Introdução
O Processo de Desenvolvimento de Produtos (PDP) é descrito como um conjunto de atividades que, a partir das necessidades do mercado e das oportunidades e restrições tecnológicas, não ignorando as estratégias competitivas e os produtos da empresa, busca chegar às especificações de projetos de um produto e de seu processo de produção de criação (Rozenfeld et al., 2006). Assim, o PDP é uma área empresarial que se destaca cada vez mais por ser um fator determinante no sucesso de novos produtos no mercado (Salgado, Salomon e Mello, 2012).
O cuidado nas etapas do PDP pode evitar, por consequência, o mau investimento de tempo e recursos, seja ele humano, seja monetário, gerando um produto com ampla aceitação, valor reduzido e com tempo de ciclo de desenvolvimento menor. Além das práticas iniciais, a gestão no PDP deve também acompanhar o produto depois de lançado, com o intuito de aprimorá-lo ou até mesmo descontinuá-lo. O acompanhamento do produto também gera conhecimentos e lições que serão aproveitados em novos processos de criação, independentemente do setor analisado (Rozenfeld et al., 2006).
A biotecnologia tem diversas aplicações em vários setores do desenvolvimento, tais como: proteômica (a identificação de estruturas especiais em proteínas), produtos farmacêuticos, bioengenharia, biomateriais e alimentos geneticamente modificados (Marques e Neto, 2007). Com sua extensa gama de disciplinas - bioquímica, ciências da engenharia, genética, informática, biologia molecular, nanotecnologia etc. a biotecnologia tem importante contribuição em novos mercados e economias baseadas em tecnologia (Da Silva, Baydoun e Badran, 2002). Apesar disso, empresas que trabalham com biotecnologia são prejudicadas pela sua vasta área de aplicação, isso em razão do desafio que é atrair investidores que consigam entender a tecnologia e suas aplicações (Vanderbyl e Kobelak, 2007).
É de fundamental importância para o sucesso de empresas que demandam grande índice de inovação que o desenvolvimento de produtos entre as empresas de biotecnologia seja levado com seriedade, pois é um processo criterioso e dinâmico que envolve vários riscos. Assim, é importante que sejam gerenciadas com cautela todas as etapas de inovação, para que seja evitada tomada de decisões que impliquem riscos significativos (Wang, Lin e Huang, 2010).
Nesse sentido, o presente trabalho teve como principal objetivo elaborar um modelo de tomada de decisão que evite a ocorrência de riscos significativos durante o desenvolvimento de novos produtos de base biotecnológica, com o intuito de dar suporte aos gestores de empresas da área. A elaboração do modelo contou com o auxílio de especialistas no assunto que julgaram e atribuíram valores numéricos aos principais riscos, levantados a partir de uma revisão sistemática de literatura, durante o desenvolvimento de novos produtos, o que possibilitou a criação de uma escala por meio da adoção do Processo de Análise Hierárquica (Analytical Hierarchy Process, AHP) (Hernández, Marins, Duran e Rocha, 2009). Portanto, contribui para a formação de um recurso intelectual acerca de gestão de desenvolvimento de produtos para auxiliar líderes de projetos na área de biotecnologia, podendo ser extrapolado para outros ramos para os quais a inovação é de grande relevância.
Revisão de literatura
Processo de Desenvolvimento de Produtos
O PDP é um ponto fundamental para que seja mantida a competitividade entre as empresas (Tyagi et al. 2015), fato que é decorrente do mercado, que se torna cada vez mais internacionalizado e exigente (Salgado et al., 2012). Segundo Yeh e colaboradores (2010), as empresas precisam se atentar para múltiplos critérios no PDP para melhor gerir suas.
As novas exigências mercantis fizeram com que a grande maioria das empresas adotasse uma nova abordagem durante seu processo de criação, na qual as atividades do PDP são conduzidas simultaneamente. Com isso, é possível se fazerem alterações no projeto com menor custo de tempo e dinheiro, o que torna o processo mais flexível (Hallikas, Virolainen e Tuominen, 2002; Silva e Rozenfeld, 2007).
