INTRODUÇÃO
A educação para a cidadania tem como principal objetivo possibilitar a aquisição de conhecimentos e competências para a inserção responsável dos cidadãos e que pode ser assumida sob a forma de elaboração e desenvolvimento de projetos, em parceria entre as instituições académicas, sector empresarial e a comunidade em geral1. Neste sentido o desenvolvimento de competências deve ser entendido como a capacidade para uma determinada tarefa no sentido de resolver uma situação e pressupõe, antes de tudo, a aquisição de conhecimentos. Possuir conhecimentos e habilidades para prestar auxílio de forma adequada e sistemática a um qualquer cidadão que dele necessita pode representar a diferença entre a vida e a morte de um ser humano. É portanto de vital importância a obtenção de conhecimentos em Suporte Básico de Vida. Conforme refere Martins2, "nesta partilha de responsabilidades cada cidadão deve ser um participante ativo da sua segurança e da segurança coletiva" e "cada um de nós tem o dever cívico de desenvolver uma verdadeira apetência de preparação face ao perigo. Qualquer que seja o ambiente onde o cidadão está inserido, este tem em si a responsabilidade de prestar toda a assistência para o qual está capaz e lhe seja possível. Apesar de existirem diversas definições de Suporte Básico de Vida constata-se um registo homogéneo nos seus significados, procurando-se o recurso a fontes mais atuais e pertinentes. Por exemplo, em 20103, Suporte Básico de Vida é definido como "medidas iniciais e imediatas aplicadas à vítima, fora do ambiente hospitalar, onde são realizadas ações por pessoal treinado na tentativa de manter os sinais vitais - respiração, pulsação, temperatura e pressão arterial -, evitando o agravamento de lesões". Rocha4, refere que Suporte Básico de Vida compreende o atendimento prestado a uma vítima de mal súbito ou trauma, visando a manutenção de seus sinais vitais e a preservação da vida, além de evitar o agravamento das lesões existentes, até que uma equipa especializada possa transportá-la ao hospital e oferecer um tratamento definitivo.
O Instituto Nacional de Emergência Médica refere-se ao Suporte Básico de Vida, como um conjunto de medidas e procedimentos técnicos, que permitem ganhar tempo, mantendo alguma circulação e ventilação na vítima até à chegada de um socorro mais diferenciado, capaz de instituir procedimentos de Suporte Avançado de Vida5. Das definições apresentadas todas convergem para apresentar o Suporte Básico de Vida como um conjunto de técnicas e procedimentos, considerando o primeiro atendimento a ser implementado em vítimas que estejam a correr risco de vida, podendo recebê-los na rua, em ambiente doméstico ou profissional. Quanto aos objetivos do Suporte Básico de Vida são enumerados a preservação das condições vitais da vítima e do seu transporte sem causar traumas ou danos ocorridos durante a manipulação e remoção inadequada. O socorrista deve ter como princípio básico evitar o agravamento das lesões e procurar estabilizar, de forma imediata, as funções respiratórias e hemodinâmicas da vítima4. As manobras de Suporte Básico de Vida são susceptiveis de ser aprendidas por qualquer pessoa. Estas, devem ser iniciadas o mais precocemente e rapidamente possível no local onde ocorreu o acidente, desde que existam condições de segurança, quer para a vítima quer para o prestador de cuidados. A variável tempo assume importância incontestável no que respeita ao sucesso da reanimação cardiorrespiratória. Uma rápida intervenção na realização das manobras de Suporte Básico de Vida aumenta a probabilidade de sobrevivência da vítima, desde que as pessoas que as praticam as saibam realizar de forma eficiente e eficaz. O Suporte Básico de Vida integra um dos quatro elos que compõem a cadeia de sobrevivência. A cadeia de sobrevivência, em geral, é referida como um conjunto de ações que relacionam a vítima de paragem cardíaca súbita com a sobrevida6. A cadeia de sobrevivência representa, simbolicamente, o conjunto de procedimentos que permitem salvar vítimas de paragem cardio-respiratória7-8. Consideram-se três atitudes fundamentais que modificam o resultado no socorro à vítima que se encontra em paragem cardio-respiratória: i) pedir ajuda, acionando de imediato o Sistema Integrado de Emergência Médica; ii) iniciar de imediato manobras de Suporte Básico de Vida. Estas compreendem um conjunto de etapas e procedimentos sequenciais que devem ser colocados em prática para que este seja bem-sucedido. Incluem as seguintes etapas: avaliação inicial; manutenção de via aérea permeável e compressões torácicas e ventilação com ar expirado. Esta sequência de procedimentos, após a avaliação inicial, segue as etapas 'ABC', com as cujas