INTRODUÇÃO
O aumento da expectativa de vida da população, juntamente com a alta prevalência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), contribui para o uso de múltiplos medicamentos, configurando um desafio à garantia de uma prescrição eficaz para os idosos [1, 2]. A polifarmácia é classificada, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), pelo uso de cinco ou mais medicamentos simultaneamente e está associada com a multimorbidade, isto é, a presença de duas ou mais condições crônicas de saúde [3].
Estudos brasileiros mostram que a prevalência de polifarmácia da população idosa assistida na comunidade varia entre 10,3 e 40,8 %, sendo predominante no sexo feminino, acima dos 70 anos de idade, em idosos com percepção regular ou ruim da própria saúde e com menor escolaridade [4-8]. Isto posto, a prática da polifarmácia nessa faixa etária pode ser explicada pela crescente incidência das DCNTs e, por conseguinte, o aumento da procura dos serviços de saúde e o número de prescrições [5, 9, 10].
O perfil medicamentoso na pessoa idosa está intimamente associado a medicamentos com ação nas principais DCNTs, sendo que as mais prevalentes na pessoa idosa são a hipertensão arterial e a diabetes mellitus [11,12]. Juntas, elas são responsáveis por desencadear outras morbidades como, insuficiência renal, disfunções cardiovasculares, síndrome dislipidêmica e até eventos cerebrais [4,13]. Essas condições de saúde provocam diminuição da funcionalidade e da qualidade de vida do idoso, afetando a forma com que ele desempenha suas atividades de vida diárias e as relações interpessoais que mantém [11].
Além disso, o uso indiscriminado de medicamentos e até mesmo a automedicação podem ser motivados pelo alívio quase que imediato dos sintomas, fácil disponibilidade em farmácias e por poupar tempo gasto em consultas médicas [14]. Dentre as consequências que essa prática produz, a interação medicamentosa pode ser considerada como a principal delas, visto que pode provocar a redução do efeito de outro medicamento, aumento do risco de hemorragias e de quedas, bem como o surgimento de efeitos colaterais indesejados com o uso a longo prazo [15, 16].
A polifarmácia também está relacionada com a prescrição medicamentosa indiscriminada por profissionais da área da saúde e, por esse motivo, é fundamental ressaltar a necessidade da prescrição racional e individualizada de acordo com a real indicação clínica para cada paciente, tendo em vista a melhora dos sintomas [6, 16, 17]. Por isso, é essencial uma equipe multiprofissional para o cuidado integral do idoso, em especial a figura do farmacêutico e do médico, a fim de monitorá-lo mais de perto e de forma individualizada para evitar consequências desastrosas [4, 5, 9].
Através do exposto, percebe-se que a polifarmácia é uma condição complexa e delicada, e que interações medicamentosas podem influenciar negativamente nas condições e qualidade de vida da população idosa, evidenciando então a importância que esta temática seja estudada e discutida de forma mais frequente entre os atores do cuidado à pessoa idosa. Dessa forma, o objetivo deste estudo é analisar o perfil medicamentoso e a prevalência de fatores associados à polifarmácia em idosos assistidos por uma Unidade de Saúde da Família de Vitória-ES.
METODOLOGIA
Esta é uma análise secundária do banco de dados de um estudo observacional transversal e de abordagem quantitativa, realizado na Unidade de Saúde da Família (USF) Luiz Castellar da Silva, no bairro Jesus de Nazareth, em Vitória-ES. A amostra foi composta por idosos com idade igual ou superior a 60 anos, assistidos pela Estratégia Saúde da Família do território analisado e que aceitaram participar do estudo através da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O cálculo amostral foi baseado no número de idosos cadastrados na USF em abril de 2018 com uma margem de erro de 0,05, estimativa de proporção de 0,5 e acréscimo de 30 % para cobrir eventuais perdas da amostra e, ao final, foram entrevistados 241 idosos.
Para seleção, realizou-se organização dos nomes em ordem alfabética, por microárea e, então, foi feita uma aleatorização simples, selecionando 2 em cada 3 idosos. A coleta de dados do estudo primário ocorreu entre os meses de abril e junho de 2018, com uma equipe de pesquisadores treinados, e através de visitas domiciliares previamente agendadas. Os critérios de exclusão consistiram em: idosos que não possuíam condições ou cuidador apto em responder ao questionário aplicado; aqueles que recusaram a visita; e aqueles que vieram a óbito ou se mudaram antes da realização das entrevistas e avaliações. Para este estudo, foram excluídos 5 idosos por não apresentarem dados sobre a polifarmácia, totalizando uma amostra de 236 idosos.