Um ponto-chave a ser enfrentado durante o processo de inovação seria: como adquirir conhecimento sobre as fontes de incerteza e como gerenciá-las para reduzir o risco de falha do projeto (Mu, Peng e Maclachlan, 2008). Conhecer a constante mudança de necessidades do público-alvo durante o processo de inovação é um elemento vital para alinhar as estratégias da organização, e isso pode ser atingido com a adoção de metodologias que auxiliem o melhor entendimento dos requisitos exigidos pelos consumidores (Prajogo, 2016).
Para Mingo (2009), a filiação de startups, que possui um grande potencial de PDP, a grupos empresariais melhora as chances de sobrevivência em economias emergentes e, em particular, na América Latina.
Riscos associados ao Processo de Desenvolvimento de Produtos
Risco pode ser definido de diferentes maneiras de acordo com a área em que é empregado. No gerenciamento de projetos, por exemplo, risco é considerado um evento incerto, que pode ser positivo (oportunidade) ou negativo (ameaça). Apesar disso, muitos estudiosos da área consideram que risco está mais ligado a efeitos adversos. Dessa perspectiva, pode-se considerar que o gerenciamento de riscos está relacionado com a identificação e o manejo de ameaças ao projeto (Wang et al., 2010).
Não correr riscos, no entanto, significa deixar de inovar. As firmas são assim obrigadas a adotarem estratégias e ferramentas para mais além de evitar riscos significativos, lançarem produtos de sucesso para se manterem competitivas. Apesar de necessária, a tarefa de eliminar e mitigar os vários riscos inerentes ao PDP é desafiadora (Mu et al., 2008).
Risco de Recursos Humanos
A eficiência dos modelos de gerenciamento durante o PDP depende da experiência do gerente de projetos em adaptá-los à realidade de cada produto em desenvolvimento. Engwall, Kling e Werr (2005) identificaram a existência de gerentes de projetos que consideram a criação e a manutenção de uma boa equipe a tarefa central de seus trabalhos. Mais do que isso, para eles, o gerenciamento de projetos é tanto gerir a motivação dos colaboradores e suas interações quanto planejar tecnicamente a solução de problemas. Além de que, integrar uma nova tecnologia a um novo produto por vezes é uma tarefa difícil; assim, a capacidade dos colaboradores do setor de pesquisa e desenvolvimento (P&D) de uma empresa é uma das principais preocupações existentes durante o PDP (Chin et al., 2009).
Risco de produção
A probabilidade de as exigências do processo de produção não serem satisfeitas dentro do cronograma é hoje a melhor definição para o risco de produção. A performance de um novo produto pode facilmente ser afetada pela sua complexidade de produção e pelo seu projeto. Assim, a simplificação e a aplicação de um projeto confiável aumentam as chances de manutenção e a confiança do novo produto (Chin et al., 2009). É importante também haver uma integração dos setores para a adequação do projeto às partes interessadas (Swink e Song, 2007).
Riscos de suprimento
O gerenciamento de suprimentos é um dos fatores mais críticos dentro do desenvolvimento de produtos (Chin et al., 2009). Pode ser definido como a probabilidade de os fornecedores não entregarem matérias-primas de qualidade dentro do cronograma. Os fornecedores têm impacto direto na qualidade, no preço, na velocidade, na tecnologia e na capacidade de resposta de quem compra (Sawik, 2013). Portanto, uma integração efetiva entre a companhia e seus fornecedores é um ponto-chave para as empresas que querem se manter competitivas (Schiele, 2010).
Risco de requisitos do produto
Dentro do contexto do PDP, um novo produto começa com uma nova ideia, o estado mais embrionário de um projeto de inovação. Quando amplificada, ou seja, quando desenvolvida e acrescida de outras ideias, e depois de testada, refinada, alinhada e ajustada às necessidades da companhia, a ideia se traduz em valor e conhecimento para a empresa, que orienta todo o PDP (Akbar e Tzokas, 2013).
A concepção de uma nova ideia tem por característica ser uma etapa desestruturada, menos formal, com pouca rotina, dinâmica e incerta, e por isso difícil de ser gerida. A partir dessa premissa, pode-se considerar que esta é uma etapa em que melhorias podem ser feitas sem dispender grande esforço. A qualidade do planejamento nessa etapa do desenvolvimento é determinante no sucesso do novo produto e na competitividade da organização. Isso porque é aqui que a equipe avalia se uma nova oportunidade vale a pena receber investimentos futuros (Akbar e Tzokas, 2013).
