustrações são claras e transmitem facilidade de compreensão | 1,0 | 1,0 | 1.0 | 1,0 | 1.0 | |
As ilustrações possuem qualidade gráfica | 1,0 | 1,0 | 1.0 | 1,0 | 1.0 | |
A quantidade de ilustrações está adequada para o conteúdo do material educativo | 1,0 | 1,0 | 1.0 | 1.0 | 1.0 | |
A presença de cada uma das figuras na cartilha é relevante | 1,0 | 0,85 | 1,0 | 1,0 | 1.0 | |
Médias dos I–CVI para ilustração | 1,0 | 0,97 | 1,0 | 0,97 | 1,0 |
*I-CVI - item-level content validity índex
**S-CVI/Ave - scale-level content validity index
Variáveis | I-CVI* | S-CVI/Ave** |
---|---|---|
Layout | 0,93 | |
O tipo de letra utilizado facilita a leitura | 1,0 | |
As cores aplicadas ao texto são pertinentes e facilitadoras para a leitura | 0,85 | |
A composição visual está atrativa e bem organizada | 0,85 | |
O formato (tamanho) do material educativo e o número de páginas estão adequados | 1,0 | |
A disposição do texto está adequada | 0,85 | |
O tamanho das letras dos títulos, subtítulos e texto é adequado | 1.0 | |
O tamanho da cartilha está adequado | 1,0 | |
Motivação | 1,0 | |
O conteúdo está motivador e incentiva prosseguir a leitura | 1,0 | |
O conteúdo despertou o interesse do leitor | 1,0 | |
O conteúdo poderá atender às dúvidas, esclarecer e educar o familiar quanto a punção venosa e estratégias para minimizar o estresse decorrente do procedimento | 1,0 | |
Cultura | 1,0 | |
O texto está compatível com o público-alvo, atendendo aos diferentes perfis dos usuários | 1,0 | |
A cartilha está indicada para uso como recurso no preparo de familiares hospitalizadas para a punção venosa periférica. | 1,0 | |
Aplicabilidade | 1,0 | |
A cartilha possui aplicabilidade prática | 1,0 |
*I-CVI - item-level content validity índex
**S-CVI/Ave - scale-level content validity index
Todos os critérios julgados obtiveram I-CVI e o S-CVI/Ave dentro do parâmetro previamente estabelecido (Tabelas 1 e 2). Apesar de a cartilha apresentar elevado S-CVI global, alguns juízes sugeriram algumas alterações, dentre elas correções ortográficas e síntese de discursos repetitivos, que foram acatadas. Outras sugestões foram feitas pelos juízes especialistas e são apresentadas na discussão dos resultados.
Parte da cartilha | Conteúdo apresentado |
---|---|
Capa | Imagem da enfermeira realizando a CIP na criança com um familiar observando, e o título da cartilha. |
Apresentação da cartilha | Contém a apresentação do projeto que deu originou a proposta da cartilha e o objetivo. |
Mensagem para os familiares | Contém os motivos que instigaram o desenvolvimento do material educativo com o intuito de promover a segurança do familiar durante a realização da CIP em crianças ao produzir redução do estresse. |
Conversa dos familiares sobre suas as experiências durante a CIP nas crianças (páginas 03 à 05) | Diálogo entre dois familiares sobre os seus sentimentos negativos manifestados durante a realização da CIP nas crianças. |
Conversa da enfermeira com os familiares (páginas 06 à 08) | Avaliação da enfermeira da CIP da criança, a qual percebe a perda do acesso, sendo necessária a realização do procedimento. Com isso, o familiar manifesta sentimentos negativos sobre a CIP e sugere conhecer mais sobre a temática. |
Orientação da enfermeira aos familiares sobre veia, cateter e motivo da realização da CIP nas crianças (páginas 09 à 11) | Através da sugestão do familiar, a enfermeira desenvolve uma educação em saúde sobre a CIP, apontando conceitos sobre elementos que envolve a realização desse, como a definição de veia, cateter e qual a finalidade de realização do procedimento, com ilustração de cada um desses. |
Explicação da enfermeira sobre o passo a passo da CIP para os familiares (páginas 12 à 13) | Apresentação do passo a passo da CIP com explicação e ilustração de cada etapa e dos materiais necessários para a realização do procedimento. |
Estratégias para minimizar o estresse do familiar durante a CIP da criança (páginas 14 à 17) | Lista de estratégias que podem ser adotadas pelos familiares antes, durante e após CIP, sendo essas sugeridas pelos familiares da fase diagnóstica do estudo. |
Espaço para a realização de desenhos ou escrita dos sentimentos vivenciados pelo familiar durante a CIP | Contém um espaço interativo com os familiares, os quais podem manifestar seus sentimentos através de desenho e/ou escrever algo, que pode ser utilizado como método de intervenção para o cuidado.. |
Não foi necessária nova rodada de validação porque as sugestões foram prontamente realizadas e não demandaram nova avaliação dos juízes. Destaca-se, também, o elevado S-CVI global a cartilha, na primeira rodada.
