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Franciscanum. Revista de las Ciencias del Espíritu

Print version ISSN 0120-1468

Franciscanum vol.66 no.181 Bogotá Jan./June 2024  Epub Oct 08, 2024

https://doi.org/10.21500/01201468.6536 

TEOLOGÍA

A intervenção divina e a renovação de Judá-Jerusalém: estudo de Zc 12,1-13,6 *

Divine intervention and the Renewal of Judah-Jerusalem: Study of Zc 12,1-13,6

La intervención divina y la renovación de Judá-Jerusalén: estudio de Zc 12,1-13,6

Maria de Lourdes Corrêa Lima1  **
http://orcid.org/0000-0003-2382-1058

Samuel Brandão de Oliveira2  ***
http://orcid.org/0000-0001-7385-2974

Fabio da Silveira Siqueira1  ****
http://orcid.org/0000-0002-5671-3347

Doaldo Ferreira Belem3  *****
http://orcid.org/0000-0003-1431-0125

1 Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro; Brasil

2 Faculdade Católica de Fortaleza; Brasil

3 Faculdade Instituto Bíblico Ebenézer; Venezuela


Resumo

Os capítulos 9 a 14 do livro de Zacarias incluem textos dos mais difíceis de serem interpretados no Antigo Testamento, com um imaginário por vezes extremamente complexo. No contexto da temática geral do bloco - a renovação de Judá-Jerusalém, com traços escatológicos amplos -, ocupa lugar privilegiado a situação política, com foco na casa de Davi, acompanhada pela renovação espiritual dos membros do povo. Seguindo esta perspectiva mais ampla do bloco, a passagem de Zc 12,1-13,6 oferece, todavia, não poucas dificuldades. Com o objetivo de destrinchar os aspectos de tal renovação nessa passagem em particular, desenvolve-se o presente estudo. Para tanto, partir-se-á da análise exegética das seções do texto, a qual colocará a base que conduzirá a identificar os aspectos estruturais e característicos envolvidos na nova realidade projetada.

Palavras-chave: Profeta Zacarias; Judá; Jerusalém; Intervenção divina; Casa de Davi

Abstract

Chapters 9 to 14 of the book of Zechariah include texts that are most difficult to interpret in the Old Testament, with an imaginary that is sometimes extremely complex. In the context of the general theme of the bloc - the renewal of Judah-Jerusalem, with broad eschatological features - the political situation occupies a privileged place, focusing on the house of David, accompanied by the spiritual renewal of the members of the people. Following this broader perspective of the block, the passage of Zc 12.1-13.6 offers, however, many difficulties. In order to unravel the aspects of such renewal in this particular passage, the present study is developed. To this goal, we will start from the exegetical analysis of the sections of the text, which will lay the basis that will lead to the identification of the structural and characteristic aspects involved in the new projected reality.

Keywords: Zechariah; Judah, Jerusalem, Divine Intervention, House of David

Resumen

Los capítulos 9 al 14 del libro de Zacarías incluyen textos que son más difíciles de interpretar en el Antiguo Testamento, con un imaginario que a veces es extremadamente complejo. En el contexto del tema general del bloque - la renovación de Judá-Jerusalén, con amplios rasgos escatológicos - la situación política ocupa un lugar privilegiado, centrándose en la casa de David, acompañada por la renovación espiritual de los miembros del pueblo. Siguiendo esta perspectiva más amplia del bloque, el pasaje de Zc 12.1-13.6 ofrece, sin embargo, muchas dificultades. Con el fin de desentrañar los aspectos de tal renovación en este pasaje en particular, se desarrolla el presente estudio. Para ello, partiremos del análisis exegético de los apartados del texto, que sentarán las bases que conducirán a la identificación de los aspectos estructurales y característicos que intervienen en la nueva realidad proyectada.

Palabras clave: Zacarías; Judá; Jerusalén; Intervención Divina; Casa de David.

