Introdução
Aspectos Contextuais e Históricos da Velhice
O envelhecimento é um processo multifatorial e relacional que conta com as experiências contextuais, da forma como se vive e se administra a própria vida no presente e de expectativas futuras. Dentro dessa multiplicidade há fatores biológicos, que dizem respeito ao acúmulo de danos moleculares e celulares, mudanças na aparência e na estrutura corporal. Há fatores sociais, em que possivelmente se estabelece uma transição e possivelmente perda de papéis e posicionamentos dos indivíduos idosos. E principalmente fatores psicológicos, que possibilitam o envelhecimento como uma experiência resiliente ou vivida de modo sofrível (Fernandes-Eloi, Dantas, Sousa, Cerqueira-Santos, & Maia, 2017).
A velhice é um fenômeno que se apresenta cronologicamente aos 60 anos, que independe do estado biológico, psicológico e social. Contudo, a idade e o processo de envelhecimento possuem suas peculiaridades e significados que extrapolam as dimensões da idade cronológica. Cada vez mais o processo de envelhecimento é visto como uma experiência heterogênea, sendo único e singular em sua essência, portanto, cada sujeito se relacionada com seu processo de envelhecimento de acordo com o contexto vivido (Teixeira, Marinho, Junior, & Martins, 2015).
Para a Organização das Nações Unidas (2017) a população mundial está envelhecendo mais, isso se dá por conta dos avanços na medicina, baixas taxas de fertilidade, avanços tecnológicos e os cuidados com a saúde. À medida que taxas de fertilidade diminuem, a proporção de pessoas com 60 anos ou mais deve duplicar entre 2007 e 2050. Estima-se que em 2050 o número de pessoas idosas duplique, alcançando 22% da população global. De acordo com Hoffman (2017), é possível que no ano de 2050 cerca de 30% da população brasileira seja composta por pessoas com 65 anos ou mais e que o país vai ocupar o sexto lugar contingente de idosos em 2025. Ter mais anos de vida é uma conquista, mas também um desafio, uma vez que traz mudanças na organização da sociedade.
Entretanto, pode-se perceber que por mais que se viva mais, a velhice de modo geral, foi tratada como uma fase da vida marcada pela perda dos papéis e funções sociais do indivíduo, em que ao se falar sobre velhice, a primeira imagem que emergia era a de um sujeito fragilizado, inválido e principalmente sem memória. Nesse sentido, a velhice por muito tempo foi perpassada pela estigmatização social, e possui ainda nos dias atuais, uma tênue alusão aos aspectos negativos, que de certa forma, estão enraizados de modo concreto ou simbólico na cultura ocidental (Pinheiro, 2004).
Assim, mesmo com grandes transformações em relação ao prolongamento da vida, envelhecer nos dias atuais ainda pode ser visto como um desafio biopsicossocial, em que indiretamente, viver mais, se vincula a ideia do corpo envelhecido como um determinante que enquadra as pessoas na decadência e nos processos de desprestígios sociais e vinculados à pobreza. Desse modo, pode-se notar que atualmente os parâmetros que associam a velhice ao desprestígio ainda possuem força e que essa subcultura persiste nas relações sociais (Uchôa, Firmo, & Costa, 2002).
Diversas sociedades constroem diferentes práticas e representações sobre a velhice. No que diz respeito ao Japão, o país com a maior proporção de idosos do mundo, mais de 26% da população tem 65 anos ou mais, ser velho é sinônimo de experiência e respeito, em que os idosos são tratados com atenção pelos anos e conhecimentos acumulados. O Japão também é um dos países em que a terceira idade desfruta de melhor qualidade de vida (depois de Suécia e Noruega) e o seu povo é afeito a valorização do corpo e do espírito, que refletem de forma positiva na qualidade de vida (Portal BBC, 2016).
No que diz respeito à realidade do continente Asiático, mais precisamente na Índia, nota-se as mudanças da relação com os mais velhos. Se antes a figura do idoso exigia respeito e representava sabedoria, atualmente com todas as mudanças sociais ocorridas, o indiano com 60 anos ou mais não desfruta desse tratamento. Um em cada cinco idosos sofre abusos físicos e/ou emocionais quase diariamente na Índia, um dos fatores que contribui é que eles dependem economicamente de seus descendentes. Em 2050 a índia terá 324 milhões de pessoas acima dos 60 anos, o que se torna preocupante, haja vista que o país sempre teve um histórico de cuidado com os seus idosos e que atualmente essa prática vem se alterando e abrindo espaço para os maus tratos (Rivas, 2015).
