1. Introduction
O setor público utiliza ferramentas de gestão do setor privado para aumentar a responsabilidade e a eficiência do Estado, promovendo mudanças de paradigmas que desafiam as estruturas burocráticas e mecanicistas institucionalizadas (Guesser, Ensslin & Petri, 2020). A gestão de desempenho de recursos humanos é uma dessas ferramentas (Audenaert et al., 2019; Guesser et al., 2020), cuja consistência do sistema de gestão de desempenho de recursos humanos (CSGDRH), torna-se recurso de trabalho que aumenta o capital psicológico e favorece a mudança de comportamento dos funcionários em prol da organização (Kakkar et al., 2020). Estudos anteriores sugerem uma maior atenção à CSGDRH, visto que as inconsistências podem causar frustrações, comprometendo o bem-estar dos funcionários (Audenaert et al., 2019; Bauwens, Audenaert & Decramer, 2019).
A manutenção da eficácia da gestão de desem-penho de recursos humanos, requer um exercício comportamental, no qual a consistência é um fator re-levante, que pode afetar o engajamento no trabalho, mediante percepções positivas de justiça organizacional (Chen, Uen & Chen, 2016; Guesser et al., 2020; Kakkar &Vohra, 2021). O desafio de implementar uma gestão de desempenho de recursos humanos eficaz, pode perpassar pela análise das relações entre CSGDRH, justiça organizacional e engajamento no trabalho (Awan, Habib, Akhtar & Naveed, 2020; Kakkar & Vohra 2021). Awan et al. (2020) sugerem analisar, em conjunto, os sis-temas de gestão de desempenho de recursos humanos e o engajamento no trabalho; incluindo, como mediadora, a percepção de justiça organizacional. Kakkar e Vohra (2021) relacionaram, no setor privado, a CSGDRH com o engajamento no trabalho, sugerindo a replicação do estudo, no âmbito governamental.
A gestão de desempenho de recursos humanos no setor público é repleta de desafios, suscitando a adoção de abordagens estratégicas para superá-los (Guesser et al., 2020). A relação entre CSGDRH e o engajamento no trabalho, mediado pela justiça organizacional, apresenta-se como uma lacuna capaz de favorecer a implementação de estratégias positivas para gestão de desempenho de recursos humanos. Desta lacuna, emerge a questão: quais os efeitos da consistência do sistema gestão de desempenho de recursos humanos (CSGDRH) no engajamento no trabalho, mediado pela justiça organizacional no setor público? Para tanto, busca-se analisar os efeitos da CSGDRH no engajamento no trabalho, mediado pela justiça organizacional, em uma Autarquia Pública Federal Brasileira.
Essa investigação justifica-se sob diferentes perspectivas (teórica, empírica e social) e está em con-gruência com várias chamadas anteriores. Contribui de forma teórica ao analisar a CSGDRH a nível organizacio-nal, integrando-a, empiricamente, ao engajamento no trabalho, a nível individual, mediado pela percepção de justiça organizacional. Estudos anteriores analisaram esses constructos de forma independente (Bauwens et al., 2019; Chen et al., 2016; Kakkar & Vohra, 2021), sem considerar os efeitos mediadores e a integração entre os diferentes níveis de análise; sobretudo, no setor privado (Audenaert et al., 2019; Chen et al., 2016). No aspecto prático, o estudo da CSGDRH apresenta uma abordagem positiva em meio à criticidade da agenda negativa da gestão de desempenho de recursos humanos (Brunetto & Beattie, 2020).
Os resultados contribuirão aos gestores públicos para a compreensão da CSGDRH. Funcionalmente, ao incumbir-se da definição de metas e prioridades coe-rentes aos funcionários, pode favorecer a percepção de justiça organizacional, refletindo-se no engajamento no trabalho, por meio da concentração dos esforços dos ser-vidores nas reais necessidades do Estado (Audenaert et al., 2019; Chen et al., 2016). No campo social,os sistemas de gestão de desempenho de recursos humanos, quando caracterizados inconsistentes, podem resultar em perdas de rendimento, retraimentos psicológicos e intenções de rotatividade entre funcionários (Kakkar et al., 2020). Mitigar aspectos negativos associados à inconsistência reper-cute no bem-estar dos servidores e, consequentemente, no desempenho individual e organizacional (Bauwens et al., 2019; Decramer, Smolders & Vanderstraeten, 2013), com implicações na prestação de serviços à sociedade (Guesser et al., 2020); além de refletir, de forma indireta na qualidade de vida dos indivíduos (Nader, Peña Bernate, & Santa-Bárbara, 2014).
A próxima seção apresentaa uma contextualização acerca da CSGDRH, da justiça organizacional, do engajamento no trabalho, e o modelo teórico de aná-lise. Já a terceira seção, descreve os procedimentos metodológicos utilizados, e identifica os construtos da pesquisa, a forma de coleta dos dados, seu tratamento e sua análise. Por fim, na quarta seção apresenta-se a análise dos resultados, enquanto que, a quinta, sintetiza as principais considerações finais.
2. Fundamentação teórica
2.1. Consistência do Sistema de Gestão de Desempenho de Recursos Humanos (CSGDRH)
A CSGDRH refere-se à conjugação entre o estabelecimento de metas, o feedback e o apoio orga-nizacional (Audenaert et al., 2019; Bauwens et al., 2019). Durante o processo de avaliação de desempenho, a CSGDRH aponta para comportamentos, atitudes e valores análogos, que devem ser definidos, monitorados e avaliados de forma congruente, livre de contra-dições, independentemente do momento ou situação (Audenaertet al., 2019; Kakkar & Vohra, 2021; Van Thielen et al., 2018). O interesse pela CSGDRH surgiu a partir de estudos de gestão estratégica de recursos humanos, com abordagens voltadas à complementaridade e ao alinhamento (Chen et al., 2016; Decramer et al., 2013; Kehoe & Wright, 2013), bem como aos conceitos relacionados aos ajustes vertical e horizontal (Kakkar et al., 2020; Van Waeyenberg et al., 2017).