Introdução

A hipótese clássica acadêmica compreende Zc 1-8 e Zc 9-14 como proveniente de origens diferentes, sendo Zc 9-14 a última seção do livro - a qual, partindo dos estudos de B. Stade no século XIX, é geralmente conhecida como “Dêutero-Zacarias” ou “Segundo Zacarias”1. Zc 9-14 introduz uma mudança radical no livro, com referência implícita ao domínio persa e a belicosa relação entre Jerusalém e as nações - embora, conforme observado por alguns eruditos, houvesse uma provável alusão histórica às conquistas de Alexandre Magno no Levante, e, consequentemente, uma descrição da mudança de época do domínio persa para o helenístico. Mais especificamente, ainda que Zc 9-14 não descreva eventos históricos literais, as cenas distópicas/utópicas são baseadas em realidades históricas - representando não os ditos de um único profeta em reposta a esses eventos históricos, mas sim uma coleção de profecias provenientes de vários indivíduos que reverenciavam as palavras de Zacarias filho de Baraquias2.

Zc 9-14, juntamente com o livro do profeta Malaquias, constituem textos dos mais difíceis de serem interpretados no Antigo Testamento, com um imaginário complexo, às vezes “impenetrável”3. Por isso, as últimas décadas mostraram um interesse crescente pela interpretação do livro do profeta Zacarias; entretanto, há uma ênfase na busca da mensagem unificada da obra, em detrimento da análise diacrônica.4 O presente artigo insere-se nesse objetivo, buscando uma análise diacrônica da passagem de Zc 12,1-13,6, frequentemente tratada como um grupo relacionado de oráculos em torno de temas escatológicos amplos, os quais podem ser resumidos como a «derradeira batalha cósmica dos povos contra Jerusalém»5. Aborda-se nessa passagem a temática da intervenção divina e a renovação de Judá-Jerusalém. Para tanto, estabelece primeiramente a delimitação, unidade e organização do texto de Zc 12,1-13,6, que permite, a seguir, o comentário exegético, feito segundo a análise da estrutura da passagem (Zc 12,1-8; 12,9-13,1; 13,2-6). Tal estudo permite identificar os elementos que constam do projeto de renovação de Judá/Jerusalém como o texto o apresenta6.

1. Delimitação, unidade e organização do texto

O capítulo 12 inicia-se pela presença de um título com três elementos: “proclamação”; “palavra de YHWH”; “oráculo de YHWH” (12,1). Alguns autores, em virtude de uma espécie de segundo título para o oráculo, presente em 1b, consideram que tal titulação serve para o conjunto de palavras compreendido entre 12,1 e 13,67; outros, para toda a seção dos capítulos 12 - 148. Esta última proposta parece mais conveniente, pois, de fato, o termo “oráculo” (מַשָּׂא) no início do capítulo 12 demarca uma porção de texto que desenvolve uma clara dimensão futura, a qual, iniciando-se em 12,1 chega até o final do capítulo 14. A delimitação dos oráculos nesse conjunto não é evidente, uma vez que há, pelo uso de referências a “aquele dia” (12,3.4.6.8.9.11; 13,1.2.4; 14,6.8.9.13.20), um entrelaçamento das ideias, de modo que temas e expressões que ocorrem de modo mais característico em certos versículos, são retomados em outros de forma idêntica ou semelhante. A expressão que relaciona o “dia” com o “YHWH” (הִנֵּה יוֹם־בָּא לַיהוָה), em 14,1 (que ainda contém o sinal macrossintático הִנֵּה), única após 12,1, todavia, demarca uma entrada importante, que permite destacar o último capítulo do livro dos oráculos anteriores, como uma seção própria dentro do conjunto maior composto pelos capítulos 12 a 14.

Com base na expressão הִנֵּה יוֹם־בָּא לַיהוָה, é possível, portanto, dividir o grande conjunto iniciado em 12,1 em duas partes. O critério temático corroboraria tal distinção, tendo em vista que em Zc 14 Jerusalém aparece como sendo saqueada, o que não ocorre antes. Além disso, em Zc 12 - 13 não aparece a imagem da conversão das nações, como em Zc 14,16-18, e, sim, uma mudança no interior do próprio povo. Zc 14 também não menciona a casa de Davi e fala, sim, da “realeza de YHWH” (Zc 14,9), numa perspectiva claramente distinta dos textos anteriores9. Mas mesmo no conjunto dos capítulos 12-13, por se concentrar sobre o tema do pastor que será ferido e a purificação de um “resto”, 13,7-9 apresenta-se como distinto do que vem antes. De fato, com o tema do pastor, Zc 13,7-9 distingue-se tanto do que o precede quanto do que o segue10. Por fim, mesmo 12,1-13,6 levanta questões acerca de se também aí encontra-se uma unidade bem coesa11.