Em contrapartida aos países que apresentam um maior prolongamento da vida, pode-se observar na região subsaariana da África, uma expectativa de vida corresponde a 40,4 anos. As projeções futuras mostram que essa região terá uma proporção de 5,6% de pessoas acima dos 60 anos. Na cultura africana o idoso é o transmissor da cultura para as novas gerações, em que o velho possui um valor inestimável, em que são considerados os guardiões da memória. Os anciões são as bibliotecas vivas de cada região, pois há um alto nível de sabedoria que será repassada para a comunidade. Contudo, frente ao empobrecimento e a complexa manutenção da qualidade de vida, os números que demarcam o prolongamento da vida, ainda são excessivamente baixos (Telles & Borges, 2013).
Já no Brasil, a expectativa de vida passou de 75,5 para 78,5 anos. De 1940 a 2016, a perspectiva de vida do brasileiro subiu mais de 30 anos. Sendo assim, estima-se que em 2020, a expectativa de vida esteja no patamar de 80 anos idade (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística -IBGE-, 2017). De acordo Faller, Teston e Marcon (2015) o país não está preparado para lidar com a crescente demanda de idosos, e que este despreparo se dá por conta das representações sociais referentes ao processo de envelhecimento que exercem influência negativa na vivência dessa nova fase.
Envelhecimento e Suicídio
Na realidade brasileira a velhice ainda é vista como um processo de estagnação, na qual o indivíduo cessa as suas atividades e passa a viver sem exercer muitas funções que até então eram realizadas por ele. Diante desse contexto, o indivíduo na tentativa de pôr um fim no próprio sofrimento pode proporcionar como última alternativa a retirada da própria vida, antecipando a morte (Souza, Minayo, Ximenes, & Deslandes, 2002).
Não se pode afirmar com precisão quais os principais fatores que agem de forma conjunta para eliciar a prática suicida, contudo, pode-se elencar alguns elementos, por exemplo, as relações fragilizadas, doenças crônicas e a depressão, além da visão estigmatizada sobre a velhice que potencializa o ato de tirar a própria vida. Em geral, a vida de um suicida pode ou não ser marcada por eventos trágicos e por intenso sofrimento psíquico, sendo o suicídio apenas uma espécie de ponto final, o que o torna reconhecidamente um fenômeno complexo e multideterminado (Sérvio, 2015).
O suicídio, por sua vez, é a junção das palavras de origem latina sui (“de si mesmo” e caedĕre (“matar”) que corresponde ao ato pelo qual o indivíduo retira a própria vida. O suicídio sofre grande influência religiosa, moral e cultural, levando a sua discussão para um patamar áspero e quase proibido. Há forte estigma e tabu sobre o assunto, e este estigma resulta de um processo em que pessoas são levadas a se sentirem envergonhadas, excluídas e discriminadas, pois têm-se a ideia errônea de que evitando falar sobre o assunto, evita-se essa prática (Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio, 2015).
Anualmente, mais de 804 mil pessoas cometem suicídio por ano no mundo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que nos Estados Unidos, o suicídio é a 11ª causa de morte, com 1,2% de óbitos. Ressalta também que a região que apresenta os índices mais altos é o Sudeste Asiático, com 17,1 suicídios por 100 mil habitantes, seguido pela Europa, que chega a 13,8 por 100 mil habitantes. Nos países Africanos o número é de 7 a cada 100 mil habitantes (Organização das Nações Unidas, 2016). Em nível global, o gênero masculino é o mais afetado pela morte voluntária, pois os meios utilizados para tal ato agem de forma mais letal, como por exemplo, o enforcamento, arma de fogo e arma branca (Fontenelle, 2016).
Um estudo realizado por Conwell, Orden e Caine (2012) mostra que nos Estados Unidos houve um aumento nas taxas de suicídio entre as pessoas nascidas nos anos de 1946 a 1964 conhecidos como geração “baby boomers”; essa elevação é resultado de diversos fatores de risco e estima-se que as doenças psiquiátricas estão presentes entre 71% e 97% dos casos de suicídio e que a depressão é o fator de maior relevância para o ato de retirar a própria vida. O estudo segue mostrando que o público masculino é o mais afetado, e quando essa perspectiva compreende gênero e raça, as taxas para mulheres negras e brancas aumentam a partir dos 55 anos de idade e logo após os 60 anos sofrem um leve declínio, já para homens brancos acima dos 60 anos as taxas sofrem um maior pico e os números tendem a crescer, registrando 45 mortes por 100 mil habitantes a cada ano.