Com os dados obtidos, classificou-se os medicamentos utilizados segundo a organização sistemática Anatomical Therapeutic Chemical (ATC) feito pelo World Health Organization Collaborating Centre for Drug Statistics Methodology e adotada como padrão internacional para estudos com utilização de fármacos, que os classifica em 5 níveis [18].
O nível 1 conta com 14 grupos de acordo com o órgão ou sistema em que atuam e, dentro de cada um dos grupos, há subdivisões que dizem respeito ao grupo terapêutico do medicamento, formando o nível 2. Neste estudo, valeu-se apenas dos níveis 1 e 2 para classificar os medicamentos utilizados pelos idosos. Já os níveis 3, 4 e 5 se referem ao grupo farmacológico, grupo químico e nome da substância química do fármaco, respectivamente [19].
As variáveis sociodemográficas consideradas para este estudo foram: idade (60 a 74 anos ou 75 anos ou mais), sexo (masculino ou feminino), etnia/raça (branco ou negro), estado civil (casado ou solteiro), escolaridade (0 a 4 anos, 5 a 11 anos ou 12 anos ou mais) e núcleo familiar (mora sozinho ou acompanhado). Juntamente das variáveis analisadas que dizem respeito aos hábitos comportamentais e à saúde dos participantes: multimorbidade (presença de duas ou mais doenças associadas), sair de casa sozinho ou acompanhado, presença de tabagismo, presença de etilismo, prática de atividades físicas, prática de atividades de lazer, prática de atividades na UBS, autopercepção da saúde (positiva ou negativa) e quantidade de medicamentos em uso. Foi considerado o conceito de polifarmácia adotado pela OMS, isto é, o uso de cinco ou mais medicamentos simultaneamente [3].
A análise descritiva dos dados foi retratada por meio de tabelas de frequências absolutas e relativas e mediana (intervalo interquartil) como medida de resumo de dados. A associação entre a variável dependente (polifarmácia) e as independentes (demais variáveis) foi feita através do teste Qui-quadrado de Pearson (ou Exato de Fisher, se uma ou mais frequências esperadas forem menores que cinco). Para isso, foi adotado nível de significância dep < 0,05, com Intervalo de Confiança de 95 % para todas as análises.
Por fim, o projeto primário que originou este estudo tem como título "Condições de saúde e funcionalidade de idosos assistidos pela estratégia saúde da família em Vitória--ES" e foi apresentado ao CEP/EMESCAM e aprovado sob o n° 2.142.377. As normas estabelecidas nas Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da resolução 466/12 foram respeitadas em todas as etapas deste estudo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A maior parte dos idosos entrevistados apresentava idade entre 60 e 74 anos (72,5 %), era do sexo feminino (61,4 %), se identificava como negro (73,7 %), era casado (61 %) e tinha de 0 a 4 anos de estudo (57,2 %). Em relação às características comportamentais, a maioria não mora só (77,1 %), sai de casa sozinho (79,7 %), não possui hábitos tabágicos (86 %) e nem alcoólicos (77,5 %), não realiza atividade física (66,5 %), pratica atividades de lazer (62,3 %) e não participa de atividades na UBS (78,4 %). No que concerne às características de saúde, 65,3 % possuem multimorbidades e 53,8 % percebem a própria saúde como positiva (tabela 1).
Fonte: autoria própria.
Legenda: 1 variáveis que não totalizam 100 % da amostra em razão da ausência da informação de participantes; 2 todas as análises foram realizadas pelo teste Qui-quadrado.
Quanto à prática da polifarmácia, a prevalência de idosos que usavam 5 ou mais medicamentos foi de 37,7 % e a maior parte destes era destinada ao tratamento de demandas cardiovasculares ou digestóricas e metabólicas. As variáveis que estiveram estatisticamente associadas com a polifarmácia foram: faixa etária de 75 anos ou mais, ausência de hábitos alcoólicos, não sair de casa sozinho, autoavaliação negativa da saúde e presença de multimorbidade (tabela 1).
Com relação ao perfil medicamentoso, no total, foi relatado o consumo de 902 medicamentos distribuídos, conforme a ATC, em 13 grupos principais (nível 1) e em 28 grupos terapêuticos (nível 2), além de 1 grupo sem classificação (tabela 2). A mediana dos medicamentos da amostra foi igual a 3 (1, 6) e os 37,7 % dos idosos em polifarmácia foram responsáveis pelo relato de consumo de 610 (67,7 %) dos fármacos registrados, sendo que 208 idosos (88,1 %) estavam em uso de pelo menos uma droga.