O ajuste vertical, vincula a avaliação de desempenho individual dos funcionários às metas corporativas, propondo um alinhamento que reflete a conexão dos objetivos dos funcionários aos propósitos estratégicos organizacionais (Kakkar et al., 2020; Van Waeyenberg et al., 2017), contribuindo para a consistência. Já o ajuste horizontal, dispõe que o estabelecimento de metas, monitoramento e avaliação, devem ser incorporados de forma unificada, promovendo apoio mútuo à consistência interna (Kakkar et al., 2020; Van Waeyenberg et al., 2017). Estes ajustes não significam a soma de componentes, mas, sim, a interação entre práticas e sistemas de gestão de desempenho (Han, Kang, Oh, Kehoe & Lepak, 2019; Kakkar et al., 2020). Combinados e alinhados a outros aspectos, os ajustes vertical e horizontal compõem um conceito mais amplo: o de consistência de gestão de desempenho (Audenaert et al., 2019; Van Thielen et al., 2018; Decramer et al., 2013).
A literatura de gestão de desempenho de recursos humanos, expõe a relevância da consistência como fonte de apoio e orientação, para que as ações dos funcionários ocorram de forma inequívoca em relação aos comportamentos desejados pela organização (Audenaert et al., 2019; Kakkar & Vohra, 2021; Van Thielen et al., 2018). Com um impacto substancial na expectativa dos funcionários, a CSGDRH tende a mel-horar a comunicação organizacional, e definir como a organização pretende apoiar seus esforços (Kakkar & Vohra, 2021). Quanto mais conexões consistentes, maior robustez do sistema, fomentando resultados individuais e organizacionais positivos, visto que elevam a percep-ção de como o sistema de gestão de desempenho incentiva, verdadeiramente, os fatores comportamentais dos funcionários, a exemplo da justiça organizacional e o engajamento (Chen et al., 2016; Kakkar & Vohra, 2021).
2.2.Justiça Organizacional.
A justiça organizacional pode ser definida como o tratamento justo e ético dentro de uma organização (Oubrich et al., 2021; Santos, Venturini, Sallaberry, Klein & Flach, 2023). Representa um evento afetivo com consequências comportamentais aos funcionários que, ao perceberem procedimentos justos, distribuições imparciais e interações neutras, realizam maiores esfor-ços para atingir os objetivos organizacionais (Dai, Chen & Wu, 2013; Khan et al., 2021). Esse construto contempla a percepção de justiça em relação à distribuição de recursos, processos decisórios e comportamentos interpessoais (Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021), a partir de três dimensões: a distributiva; a processual e; a interacional, subdividida em justiça informacional e justiça interpessoal (Khan et al., 2021; Lee, 2019; Lee & Wei, 2017; Holtz & Hu, 2017).
A dimensão da justiça distributiva diz respeito à percepção construída pelos subordinados em relação aos inputs e outputs no âmbito organizacional (Lee & Wei, 2017; Oubrich et al., 2021). Surgiu com a Teoria da Equidade (Arango, 2009), em que há uma tendência de comparação dos inputs e outputs percebidos pelo indivíduo, em relação a uma referência, que geralmente são os pares (Lee, 2019; Lee & Wei, 2017). A proporção adequada entre essas relações de entrada e saída, determinao nível de justiça apreendido pelos colaboradores (Arango, 2009; Lee, 2019). No contexto específico da gestão de desempenho, os colaboradores avaliam a justiça dis-tributiva em relação à organização, aos indivíduos que a compõem e aos superiores hierárquicos (Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021).
A justiça processual representa os padrões e métodos de tomada de decisão respaldados na equidade dos processos, ou seja, refere-se às políticas e procedimentos decisórios (Arango, 2009; Dai et al., 2013; Lee & Wei, 2017). Nessa dimensão, há uma mudança do eixo dos resultados para os processos que os geram, centrando-se em critérios e formas decisórias que promovem a gestão da incerteza em relação aos processos (Lee & Wei, 2017; Oubrich et al., 2021; Santos et al., 2023). Na gestão de desempenho, as percepções de justiça processual estão relacionadas aos sistemas de gestão de desempenho (Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021) e outros fatores ligados ao atributo da consistência, tais como: aplicação concisa de regras para todos os colaboradores; informações claras e exatas; e intervenção do subordinado em relação ao seu processo de avaliação (Decramer et al., 2013).
Já a justiça interacional é uma abordagem avaliada durante o planejamento do processo, quando os proce-dimentos são adotados, e na tomada de decisão após sua implementação (Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021; Santos et al., 2023). Foca sua atenção na qualidade do tratamento interpessoal (Lee & Wei, 2017; Oubrich et al., 2021), integrando valores e características, tais como: respeito, dignidade, sinceridade, imparcialidade, sensibilidade nas relações interpessoais e fornecimento de feedback; utilizando informações claras, tempes-tivas e fidedignas. As percepções de justiça interacional promovem, nos indivíduos, reações à figura do líder (Lee & Wei, 2017), estando subdividida em outras duas dimensões: informacional e interpessoal (Holtz & Hu, 2017; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021).