Pensar o suicídio como algo que acontece na velhice significa colocá-lo no contexto da violência dos problemas que os idosos sofrem. O tema de suicídio de idosos no Brasil vem sendo discuto há pouco tempo, só a partir de 2010 que entrou em pauta nas pesquisas realizadas no país. Existe um paradoxo no caso dos idosos, pois eles sabem que chegarão a última etapa do ciclo vital, mas por motivos e pretextos eles antecipam, planejam e dão cabo à vida, mostrando que o suicídio na velhice é um ato de escolha dolorosa, solitária e que implica na desistência da vida (Minayo, Figueiredo, & Silva, 2016).
O Brasil é o oitavo país em número absoluto de suicídios, com 31.507 casos registrados entre 2012 a 2014. A pesquisa mostra que as taxas de suicídio são maiores entre os que têm mais de 70 anos (Castro, 2016). Os dados divulgados pelo mapa da violência mostram que na realidade Brasileira foram registrados 1670 casos de autoextermínio no ano de 2012, o número de suicídio por pessoas acima de 60 anos sofreu um aumento de 8% para cada 100 mil habitantes (Mapa da Violência, 2014).
No Nordeste do País o número de óbitos em 2013 foi de 8,4 por 100.000 habitantes na faixa etária entre 60 e 69 anos. Nesse contexto, o público masculino também é responsável pelo maior número de práticas autoinfligidas registrando 10 mortes por 100.000 habitantes, já o público feminino representa um quantitativo de 2,9 mortes por 100.000 habitantes, às mulheres geralmente utilizam meios menos letais para a prática do suicídio, nota-se morte por exposição à fumaça, fogo ou precipitação de lugar elevado (Pinto & Assis, 2015).
Assim, diante da discussão apresentada, percebe-se que nos últimos anos o índice de suicídio na velhice tem se estendido e ampliado de modo acelerado. Contudo, pesquisas, intervenções, debates comunitários que articulem o envelhecimento e suicídio ainda são escassos e com pouca discussão acadêmica. Neste sentido, este estudo possui o objetivo de caracterizar a produção científica sobre o suicídio na velhice publicada no período de 2007 a 2017 nas bases de dados Scielo, PePSIC, LILACS e Index Psi.
Método
Trata-se de um estudo descritivo de caráter misto produzido a partir de uma revisão integrativa da literatura acerca das produções científicas sobre suicídio na velhice produzida entre os anos de 2007 e 2017. A revisão integrativa foi utilizada como instrumento processual para possibilitar a reunião, avaliação crítica e sintética dos achados, ou seja, por ser um método sistematizado, permitiu maximizar o potencial da coleta de dados para que se alcançasse resultados válidos, fidedignos e específicos sobre suicídio na velhice e por possibilitar uma reflexão crítica e ampla a respeito do que foi encontrado nos estudos dos últimos onze anos (Koller, Couto, & Hohendorff, 2014).
A abordagem mista utilizada, diz respeito a uma junção dos métodos quantitativos (coleta de números, dados estatísticos) e dos métodos qualitativos (coleta de palavras, das relações sociais), que juntos somam e contribuem para um maior aprofundamento dos assuntos pesquisados. Desse modo, compreende-se que a pesquisa de métodos mistos engloba suposições filosóficas e métodos de investigação, concentrando-se numa coleta de análises qualitativas e quantitativas em um único estudo, proporcionando um melhor entendimento sobre o problema que a pesquisa levanta, pois um método incorpora o outro fazendo com que ambas se construam (Creswell & Clark, 2013).
Procedimentos de Coleta e Análise dos Dados
Estabeleceu-se um processo de busca de artigos a partir da combinação dos descritores velhice, envelhecimento, idoso, idosos, terceira idade, velho e suicídio, nas seguintes bases de dados, Scientific Electronic Library online (Scielo), do Periódico Eletrônico em Psicologia (PePSIC), Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e do Index Psi que reúne, organiza e divulga a literatura técnico-científica nacional de periódicos publicada na área da Psicologia. A pesquisa deu-se no segundo semestre de 2017. Os artigos obtidos através da coleta com os descritores acima mencionados foram anexados numa tabela para uma maior organização dos resultados, após a coleta dos artigos foram aplicados os seguintes critérios de inclusão: a) artigos que estivessem dentro do tema, b) artigos completos e disponíveis para downloads, c) publicados entre os anos de 2007 e 2017, d) artigos que estivessem nos idiomas português, espanhol e inglês. Já os critérios de exclusão foram: a) artigos que estavam fora do período proposto (2007-2017), b) artigos que estivessem duplicados, c) indisponíveis para download, d) fora dos idiomas (português, espanhol e inglês), e) e outros materiais científicos como: livros, jornais, dissertações e teses. Para que os achados científicos tivessem maior fidedignidade, foi utilizado o auxílio de dois juízes, que contribuíram participativamente com a seleção e exclusão dos artigos encontrados.