Os medicamentos foram agrupados segundo a classificação ATC (em níveis 1 e 2) e listados na tabela 2. O nível 1 mais utilizado pelos idosos corresponde a drogas com ação no sistema cardiovascular (48,7 %) e, dentro dessa classe, os medicamentos que agem no sistema renina-angiotensina e os diuréticos (nível 2). Outras drogas muito utilizadas foram as correspondentes à classe A (nível 1) de medicamentos com ação nos sistemas digestivo e metabólico (21,5 %), como os medicamentos usados na diabetes (nível 2).
A polifarmácia é um fenômeno crescente na atualidade e no presente estudo a prevalência encontrada foi de 37,7 % em idosos assistidos por uma UBS de Vitória, valores próximos a este foram vistos nas análises de Pereira et al. (2017), em Florianópolis-SC, e de Silveira, Silva e Rocha (2018), em Patos de Minas-MG, que encontraram prevalências de 32 % e 40,8 %, respectivamente, de polifarmácia entre os idosos estudados na comunidade e aqueles assistidos por uma UBS [5, 7]. Além disso, o perfil farmacoterapêutico dos idosos avaliados demonstrou o uso de 3,8 medicamentos por idoso, que vai de encontro com outros estudos nacionais [5, 20, 21].
Segundo a literatura, dois importantes agravantes desta condição são a automedicação e a presença de doenças crônicas que, para controle dos sintomas clínicos, faz-se necessário o consumo contínuo e diário de diversas medicações [22, 23]. Ainda, Procópio, Andrade e Campos (2021) encontraram uma relação positiva entre o aumento da idade com o aumento na quantidade de medicamentos em uso [20].
A prevalência da polifarmácia está associada a fatores como faixa etária e multimorbidade, evidente nos idosos com 75 anos ou mais. Isto posto, percebe-se que tais condições estão interligadas, visto que é possível notar o surgimento de doenças crônicas, tanto físicas quanto mentais, à medida que o indivíduo envelhece, necessitando do consumo de múltiplos medicamentos para o tratamento ou controle clínico das morbidades associadas [5, 22].
Outro fator relacionado à polifarmácia no presente estudo, foi a ausência de hábito alcoólico, como encontrado nas pesquisas realizadas por Alves e Ceballos (2018) e Andrade et al. (2020) [1, 24]. Este fato pode ser justificado pela veemente e padronizada recomendação dos profissionais de saúde para que idosos que fazem uso diário de medicamentos para controle de comorbidades evitem a ingestão de bebidas alcoólicas, em razão das reações que os fármacos podem provocar quando ingeridos concomitantemente com álcool, tais como aumento da dose para atingir o efeito terapêutico, sedação excessiva, acidose lática, toxicidade hepática, hipertensão refratária e reações do tipo "dissulfiram" que incluem náuseas, vômitos e rubor facial [25, 26].
Idosos que não saem de casa sozinhos provavelmente são mais dependentes para a realização de atividades da vida diária e, devido a isso, podem ter mais patologias associadas, como as que acometem articulações, ossos, musculatura e cognição [27]. Sendo assim, necessitam de mais medicamentos diários e tudo isso contribui para elevar a incapacidade funcional deles, limitando diversas atividades, como a locomoção independente [27].
Um dos fatores relacionados com a prática da polifarmácia é a prescrição inadequada por parte dos médicos que, muitas vezes, incluem novos fármacos ou fazem escolhas equivocadas para determinado tratamento, aumentando as interações medicamentosas, reações adversas e contribuindo para o surgimento de novos sintomas, o que reinicia a cascata de prescrição [17, 28, 29].
Para contornar esse problema, seria importante a presença de uma equipe multidisciplinar específica em cuidados geriátricos, centrada e comunicativa, com o intuito de elaborar o melhor plano de ação de acordo com as particularidades de cada idoso, bem como observar medicações atuais e reajustar terapias anteriores, ponderando todos os riscos e benefícios junto com o paciente [28, 30].
Outro ponto que tange a polifarmácia é a automedicação, prática habitual em nosso país pela facilidade de compra de medicamentos que, muitas vezes, podem provocar efeitos indesejáveis, como farmacodermias, hepatite medicamentosa, insuficiência renal aguda e, até mesmo, a morte [5, 31]. Posto isso, percebe-se a necessidade de conscientização, tanto da equipe de saúde, quanto do paciente, para diminuir o consumo irresponsável de medicamentos sem um quadro clínico bem estabelecido, e uma adequada prescrição médica [6, 29, 31].