A unidade de 12,1 - 13,6 é conferida, sob o ponto de vista formal, particularmente em virtude da repetição da fórmula “naquele dia” ou “acontecerá naquele dia” (12,3.4.6.8.9.11; 13,1.2.4) e a menção do(s) “habitante(s)” de Jerusalém (12,5.7.8.10; 13,1) e da “casa de Davi” (12,7.8.10.12; 13,1). Por outro lado, a menção a Judá (12,2b.4-8), num texto que se inicia e tem foco em Jerusalém (12,2a.3.9), chama a atenção e é nesse sentido que um e outro autor consideram a unidade textual formada paulatinamente, com as menções a Judá como uma expansão, num segundo momento, de um texto base12, ou ainda como uma unidade inicial (Zc 12,1 - 13,1) com dois “apêndices”: 13,2-6 (o descrédito da profecia); 13,7-9 (o poema sobre o pastor ferido e a conversão de um “resto”)13.

De outro lado, os capítulos 12 e 13 apresentam duas variações na menção do “dia”: “naquele dia” (בַּיּוֹם הַהוּא: 12,4.6.8.11; 13,1) e “e acontecerá naquele dia” (וְהָיָה בַיּוֹם־הַהוּא: 12,3.9; 13,2.4). Esta última ganha destaque por apresentar o sinal macrossintáticoוְהָיָה . Este ocorre também em outros momentos, mas, então, dependendo da indicação temporal anterior do “dia” (13,3.8), respectivamente em 13,2 (em referência a 13,3), 13,8 (em relação a 13,4)14. Considerando, por conseguinte, a expressão “e acontecerá naquele dia” (וְהָיָה בַיּוֹם־הַהוּא) como mais marcante nos dois capítulos, estes poderiam ser vistos, sob tal aspecto, organizados nas seguintes seções: 12,3-8; 12,9 - 13,1; 13,2-3; 13,4-9, ficando os versículos iniciais do capítulo 12 à parte, como introdução geral do conjunto (12,1) e uma introdução própria à primeira unidade textual (12,2). Zc 13,2-6 continua o desenvolvimento do tema dos versículos anteriores, com ênfase, porém, no fenômeno profético, o que o destaca como uma seção à parte. Por outro lado, a temática do pastor em 13,7-9, distingue estes versículos do contexto, distinção marcada pela setumá do v. 6, de modo que em 13,6 se tem uma primeira finalização das palavras iniciadas em 12,1. Desse modo, sendo 12,2 o início da fala de YHWH, já que o v.1 contém uma apresentação genérica de sua pessoa, pode-se considerar a unidade textual 12,2 - 13,6 como uma palavra que explicita o que é dito em 12,2, ou seja, que YHWH fará “de Jerusalém uma taça de vertigem para todos os povos ao redor” e também “contra Judá, durante o assédio contra Jerusalém”.

Em síntese, partindo das seções anteriormente identificadas e considerando-se ainda o uso da expressão “naquele dia”, 12,1(2) - 13,6 apresenta-se organizado como se segue:

12,1 introdução geral aos capítulos 12 a 14

12,2-8 primeira seção

12,9 - 13,1 segunda seção

13,2-6 terceira seção

2. Início do texto e primeira seção: Zc 12,1-8

O texto começa com o termo מַשָּׂא. Derivado da raiz אשׂנ (levantar, erguer), o termo pode significar, em sentido próprio, uma carga, um fardo, algo pesado a ser carregado. Em sentido figurado, por sua vez, o termo pode designar, dentre outras coisas, um encargo confiado a alguém (Nm 11,11). Na profecia bíblica, o termo pode ser traduzido como “oráculo” ou “proclamação” e é empregado geralmente no início de textos proféticos que possuem caráter de juízo (Na 1,1; Zc 9,1; 12,1).15 Segundo Stolz, “maśśāʾ is the ‘burden’ of judgment loaded on the addressee through the prophetic word”16.