Resultados
A busca dos artigos na Scielo gerou um resultado de 200 artigos, dentre esses 73 pertenciam a língua portuguesa, 9 eram artigos em espanhol e 118 pertencentes ao inglês. 193 artigos foram eliminados por não estarem de acordo com os critérios de inclusão. Sendo assim, restou um total de 7 artigos que iam de encontro com os critérios de inclusão, dentre os quais, somente um estava em inglês.
No periódico PePSIC os resultados obtidos na primeira triagem mostraram um total de 21 artigos, sendo 4 em português, 1 em espanhol e 16 em inglês. 11 artigos se repetiram e 10 artigos não estavam nos critérios de inclusão, sendo assim, nenhuma produção compôs os critérios de inclusão (n= 0).
Na base de dados LILACS foram encontrados um total de 622 produções, dos quais 276 eram pertencentes à língua portuguesa, 27 eram espanhóis e 319 publicados na língua inglesa. 513 artigos encontravam-se em repetição, 107 que condiziam com os critérios de exclusão, restando assim 2 artigos em espanhol, que iam de encontro aos critérios de inclusão previamente estabelecidos.
Na última base de dados Index Psi foi obtido na primeira triagem um total de 30 artigos, 19 em português, 3 em espanhol e 8 artigos em inglês. 23 artigos estavam repetidos, 7 artigos pertenciam aos critérios de exclusão, sendo assim, nenhuma produção estava de acordo com os critérios de inclusão (n= 0).
A Figura 1 sintetiza o processo das buscas nas bases de dados, mostrando o número de artigos encontrados para cada combinação de descritores, bem como o número de artigos excluídos em cada etapa da revisão integrativa.
Obteve-se um total de 873 artigos correspondentes às quatro bases de dados analisadas. No que diz respeito ao quantitativo geral, os descritores com mais achados foram: a) Suicídio and Idosos n= 366, b) Suicídio and Velho n= 238, e c) Suicídio and Idoso n= 151.
É perceptível a escassa produção de artigos em todas as bases de dados analisadas, visto que o número foi reduzido e o descritor suicídio and terceira idade não obteve resultado algum em todas as bases de dados (n= 0). A Tabela 1 apresenta os achados para cada combinação dos descritores na primeira triagem.
Descritores Português/Espanhol/Inglês | Artigos Encontrados |
---|---|
Suicídio and Velhice Suicidio and Vejez / Suicide and Old Age | 30 |
Suicídio and Envelhecimento Suicidio and Enjevecimiento / Suicide and Aging | 88 |
Suicídio and idoso Suicidio and Edad Avanzada / Suicide and Old Man | 151 |
Suicídio and Idosos Suicidio and Los Ancianos / Suicide and Elderly | 366 |
Suicídio and Terceira Idade Suicidio and Tercera Edad / Suicide and Third Age | 0 |
Suicídio and Velho Suicidio and Viejo / Suicide and Old | 238 |
Pode-se perceber que no Brasil, ainda de modo escasso se fala sobre suicídio na velhice. Embora muitas produções fugissem da temática e estivessem duplicadas, notou-se que os achados estavam em sua grande maioria voltados para assuntos referentes aos estudos da Psicologia (questão social e relações subjetivas). Os artigos filtrados são pertencentes as revistas Ciência & Saúde Coletiva, Psicologia: Ciência e Profissão, Revista de Saúde Pública, Estudos de Psicologia, Medisan e Revista Colombiana de Psiquiatria.
Em relação à periodicidade das produções, todas as bases de dados analisadas possuíam uma maior concentração nos períodos de 2013 e 2015 (Como ilustra a Figura 2). Das 9 produções filtradas 3 são pertencentes a língua estrangeira (Espanhol e Inglês), sendo: Betancourt (2011), Monak, Agudelo e Ortiz (2013) e Alves, Maia e Nardi (2014).
Dentre os 9 artigos analisados disponíveis nas bases de dados foram encontrados 6 artigos fundamentados na perspectiva qualitativa, sendo eles: Minayo, Cavalcante, Mangas e Souza (2012), Cavalcante e Minayo (2015), Sérvio e Cavalcante (2013), Minayo e Cavalcante (2010), Minayo, Teixeira e Martins (2016) e, Minayo e Cavalcante (2015). E 3 na perspectiva quantitativa, sendo: Alves Et al., (2014), Betancourt (2011), e Monak et al. (2013). Foram identificadas também 39 palavras - chave entre os resumos, e destas, as mais citadas foram: Suicídio (n=7), Tentativa de Suicídio (n=4) e Idoso (n=3).