Por fim, a dimensão da justiça informacional abrange a qualidade da informação (Holtz & Hu, 2017; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021), à medida que os colaboradores percebem informações adequadas no que concerne aos procedimentos usados, e aos resultados distribuídos na organização (Holtz & Hu, 2017; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021). Em outras palavras, consiste em informar aos funcionários os porquês de certos pro-cedimentos e tomadas de decisão pela gestão. Já a jus-tiça interpessoal relaciona-se ao tratamento dado aos funcionários quanto aos aspectos da dignidade, polidez e respeito (Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021). Todas as dimensões de justiça organizacional aqui expostas, refletem no engajamento no trabalho dos indivíduos.
2.3.Engajamento no Trabalho.
O engajamento no trabalho é definido como uma forte identificação emocional, cognitiva e física do colaborador para com as atividades que desempenha (Santos et al., 2020). É um construto multifatorial representado por três elementos principais: vigor, dedicação e absorção (Ancarani et al., 2021; Maake, Harmse & Schultz, 2021; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021; Strom, Sears & Kelly, 2014). O vigor é caracterizado por elevados níveis de energia e resiliência mental durante o trabalho, que promovem o esforço e persistência dos funcionários diante de entraves nas relações laborais (Ancarani et al., 2021; Maake et al., 2021; Strom et al., 2014). A dedicação vale-se do entusiasmo, inspiração, orgulho de pertencimento ao trabalho, significado como senso de importância e do desafio, como características impulsionadoras do engajamento (Ancarani et al., 2021; Maake et al., 2021). Por fim, a absorção, refere-se à perpetuação do foco e concentração no trabalho.
Ao apropriar-se desses elementos, o conceito de engajamento no trabalho apresenta um estado comportamental assertivo, caracterizado pela dedi-cação, absorção, resiliência, comprometimento e satis-fação no trabalho (Awan et al., 2020; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021; Strom et al., 2014), capaz de desenvolver, nos funcionários, esforços discricionários extras para o alcance dos objetivos organizacionais (Awan et al., 2020; Kumar & Padhi, 2021). O engajamento no trabalho funciona como um termômetro do bem-estar ocupacional (Santos et al., 2020), considerado ponto focal da gestão de desempenho de recursos humanos (Lee, 2019), desejável para melhorar o desempenho individual e organizacional (Santos et al., 2020).
As organizações contemporâneas necessitam se concentrar em resultados proximais, como o engajamento no trabalho (Awan et al., 2020), especialmente no setor público, uma vez que, nesse ambiente, são percebidos menores níveis dessa característica comportamental se comparado ao setor privado (Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021). Na seara pública, funcionários desengajados podem representar custo ao Estado e influenciar negativamente a prestação de serviços à sociedade (Ancarani et al., 2021; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021). O sucesso desse setor depende das relações construídas entre a gestão de desempenho e o engajamento no trabalho (Maake et al., 2021).
2.4.Modelo Teórico de Análise.
Os sistemas de gestão de desempenho de recursos humanos com disposições e regras inconsistentes, podem gerar expectativas desalinhadas com os objetivos organizacionais, promover sentimentos negativos, criar tensão entre funcionários, reduzindo a percepção de bem-estar, justiça organizacional e engajamento no trabalho (Bauwens et al., 2019; Chen et al., 2016). Questões de justiça e equidade são fundamentais à eficácia dos sistemas de gestão de desempenho de recursos humanos, sendo a consistência um dos aspectos considerados pelos colaboradores no alcance de tais sentidos (Lee & Wei, 2017). A consistência produz um clima de integração, transmitindo uma mensagem clara e justa dos resultados desejados, ao desenvolver canais de comunicação que ajudam os funcionários a identificar recursos uniformes de interpretação das informações prestadas pela organização (Chen et al., 2016).
Os colaboradores percebem melhor os efeitos positivos dos sistemas de gestão de desempenho de recursos humanos quando recebem tratamentos adequados e justos (Oubrich et al., 2021). Inicialmente, são construídos contratos psicológicos nas relações laborais que, analisados sob o prisma da justiça organizacional, afetam o desempenho dos funcionários (Lee & Wei, 2017; Chen et al., 2016). A apreensão individual do contrato psicológico é influenciada pela natureza da CSGDRH, que sustenta um consenso de legitimidade, aumentando a percepção de justiça pelos funcionários (Harrington & Lee, 2015).
Estudos anteriores (Decramer et al., 2013; Chen et al., 2016; Lee, 2019; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021) sugerem efeitos positivos da CSGDRH na justiça, considerando que altos níveis de consistência interna afetam a satisfação; Decramer et al. (2013) avaliaram a percepção de justiça por meio de uma escala de comunicação bidirecional, concluindo que a CSGDRH eleva os níveis de desempenho no trabalho. Já Chen et al. (2016) examinaram a CSGDRH e sua influência no desempenho individual, por meio da justiça processual e da percepção do contrato psicológico. Os pesquisadores exploraram como a consistência afeta as percepções compartilhadas de justiça processual e o desempenho dos funcionários, em empresas de Taiwan, concluindo que a CSGDRH afeta positivamente o desempenho individual mediado pela justiça processual.
Ao estudar o setor público, Lee (2019) examinou como qualidade do processo de implementação do sistema de gestão de desempenho de recursos humanos relaciona-se com a motivação intrínseca e com o esforço no trabalho. Os resultados evidenciaram efeito motivacional e esforços maiores para aqueles funcionários que apreenderam sensações de justiça em relação à consistência (Lee, 2019). Já Stankevičiūtė e Savanevičienė (2021) investigaram a relação entre comportamento dos líderes na gestão de desempenho, engajamento no trabalho e justiça organizacional no setor público da Lituânia, indicando que o esta-belecimento de metas e feedback - componentes associados à consistência - impactaram positivamente no engajamento no trabalho.