Como foi tratado em sessões anteriores, a integração entre empresas pode ser benéfica para o produto em desenvolvimento, porém certos fatores têm que estar bem definidos antes do envolvimento de terceiros no PDP. Comunicação interempresas, acordos sobre propriedade intelectual, colaboradores externos integrados à equipe e alinhamento do objetivo organizacional entre as empresas são pontos que devem ser considerados para que a parceria gere bons frutos para as duas partes (Ragatz, Handfieldb e Petersen, 2002).
Risco financeiro
Mesmo sabendo da ligação da finança na alocação de recursos, na gestão do portfólio e na gestão dos negócios, poucos estudos abordam a situação financeira com o PDP. Empresas líderes em inovação, como a 3M, promovem uma cultura de educação financeira que nomeia um analista de negócios a cada equipe responsável pelo PDP (Hempelmann e Engelen, 2014). É importante também a integração de setores como marketing, design e manufatura de forma coesa e alinhada às estratégias empresariais (Swink e Song, 2007).
Risco de mercado
O mercado por si só já carrega diversos riscos devido à sua volatilidade e às suas incertezas em relação ao mercado de ações, às taxas de juros, à taxa cambial, à recessão econômica etc. O principal risco de mercado para produtos inovadores é a própria inovação, que possui uma pequena taxa de sucesso. Para resolver esse problema, é recomendada uma aproximação do PDP com o cliente a fim de buscar um maior potencial de mercado (Enkel, Kausch e Gassmann, 2005). Pela menor taxa de sucesso, os produtos inovadores carregam uma menor confiabilidade do mercado que influencia nas receitas e nos custos, ficando difícil de prever seus efeitos sobre o lucro da empresa (Mackelprang et al., 2015).
Os riscos enfrentados pelo PDP são inter-relacionados e fazem parte da realidade de todos os departamentos da empresa. Portanto, apesar de terem sido discutidos separadamente neste artigo, é importante perceber que os vários riscos e seus sub-riscos citados aqui devem ser encarados de forma conjunta.
Empresas de biotecnologia
O aumento da população mundial tem por consequência o aumento da demanda por saúde, alimento, água e energia. Isso levanta questões de como atender a essas expectativas sem que haja um aumento significativo nos custos e um decaimento da qualidade, ao mesmo tempo aumentando a produção. E uma resposta viável para essa pergunta é a biotecnologia (Erbas e Memis, 2012).
O relatório das Nações Unidas "Making new technologies work for human development" (2001) trata a biotecnologia como fator-chave para o avanço socioeconómico de países em desenvolvimento (Erbas e Memis, 2012). Da Silva et al., (2002), por sua vez, consideram a biotecnologia como uma fonte riquíssima de oportunidades para corporações e um "motor" para países em desenvolvimento e já desenvolvidos.
O setor da biotecnologia nos EIJA tem apresentado um crescimento substancial nos últimos anos. Em 2012, esse crescimento chegou a 18,2%, cerca de sete vezes mais que o setor farmacêutico, que apresentou um crescimento de 2,5 % no mesmo ano. Esse crescimento é impulsionado por produtos biológicos, nos quais se destacam anticorpos monoclonais (mAbs), hormônios, fatores de crescimento, vacinas recombinantes, entre outros, que movimentaram cerca de USD $63,6 bilhões. Esses produtos têm potencial para combater vários tipos de câncer como o de mama, ossos, sangue, melanoma, no tratamento de diabetes, anemia, doenças renais, transtornos anti-inflamatórios etc. (Aggarwal, 2014). A taxa de aprovação de novos produtos biológicos pelas agências regulatórias é alta, o que impacta o mercado (Walsh, 2014). Outro setor da biotecnologia que tem desenvolvido novos produtos é o da engenharia genética. Com a técnica CRISPR-Cas9 de edição do genoma, empresas têm editado culturas agrícolas que tem instigado o mercado em relação à produtividade e novos produtos (Hsu, Lander e Zhang, 2014).