DISCUSSÃO
Este estudo desenvolveu e avaliou, quanto a validade de aparência e conteúdo, a cartilha “Punção venosa periférica para família”, juntamente, com juízes especialistas, através da técnica Delphi.
A referida cartilha pode ser considerada como inovação tecnológica no país, tendo em vista que, embora o preparo da família para procedimentos invasivos, a exemplo da CIP, apresenta interesse de pesquisadores nacionais, foram encontradas duas tecnologias contendo este conteúdo8,11.
A cartilha foi validada na primeira rodada de avaliação dos juízes, com S-CVI global de 0,98, parâmetro este semelhante ao encontrado na validação de outros recursos educacionais impressos brsaileiros, que variou de 0,87-0,9823,32-36.
No entanto, alguns estudos demonstram que para a validação de recursos educacionais impressos é necessária a realização de duas ou mais rodadas, dependendo do nível de consenso adotado pelos autores21-22, 31.
No Brasil foi possível observar outras pesquisas metodológicas do tipo construção e validação de conteúdo e aparência de recurso educativos impressos que utilizaram o IVC23,28,30,32-37, como método para o julgamento da avaliação pelos juízes selecionados e permitir a qualificação dos recursos educacionais validados.
A elaboração de recurso educativos de qualidade, potencializa a realização de intervenções em saúde pautadas em saberes estruturados e informações direcionadas ao público-alvo34. Neste sentido, visando aprimorar o conteúdo e a aparência da cartilha validada, foram incluídas todas as sugestões dos juízes especialistas, o que foi possível observar em outras pesquisas22-23,28,30-37.
O conteúdo da cartilha “Punção venosa periférica para família” contextualiza as vivências dos familiares durante a hospitalização da criança com necessidade da CIP, apresentando os sentimentos e angústia expressados por eles. Esclarece os conceitos relacionados a esta intervenção, com destaque para a definição sobre veia, cateter e as etapas para a realização da CIP. Contém, ainda, as estratégias que podem ser adotadas pelos familiares antes, durante e após esta intervenção, objetivando amenizar o estresse ocasionado pelo momento.
O conteúdo da cartilha, que obteve S-CVI/Ave de 0,98, foi considerado pelos juízes especialistas como cientificamente correto, apropriado e suficiente para o público-alvo, possuiu sequência lógica, além de favorecer a aprendizagem da temática. Em pesquisas metodológicas desenvolvidas no Brasil os juízes especialista também consideraram o conteúdo dos recursos educacionais impressos validados como adequados33,35.
Neste sentido, o conteúdo da cartilha possibilitará para os familiares a oportunidade de compreender a temática, por meio de informações corretas sobre a CIP e as estratégias que possam auxiliá-los a enfrentar esse momento.
No entanto, neste estudo, os juízes especialistas ressaltaram a importância de incluir algumas situações cotidianas do cuidado para aproximar o conteúdo da cartilha a realidade hospitalar, como a introdução de termos sinônimos a CIP, tais como “pegar a veia”, “pegar o acesso” e “realizar uma punção”, além de identificarem a necessidade de discutir outras implicações do procedimento, como as inúmeras tentativas em casos de criança com acesso difícil e os motivos que levam ao não funcionamento da CIP.