Na introdução do oráculo, mais precisamente nos segmentos 1b-1d, YHWH, que é quem toma a palavra nos vv. 2-6, é apresentado com imagens da criação: o “que estende os céus”, “estabelece a terra” e “forma o espírito do homem em seu interior”. O uso da expressão נוֹטֶה שָׁמַיִם em 1b conecta o texto, do ponto de vista da fraseologia, com Is 44,24, 51,13 e o Sl 104,217. O uso em conjunto das expressões “estender” ou “firmar o céu” e “estabelecer a terra”, é utilizado também na literatura sapiencial, como se vê em Pr 3,1918, para apresentar a imagem de Deus como criador. Os termos “céus e terra” formam um binômio utilizado na BH (Bíblia Hebraica), particularmente nos Salmos, para designar o conjunto do cosmos.19 Esse fragmento hínico, conforme o classifica Meyers,20 culmina com a referência ao homem. A expressão רוּחַ־אָדָם só ocorre neste texto. O termo רוּחַ, que pode significar “sopro, vento, espírito” é frequentemente relacionado com Deus, desde a primeira página da Escritura (Gn 1,1). Algumas vezes o termo aparece aplicado ao homem, enquanto ele recebe o “espírito de Deus” (Gn 6,17). O uso da raiz יצר para se referir à criação do homem, conecta o texto com o vocabulário de Gn 2,7. Contudo, enquanto em Gn 2,7 tal raiz é utilizada para referir-se à formação do corpo do homem, em Zc 12,1 trata-se do espírito do homem, formado dentro dele. O profeta dá ênfase, portanto, ao aspecto interior, o que se coaduna com o conjunto do texto, uma vez que, em Zc 12,5a, os chefes de Judá dirão “em seu coração” que os habitantes de Jerusalém são para eles uma fortaleza.

A sucessão das três formulações deste início da profecia recorda o modo como o autor sacerdotal apresenta a criação em Gn 1,1 - 2,3: o homem é colocado por último, em seu vértice. Meyers acredita que tal colocação não é por acaso. O profeta deseja mostrar que a existência humana depende fundamentalmente do poder criador de Deus, assim como o restabelecimento da situação de Jerusalém; por isso a coloca no vértice, ainda que valendo-se, talvez, de uma forma hínica preexistente21. Tais imagens que abrem o oráculo parecem ter como função apresentar YHWH como “Senhor da Criação” em vista do que será dito em Zc 14, onde, também com imagens que manifestam o poder de YHWH sobre a criação, é descrita a vitória final de Jerusalém e a subida dos povos até ela (Zc 14,16).

O v. 2, que, a um tempo, introduz o conjunto 12,1 - 13,6 e a sua primeira subunidade (vv. 3-8), coloca em cena duas localidades sobre as quais falará o oráculo: Judá e Jerusalém. O v. 2b foi objeto de múltiplas interpretações. Alguns quiseram ver nele a ideia de que também Judá estaria contra Jerusalém no cerco, outros acham sua construção demasiado difícil para tomar qualquer posição22. Boda procura dirimir a questão por uma análise minuciosa do texto hebraico. Quando, em 2a, fala-se de maneira genérica dos “povos” que irão cercar Jerusalém, o autor sagrado utiliza a expressão לְ. Em 2b, por sua vez, tanto Judá quanto Jerusalém vêm introduzidas pela preposição עַל, o que, gramaticalmente, parece indicar que as duas serão objeto do cerco: não somente a região, mas também a cidade que está em seu centro e em torno da qual se construiu, no Antigo Israel, uma forte teologia23.

Embora o v. 2 mencione Judá e Jerusalém, o autor sagrado parece pôr o acento sobre esta cidade. Aqui é construída a primeira metáfora do texto. YHWH fará de Jerusalém “uma taça de vertigem” (סַף־רַעַל) para os povos ao redor. O termo “vertigem” (רַעַל) é único na BH24. A expressão “taça de vertigem” também aparece em Is 51,17.22, mas com um termo derivado da raiz רַעַל: תַּרְעֵלָה. Não é, obviamente, um termo idêntico, mas, sendo da mesma raiz, isso aproxima os textos. O que chama atenção também é o uso do termo סַף para indicar “taça”. Em Is 51,17.22, o termo utilizado é כּוֹס. O termo סַף utilizado em Zacarias é encontrado em textos que se referem ao culto, sendo traduzido normalmente como “bacia”, em Ex 12,22, ou, “limiar”, para indicar o limiar dos pórticos do Templo descritos na visão de Ezequiel (Ez 40,6). A escolha incomum poderia ser, talvez, proposital, com o intuito de dar, ainda que indiretamente, relevo ao Templo, que está em Jerusalém. Sua presença em meio à cidade seria, ainda, a garantia da proteção e da bênção de YHWH, fortalecendo Jerusalém e Judá contra os povos que as cercam25.