iniciais provêm dos termos ingleses airway, breathing e circulation; iii) aceder à desfibrilhação tão precocemente quanto possível mas apenas quando indicado. Estes procedimentos ocorrem de forma encadeada sucedendo-se de forma sistemática e constituem uma cadeia de atitudes representadas por elos. Cada elo articula o procedimento anterior com o seguinte. Neste âmbito, surge o conceito de cadeia de sobrevivência, composta por quatro elos ou ações criteriosamente definidos7: i) acesso precoce ao Sistema Integrado de Emergência Médica; ii) início precoce do suporte básico de vida; iii) desfibrilhação precoce e iv) suporte avançado de vida precoce. Se tivermos em conta que a principal causa de morte no espaço europeu é a paragem cardiorrespiratória súbita9, e que dois terços destas ocorrências se passam em ambiente extra-hospitalar, compreenderemos que é fundamental que qualquer cidadão esteja apto a iniciar e exercer de forma correta manobras de Suporte Básico de Vida. Em Portugal, são também as doenças cardiovasculares que constituem um dos problemas mais graves para a população e a maior parte das mortes evitáveis associa-se à doença coronária, ocorrendo em contexto extra-hospitalar7. Atendendo a toda esta problemática, foi desenvolvido um estudo com o objetivo de avaliar os conhecimentos sobre Suporte Básico de Vida dos trabalhadores de uma Câmara Municipal, antes e após a implementação do programa de intervenção "Capacitar para Salvar" e avaliar as competências demonstradas em Suporte Básico de Vida, após a participação no programa de intervenção.
MATERIAIS E MÉTODOS
Trata-se de um estudo de natureza quantitativa, enquadrando um estudo do tipo quase-experimental e longitudinal. O carácter longitudinal é justificado pela intenção de elaborar um processo de recolha de dados em dois momentos junto do mesmo grupo. Fortin, Côté e Fillion10, referem que "o estudo longitudinal recolhe dados de forma periódica junto dos mesmos grupos e começa no presente e termina no futuro", sendo que a tipologia do estudo referida, caracteriza-se pela ausência de um grupo de controlo ou repartição aleatória e a existência de uma variável manipulável. O presente estudo integrou três fases que, sumariamente, se descrevem:
a primeira fase compreendeu a avaliação inicial dos conhecimentos sobre Suporte Básico de Vida dos trabalhadores de uma Câmara Municipal, através do preenchimento de um questionário e decorreu entre março e abril de 2016;
a segunda fase constou essencialmente da implementação de um programa de intervenção "Capacitar para Salvar", com quatro sessões com enfâse na tipologia teórico-prática sobre Suporte Básico de Vida. Cada sessão teve a duração de duas horas e decorreu durante o mês de abril de 2016;
A terceira fase diz respeito à avaliação do programa de intervenção: três meses após a implementação do programa de intervenção "Capacitar para Salvar" para avaliação dos conhecimentos e competências em Suporte Básico de Vida. Utilizou-se o questionário inicial para avaliação de conhecimentos e uma grelha de observação para avaliação de competências. Esta fase decorreu durante os meses de junho e julho de 2016.
A população que esteve na base deste estudo foi constituida por todos os trabalhadores de uma Câmara Municipal do norte de Portugal. Foi definido como critério de exclusão os trabalhdores que tiveram formação sobre Suporte Básico de Vida há menos de dois anos. A amostra, foi selecionada com base numa amostragem não probabilística por conveniência, sendo integrada por todos os trabalhadores que manifestaram o seu consentimento para participar no estudo. Como instrumentos de recolha de dados foram utilizados:
um questionário constituido por 2 partes: uma de caraterização sociodemográfica e profissional com 8 questões e uma segunda parte constituida por um questionário de avaliação de conhecimentos sobre Suporte Básico de Vida no que respeita a princípios gerais e objetivos sobre Suporte Básico de Vida, abordagem de uma vítima adulta, início das manobras de reanimação, relação entre compressões/ventilações, modo de realização das compressões, posição lateral de segurança, avaliação da respiração espontânea, manutenção de Suporte Básico de Vida e ventilação boca a boca. Trata-se de um questionário composto por um conjunto de 13 afirmações, em relação às quais o trabalhador assinalava a afirmação que melhor traduzia a sua opinião;
uma grelha de avaliação de competências em Suporte Básico de Vida, onde era registada a competência demonstrada ou não demonstrada, relativamente a 6 parâmetros: avaliação de condições de segurança, avaliar se vítima responde, pedido de ajuda, permeabilização da via aérea, avaliação da respiração e execução de compressões torácicas.