A partir dessas pesquisas, percebe-se que uma gestão de desempenho consistente, favorece o sentimento de justiça no trabalho, tornando os funcionários mais engajados (Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021). Quando os objetivos são ambíguos e inconsistentes, torna-se mais difícil essa interpretação para os colaboradores (Kakkar & Vohra, 2021). Assim, os funcionários são menos propensos a demonstrar engajamento no trabalho, pois não visualizam relação positiva entre esforço e resultado (Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021). Quando percebida de forma injusta e inconsistente, aumenta a sensação de incerteza, reduzindo o engajamento no trabalho (Lee, 2019; Maake et al., 2021; Sharma et al., 2016). Assim, a hipótese elaborada nesta pesquisa estabelece que:
Em termos de resultados organizacionais positivos, o envolvimento dos funcionários na gestão desses sistemas torna-seimperativo às organizações (Maake et al., 2021; Kumar & Padhi, 2021). A CSGDRH propõe o alinhamento do estabelecimento de metas com o fornecimento de feedback e avalição (Audenaert et al., 2019; Kakkar & Vohra, 2021; Van Thielen et al., 2018). Dessa forma, reiterar os valores, os comportamentos e as atitudes, oferece uma percepção de consistência que implica em uma compreensão abrangente da avaliação, e desenvolve padrões de desempenho adequados, refletindo-se no engajamento no trabalho (Chen et al., 2016; Decramer et al., 2013; Van Thielen et al., 2018). Ao utilizar objetivos claros e específicos, a consistência conduz as relações interorganizacionais com foco na segurança, no consenso e na legitimidade, propondo um ambiente mais justo, razoável e estável em relação às regras de gestão de desempenho de recursos humanos (Chen et al., 2016).
3. Procedimentos metodológicos
A pesquisa caracteriza-se como quantitativa, descritiva e de levantamento, realizada por meio de uma survey single Entity (Mucci, Frezatti & Dieng, 2016), junto aos servidores de diferentes cargos de uma organização pública federal brasileira. O corte populacional deu-se pela escolha de uma Autarquia vinculada ao Ministério da Infraestrutura (MInfra), que utiliza um sistema de gestão de desempenho de recursos humanos, com avaliação anual e servidores participantes de no mínimo 8 ciclos.
Os construtos CSGDRH, engajamento no trabalho e justiça organizacional foram mensurados por meio de itens múltiplos, com escala Likert de sete pontos. Para a CSGDRH, foi utilizado um instrumento de pesquisa com 12 itens (Sharma, Sharma & Agarwal, 2016). Para engajamento no trabalho, utilizou-se a Utrecht Work Engagement Scale (UWES), em versão reduzida (Schaufeli, Bakker & Salanova, 2006), com nove itens. Justiça organizacional foi avaliada pela Escala de Percepção de Justiça de Colquitt (2001) , com 13 itens. A Tabela 1 apresenta as definições operacionais dos construtos.
Construtos/Variáveis | Definições Operacionais | |
---|---|---|
CSGDRH | Um sistema de gestão de desempenho é consistente quando os objetivos dos empregados estão vinculados aos organizacionais; o feedback fornecido está concatenado aos objetivos definidos; a avaliação retrata o feedback com acurácia; e as recompensas são proporcionais a toda avaliação processada (Sharma, Sharma & Agarwal, 2016). | |
Engajamento no Trabalho (ENG) | Diz respeito a comportamentos positivos no ambiente de trabalho, caracterizado pelo comprometimento (Schaufeli, Bakker & Salanova, 2006). | |
Justiça organizacional (JUST_ORG) | Justiça Distributiva (JDIS) | Refere-se à percepção dos colaboradores sobre justiça nas relações laborais que ocorrem dentro da organização (Colquitt, 2001). |
Justiça Processual (JPRO) | ||
Justiça Informacional (JINF) | ||
Justiça Interpessoal (JINT) |
Fonte: elaboração própria.
A coleta de dados foi realizada a partir de um recorte transversal; o contato com os servidores foi realizado pelo aplicativo WhatsApp® em maio de 2022, cuja escolha se deu por acessibilidade. Os grupos de contato abrangeram àqueles cargos das áreas de atividades meio (com competências voltadas às atividades de natureza administrativa) e áreas de atividades fim (com competências relacionadas ao produto a ser entregue à sociedade).
Todos os servidores, de diferentes estratos sociais, foram contemplados como potenciais respondentes, dado que o processo legalmente estabelecido de gestão de desempenho de recursos humanos, ocorre de forma indistinta entre os servidores da Autarquia, a exceção dos servidores em situação de cedidos, afastados e aos ocupantes exclusivos de cargos em comissão, que não compuseram a amostra. Avulta-se que os cargos de gestão da Autarquia são ocupados quase que exclusivamente por servidores efetivos do quadro. Ao final da coleta de dados, a amostra reuniu 132 servidores, de uma população de 2.197 potenciais respondentes.
Os dados foram analisados por meio de estatísticas descritiva e de equações estruturais (Hair Jr., Black, Anderson & Tatham, 2009). A análise no SmartPLS® compreendeu a estatística descritiva dos indicadores de cada construto de mensuração. Na sequência, foi realizado o teste de viés de método, utilizando-se da análise de componentes principais e, por conseguinte, avaliouse o ajuste, a validade e a confiabilidade dos modelos pela análise fatorial confirmatória (Hair Jr et al., 2009). A avaliação da qualidade do modelo seguiu os critérios definidos para medidas do ajuste global (Ringle, Silva & Bido, 2014). Após a análise confirmatória, foi realizada a avaliação dos modelos estruturais de mensuração, cujos resultados são mostrados no próximo tópico.