Vale destacar também que a presença de DCNTs, como diabetes, distúrbios cardiovasculares, doenças reumáticas e alterações pulmonares, contribuem para o aumento do consumo de medicamentos, a fim de controlar as doenças e retardar o agravamento dos quadros [5, 11]. A adoção de estratégias preventivas é a melhor alternativa, com o objetivo de aumentar a adesão a políticas de educação em saúde e cuidados com a população idosa [6].
Ferramentas muito utilizadas são os Critérios de Beers e o STOPP, validadas no Brasil pelo Consenso Brasileiro de Medicamentos Potencialmente Inapropriados para Idosos (CBMPI), que enumeram medicamentos potencialmente inapropriados utilizados por idosos e suas possíveis interações medicamentosas e reações adversas [32]. Esses instrumentos colaboram para a prática clínica dos profissionais de saúde ao averiguarem as medicações em uso, facilitando a modificação de drogas inadequadas para cada situação [33].
Levando em consideração os medicamentos utilizados pelos idosos averiguados neste estudo, percebe-se que alguns fármacos deveriam ser evitados. Inibidores da bomba de prótons, utilizados para desordens relacionadas à acidez gástrica, devem ser evitados por um período maior que 8 semanas por colaborar com o desenvolvimento de fraturas ósseas, demência e insuficiência renal a longo prazo [32]. O antidiabético oral que deve ser evitado em idosos é a glibenclamida, visto que possui risco aumentado de proporcionar quadro de hipoglicemia grave [32].
Vale destacar que o ácido acetilsalicílico (antitrombótico) em doses maiores de 150 mg/ dia, assim como o uso indiscriminado e crônico de anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs), aumentam o risco de sangramentos gastrointestinais e devem ser evitados [32]. Outra classe bastante utilizada foram os diuréticos, porém devem ser restringidos o uso de diuréticos de alça e poupadores de potássio, uma vez que aumentam o risco de hipovolemia e hipercalemia, respectivamente, em pacientes com hipertensão arterial [32]. Por fim, o uso dos benzodiazepínicos (psicolépticos) e antidepressivos tricíclicos (psicoanalépticos) está contraindicado na pessoa idosa, pois contribuem para aumentar o risco de quedas e fraturas por comprometimento cognitivo e aumento de reações anticolinérgicas e queda da pressão ortostática, respectivamente [32].
Neste estudo, percebeu-se que as classes medicamentosas mais utilizadas pelos idosos foram relativas aos sistemas cardiovascular, digestório e metabólico, com maior prevalência dos medicamentos usados para o tratamento da hipertensão arterial e diabetes, que reflete as DCNTs mais frequentes na população idosa, de acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde, feita em 2019 [34]. O uso de polifarmácia se justifica nesses casos, uma vez que essas comorbidades, especialmente as relacionadas ao sistema cardiovascular, precisam estabelecer politerapia medicamentosa para mudar o curso da doença.
Um dado intrigante foi o alto uso de drogas para controle da acidez estomacal, principalmente os inibidores da bomba de prótons, como o omeprazol e o pantoprazol, seja para tratamento de úlceras ou para profilaxia, visto que o uso de alguns desses medicamentos é inadequado à população idosa, pois aumenta o risco de infecções bacterianas no trato digestório e intensifica o processo de perda óssea, aumentando o risco de fraturas [29].
Ainda sobre os medicamentos relacionados ao sistema digestório e metabólico, as subclasses (nível 2) de vitaminas e suplementos minerais foram amplamente utilizadas, o que pode ser esclarecido pela necessidade de reposição desses nutrientes no organismo da pessoa idosa, seja por deficiência de ingestão ou de metabolismo, seja por déficit secundário ocasionado por alguma patologia de base, como anemias carenciais e osteoporose, muito comuns nessa faixa etária [35, 36].
Outra associação encontrada foi a polifarmácia com a avaliação negativa da própria saúde dos idosos estudados, que também se mostra presente em Nascimento et al. (2017) e Carneiro et al. (2018) [2, 37]. Essa relação pode ser explicada devido a alterações farmacocinéticas e farmacodinâmicas próprias do envelhecimento, ao passo que mudanças fisiológicas dependentes de diferentes mecanismos moleculares proporcionam modificações na distribuição, no metabolismo, na excreção e no sítio de ação do fármaco e, por consequência, são capazes de reduzir tanto a tolerabilidade quanto a eficácia da terapêutica medicamentosa [38, 39]. Ao conceber que múltiplos medicamentos não geram a resposta esperada ou proporcionam efeitos colaterais incomodativos, é intuitivo hipotetizar que a pessoa idosa interprete tal situação como descaimento da própria saúde.