Os estudos categorizados quanti e qualitativamente estão na Tabela 2, descrita abaixo.
Qtd. | Descritores | Referências | Base de Dados |
---|---|---|---|
1 | Suicídio and Idosos | Autópsias psicológicas sobre suicídio de idosos no Rio de Janeiro. Ciênc. saúde coletiva, Out 2012, vol.17, no.10, p.2773-2781. | Scielo |
2 | Suicídio and Idosos | Estudo qualitativo sobre tentativas e ideações suicidas com 60 pessoas idosas brasileiras. Ciênc. saúde coletiva, Jun 2015, vol.20, no.6, p.1655-1666. | Scielo |
3 | Suicide and Elderly | Retratos de Autópsias Psicossociais sobre suicídio de idosos em Teresina. Psicol. cienc. prof., 2013, vol.33, no.spe, p.164-175. | Scielo |
4 | Suicídio and Idosos | Suicide Among Elderly: A Systematic review. MedicalExpress (São Paulo, online), Feb 2014, vol.1, no.1, p.9-13. | Scielo |
5 | Suicide and Elderly | Suicídio entre Pessoas Idosas: Revisão da Literatura. Rev. Saúde Pública, Ago 2010, vol.44, no.4, p.750-757. | Scielo |
6 | Suicídio and Velhice | Tédio enquanto Circunstância Potencializadora de Tentativas de Suicídio na Velhice. Estud. psicol. (Natal), Mar 2016, vol.21, no.1, p.36-45. | Scielo |
7 | Suicídio and Idoso | Tentativas de Suicídio entre Pessoas Idosas: Revisão de Literatura (2002/2013). Ciênc. saúde coletiva, Jun 2015, vol.20, no.6, p.1751-1762. | Scielo |
8 | Suicídio and Idosos | Caracterización Psicosocial de Ancianos que se Suicidaron. Medisan,15(3):339-344, mar. 2011. | LILACS |
9 | Suicídio and Vejez | Caracterización sociodemográfica de los suicidas adultos mayores de 60 años: Bogotá 2003-2007. Rev. colomb. psiquiatr,42(supl.1):56-64, oct.-dic. 2013. ilus, tab. | LILACS |
Discussão dos Resultados
O processo de categorização deu ênfase nas palavras e seus sentidos, e deve ser entendida como a essência de um processo de obtenção de dados. As categorias emergiram a partir do resultado da leitura na íntegra. Houve o auxílio de três juízes que contribuíram nesse processo, fortalecendo a escolha das categorias. A grande maioria dos textos abordavam três temáticas que discriminaram as categorias analisadas neste estudo, sendo a) Fatores de Risco (55,6%), b) Relações Familiares (33,3%) e c) Suicídio na Velhice e Saúde Pública (11,1%).
Fatores de Risco
Entre os achados nesta categoria, pode se observar que o mais antigo foi elaborado em 2010. Trata-se do estudo elaborado por Minayo e Cavalcante (2010) que realizou uma revisão da literatura sobre os principais fatores associados à ideação, tentativas e suicídio propriamente dito de pessoas idosas. As pesquisas foram realizadas nas bases de dados MEDLINE, PsychInfo, SciELO e Biblioteca Virtual em Violência e Saúde da BIREME, referentes ao período de 1980 a 2008. Foram selecionadas 52 referências e concluiu-se que a depressão é um fator de risco no comportamento suicida entre idosos.
Outra pesquisa encontrada é o artigo elaborado por Sérvio e Cavalcante (2013) que objetivou analisar os fatores psicossociais que perpassaram o suicídio de idosos em Teresina, por meio de uma investigação retrospectiva dos aspectos da vida do suicida antes do autoextermínio e da reconstituição dos fatores de risco para o suicídio. Foram construídas autópsias psicossociais de cinco casos de suicídios de idosos ocorridos no período de 2004 a 2009. Após a análise dos resultados pôde-se constatar que os principais fatores de risco associados ao suicídio desses idosos foram a depressão, transtornos mentais graves, estigma referente ao envelhecimento, alcoolismo e relações familiares fragilizadas.
Outro estudo significativo foi realizado por Alves et al. (2014) que consistiu numa revisão sistemática do suicídio entre os idosos, utilizando os termos suicídio e idosos, suicídio e adultos mais velhos e tentativa de suicídio entre o período de 2008 e 2013 nas bases de dados SCOPUS, Medline / Pubmed e Web of Science -WOS-. Foi encontrado um total de 1613 referências, mas apenas 7 preencheram os critérios de inclusão. A pesquisa concluiu que o tema do suicídio entre os idosos raramente é discutido e que pouco se sabe sobre influências, causas ou prevalência de suicídio entre os idosos. E que a depressão é um fator de risco de extrema influência para a prática suicida.