O estudo da Fundação Biominas "A indústria de biociências nacional: Caminhos para o crescimento" contabilizou 271 empresas no setor de biociências; destas, 52,8% (143) têm suas atividades relacionadas diretamente com a biotecnologia no ano de 2017. Essas empresas são na maioria micro ou pequenas, em que 17,8% ainda não possuem faturamento, 54,2% possuem faturamento de até 1 milhão e os outros 28,8 % possuem acima de 1 milhão. Essas empresas estão concentradas principalmente nas áreas da saúde humana (33%), agronegócio (31°%) e insumos (18%), como podemos ver no quadro 1. Cerca de 44 % delas ainda não completaram cinco anos de idade e 73% os dez anos (Biominas, 2017). As principais empresas do setor de biotecnologia possuem grandes investimentos em P&D; assim, elas se beneficiam de patentes e eliminam a concorrência mais direta, o que lhes garante lucros elevados (Fardelone e Branchi, 2006).
Áreas de atuação | Principais produtos e serviços |
Agricultura | Controle biológico de pragas Melhoramento genético de sementes |
Bioenergia | Melhoramento genético de cultivares agrícolas para a produção de etanol e biodiesel |
Insumos | Insumos reagentes para análises clínicas |
Meio ambiente | Serviços de biorremediação e tratamento de efluentes |
Mistas | Serviços de diagnóstico molecular P,D&I de produtos com múltiplas áreas de atuação |
Saúde animal | Produção de vacinas recombinantes Serviços de diagnóstico genético-animal |
Saúde humana | P,D&I de novas terapias e vacinas Diagnósticos in vitro CROS |
Nota. P,D&I: Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação; CROS: Contract Research Organizations.
Fonte: adaptado de Fundação Biominas (2009).
O quadro 2 demonstra as principais técnicas biotecnológicas divulgadas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) com o intuito de auxiliar a classificação. Essa classificação tem um caráter dinâmico em que novas técnicas podem ser incorporadas.
Segundo Marques e Neto (2007), apesar de o Brasil ter a tradição em pesquisa, ponto forte na biotecnologia, ele possuía apenas cerca de 0,46% das patentes biotecnológicas em 2009. Outro problema do setor é a relação entre a pesquisa e o setor privado. A maioria dos pesquisadores brasileiros se encontra dentro de universidades, distantes do mercado (Biominas, 2017). O desenvolvimento de políticas públicas que incentivem essa interação contribui com a transferência de tecnologia, fortalece a base tecnológica e o potencial inovador das empresas nacionais. Além disso, embora haja apoio governamental ao fomento à proteção intelectual, existe a necessidade de ampliá-lo, principalmente com o foco internacional, e assim contribuir com o fortalecimento da plataforma tecnológica das empresas nacionais, atraindo investidores (Drozdoff e Fair-bairn, 2015).
Segundo Rosa (2005), o aglomerado de empresas de biotecnologia em Belo Horizonte (estado de Minas Gerais) formam um grupo informal de empresas caracterizado pela ausência de líderes e pela baixa capacidade de inovação. Isso acontece pelo fato de a maioria das empresas ser criada pelo empreendedorismo de pesquisadores sem experiência em negócios e marketing (Biominas, 2017). Existe a necessidade de uma aproximação de atores sociais (instituições de pesquisa, profissionais da área, grupos de investidores etc.) que permitam a viabilização desse grupo de empresas.
Processo de Análise Hierárquica
O método AHP, concebido por Thomas Saaty durante os anos 1970, toma por base a estruturação de um problema em forma de hierarquia, reduzindo o estudo a uma sequência de comparações feitas aos pares (Saaty, 1980). Em geral, o AHP é usado para a tomada de decisão dedutiva e indutiva, que evita o uso de silogismo e que leva vários fatores em consideração simultaneamente, através de decisões numéricas para se chegar a uma síntese ou conclusão.
As suas maiores aplicações se encontram na tomada de decisões que envolvem multicritérios, planejamento e alocação de recursos e na resolução de conflitos (Saaty, 1987), sendo que problemas que envolvem multicritérios representam grande parte dos problemas enfrentados no mundo corporativo (Santos e Viagi, 2009). Alguns trabalhos como os realizados por Ribeiro e colaboradores (2017), Silveira, Hikichi e Salgado (2016), e Mendes, Salgado e Ferrari (2016), que empregam a ferramenta em diferentes áreas e linhas de pesquisa, podem ser utilizados como exemplos do sucesso desta.