Sweeney destaca que Zc 12,2 aparece como uma reversão de Is 51,17-23, tendo em vista que em Isaías foi Jerusalém que bebeu, das mãos de YHWH, uma taça de vertigem como punição, uma aparente alusão ao exílio. Agora serão os que a cercam que a experimentarão, ela própria, como cálice de vertigem26. Contudo, Zacarias também parece estar em continuidade com o mesmo texto de Isaías, tendo em vista que, em Is 51,23, YHWH promete passar o cálice das mãos de Jerusalém para as mãos dos seus opressores, dos que pretendiam não só cercá-la, mas passar por cima do seu dorso. A imagem em Zacarias é elevada: o cálice é a própria cidade. Petersen destaca que, envolvida pelo império Persa, Judá não foi nele simplesmente absorvida. Jerusalém se conserva, providencialmente, numa posição estratégica. Ela será o instrumento de YHWH para punir os povos que pretendem removê-la de sua posição. A partir dela acontecerá a renovação prevista em Zc 1427.

O v. 3 abre a primeira seção do texto com a aparição da expressão וְהָיָה בַיּוֹם־הַהוּא, considerada um elemento estruturante para Zc 12-14. Esta expressão, como outras equivalentes (“naqueles dias”, “naquele tempo” etc), refere-se ao יוֹם יהוה, entendido como dia do julgamento de Deus sobre Israel e/ou as outras nações. Embora tal lexema indicasse geralmente o cumprimento dos desastres em âmbito político previstos na profecia pré-exílica, com o exílio babilônico ocorre uma mudança na sua compreensão, passando a indicar a intervenção definitiva de Deus na história28.

O v. 3 centra-se no cerco que será feito a Jerusalém. Em 3b encontra-se uma segunda metáfora a respeito de Jerusalém: ela se tornará uma “pedra a ser carregada” (אֶבֶן מַעֲמָסָה). Derivado da raiz עמס, o termo também é único em toda a BH29. As imagens que se sucedem e o uso de termos únicos na BH conferem não somente beleza ao texto, mas reforçam uma ideia: Jerusalém como instrumento do juízo de YHWH contra os povos que a pretendem assaltar. A esse respeito, Sweeney chama atenção para a assonância existente entre מַעֲמָסָה e o título da seção, מַשָּׂא. Ele considera tal uso uma espécie de ironia, onde o profeta demonstra, já de início, que Jerusalém mesma será o ônus, o peso, ou seja, o instrumento de YHWH para punição dos seus inimigos30.

É possível, talvez, conjecturar, que no v. 3b há uma certa ampliação do v. 2a. Em Zc 12,2a se fala especificamente dos povos ao redor de Jerusalém, ou que a cercam, e o versículo termina com o advérbio סָבִיב. Em Zc 12,3b, por sua vez, falta esse advérbio. Num texto poético, esperar-se-ia uma terminação mais assonante, com os dois segmentos terminando pela expressão לְכָל־הָעַמִּים (12,2a.3b). Nesse caso, a ausência de assonância pode ser proposital, com o intuito de mostrar um juízo de YHWH que começará em torno de Jerusalém, mas que se espalhará entre todos os povos. Isso parece se coadunar com a expressão “famílias da terra”, usada para descrever os que virão a Jerusalém em Zc 14,17. No v. 13b fica claro que Jerusalém pode até ficar abatida, de certa forma, pode ser “carregada”, mas o será como uma pedra que ferirá gravemente os que pretenderem fazê-lo. Petersen vê nesse versículo uma releitura dos Salmos de Sião, particularmente os Salmos 46, 48, 76. Numa sua leitura do Sl 46,6, que afirma que Jerusalém é inabalável, ele afirma que, na perspectiva de Zacarias, Jerusalém pode até ser abalada, “carregada”, mas não será efetivamente removida de seu lugar, porque YHWH a protegerá e a transformará em pedra que fere e faz perecer31.

Os vv. 4-5 formam a segunda seção do texto. Nestes versículos Judá está no centro. O v. 4 é uma descrição da ação de YHWH em favor de Judá; o v. 5, por sua vez, nos reporta uma fala dos chefes de Judá com relação aos habitantes de Jerusalém. O v. 4 é construído com paralelismos que funcionam como uma moldura:

בַּיּ֙וֹם הַה֜וּא נְאֻם־יְהוָ֗ה 4aα Naquele dia, oráculo de YHWH,

אַכֶּ֤ה כָל־סוּס֙ בַּתִּמָּה֔וֹן 4aβ ferirei todo cavalo de espanto,

וְרֹכְב֖וֹ בַּשִּׁגָּע֑וֹן 4b e os que os cavalgam (ferirei) de pânico.