O artigo elaborado por Minayo e Cavalcante (2015) realizou uma revisão da literatura sobre as principais questões associadas às tentativas de suicídio em pessoas idosas. O estudo abrangeu o período de 2002 a 2013, a partir das bases Medline, Lilacs, PubMed, PsychInfo, SciELO, Biblioteca Virtual em Violência e Saúde da Bireme e Biblioteca Virtual de Saúde Pública (BVS/SP). Foram selecionadas 105 referências e analisadas 75. A literatura mostrou que os principais fatores predisponentes são doenças graves e degenerativas, dependência física, distúrbios e sofrimentos mentais e depressão severa. Os autores concluem que a depressão é o mais relevante fator explicativo e que o tema é da mais alta relevância para o Sistema Único de Saúde, mas não tem sido abordado no Brasil nem na teoria e nem na prática.
O estudo realizado mais recentemente por Minayo et al. (2016) que teve o objetivo de refletir sobre o tédio enquanto circunstância potencializadora das tentativas de suicídio de um idoso institucionalizado. O artigo narra o caso de uma pessoa idosa residente na cidade de Teresina (PI) que realizou duas tentativas de suicídio. A investigação privilegiou a perspectiva da pessoa selecionada sobre todas as questões e problemas narrados por ela. Os resultados do estudo apontaram que o tédio, o isolamento social e a depressão são circunstâncias que, associadas, contribuíram para suas tentativas de suicídio e uma persistente ideação de dar fim à vida.
Diante dos estudos apresentados, pode-se perceber que a depressão está relacionada com os diversos fatores de risco associados ao comportamento suicida do idoso, além das doenças crônicas e o estigma sobre a velhice. A depressão é para além da tristeza ou da melancolia, ela pode provocar intensos sentimentos de culpa, uma incapacidade de realizar tarefas, sensação de cansaço e falta de concentração. Idosos submetidos a contextos altamente produtores de sofrimento psíquico tem maior probabilidade de desenvolver quadros depressivos. Observam-se em contexto nacional e internacional índices expressivos de depressão na velhice, a prevalência está entre 1% e 10% da população com mais de 60 anos e varia de acordo com a população estudada (Braga, Santana, & Ferreira, 2015).
No que diz respeito às doenças crônicas, o risco de suicídio geralmente está associado as consequências incapacitantes dessas enfermidades. A relação de fatores crônicos e psicológicos pode somar-se com a depressão, tornando-se o mais relevante fator de risco nas tentativas contra a vida. No Brasil, as doenças crônicas estão cada vez mais presentes em idosos, na faixa dos 60 anos, as mais frequentes são a hipertensão e a diabetes. O idoso portador de três ou mais enfermidades crônicas tende a desenvolver sintomatologia depressiva (Cavalcante et al. 2016).
Já em relação a velhice, pode-se perceber que os estigmas que circundam biologicamente, socialmente e psicologicamente os mais velhos, podem acentuar de forma negativa a percepção da própria existência, culminando num processo de negação, gerando a insatisfação com a vida. Neste sentido, precisa-se investir em processos que possibilitem a ressignificação do prolongamento da vida, suas atividades, percepções e sentimentos, para que o viver mais não se associe a uma profunda tristeza, isolamento social, falta de motivação e uma habilidade diminuída de derivar prazer à vida, e em consequência disso a vivência da depressão e suicídio (Dougher & Hackbert, 2003).
Relações Familiares
Nesta categoria os estudos versam sobre processos relacionais familiares, num sentido mais fragilizado, contribuindo para o deslocamento do idoso no contexto familiar e consequentemente produzindo um agravamento da ideação ou prática suicida. Como por exemplo, pode-se perceber no estudo de Betancourt (2011) que foi realizado uma pesquisa descritiva e retrospectiva sobre 9 idosos que consumaram o suicídio, pertencentes à área de saúde da Universidade Policlínica “José Martí Pérez” de Santiago de Cuba, de 2000 a 2005, para caracterizá-los psicossocialmente. Foi organizada uma entrevista com os parentes próximos e se observou a predominância de homens entre 60 e 75 anos. Constatou-se que a grande maioria dos falecidos tinham famílias extensas, cujos relacionamentos eram conflituosos e inadequados entre seus membros, ocasionando problemas pessoais e familiares.