4. Resultados e discussões
4.1. Características dos respondentes.
A amostra desta pesquisa é composta de 132 servidores públicos, dentre gestores e não gestores. Os respondentes do gênero masculino prevaleceram na amostra (58%). Em relação à faixa etária dos participantes, a predominante foi entre 31 e 40 anos, totalizando 44,69% dos respondentes. Referente à área de atuação na entidade pública em análise, 62,9% dos respondentes pertencem à área meio. Verificou-se que, dentre o total de respondentes, 97,7% possuem no mínimo Ensino Superior Completo, contemplando os graus de Mestrado (7,6%) e Doutorado (2,3%).
Em relação ao exercício de cargo de gestão, 62,1% responderam que não exercem função de chefia na entidade pública, enquanto 37,9% afirmaram exercer alguma função de gestão. Esses resultados vão ao encontro da estrutura organizacional enxuta do ente público, com poucos cargos de gestão nas unidades descentralizadas. Ademais, percebe-se que os respondestes estão concentrados, em sua maioria, na faixa de período de experiência de 8 a 10 anos (com 81 respondentes). Sublinha-se que grande parte dos participantes, passou por, no mínimo, oito ciclos de avaliação de desempenho, submetendo-se a uma avaliação 360 graus. Caracteriza-se como uma amostra experiente quanto à avaliação de desempenho, que proporciona maior robustez e confiabilidade dos resultados deste estudo.
4.2.Análise Descritiva dos Dados.
A análise descritiva consistiu na avaliação dos intervalos reais de mínimo e máximo, mediana, moda, média e desvio padrão. Os resultados da CSGDRH revelam que nem todos os respondentes percebem a consistência. As variáveis que buscam verificar se “o plano de desempenho baseado no sistema de gestão de desempenho de recursos humanos proporciona uma ideia de clareza das metas organizacionais a serem atingidas”, e se “o plano de desempenho ajuda a focar os esforços na identificação de metas, comportamentos ou habilidades relevantes para atingir os objetivos organizacionais” apresentaram maiores médias (respectivamente 4,96 e 4,94), menores desvios padrão (respectivamente 1,75 e 1,71) e moda e mediana entre 6 e 7. Esses achados indicam uma tendência dos participantes de compreenderem os planos de desempenho, e associarem às suas respectivas metas.
A variável “os comportamentos e habilidades dos respondentes são avaliadas com precisão em um processo de revisão” apresentou menor média (3,92). Esse resultado aponta para uma menor percepção do processo de revisão e feedback, em relação à CSGDRH, com o agravante de que maioria dos participantes assinalou a menor escala nessa variável. Tal achado sugere uma maior ação da entidade pública nas fases iniciais do ciclo de vida dos sistemas de gestão de desempenho de recursos humanos (Guesser et al., 2020). Para Audenaert et al. (2019) , a consistência dos CSGDRH reivindica um ciclo contínuo de subpráticas. A menor percepção do processo de revisão e feedback sugere quebra da continuidade das subpráticas que compõem o ciclo de vida dos sistemas de gestão de desempenho de recursos humanos, reduzindo a satisfação no trabalho (Bauwens et al, 2019). Mitigar essa percepção pode repercutir positivamente no bem-estar e no desempenho individual e organizacional (Decramer et al., 2013). Tais achados indicam que, em média, servidores da área meio tem melhor percepção da CSGDRH que os da área fim; o gênero feminino percebe a consistência melhor que o masculino, enquanto gestores e não-gestores apresentam percepção bem semelhante. Este último corrobora os resultados de Decramer et al. (2013) que, ao contrário do esperado, cargos de gestão, comparados aos operacionais não percebem melhor consistência interna das práticas de gestão de desempenho.
A análise da justiça organizacional alude que nem todos os respondentes estão satisfeitos com a avaliação de desempenho. A dimensão justiça interpessoal foi melhor avaliada, considerando que as chefias tratam os participantes da pesquisa de forma respeitosa, educada e com dignidade (média de 6,22, moda e mediana 7). A dimensão justiça informacional apresentou média de 4,68 e mediana 5, o que pode influenciar na concordância da política de comunicação da entidade em termos de promover a transparência ativa e passiva dos seus atos. Todavia, as justiças distributiva e processual apresentam as menores médias, indicando que alguns dos servidores consideram o não atingimento do padrão de equidade estabelecido, nem os métodos decisórios respaldados na equidade dos processos (Dai et al., 2013; Holtz & Hu, 2017; Lee & Wei, 2017; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021). Nesse ponto, há indivíduos com percepções de inconsistência em relação ao processo de avaliação, com destaque à variável “consigo expressar minhas opiniões e sentimentos durante os procedimentos de avaliação de desempenho” (moda igual a 1), sugerindo que os res-pondentes têm participação passiva na avaliação. Esse resultado vai de encontro à ideia de avaliação 360 graus, alvitrando o real poder ativo da ferramenta em relação à participação do servidor na avaliação de desempenho, não refletindo, de forma efetiva, o seu desejo.
Em relação às dimensões que apresentam menores percepções de justiça organizacional, a variável “as recompensas são justas ao considerar os demais salários recebidos na instituição” apresentou menor média (3,77), permitindo perceber que a maioria dos servidores se manifestou negativamente quanto a justiça distributiva em relação aos salários recebidos. Esse achado está intrinsecamente ligado à tendência de comparação dos inputs e outputs percebidos, em que os indivíduos podem não considerar justas suas remunerações ao nível de produção, engajamento e comprometimento em comparação com seus pares (Lee & Wei, 2017; Lee, 2019; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021).