O uso do AHP deve ser feito seguindo três princípios: decomposição, julgamentos comparativos e síntese de prioridades (Saaty, 1987). Para aplicar o princípio da decomposição, deve-se estruturar o problema em níveis hierárquicos (Saaty, 1987; Santos e Viagi, 2009) como mostrado na figura 1, em que o objetivo é o problema central a ser resolvido (Santos e Viagi, 2009). A decomposição em níveis hierárquicos torna mais fácil a compreensão e visualização do problema a ser julgado.
O princípio de julgamentos comparativos é aplicado para construir um ranking sobre a importância relativa de cada critério e subcritério por meio da atribuição de valores de importância para cada elemento (Saaty, 1987). Para tal, são utilizadas matrizes de julgamento aos pares; dessa forma, é possível obter valores de importância dos critérios e valores de desempenho dos elementos da hierarquia em relação ao seu nível superior. Os julgamentos das matrizes e a atribuição dos valores devem ser feitos por especialistas sobre o assunto abordado no problema (Santos e Viagi, 2009), o que garante que a priorização dos elementos seja coerente.
A medição da priorização é relativa e tem base na comparação de julgamentos com o uso da escala fundamental de Saaty, com a finalidade de se obter uma ordem de prioridades. Essa escala vai de 1 a 9, em que "1" significa igual importância entre os critérios comparados, "3" indica uma importância pequena de uma em relação a outra, "5" indica uma importância grande ou essencial, "7" indica uma importância muito grande ou importância demonstrada, "9" indica importância absoluta e "2", "4", "6", "8" são valores intermediários entre as definições. Saaty notou que as percepções dos indivíduos seguem escala linear, apesar de as diferenças de estímulo seguirem um padrão de escala geométrico (Santos e Viagi, 2009).
Quando as matrizes são julgadas, elas refletem a resposta a duas perguntas: "qual dos elementos comparados é mais importante em relação a um critério de nível superior e com qual intensidade, baseado na escala fundamental?" (Saaty, 1980).
Para pôr em prática e analisar os julgamentos, é necessário a formação de matrizes quadradas de ordem n e seus autovetores relacionados. A equação 1 é utilizada para demonstrar a relação entre a matriz de decisão A e o au-tovetor o, que equivale à importância de um dos critérios ou de uma das alternativas enquadradas dentro de um dos critérios.X é o autovalor, e A é uma matriz de decisão quadrada de ordem m.
A equação 2 é utilizada para calcular a quantidade de julgamentos necessários para cada matriz.
Cada matriz de julgamento deve ter sua matriz ponderada calculada, ou seja, cada elemento da coluna da matriz é dividido pela soma dos elementos da coluna. O que torna a soma dos elementos da coluna igual a 1. A próxima etapa é calcular o vetor de prioridades (pesos normalizados), que é possível por meio do cálculo da média dos elementos de cada linha. O peso normalizado é o que indica qual dos critérios ou alternativas é o mais importante.
Feito isso, é necessário fazer o cálculo do Índice de Consistência (IC) usando como referência o autovalor máximo (λ máx) obtido e o número de elementos analisados (n) como descrito na equação 3. Segundo Saaty (1980), o autovalor máximo é calculado por meio da multiplicação da matriz de julgamentos pelo vetor de prioridades; esse resultado obtido é então divido pelo vetor de prioridades.
Um dos pontos mais cruciais no uso do método AHP é a verificação da coerência do julgamento feito pelos especialistas nas comparações pareadas. De acordo com Saaty (1980), para que um julgamento seja coerente, ele precisa apresentar razão de consistência (CR) abaixo de 10%; caso o CR seja superior a esse valor, é necessário que os especialistas refaçam suas análises a fim de que seja possível utilizá-las para criar uma escala de priorização. A equação 4 é utilizada para o cálculo do CR, que leva em consideração o IC e o índice de consistência randômico (RI). O RI é determinado pela quantidade de elementos.
Depois de concluídos os julgamentos, é necessário sintetizar as prioridades, e isso pode ser alcançado de duas maneiras (Costa e Belderrain, 2009): agregação individual de julgamentos (AIJ) e agregação individual de prioridades (AIP).