Já a pesquisa de Minayo et al. (2012) analisou autópsias psicológicas e contextualizou problemas e fatores que levaram algumas pessoas idosas a acabar com a própria vida na cidade do Rio de Janeiro, entre 2004 e 2007. O estudo parte de 26 laudos periciais de homens e mulheres que cometeram suicídios. Foram realizadas oito autópsias psicológicas. Os eventos suicidas ocorreram com e sem apoio familiar, com e sem acompanhamento médico. Os autores ressaltam a necessidade de se adotar uma visão complexa do problema.
Em 2015 o estudo realizado por Cavalcante e Minayo (2015) analisou 60 casos de tentativas e ideações suicidas em idosos de treze municípios brasileiros, com objetivo de conhecer, a partir de suas falas, as razões e as interpretações para atentarem contra sua vida. Utilizou-se o método qualitativo segundo a abordagem hermenêutica e dialética que buscou compreender o outro em sua história e singularidade. Foram entrevistados 60 idosos em risco de suicídio. Os casos analisados mostram uma multiplicidade de fatores precipitantes e associados combinados, sendo eles as relações familiares fragilizadas, sofrimento por doenças crônicas entre outros.
De acordo com os dados apresentados, as relações familiares fragilizadas correlacionam-se com negligências, abusos ou violências contra idosos. Nota-se que algumas pessoas acima dos 60 anos vão perdendo gradativamente o seu espaço no ciclo familiar. A violência intrafamiliar refere-se ainda, ao tipo de violência vivenciada dentro dos lares, na maioria das vezes praticada por filhos, parentes ou até mesmo vizinhos. Esses abusos podem aparecer de forma física, psicológica, financeira e/ou sexual (Araújo, Rocha, & Cruz, 2012).
Neste sentido, pode-se perceber que as instituições familiares não são sinônimos de segurança e proteção, podem promover tanto o acolhimento durante a velhice como a instalação de cotidianos violentadores. Nota-se neste contexto, que nessas configurações familiares o desamparo que permeia o lar para aqueles que o habitam, promove o sofrimento psíquico e a vivência de ideações suicidas (Maffioletti, 2005). Faz-se necessário, portanto, visibilizar o despreparo familiar para lidar com os processos de envelhecimento, para que não sejam romantizadas as relações na velhice, e que, as práticas do cotidiano não promovem e perpetuem a violência contra os mais velhos.
A família deve ser compreendida em suas forças, suas fraquezas, suas dificuldades e complexidades, havendo a necessidade de se reeducar frente a desafios que são pertinentes a vivência em sociedade e suas transformações culturais em relação a papel social do idoso. Esses percursos poderão contribuir com os direitos e dignidades do idoso (Vieira, Santrain, Tamboril, Freitas, & Campos, 2016).
Suicídio na velhice e Saúde Pública
Nesta categoria, se discute o estudo realizado por Monak et al. (2013) onde foi possível identificar características epidemiológicas disparadoras para o suicídio entre idosos residentes em Bogotá na Colômbia. Neste estudo foram sistematizados 98 relatórios obtidos através do programa “Epi-Info”, tais relatórios mostraram que a maioria dos suicídios cometidos na velhice foi realizado por pessoas do sexo masculino (88,78%) e em menor quantidade no público feminino (11,22%). O estudo salientou a importância do cuidado, assistência e atenção com os idosos e chamou a atenção para os fatores de proteção e políticas públicas que podem assegurar a saúde mental desses idosos.
Questões ligadas ao gênero podem ser discutidas, visto que há normas impostas e construídas pela sociedade, papéis são atribuídos a homens e mulheres, que acabam desnivelando e proporcionando desigualdades que afetam diretamente essas pessoas, inclusive na velhice. A figura masculina é vista com superioridade, sendo assim a prática do suicídio é predominante nesse público, e é atribuído ao homem um grau de energia e coragem ao efetivar esse ato, quando essa situação é inversa, é atribuído a mulher um extenso sinal de passividade e fraqueza, denotando mais uma vez a desigualdade de gênero (Meneghel, Gutierrez, Silva, Grubits, Hesler, & Ceccon, 2012).
O suicídio está entre as dez causas de morte mais frequentes em muitos países do mundo. No Brasil, são registradas 10 mil mortes por ano, com uma taxa de 4,8 a cada 100 mil habitantes (Organização Mundial da Saúde, 2014). Especialistas da área da saúde mental reafirmam que a questão do suicídio é um problema de saúde pública e que há urgência e necessidade em se pensar nas políticas públicas de prevenção. Em geral, seis meses antes de consumar o ato, pessoas com pensamentos suicidas procuram ajuda com profissionais, estima-se que 90% dos casos podem ser evitados caso haja essa oferta de ajuda (Martins, 2014).