וְעַל־בֵּ֤ית יְהוּדָה֙ אֶפְקַ֣ח אֶת־עֵינַ֔י 4c mas sobre a casa de Judá abrirei meus olhos,

וְכֹל֙ ס֣וּס הָֽעַמִּ֔ים אַכֶּ֖ה בַּֽעִוָּרֽוֹן׃ 4d mas todo cavalo dos povos ferirei de cegueira.

A ação de YHWH é descrita no v. 4 por meio de uma cena de guerra, o que é confirmado pela menção dos “cavalos” e dos que os cavalgam.32 Todos esses serão “feridos” (נכה) por YHWH. A raiz נכה, normalmente utilizada na BH em contexto bélico, pode ser traduzido como “golpear, ferir”. Metaforicamente, YHWH pode ser o sujeito e, com isso, se indica «that Yahweh can intervene supernaturally to injure or destroy foreign powers and nations without resort to military means»33.

O v. 4 utiliza termos presentes em Dt 28,28: “espanto” (תִּמָּהוֹן), “pânico” (שִׁגָּעוֹן) e “cegueira” (עִוָּרוֹן)34. O uso dos três termos em conjunto, sobretudo levando-se em conta que são termos raros na BH, e que o primeiro e o último somente ocorrem em Zc 12,4 e Dt 28,28, indica certa conexão entre os textos, ainda mais que Dt 28,28 também abre-se com a raiz נכה, a mesma presente em Zc 12,4a.4d35. Contudo, em Dt 28,28 esses serão os males que ferirão os israelitas, caso não obedeçam a voz de YHWH (Dt 28,46). O autor utiliza aqui o mesmo procedimento literário que usou em 2a: toma uma imagem de punição para Israel utilizada em outro texto bíblico e a usa para expressar a punição de YHWH aos que irão ameaçar Israel no futuro36. O v. 4 se prende mais à ação de YHWH do que ao poderio bélico de Judá ou Jerusalém. Será YHWH quem agirá primeiro, tornando os inimigos inaptos para a luta.

O segmento 4c tem lugar de destaque, uma vez que apresenta uma contraposição de ideias: enquanto fere os inimigos de Judá e Jerusalém, YHWH abrirá os olhos sobre “a casa de Judá”. Destaca-se, assim, no meio de um juízo, uma ação salvífica37. A construção com a preposição עַל recorda 2b: o cerco acontecerá “contra Judá” (עַל־יְהוּדָה), mas ela estará a salvo porque YHWH abrirá sobre ela seus olhos, sobre a “casa de Judá” (וְעַל־בֵּית יְהוּדָה). Os segmentos 4c e 4d se detêm no campo da visão, com a ideia do “abrir os olhos” sobre Judá e da “cegueira” perpetrada aos cavalos, que representam os inimigos. Algumas vezes, na BH, a ação salvífica de YHWH começa justamente com o seu “ver” a opressão do seu povo (Ex 3,7). Se a salvação de YHWH começa com o seu olhar para a situação do seu povo, entende-se melhor Dt 4,28, onde o autor sagrado chama a atenção de Israel para que não creiam nos deuses que “não podem ver” (לֹא־יִרְאוּן), em outras palavras, que não podem salvar38. O segmento 4c prepara o que virá melhor descrito no v. 6. Judá será capaz de derrotar os inimigos que o cercam, bem como cercam Jerusalém, porque YHWH estará com eles.

Assim como em 1d a criação do homem é apresentada mais no seu aspecto interno, o v. 5 também se abre com um destaque para a interioridade dos chefes de Judá. Estes dirão “em seu coração” (בְּלִבָּם), expressão que costuma ser utilizada para descrever os pensamentos internos do sujeito39. Tal expressão pode ser utilizada, também, para indicar um reconhecimento, em nível profundo, uma certeza a respeito de algo, que virá expresso no segmento seguinte40. Em 5b a fala dos habitantes de Judá é reportada. Eles reconhecem que os “habitantes de Jerusalém” são uma força para eles, em YHWH dos Exércitos. O epíteto dado a YHWH encaixa-se bem num contexto que aponta para uma batalha, a qual está sendo aos poucos descrita por meio de metáforas e comparações.