O estudo foi autorizado pela Comissão de Ética da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (parecer 11/2016) e as pessoas envolvidas foram informadas e esclarecidas acerca da natureza e objectivos do estudo e convidadas a participar de forma voluntária, sabendo que não existiam riscos nem desconfortos para quem participasse no estudo, sendo assegurado o total anonimato e confidencialidade das informações obtidas.
Os dados recolhidos foram introduzidos e tratados no software aplicativo IBM®SPSS V22. Foi realizada a análise descritiva dos dados recorrendo à estatística descritiva e inferencial das observações recolhidas. Foi verificada para as variáveis contínuas utilizadas, a ausência de uma distribuição normal (p<0,05), das respostas dadas pelos participantes. A verificação foi realizada com recurso ao teste Kolmogorov-Smirnov (K-S) que serve para analisar a aderência à normalidade da distribuição de uma variável. O teste pressupõe a rejeição da normalidade da distribuição dos dados se o níivel de significância for inferior a 5% (p <0,05). Como não se verificou uma distribuição normal, optou-se pela utilização de testes não paramétricos para a estatística inferencial.
RESULTADOS
A amostra é constituída por 97 trabalhadores, 74,2% do sexo feminino e 25,8% do masculino. A idade dos inquiridos, varia entre um mínimo de 23 anos e um máximo de 66 anos, sendo a média de idade de 44,2 anos. No que respeita ao estado civil, a maioria (57,7%) dos inquiridos são casados, 25,8% são solteiros e 10,3% são divorciados. Quanto ao nível de instrução, verificou-se que a maioria (54,6%) dos participantes possui o ensino secundário, 29,9% o ensino superior e 12,4% o 3º ciclo do ensino básico. No que diz respeito ao tempo de serviço, a maioria (38,2%) dos inquiridos exerce funções naquele municipio entre 11 e 20 anos e 33,9% exerce funções há 10 ou menos anos. Relativamente à área de residência, constata-se que 64,9% dos participantes do estudo residem em zona urbana, e os restantes 35,1 % em zona rural.
Atendendo à avaliação dos conhecimentos sobre Suporte Básico de Vida dos trabalhadores de uma Câmara Municipal do norte de Portugal, antes e após a participação no programa de intervenção "Capacitar para salvar", a Tabela 1 apresenta os resultados relativos às respostas corretas e incorretas no 1º e 2º momento para cada um dos itens que constam do questionário de Avaliação de Conhecimentos em Suporte Básico de Vida.