A Lei n. 10.741 (2003) frisa através do artigo 1º e incisos II e III respectivamente, que o idoso tem preferência na formulação e na execução de políticas sociais públicas específicas e destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção ao idoso. Bem como garantia de acesso à rede de serviços de saúde e de assistência social locais seguindo as recomendações do inciso VII. Nota-se ainda, que a realidade vigente difere do que é descrito no estatuto do idoso, pois muitas vezes há o desligamento dessas pessoas com sua coletividade.
De modo prático, observa-se em contexto nacional uma ausência de políticas públicas efetivas e uma discrepância entre criação e efetivação de ações continuadas preventivas. Sabese que o suicídio em idosos tornou-se um grave problema de saúde pública e a ausência dessas políticas preventivas tornam a gestão da saúde cada vez mais fragilizada. Ressalta-se ainda, a importância do atendimento humanizado e sensibilizado, para que seja possível fazer com que essa pessoa sinta-se confortável, acolhida e que possa falar dos seus sentimentos e pensamentos, que por vezes são silenciados (Sousa, Cavalcanti, Perrelli & Sougey, 2016).
Considerações Finais
Este estudo objetivou realizar uma revisão integrativa da literatura a cerca do suicídio na velhice. A revisão considerou os artigos publicados nas bases de dados Scielo, Pepsic, LILACS e INDEXPSI no período de 2007 - 2017. As análises apontaram três categorias analíticas, fatores de risco, relações familiares e suicídio na velhice e saúde pública.
A busca em quatro bases de dados permitiu uma abertura para investigação do tema proposto, contribuindo para a construção e corpo do trabalho. Através da revisão integrativa da literatura foi possível realizar uma busca criteriosa e um levantamento de dados fidedignos, permitindo uma investigação ampla sobre o que foi produzido sobre suicídio na velhice. Contudo, foi perceptível que as produções são limitadas e os anos dessas produções são específicos, a maioria no período de 2013 e 2015.
Como resultado dos dados, verificou-se a ausência de achados no que se refere à combinação dos descritores suicídio and terceira idade nos três idiomas pesquisados, esse dado pode correlacionar-se com duas hipóteses, uma delas é a ausência das produções sobre a temática e a outra refere-se a uma não utilização do termo terceira idade, que denota-se como uma terminologia que tenta sequenciar a velhice em si.
Durante todo o percurso dessa produção, pôde-se perceber que não existe uma extensa gama de autores que referenciem com excelência esse assunto. Mesmo diante do baixo valor numérico de artigos, os autores encontrados mostraram um valor qualitativo impressionante, em que as produções conseguiram ser grandiosas em suas discussões, apontamentos e problematizações acerca do tema pesquisado.
Neste estudo foi possível ainda, refletir que as pesquisas sobre suicídio na velhice têm um início muito recente, e que os autores que assumiram a posição de pesquisadores desse assunto têm demonstrado grandes contribuições para a comunidade acadêmica e para a sociedade. Conclui-se que é necessário reforçar a importância do conhecimento que os profissionais de saúde precisam ter para que haja o preparo em saber lidar, abordar e manejar pessoas de comportamento suicida, incluindo a existência de orientações adequadas para prevenção do suicídio. Aponta-se a necessidade de estruturar uma nova rede de apoio social, formada por equipes multidisciplinares, além da promoção do cuidado humanizado e integral. Na área da saúde, há grandes fragmentações que complicam ainda mais o entendimento sobre os fenômenos envolvidos nos problemas (Silva, Sousa, Vieira, & Tavares, 2016).
Percebe-se também, que é necessário dar novo sentido ao que se conhece e/ou vive sobre a velhice. Assim, o entendimento de incapacidade do sujeito idoso vem de uma construção social baseada na produtividade, consumo e supervalorização da beleza. Essas demarcações sociais perpassam uma conotação negativa acerca da velhice, reforçando uma cultura de desvalorização do ser, culminando num desprestígio da vida, ocasionando assim comportamentos de autodestruição (Teixeira et al., 2015).
Assim, este estudo compreende que o suicídio é um problema de saúde pública, e como tal, não vem sendo investigado como deveria ser, e quando essa realidade perpassa a fase da velhice, outras dimensões de consequências aversivas tomam maiores proporções (Martins, 2014, Minayo & Cavalcante, 2015).
Sugere-se que os dados dessa pesquisa contribuam para novas produções e investigações sobre a realidade de idosos que vivenciam ideação suicida, ou dos familiares que são afetados pela situação. Espera-se também que o olhar para essa realidade seja ampliado, e que pesquisas empíricas se somem a produção de conhecimento acerca de novas perspectivas sobre envelhecimento, saúde e qualidade de vida.