Estes conteúdos proporcionarão ao familiar compreender melhor a necessidade da CIP e suas implicações para a criança, e, desse modo, participar do cuidado de forma mais segura. Os juízes também destacaram a incoerência de uma das falas do familiar, “vem todos os dias pegar a veia do meu filho”, pois na prática o intuito é manter o cateter pelo máximo de tempo necessário para a TIV, podendo essa expressão ser equivocada e assustar o familiar. Outras sugestões propostas quanto ao conteúdo e à linguagem foram a adequação ortográfica dos textos e simplificar expressões repetidas.
Mudança de termos e expressões, além de reformulação de textos foram sugestões de juízes especialistas de outras pesquisas metodológicas22-24,29.
Conforme avaliação dos juízes quanto ao critério linguagem, S-CVI/Ave de 1,0, a cartilha validada possui estilo de redação compatível com o público-alvo, a escrita é atrativa e o texto possui linguagem clara e objetiva, o que fora observado em outras pesquisas nacionais23,28,31-33,36.
A linguagem utilizada em recursos educacionais impressos poderá facilitar ou dificultar a compreensão da mensagem transmitida. Por isso, a preparação textual deve estar adequada ao nível educacional e cultural do cliente a ser beneficiado por estes recursos32.
Portanto, o delineamento do conteúdo de maneira correta e corrente, bem como, a utilização de uma linguagem clara, fácil e atrativa, são elementos fundamentais que objetivam promover a compreensão das informações oferecidas pela cartilha e potencializar a sua relevância prática36.
Desta maneira, pensa-se que a utilização da cartilha “Punção venosa periférica para família” poderá amenizar o estresse e ansiedade do familiar acompanhante desta intervenção em saúde, acalmando-os neste momento e sendo forte fonte de apoio para a criança, que de certa forma, também se beneficiará com a utilização deste recurso didático por seus familiares. Também, poderá contribuir com a realização da CIP, pois os familiares e futuros leitores da cartilha poderão transmitir informações corretas para a criança, deixando-as mais calmas e colaborativas com o profissional insertor do cateter intravenosos periférico.
Os juízes consideraram que as ilustrações da cartilha são pertinentes, claras, adequadas, relevantes, elucidam o conteúdo, facilitam a compreensão e possuem qualidade gráfica, resultados semelhantes aos de outras pesquisas brasileiras22,28,33,35. O S-CVI/Ave para este critério foi de 0,99.
A utilização de ilustrações em recursos educacionais impressos é considerada pertinente, por torná-lo mais atrativo, potencializando a compreensão do público-alvo, independentemente da sua escolaridade36.
Nesse sentido, as ilustrações sobre a veia, cateter e etapas da CIP, apresentadas na cartilha validade, agrega valor ao enredo da história por meio dos personagens e do cenário. Desse modo, para o familiar, esse quesito terá a possibilidade de aliar as informações descritas na cartilha com a demonstração das imagens.
Nessa categoria, um juiz apontou a necessidade de introduzir mais móveis ao cenário, pensando em retratar melhor um ambiente hospitalar. Também destacou a necessidade do uso de todos os Equipamento de Proteção Individual (EPIs) pela personagem enfermeira. Outras sugestões foram: organizar os balões de diálogos ao lado dos personagens e colocar bordas na última página destinada para desenhar, pintar e escrever.
Com relação ao critério layout, S-CVI/Ave de 0,93, os juízes concordaram que o tipo de letra e cores utilizados na cartilha facilitam a sua leitura. A composição visual é atrativa e a cartilha está bem organizada. O tamanho do material educativo, número de páginas, disposição do texto, tamanho das letras e da cartilha são adequados. A adequação deste critério foi observada em pesquisa que validou um álbum seriado para a promoção do controle de peso corporal infantil35.
As letras da cartilha são do tipo Comic Sans MS e as páginas estão nas cores azul e laranja. As falas dos personagens estavam apresentadas em balões de diálogo. Para os familiares, esses elementos instigará a leitura da cartilha por sua atratividade visual.
No critério layout, os juízes propuseram que os tamanhos das letras estivessem padronizados e os textos sobre o passo a passo da CIP fossem divididos em mais balões de diálogos para facilitar a visualização. Quanto a capa, foi sugerido que modificasse a ilustração para melhor caracterizar o assunto que foi abordado na cartilha.