Itens de avaliação de conhecimentos em Suporte Básico de Vida | 1ºMomento (antes) | 2ºMomento (após) | |||||||
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Respostas corretas | Respostas incorretas | Respostas corretas | Respostas incorretas | Teste de McNemar | |||||
N | % | N | % | N | % | N | % | p | |
1. Os princípios gerais do Suporte Básico de Vida são: | 37 | 38,1 | 60 | 61,9 | 23 | 23,7 | 74 | 76,3 | 0,022 |
2. O Suporte Básico de Vida tem por objetivo: | 42 | 43,3 | 55 | 56,7 | 66 | 68 | 31 | 32 | <0,001 |
3. Como deve proceder antes de abordar uma vítima adulta: | 32 | 33 | 65 | 67 | 80 | 82,5 | 17 | 17,5 | <0,001 |
4. Perante um adulto que não respira, deve iniciar as manobras de reanimação por: | 11 | 11,3 | 86 | 88,7 | 69 | 71,1 | 28 | 28,9 | <0,001 |
5. A relação compressões /ventilações na vítima inconsciente e em paragem cardiorrespiratória são: | 14 | 14,4 | 83 | 85,6 | 88 | 90,7 | 9 | 9,3 | <0,001 |
6. As compressões no tórax devem ser feitas: | 8 | 8,2 | 89 | 91,8 | 30 | 30,9 | 67 | 36,1 | <0,001 |
7. Em que situação se deve colocar a vítima em posição lateral de segurança: | 39 | 40,2 | 58 | 59,8 | 76 | 78,4 | 21 | 21,6 | <0,001 |
8. A avaliação da respiração espontânea e eficaz deve ser efetuada durante: | 16 | 16,5 | 81 | 83,5 | 78 | 80,04 | 19 | 19,6 | <0,001 |
9. Como proceder perante um adulto consciente com obstrução de via aérea por corpo estranho: | 7 | 7,2 | 90 | 92,8 | 24 | 24,7 | 73 | 75,3 | <0,001 |
10. Indique qual o número Europeu de Emergência Médica: | 92 | 94,8 | 5 | 5,2 | 95 | 97,9 | 2 | 2,1 | 0,375 |
11. Os quatros elos da cadeia de sobrevivência são: | 33 | 34 | 64 | 66 | 67 | 69,1 | 30 | 30,9 | <0,001 |
12. O Suporte Básico de Vida deve ser mantido sem interrupção até: | 25 | 25,8 | 72 | 74,2 | 61 | 64,9 | 36 | 37,1 | <0,001 |
13. Durante a ventilação boca a boca deve: | 23 | 23,7 | 74 | 76,3 | 65 | 67 | 32 | 33 | <0,001 |
Relativamente aos itens com maior percentagem de respostas corretas destacam-se o item 10 "indique qual o número europeu de emergência médica:" com 94,8%; o item 2 "o Suporte Básico de Vida tem por objetivo:" com 43,3%; o item 7 "em que situação se deve colocar a vítima em posição lateral de segurança: " com 40,2% e o item 1 "os princípios gerais do Suporte Básico de Vida são:" com 38,1%. Salienta-se que apenas 8,2% dos participantes conhece como as compressões no tórax devem ser feitas (item 6) e 7,2% como proceder perante um adulto consciente com obstrução de via aérea (item 9).
No que concerne ao 2º momento, os dados demonstram que o maior número de respostas corretamente assinaladas, diz respeito aos itens 10 "indique qual o número europeu de emergência médica:" com 97,9%; ao item 5 "nas manobras de reanimação a relação compressões/ventilações na vítima adulta inconsciente e em paragem cardiorrespiratória é:" 90,7%; ao item 3 "como deve proceder antes de abordar uma vítima adulta:" com 82,5% e ao item 8 "a avaliação da respiração espontânea e eficaz deve ser efetuada durante:" com 80,0%. Os itens com menor número de respostas assinaladas são o item 1 "os princípios gerais do Suporte Básico de Vida são:" com 23,7% e o item 9 "como proceder perante um adulto consciente com obstrução grave de via aérea (asfixia) por corpo estranho (alimentos ou objetos):" com 24,7%. Podemos, então, considerar que existiu um aumento do número de respostas corretamente assinaladas sobre os conhecimentos em Suporte Básico de Vida, com exceção para o item 1 "os princípios gerais do suporte básico de vida são" para a qual se observa um decréscimo de repostas corretamente assinaladas do 1º para o 2º momento (37 vs 24).
Relativamente à avaliação das competências demonstradas sobre Suporte Básico de Vida, após a participação no programa de intervenção "Capacitar para Salvar", estas foram sujeitas a verificação decorrido um período superior a dois meses após a participação no referido programa de intervenção. Procedeu-se à avaliação da execução prática e individual com registo numa grelha de avaliação de competências, essenciais para prestar socorro eficaz à vítima que se encontra em paragem cardio-respiratória. Os dados obtidos constam na Tabela 2 e demonstram que os itens executados corretamente por um maior número de indivíduos foram: o item 1 "avaliação de condições de segurança"e o item 3 "pedido de ajuda" ambos com 86 demonstrações corretas; o item 2 "avaliação da resposta da vítima" com 80, e o item 5 com 69 desmosntrações corretas. Contrariamente, o item 6 "execução de compressões torácicas" foi o que apresentou o menor número de participantes a executaram corretamente a técnica.