Os achados indicam que, em média, servidores da área meio tem melhor percepção da justiça organizacional que os da área fim; que o gênero feminino tem melhor percepção que o masculino, enquanto gestores apresentam percepção mais positiva da justiça organizacional que os não-gestores. Chen et al. (2016) não constataram diferenças entre percepções de justiça no mesmo ambiente organizacional. Tal apontamento convergiu com o encontrado nesta pesquisa apenas para os grupos compostos pelos gêneros feminino e masculino, enquanto as diferenças de percepção de justiça organizacional entre áreas meio e fim e, gestores e não-gestores, apresentaram dissimilaridades mais acentuadas.
A análise do engajamento no trabalho expõe que, nem todos os participantes do estudo sentem-se engajados. As variáveis “estou orgulhoso com o trabalho que faço” e “estou imerso em meu trabalho” obtiveram maiores médias (5,53 e 5,48, respectivamente) e menores desvios padrão (1,51 e 1,50, respectivamente). Tal achado representa que os participantes têm maior nível de concordância em relação ao elemento dedicação, componente do engajamento no trabalho, posto que o servidor está envolto em um clima de orgulho e pertencimento (Ancarani et al., 2021; Maake et al., 2021; Strom et al., 2014). Esse construto apresentou menores médias nas variáveis “quando me levanto pela manhã, tenho vontade de ir trabalhar” e “deixo-me levar pelo meu trabalho”. O primeiro relacionado ao elemento vigor, assinalado por elevados níveis de energia. Já o segundo, refere-se ao elemento absorção, no qual os servidores se apresentam apreendidos pelo trabalho (Ancarani et al., 2021; Maake et al., 2021; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021; Strom et al., 2014). Esses resultados denotam que alguns servidores não tendem a empregar esforços extras para o alcance dos objetivos organizacionais (Awan et al., 2020; Kumar & Padhi, 2021).
O engajamento no trabalho assinala que, em média, servidores da área meio estão mais engajados que os da área fim; que o gênero feminino sentese mais engajado que o masculino; e que gestores apresentam maior engajamento que os não-gestores. Esse achado pode estar relacionado à diferença de percepção da justiça organizacional entre os dois grupos, pois os não-gestores apresentaram menor percepção de justiça organizacional em relação aos gestores. A percepção positiva da justiça organizacional pode moldar o comportamento dos servidores, impactando no engajamento no trabalho de modo a potencializá-lo (Harrington & Lee, 2014; Lee & Wei, 2017; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021).
4.3. Equações Estruturais
Para verificar o efeito da relação mediadora da justiça organizacional entre CSGDRH e engajamento no trabalho, utiliza-se a modelagem de equações estruturais. Iniciando-se pela avaliação do modelo estrutural, observa-se que as cargas padronizadas apresentamse superiores a 0,5, fator mínimo para confirmação da presença de todas as variáveis no modelo (Hair Jr. et al., 2009). Percebe-se que os índices de ajuste e confiabilidade do modelo estão entre os valores aceitáveis de ajustamento, confirmando sua validade preditiva. Os valores das raízes quadradas das Average Variance Extracted(AVEs) foram superiores às correlações dos construtos.
A Tabela 2 evidencia valores acima de 0,5 para AVE (Henseler et al., 2009), tendo a justiça organizacional AVE de 0,576, o menor valor do critério. Ao analisar a multicolinearidade entre os fatores (VIF), os resultados obtidos são definidos como aceitáveis (Hair Jr. et al.,2016). Os valores para confiabilidade composta estão acima de 0,919, superior ao valor de 0,70; considerado aceitável (Hair Jr. et al., 2016). O Alfa de Cronbach mostraramse adequados aos construtos e variáveis (Hair Jr. et al., 2016), conferindo confiabilidade e adequação ao modelo testado.
Validade Discriminante | CSGDRH | ENG | JDIS | JINF | JINT | JPRO |
---|---|---|---|---|---|---|
CSGDRH | 0.844 | |||||
ENG | 0.523 | 0.863 | ||||
JDIS | 0.654 | 0.489 | 0.933 | |||
JINF | 0.733 | 0.544 | 0.638 | 0.948 | ||
JINT | 0.250 | 0.276 | 0.278 | 0.438 | 0.979 | |
JPRO | 0.790 | 0.579 | 0.710 | 0.748 | 0.383 | 0.890 |
CollinearityStatistic (VIF) | ENG | JDIS | JINF | JINT | JPRO | JUST_ORG |
CSGDRH | 2.523 | 1.000 | ||||
JUST_ORG | 2.523 | 1.000 | 1.000 | 1.000 | 1.000 | |
Indicadores de Confiabilidade | AVE | CC | Alfa de Cronbach | R Square | Relevância Preditiva (Q²) | Tamanho do Efeito (f²) |
CSGDRH | 0.712 | 0.967 | 0.963 | - | - | 0.658 |
ENG | 0.745 | 0.963 | 0.957 | 0.363 | 0.266 | 0.683 |
JUST ORG | 0.576 | 0.945 | 0.937 | 0.604 | 0.339 | 0.514 |
JDIS | 0.870 | 0.964 | 0.950 | 0.744 | 0.638 | 0.760 |
JINF | 0.898 | 0.964 | 0.943 | 0.779 | 0.694 | 0.740 |
JINT | 0.958 | 0.986 | 0.978 | 0.319 | 0.298 | 0.844 |
JPRO | 0.791 | 0.919 | 0.868 | 0.796 | 0.625 | 0.552 |
Fonte: elaboração própria.