As ilustrações são consideradas como elementos primordiais no que diz respeito à elucidação e compreensão de uma determinada temática com base em imagem, e aliadas ao layout produzem a atratividade necessária para despertar o interesse pela leitura.
Em pesquisa do tipo quase experimental que avaliou e comparou o efeito anestésico entre a presença da família sem uma animação de distração e a presença da família com uma animação de distração durante a realização da CIP em crianças entre 1-7 anos de idade, demonstrou-se que das 35 crianças acompanhadas apenas por membro da família, 88,57% apresentaram dor severa (escore de 07 -10) e nenhuma estava relaxada/confortável (escore 0), no entanto, das 35 crianças acompanhadas por um membro da família que utilizou a distração de animação, 20% apresentaram dor severa e 25,71% estavam relaxadas/confortável (escore 0)41.
Com relação ao critério cultura, os juízes consideram que o texto da cartilha é compatível com o público-alvo, atende aos diferentes perfis de usuários, sendo indicada para uso como recurso para preparar familiares de crianças hospitalizadas para a CIP.
Além disso, a cartilha foi considerada motivadora e capaz de despertar o interesse do leitor. Também, possui potencial para esclarecer prováveis dúvidas dos familiares, orientando-os adequadamente quanto a CIP.
O quesito motivação foi um dos itens com elevada aprovação dos juízes, isso faz refletir, que o material didático e instrucional estimulará os familiares a sentir vontade de aprender sobre a temática apresentada.
Na perspectiva dos juízes especialistas, a cartilha validada possui aplicabilidade prática, o que fora considerado para outros recursos educacionais impressos23,28,34 42.
Assim, a utilização da cartilha “Punção venosa periférica para família” no contexto prático configura-se em uma tecnologia educacional de promoção da segurança do paciente, uma vez que, introduz o familiar no cuidado, além de prevenir a ocorrência de danos às crianças, pois, quando o familiar conhece a CIP e estratégias que podem tranquilizar a criança durante o procedimento, essa pode ficar calma e facilitar o desenvolvimento do trabalho do profissional.
Estudos apontaram que os profissionais de saúde ressaltaram a importância de estabelecer vínculos como os familiares e promover a interação com eles oferecendo informações sobre os cuidados prestados com as crianças43-44. Eles também concordam e apoiam a presença dos pais durante a CIP na criança44.
No entanto, em uma pesquisa realizada com 59 familiares, observou-se que 6,8% deles disseram compreender como ocorre a CIP na criança e 37,2% relataram receber informações sobre o procedimento45.
Percebe-se que os profissionais identificam as carências e as necessidades dos familiares de inclui-los e engaja-los no cuidado46. Mas, muitas vezes, por falta de capacitações e a sobrecarga de trabalho, ressaltando a equipe de enfermagem, dificultam o desenvolvimento de práticas baseadas na filosofia do CCFC. Então, é preciso romper com paradigmas biologicistas para que novas práticas assistências possam surgir nos hospitais pediátricos.
Esta pesquisa apresentou as seguintes limitações: ausência de participação de especialistas em comunicação, ter sido validada por profissionais de praticamente um único estado brasileiro e não ter realizado o cálculo amostral. Também, a incipiente produção do conhecimento sobre a temática pesquisada impossibilitou a comparação dos seus achados, sendo utilizadas informações de pesquisas com cartilhas relacionadas a temas diferentes.
CONCLUSÕES
O estudo possibilitou aos juízes especialistas analisar a cartilha “Punção venosa periférica para família” em vários aspectos, visando facilitar seu entendimento e torná-la mais prática e atrativa para os familiares, aprimorando-a para uso por enfermarias pediátricas brasileiras.
A cartilha foi validada em seu conteúdo na primeira rodada de avaliação pelos juízes especialistas, quanto ao conteúdo e aparência, que propuseram algumas sugestões para potencializar o seu aprimoramento e dar maior credibilidade ao material.
Este recurso didático poderá ser utilizado como tecnologia assistencial promotora de educação em saúde para familiares de crianças hospitalizadas. Ainda, necessita-se realizar estudos quanto a validade de constructo da cartilha.