Dimensão de competência | Competência | N | % |
---|---|---|---|
1. Avaliação de condições de segurança | Não demonstrada | 11 | 11,3 |
Demonstrada | 86 | 88,7 | |
2. Avaliação de resposta da vítima | Não demonstrada | 17 | 17,5 |
Demonstrada | 80 | 82,5 | |
3. Pedido de ajuda | Não demonstrada | 11 | 11,3 |
Demonstrada | 86 | 88,7 | |
4. Permeabilização da via aérea | Não demonstrada | 41 | 42,3 |
Demonstrada | 56 | 57,7 | |
5. Avaliação da respiração | Não demonstrada | 28 | 28,9 |
Demonstrada | 69 | 71,1 | |
6. Execução de compressões torácicas | Não demonstrada | 64 | 66,0 |
Demonstrada | 33 | 34,0 | |
7. Execução de ventilações | Não demonstrada | 21 | 32,0 |
Demonstrada | 66 | 68,0 |
DISCUSSÃO
Em Portugal a principal causa de morte é a paragem cardiorrespiratória súbita, com as doenças cardiovasculares a constituírem um dos problemas mais graves e a causa da maior parte das mortes evitáveis associadas à doença coronária. Estes factos tornam imperativa a promoção da capacitação dos cidadãos ditos "leigos", que este estudo releva como forma de intervir para aumentar os conhecimentos e habilidades da população para o atendimento precoce em situações de emergência e instituição do Suporte Básico de Vida como fundamental para salvar vidas.
Num estudo realizado em 201411, com o objetivo de avaliar conhecimentos e competências em Suporte Básico de Vida em estudantes do 9º e 12º ano de escolaridade, encontraram-se resultados similares, com mais respostas corretamente assinaladas, nomeadamente, quanto à necessidade de asseguar as condições de segurança na abordagem à vítima (99,6%) e que no nosso estudo foi de 82,5%. Outro estudo12, corrobora o conhecimento que a população portuguesa adulta tem sobre a necessidade de avaliar as condições de segurança (79,9%).
Pergola e Araujo13, ao identificarem os conhecimentos sobre Suporte Básico de Vida numa população leiga do Brasil, constataram que apenas 9,9% conhece a manobra de respiração boca-a-boca, o que também é corroborado no presente estudo, onde apenas 23,7% respondeu corretamente. Trata-se de um procedimento com alguma complexidade na medida em exige o cumprimento de alguns critérios específicos, como uma boa adaptação à boca da vítima e a hiperextensão do pescoço, no sentido de assegurar um fluxo uniforme de ar. Sobre o início das manobras de reanimação perante uma vítima que não respira, 88,7% não conhece o número de compressões que deve ser feito no tórax, resultados muito semelhantes aos do estudo da Cruz Vermelha Portuguesa14, com 71,3%. Em relação às manobras de reanimação, a combinação da relação entre compressões/ventilações nos estudos de Dixe e Gomes12, e no estudo de Rodrigues15, apontam para valores ligeiramente superiores quanto ao número de respostas corretas, respetivamente 20,2% e 44%, em oposição aos resultados obtidos no presente estudo no 1º momento (14,4%) e que é amplamente superado no 2º momento (90,7%). Na explicitação da cadeia de sobrevivência, que consiste num conjunto ações que se sucedem de forma encadeada, a avaliação da respiração é determinante para a tomada de decisão sobre os procedimentos concretos e explícitos a seguir. Neste estudo, no 1º momento apenas 16,5% respondeu corretamente (10 segundos), verificando-se que no 2º momento o valor percentual é consideravelmente mais elevado (80,04%). Este resultado é muito similiar ao verificado no estudo de Dixe e Gomes12, ao referir que 77,9% dos participantes tinham intenção de o executar. O conhecimento específico sobre a posição lateral de segurança é fundamental para manter a permeabilidade da via aérea, e a sua execução deve ser feita de forma correta para evitar lesões adicionais na vítima. Verificou-se que apenas 40,2% detinha este conhecimento no 1º momento, valor superior (30,8%) ao encontrado no estudo da Cruz Vermelha Portuguesa14. A obstrução da via aérea, normalmente como resultado de causas extrínsecas, é uma emergência que exige uma ação rápida e eficaz, sendo que apenas 7,2% e 24,7% responderam corretamente no 1º e 2º momento, respetivamente. O reduzido valor percentual das afirmações corretamente assinaladas pode dever-se à dificuldade em diferenciar se a obstrução é grave (asfixia) ou ligeira, o que também se verifica no estudo de Dixe e Gomes12.