Ao avaliar a porção da variância das variáveis endógenas, por meio da verificação dos coeficientes de determinação de Pearson (R²), observa-se que a relação com menor poder de influência ocorreu entre CSGDRH e JINT (0,322), seguida pela relação entre CSGDRH e engajamento no trabalho (0,363). A relevância preditiva do modelo, mensurada pelo indicador de Stone-Geisser (Q²), denotou menor valor registrado, condizente com Hair Jr. et al. (2016) . O menor valor encontrado de f² foi de 0,514, construto da justiça organizacional, superior a 0,35 definido como satisfatório para o ajuste do modelo estrutural (Hair Jr. et al., 2016). A Tabela 3 apresenta os resultados dos coeficientes estruturais e significância das relações testadas.
Observaseque os efeitos diretos da CSGDRH sobre o engajamento no trabalho não foram suportados. O caminho (path) CSGDRH→ENG não se mostrou estatisticamente significativo (β: 0,155; p<0,170). O teste t para esta relação também não foi aceitável, segundo Hair Jr. et al. (2009) . Tais fatos reforçam o ensejo de analisar variáveis intervenientes como recursos que determinam as habilitações capazes de promovera relação na qual uma maior CSGDRH resulta em melhor engajamento no trabalho. Todas as demais relações foram significativas (p>0,001).
A relação CSGDRH→JUST_ORG revelou os melhores indicadores, sugerindo efeitos diretos e positivos. O R² da relação CSGDRH→JUST_ORG mostra que 60,4% da variância é explicada por suas variáveis independentes. O teste t é satisfatório, de acordo com Hair Jr. et al. (2009) . O modelo aborda ainda a relação JUST_ORG→ENG, que se apresentou como positiva e significativa, a partir dos resultados do teste t (3,783), superior ao recomendado por Hair Jr. et al. (2009).
4.4. Discussões
Os resultados do modelo testado revelam uma influência indireta da CSGDRH→ENG, por meio da justiça organizacional, ao passo que o coeficiente de caminho, que mede relação direta entre CSGDRH e o engajamento no trabalho, revela um valor de β de 0,155. O caminho indireto da CSGDRH no engajamento no trabalho, influenciado pela justiça organizacional, reflete um valor de 0,368. O produto dos coeficientes perfaz um efeito total de 0,523. A percepção da justiça organizacional nesta relação permite uma melhor compreensão dos efeitos da CSGDRH no engajamento no trabalho, considerando que o coeficiente de explicação do modelo mediador é maior que aquele vinculado à relação direta entre CSGDRH→ENG. Os resultados permitem confirmar a hipótese de que a justiça organizacional medeia a relação entre a CSGDRH e o engajamento no trabalho.
Os resultados seguem o preconizado na pesquisa de Awan et al. (2020) , que sugeriram a inclusão da percepção da justiça organizacional como variável mediadora entre eficácia do sistema de gestão de desempenho e o engajamento no trabalho. Sharma et al. (2016) também haviam declarado que atributos da eficácia de um sistema de gestão de desempenho podem potencializar o engajamento, considerando a justiça organizacional como aspecto imbricado à eficácia, termo que engloba aspectos da consistência do sistema de gestão de desempenho.
Caminhos estruturais | β | t-value | p-value | R2 |
---|---|---|---|---|
CSGDRH → ENG | 0.155 | 1.375 | 0.170ns | 0.363 |
CSGDRH → JUST ORG | 0.777 | 19.961 | 0.000 | 0.604 |
JUST ORG → ENG | 0.474 | 3.783 | 0.000 | 0.363 |
Fonte: elaboração própria.
Por conseguinte, os resultados desta pesquisa são congruentes com aqueles apresentados por Stankevičiūtė e Savanevičienė (2021) , que encontraram relação mediadora da justiça organizacional entre clareza de metas e feedback (atributos da consistência) e o engajamento no trabalho, impactando-os de forma positiva. Corroboram Chen et al. (2016) que, ao analisarem a consistência das práticas de GRH, alvitraram em seus achados que o clima de justiça processual tem efeitos de mediação significativos entre a consistência de práticas de gestão de recursos humanos e o desempenho dos funcionários. Percebe-se na literatura anterior, que a CSGDRH é um construto preditor da justiça organizacional e do engajamento no trabalho (Chen et al., 2016; Kakkar & Vohra, 2021; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021).
Como mediadora, a justiça organizacional estabelece que a influência da CSGDRH no engajamento no trabalho pode ser entregue pela formação de um clima organizacional de consistência e percepção individual de justiça, no desempenho atitudinal do funcionário. A CSGDRH contribui na construção de um modelo de causa e efeito no ambiente de trabalho, com impactos positivos na justiça e na percepção do funcionário em relação ao pactuado com a organização, na forma de contrato psicológico (Chen et al., 2016). A CSGDRH impacta psicologicamente os funcionários por meio da justiça organizacional como um mecanismo de engajamento no trabalho (Kakkar & Vohra, 2021). À medida que os funcionários tendem a julgar mais as decisões organizacionais como justas ou não, a justiça organizacional ganha furor para explicar uma ampla gama de comportamentos, como o engajamento no trabalho (Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021).
Como fator organizacional da avaliação de de-sempenho, a CSGDRH funciona como meio de integração entre as necessidades organizacionais e individuais (Kakkar et al., 2020; Maake et al., 2021; Stankevičiūtė & Savanevičienė, 2021), representando mais um recurso que apoia o crescimento, aprendizado e autonomia do funcionário, elevando, assim, a sensação de per-tencimento à organização, e de justiça organizacional, com impacto em melhores níveis de engajamento no trabalho (Ancarani et al., 2021; Kakkar & Vohra, 2021; Chen et al., 2016). Assim, a CSGDRH promove apoio organizacional aos servidores públicos, seja pelo estabelecimento de metas e feedbacks objetivos e co-erentes, seja pela adoção de atitudes análogas, livres de contradições, durante todo o processo de gestão de desempenho de recursos humanos, ao fomentar a percepção de justiça organizacional e direcionar esforços aos objetivos estratégicos, visando melhor desempenho individual e organizacional.