Para um envelhecimento saudável e funcional, é importante que o idoso tenha uma rede de apoio multiprofissional para o cuidado integral e longitudinal, de forma a garantir sua autonomia e independência até quando for possível e, com isso, atenuar a discriminação etária [40]. A coordenação das redes de atenção no cuidado com o idoso é fundamental, portanto, para impedir condutas iatrogênicas, declínio da saúde e intervenções desnecessárias [40]. Com isso, pode-se, até mesmo, diminuir a incidência do fenômeno de polifarmácia [40].
A avaliação multidimensional abrange, inicialmente, os profissionais da Atenção Básica à Saúde, como médicos, enfermeiros e auxiliares, dentistas, assistentes sociais, educadores físicos, farmacêuticos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, nutricionistas e agentes comunitários de saúde [41]. Eles têm como objetivo identificar e intervir em áreas fragilizadas do idoso, a fim de prevenir agravos, evolução de doenças e comprometimento físico e social, aumentando, assim, a qualidade de vida desses indivíduos [30, 40].
Em vista disso, esses profissionais devem ser mais sensíveis aos medicamentos prescritos e à farmacodinâmica nesses pacientes, uma vez que essa população já possui o organismo mais vulnerável devido ao processo de envelhecimento natural, cursando com o aumento de infecções por baixa imunidade, a diminuição da função renal e um conjunto de síndromes geriátricas [5, 42].
A polifarmácia, portanto, quando não evitável, deve ser sempre feita de forma adequada, isto é, a partir do uso racional dos medicamentos e da conscientização acerca dos efeitos colaterais e interações medicamentosas de cada um, em concordância com as evidências científicas [29]. Com isso, será possível devolver, mesmo que aos poucos, a autonomia e a independência dos idosos em polimedicação e reintroduzi-los aos pontos de atenção à saúde direcionada a este público, articulando-os em diversos setores, seja em serviços de saúde, direitos humanos, entidades comunitárias e até em locais de esporte, cultura e lazer [30, 40].
Através do exposto, entende-se que o estudo apresenta importantes contribuições e atualizações acerca da prática medicamentosa e da polifarmácia na população idosa, porém, algumas limitações devem ser consideradas. Uma delas consiste no seu delineamento, pois estudos transversais não são capazes de estabelecer relação causal entre as variáveis estudadas, porém, é potente no levantamento de hipóteses a serem exploradas mais profundamente por estudos prospectivos. Outro fator limitante é o viés de transcrição que consiste na perda de informações relevantes no momento de transcrever os dados coletados das entrevistas, devido à incompletude do questionário ou caligrafia ilegível, todavia vale ressaltar que a transcrição dos dados foi feita em contato com os indivíduos que realizaram as entrevistas, na intenção de minimizar tal viés.
CONCLUSÃO
A polifarmácia apresentou alta prevalência entre os idosos estudados e esteve associada com ter 75 anos ou mais, ausência de prática alcoólica, não sair de casa sozinho, apresentar multimorbidade e autoavaliação negativa da saúde. Os medicamentos mais utilizados foram os de ação no sistema cardiovascular, em especial aqueles que agem no sistema renina-angiotensina, diuréticos e as drogas com ação nos sistemas digestivo e metabólico, com destaque para a diabetes mellitus.
Logo, urgem iniciativas que estabeleçam protocolos para minimizar a acessibilidade da livre aquisição dos medicamentos, diminuindo a cultura da automedicação. É necessário, também, estimular medidas de educação permanente nos postos de trabalho e nas escolas de formação médica, de modo que esses profissionais possam observar e manejar o perfil medicamentoso dos pacientes de maneira mais adequada, atentando-se para os medicamentos já em uso e adequando as prescrições dentro da necessidade clínica da pessoa idosa.
Outra importante sugestão seria a incorporação, dentro dos prontuários eletrônicos, de ferramentas que auxiliem na identificação das interações medicamentosas, contribuindo com a diminuição da ocorrência de prescrições inadvertidas, bem como garantindo maior segurança para a saúde do paciente e maior qualidade da assistência a esta população.