O AIJ tem como premissas que os especialistas objetivam o bem de uma empresa, portanto agem em sintonia entre eles e realizam ações em consenso de modo que haja uma concordância entre os julgamentos. Em outras palavras, os especialistas agem como se fossem um único indivíduo, em que a análise hierárquica é feita a partir da média aritmética ou geométrica das matrizes de julgamento. Já o método AIP segue a linha que os especialistas não apresentam nenhum tipo de relação, e seus objetivos não seguem um padrão único e, por isso, tendem a expressar nos julgamentos suas preferências, valores e objetivos (Forman e Peniwati, 1998; Ishizaka e Nemery, 2013).
Metodologia
A obtenção dos dados foi feita por questionário, constituído por uma série de critérios e subcritérios que foram avaliados quanto à sua prioridade (aos pares) por especialistas em desenvolvimento de produtos. O questionário foi enviado por e-mail e respondidos sem a presença de um entrevistador. Essa é uma técnica de observação direta e extensiva (Lakatos e Marconi, 2003).
O artigo tem características de um estudo de casos múltiplos com uma abordagem qualitativa e quantitativa. A definição dos critérios e subcritérios por meio de uma revisão da literatura consiste na parte qualitativa. O tratamento dos dados coletados a partir do questionário representa a parte quantitativa. Como os especialistas que participaram dessa pesquisa exprimiram suas próprias opiniões e suas preferências ao responder aos julgamentos, foi adotado o método AIP para a síntese das prioridades (Costa e Belderrain , 2009).
Para elaborar o modelo de priorização de riscos durante o desenvolvimento de produtos de base biotecnológica, proposto nesta pesquisa, utilizaram-se como objeto de estudo especialistas em P&D de empresas de biotecnologia privadas bem como pesquisadores de instituições públicas.
Forma entrevistados quatro especialistas em P&D, sendo dois com formação acadêmica em Engenharia Agronômica, um em Biotecnologia e um doutor em Zootecnia.
Para ranquear a ordem de prioridade da estrutura hierárquica obtida por meio da bibliografia, foi utilizado o método AHP por meio de um software on-line (Decisões Mais Simples - Número do registro: BR512014001380-4), que oferece suporte para dois tipos de usuário, o administrador e o especialista. O administrador cria a hierarquia e convida especialistas para julgarem os elementos contidos na estrutura. O administrador tem espaço para criar uma página de ajuda, um termo de compromisso e adicionar descrições aos critérios e subcritérios para apoiar a decisão dos especialistas. As avaliações podem ser feitas por meio do método AIJ ou AIP com média geométrica ou aritmética. O resultado da priorização fica disponível em gráficos de pizza, barra e na própria hierarquia.
Critérios | Especialistas | ||||||
c1 | c2 | c3 | c4 | c5 | c6 | Prioridades | |
c1 | 1 | 3 | 5 | 5 | 7 | 9 | 23,51 % |
c2 | 1/3 | 1 | 3 | 5 | 7 | 7 | 9,99 % |
c3 | 1/5 | 1/3 | 1 | 3 | 5 | 5 | 16,29 % |
c4 | 1/5 | 1/5 | 1/3 | 1 | 3 | 5 | 12,47 % |
c5 | 1/7 | 1/7 | 1/5 | 1/3 | 1 | 3 | 13,27 % |
c6 | 1/9 | 1/7 | 1/5 | 1/5 | 1/3 | 1 | 24,51 % |
Fonte: elaborado pelos autores.
Para que o especialista possa responder ao questionário, é necessário que ele seja convidado pelo administrador e faça um cadastro, no qual é preciso fornecer nome, formação acadêmica e experiência profissional. Durante a avaliação, o especialista pode acessar a descrição dos critérios e subcritérios e ainda pode visualizar a qualquer momento o índice de consistência de seus julgamentos. Após ter concluído o questionário, o especialista tem acesso à hierarquia priorizada por ele.
Resultados e discussão
Os principais riscos utilizados para a elaboração da estrutura hierárquica específica para empresas de cunho biotecnológico foram levantados com base na literatura disponível acerca de desenvolvimento de produtos e estão listados a seguir.
A hierarquia final conteve 6 critérios e 21 subcritérios no total, divididos como a figura 2.