De uma forma global e embora se tenham verificado competências em Suporte Básico de Vida, é necessário uma atenção especial para os procedimentos relativos à execução das compressões torácicas, sendo este procedimento determinante para assegurar em cerca de 25% o débito cardíaco. Apesar de reconhecermos que os conhecimentos são estruturantes para a execução correta, também temos consciência que o Suporte Básico de Vida exige destreza manual e competências muito específicas para o socorrista ser capaz de agir em situação concreta de prestação de auxílio a uma vítima em paragem cardio-respiratória. Decorre desta constatação a necessidade de periodicamente atualizar conhecimentos e melhorar as competências, através de projetos formativos que conjuguem uma dimensão mais teórica com uma dimensão prática em contexto de simulação. Esta constatação pode ser verificada num estudo realizado em 201411, realizado com alunos do 9º e 12º ano de escolaridade, que, ao avaliarem as competências em três momentos diferentes, observaram que o registo sobre as competências melhora ao longo dos períodos de avaliação.
A reflexão sobre os resultados deste estudo orientam para a necessidade de continuar a formar e capacitar a população, em Suporte Básico de Vida, no sentido de conferir uma maior preparação para socorrer outras pessoas, assim como devemos ter em conta a responsabilidade social-empresarial no setor da saúde que cada instituição deve ter a seu cargo16, não esquecendo, a importância da promoção da saúde no local de trabalho que qualquer empresa, também, tem de ter17.
Como em qualquer investigação foram sentidas algumas limitações de entre as quais a impossibilidade de todos os colaboradores integrarem o programa de intervenção o que limitou o número de participantes e portanto a oportunidade de massificar a aquisição de conhecimentos e competências como estratégia fundamental para a melhoria das habilidades técnicas que integram o Suporte Básico de Vida.
CONCLUSÕES
Considerando os resultados obtidos neste estudo e no que concerne aos conhecimentos sobre Suporte Básico de Vida demonstrados, constatamos que a maioria dos participantes (94,8%) já conhecia o número europeu de emergência médica antes da implementação do programa de intervenção. Nenhum dos itens avaliados que integram o questionário de avaliação de conhecimentos em Suporte Básico de Vida obteve 100% de respostas corretas, o que permite concluir que os conhecimentos sobre Suporte Básico de Vida na população estudada são ainda insuficientes, estando em conformidade com alguns resultados relatados por outros estudos já apresentados.
Quanto à aquisição de conhecimentos sobre Suporte Básico de Vida entre o 1º e o 2º momento, verificámos que existem diferenças estatisticamente significativas em todos os itens, com excepção do item 10, o que permite dizer que, após a implementação do programa de intervenção "Capacitar para salvar", os participantes no estudo adquiriram mais conhecimentos, o que releva o contributo positivo do mesmo, para a obtenção de ganhos em conhecimentos sobre Suporte Básico de Vida por parte dos trabalhadores de uma Câmara Municipal do norte de Portugal.
No que respeita às competências, a maioria dos indivíduos demonstrou saber realizar corretamente todas as manobras de Suporte Básico de Vida, com exceção da execução correta de compressões torácicas, na qual os participantes revelaram maiores dificuldades na sua concretização (66,0%). Aliás, foi também neste domínio do conhecimento que ocorreu um elevado número de respostas não corretamente assinaláveis (36,1%) mesmo após a implementação do programa de intervenção.
É um facto que a principal causa de morte no espaço europeu é a paragem cardiorrespiratória súbita. Este facto torna imperativa a promoção da capacitação dos cidadãos para que possam intervir com autonomia e segurança no auxílio a vítimas em risco de vida, devendo por isso possuir habilidades e conhecimentos adequados para prestar Suporte Básico de Vida de forma eficaz e eficiente. A reflexão sobre os resultados deste estudo, orienta para a necessidade de continuar a formar e capacitar a população em geral em Suporte Básico de Vida, no sentido de lhe conferir uma maior preparação para socorrer outras pessoas contribuindo para uma redução significativa das taxas de mortalidade e morbilidade o que se constitui num beneficio para a sociedade. A capacitação do cidadão dito "leigo" para o atendimento precoce em situações de emergência é fundamental para salvar vidas.