5. Conclusões
Com objetivo de analisar os efeitos da CSGDRH no engajamento no trabalho, mediado pela justiça organizacional em uma Autarquia Pública Federal Brasileira, procedeu-se um estudo quantitativo, descritivo, utilizando-se de uma survey single Entity. A amostra foi composta por 132 servidores públicos, sendo 50 gestores e 82 não-gestores, com participação mínima em oito ciclos de avaliação de desempenho de recursos humanos. Os dados foram analisados por meio da modelagem de equações estruturais.
Os achados do modelo indicam que os efeitos comportamentais da justiça organizacional são capazes de melhorar os fatores de influência da CSGDRH no engajamento no trabalho. Os efeitos positivos da CSGDRH podem agir de tal forma a sustentar a legitimidade dos sistemas de gestão de desempenho de recursos humanos, aumentando as percepções de justiça dos servidores em relação aos contratos psicológicos firmados com a organização, fomentando, assim, o engajamento e desempenho no trabalho. A consistência e o clima positivo de justiça fortalecem os canais de comunicação intraorganizacionais e ajudam os servidores públicos na compreensão das mensagens e foco nos objetivos da organização. A partir da condição preditora da CSGDRH para com construtos comportamentais, sobreleva-se a sua capacidade de influenciar a gestão de desempenho de recursos humanos de forma positiva, integrando o nível organizacional ao individual.
Os resultados da pesquisa permitiram concluir que a CSGDRH é preditora da justiça organizacional e do engajamento no trabalho. O atributo da consistência tem o potencial de reforçar o alcance dos objetivos propostos pelo sistema de gestão de desempenho de recursos humanos, e de superar os entraves percebidos na gestão de desempenho de recursos humanos do setor público por meio de uma comunicação clara. De acordo com Stankevičiūtė e Savanevičienė (2021) , são percebidos menores níveis de engajamento no trabalho no setor público em relação ao setor privado. Dessemelhança que pode ser suavizada a partir da utilização de sistemas de gestão de desempenho de recursos humanos consistentes, visto que esta pesquisa denotou, assim como na seara privada, que a Administração Pública pode valer-se da CSGDRH como fator capaz de influenciar os comportamentos dos funcionários, e impactar seu nível de engajamento no trabalho (Awan et al., 2020; Maake et al., 2021).
Os resultados apontados fornecem subsídios aos gestores quanto aos fatores sensíveis ao engajamento no trabalho de servidores públicos. A percepção dos servidores públicos acerca dos construtos analisados pode ser utilizada para melhorar a compreensão da gestão de desempenho individual. Ao verificar a relevância das relações e as diferentes percepções dos servidores em relação à CSGDRH, o engajamento no trabalho e a justiça organizacional, principalmente entre áreas meio e fim, e gestores e não-gestores, reforça-se os aspectos da consistência entre grupos com percepções mais negativas. A compreensão dos motivos desses resultados deve ser o gatilho para elevar os níveis de percepção de justiça organizacional e, consequentemente, engajamento no trabalho, pois, quando o sistema de gestão de desempenho de recursos humanos é inconsistente, tende a promover efeitos negativos no comportamento dos indivíduos. Ademais, compreender a CSGDRH pode favorecer a implementação e institucionalização de novos sistemas de gestão de desempenho de recursos humanos.
Algumas limitações do estudo podem ser referenciadas: a transversalidade da análise que não permite estabelecer relações de causalidade. Os resultados da pesquisa estão sujeitos ao viés de confirmação, cujas percepções dos construtos em análise são subjetivas e abertas à interpretação. A definição da análise apenas em uma entidade pública não permite, também, a generalização dos resultados para todo o setor público.
Nesse sentido, o estudo de mais organizações pode potencializar os resultados. Entretanto, outra limitação deve ser considerada: a necessidade de utilização de um sistema de gestão de desempenho de recursos humanos, critério que justificou a pesquisa na entidade pública em questão. O número de respondentes e a amostra, também podem representar uma limitação. Ao utilizar uma amostra por acessibilidade, pode ocorrer comprometimento da representatividade. Apesar das limitações, o rigor metodológico aplicado na pesquisa minimiza tais efeitos, corroborando a conformidade do desenvolvimento do estudo.
Os achados da pesquisa contribuem com a literatura acerca do tema e convidam gestores a perceberem a importância da CSGDRH à iniciativa pública e aos impactos sociais da ausência desse atributo na gestão de desempenho de recursos humanos. Com isso, a organização pública em estudo pode direcionar recursos à manutenção de fatores que favoreçam a CSGDRH e eficácia dos sistemas. Ao apontar a relevância da CSGDRH para o engajamento no trabalho e o papel mediador da justiça organizacional, há um imperioso estímulo de análise de outros fatores comportamentais que possam influenciar essa relação, tais como satisfação no trabalho, empoderamento, impacto social percebido, quebra do contrato psicológico, rotatividade, dentre outros.
Pesquisas futuras podem abranger a avaliação da consistência nas fases do ciclo de vida dos sistemas de gestão de desempenho de recursos humanos, ou abranger períodos longitudinais e serem replicadas em outros entes públicos, contribuindo para consolidação da área comportamental da contabilidade, ainda considerado tema emergente.