Para os critérios e cada grupo de subcritérios, foram feitos os julgamentos comparativos dos quatro especialistas da área para se obter uma classificação local e uma geral das prioridades de riscos. A tabela 3 demonstra os vetores de prioridades dos critérios. Todos os julgamentos foram consistentes (CR < 10%). A variação do CR foi de 0 até 8,71°%, o que demonstra que os especialistas entenderam que estavam sendo julgados e a dinâmica das comparações.
A tabela 4 mostra o ranking local e geral das prioridades.
Dentre os critérios analisados, o risco de maior importância, segundo o julgamento dos especialistas, foi o de Mercado (24,51%%), seguido por Recursos humanos (23,51%%) e Suprimentos (16,29 %). O julgado com menos importância foi o risco de Produção (9,99%), risco Financeiro em quarto (13,27%) e risco de Requisitos do produto em quinto lugar (12,47%).
É esperado que o mercado carregue os principais riscos quando se trata de um novo produto que ainda não passou pela experiência de mercado. No ranking global, "o mau ou o desconhecimento de ferramentas de mitigação de riscos", "a avaliação errada dos desejos de mercado", "a avaliação errada do potencial de mercado" obtiveram as 2a, 4a e 6a maiores prioridades respectivamente. O risco considerado de maior importância aqui foi o mal-uso e desconhecimento de ferramentas de mitigação de risco (37,86%), indo de acordo com a importância que Deszca, Munro e Noori (1999) dão a esse quesito e á necessidade de se mitigar riscos durante o desenvolvimento de produtos. O segundo subcritério mais crítico julgado pelos especialistas foi a Avaliação errada dos desejos do mercado (33,93%); esse resultado confirma a preocupação dos autores (Swink e Song, 2007) com a necessidade de aproximar o público-alvo ao projeto de desenvolvimento. A Avaliação errada do potencial de mercado (28,21%%), apesar de ter apresentado a menor prioridade entre os riscos de mercado, obteve uma boa classificação geral, o que indica a sua importância, da mesma forma observado por Samaan, Salgado, Silva e Mello (2012).
Risco de recursos humanos: dentro desse critério, o quesito de maior prioridade foi a Ausência de capacitação da equipe (42,64%), o que provou que, com o dinamismo cada vez maior do mercado, ter uma equipe bem preparada se torna um diferencial competitivo para a empresa e seus novos produtos (Harel e Tzafrir, 1999; Chin et al., 2009). Ausência de capacitação do gerente (35,43%) foi considerado o risco de segunda maior importância seguido pelo Ambiente ruim de trabalho (29,43%), o que evidencia que a capacitação da equipe juntamente com um ambiente de trabalho integralizado e harmônico são preocupações centrais, considerando que esses subcritérios apresentaram 1°, 3° e 5° priorização geral.
Risco de suprimentos: a Baixa similaridade entre os suprimentos (32,25%) foi considerado o risco que se deve ter mais atenção entre os subcritérios de Suprimento, o que evidencia a dificuldade em se formar e a importância de se manter uma cadeia de suprimentos confiável (Chin et al., 2009). O subcritério Necessidade de nova mão de obra (20,71%%) foi o segundo risco de maior relevância e mostra mais uma vez como é importante uma equipe confiável para o processo de PDP e para a mitigação dos riscos (Harel e Tzafrir, 1999; Song e Benedetto, 2008; Chin et al., 2009). Em terceiro lugar entre as prioridades desse critério, ficou o risco de Falha de logística (16,61%%), seguido de perto pela Falha na formação da cadeia de fornecedores (16,47%), mais uma vez demonstrando a preocupação com o fornecimento de suprimentos e as falhas que podem decorrer desse risco; além disso, a proximidade entre o resultados desses dois quesitos mostra a preocupação de atender ao cronograma ao evitar falhas na manufatura e na entrega dos produtos (Chin et al., 2009). Por fim, a falta de integração entre a companhia e seus fornecedores (13,22%) foi o risco considerado menos preocupante dentre os julgados, o que foi considerado um ponto-chave para Ragatz et al. (2002), Song e Benedetto (2008) e Chaudhuri, Mohanty e Singh (2012) parecem não ser tão significativo para os especialistas entrevistados.
Risco financeiro: dentre os subcritérios contidos nesse risco, o Custo do produto final acima do esperado (39,79%) foi tratado como o de maior prioridade pelos especialistas, o que mostra a preocupação das empresas em entregar um produto atrativo ao mercado, e mais uma vez a preocupação com a manufatura, pois falhas nesse processo podem gerar um custo inesperado para o produto (Deszca, Munro e Noori, 1999), o que demonstrou novamente a preocupação com o consumidor; o quesito Não tradução da voz do público-alvo (32,09%) ficou em segundo lugar, isso porque, para que o produto seja rentável, é importante que ele crie no público o desejo de comprar e continuar comprando (Deszca et al., 1999; Swink e Song, 2007). Por fim, o subcritério Falha no desenvolvimento do plano de negócios (28,13%) foi tido como o menos importante comparado aos demais; apesar disso, nenhum dos itens julgados teve destaque muito grande em relação ao outro. Embora tenha sido julgado como menos importante, é necessário se dar atenção ao plano de negócios, pois, quando criado de maneira criteriosa, é mais fácil controlar os setores da empresa, principalmente o financeiro, garantindo que sempre existam fundos disponíveis para a inovação (Vanderbyl e Kobelak, 2007).
Risco de requisitos do produto: a Não proteção da propriedade intelectual (38,61%%) foi considerado o risco mais agravante entre as alternativas contidas nos Requisitos do produto, isso mostra que, em um nicho com o P&D altamente intenso como o da biotecnologia, a proteção da propriedade intelectual se torna um fator decisivo; afinal, essa medida evita que outras empresas copiem o produto que está sendo desenvolvido (Vanderbyl e Kobelak, 2007). A Falha no gerenciamento na etapa de concepção do novo produto (32,57%) também foi considerada um fator importante durante o PDP, pois, quando essa etapa é feita de forma correta, é possível analisar de forma precisa se um novo produto tem potencial para chegar no mercado e ser bem-sucedido (Akbar e Tzokas, 2013). A Falha na integração de terceiros (28,82%) foi o subcri-tério julgado menos importante dentro dessa seção, o que leva a crer que a Falha na integração de terceiros não seja algo relevante na opinião dos especialistas.
Risco de produção: demonstrando mais uma vez a preocupação com a manufatura, o quesito Complexidade de produção (32,26%) foi considerado o mais prioritário dento dos riscos de Produção, pois um projeto muito complexo pode levar a falhas na sua execução. A preocupação com a Capacidade de produção limitada (27,06%) e a Falta de similaridade entre o processo de produção (23,31%%) demonstra novamente a necessidade que os especialistas veem em ter fornecedores confiáveis para manter sempre a produção atendendo às necessidades impostas pelos consumidores. A Falta de coesão entre os setores da empresa (17,33%), tratado por Deszca et al. (1999) e Swink e Song (2007) como fator que compromete a rotina da produção, não foi visto entre os especialistas como algo influenciável para que o novo produto chegue com qualidade ao consumidor.
Conclusões
Os riscos levantados durante a revisão da literatura tiveram por objetivo criar um modelo para a priorização de riscos no PDP em empresas de biotecnologia. É importante salientar que cada empresa tem seus desafios e sua realidade, o que significa dizer que o modelo deve ser aplicado com flexibilidade para que seja mais eficiente.
Os três riscos apontados como prioritários durante o desenvolvimento de produtos de base biotecnológica são: ausência de capacitação da equipe, mal-uso ou desconhecimento de ferramentas de mitigação de riscos e ausência de capacitação do gerente. Aqueles apontados com menor importância foram: falta de coesão entre os setores da empresa, falta de integração entre a companhia e seus fornecedores, falta de similaridade entre processos de produção.
Como sugestão para trabalhos futuros, partindo da perspectiva de que os riscos apontados neste trabalho foram coletados a partir da literatura, seria levantar dados a partir da observação direta nas empresas que trabalham com a criação de novos produtos de base biotecnológica e compará-los com os citados aqui.
Além disso, pensando em tornar esse projeto amplamente aplicável, o desenvolvimento de novos métodos de tomada de decisão tornaria essa ferramenta mais completa para enfrentar riscos que envolvem a criação de novos produtos baseados na biotecnologia.