Mais uma vez o profeta aplica a Jerusalém um termo único na BH, como fez nos segmentos 2a (רַעַל) e 3b (מַעֲמָסָה): “fortaleza”, “força” (אַמְצָה)41. Contudo, enquanto os termos empregados em 2a e 3b tinham uma conotação negativa, o termo “fortaleza” de 5b tem uma conotação positiva: os chefes de Judá reconhecerão nos habitantes de Jerusalém a sua força. O texto não deixa suficientemente claro se havia ou não algum conflito entre Judá e a capital Jerusalém, e que tal conflito estaria agora resolvido. O que o texto parece querer significar é que haverá uma união muito estreita entre toda a região, tendo Jerusalém como centro, quando vierem contra eles as nações inimigas42.

Uma terceira seção abre-se com o v. 6 pelo retorno da expressão “naquele dia” (בַּיּוֹם הַהוּא). Além de serem uma continuação dos vv. 4-5, onde é mencionada a “casa de Judá” (4c) e seus “chefes” (5a), os vv. 6-7 conectam-se de modo muito particular com o v. 3. Além de também trazer o yiqtol do verbo שׂים logo após a expressão בַּיּוֹם הַהוּא, enquanto o v. 3 se detém numa metáfora que explica como Jerusalém combaterá contra os inimigos que a cercam, os vv. 6-7 centram-se na ação de Judá, recorrendo o v. 6, igualmente, a recursos comparativos. No v. 3a é utilizada propriamente uma metáfora, enquanto que, em 6a, usa-se uma comparação, com recurso à partícula כְּ. Judá aparece representada pelos seus chefes, que serão como um “braseiro de fogo” em meio às árvores e “como uma tocha” em meio aos feixes.

Em algumas profecias de juízo, o binômio “fogo” (אֵשׁ) e “devorar” (אכל) aparecem para indicar o modo como YHWH agirá punindo sejam os inimigos de Israel (Am 1,4), seja o próprio Israel (Jr 17,27). Nesses textos, é YHWH quem age diretamente, enviando um fogo, sinal do juízo, que devorará aqueles que fazem o mal. Em Zc 12,6, os chefes de Judá serão como esse fogo, como braseiros ou tochas, que devorarão tudo, à direita e à esquerda. Como é comum na BH, quando este binômio é utilizado, a “direita” vem em primeiro lugar. Meyers entende que se trata de um merismo, semelhante a expressão “de mar a mar”, que indica uma totalidade43.

O segmento 6b, do ponto de vista da fraseologia, se apresenta como uma completa reversão do que vem descrito em 2ab, que fala do cerco a Judá e Jerusalém. Assim como o cerco será “contra” (עַל) Judá e “contra” (עַל) Jerusalém, assim também o fogo devorará os inimigos à direita (עַל) e à (עַל) esquerda. A raiz אכל não precisa, necessariamente, que seu complemento seja introduzido pela preposição עַל, mas parece que o autor sagrado assim o quis, com o intuito de demonstrar mais claramente que a ação de YHWH através dos clãs de Judá reverterá a situação de opressão sofrida por Jerusalém, o que prepara o segmento 6c, com a afirmação de que Jerusalém poderá habitar “de novo” em seu lugar. Além disso, enquanto 2a menciona explicitamente “todos os povos ao redor” (לְכָל־הָעַמִּים סָבִ֑יב), 6b também faz o mesmo com a expressão “todos os povos ao redor” (אֶת־כָּל־הָעַמִּים סָבִיב). Fica assim esclarecida a ação de YHWH tanto por meio de Jerusalém, tornada taça de vertigem para todos os povos ao redor, quando por meio de Judá, tornado um fogo que devora tudo à direita e à esquerda.

No segmento 6c chama atenção o uso do advérbio עוֹד, traduzido normalmente como “de novo, novamente”. O texto se encontra já no pós-exílio, quando Jerusalém já está restabelecida em seu lugar. Tal ação futura dos povos contra ela não é descrita como contendo novo exílio, mas apenas um cerco, que será contido com a destruição desses povos. Logo, o sentido de “habitar novamente” pode causar certa estranheza. Deve-se recordar, contudo, que, segundo Alonso Schökel, o advérbio עוֹד pode significar não somente reiteração, mas, também, continuidade. Nesse sentido, o profeta poderia estar querendo afirmar que Jerusalém “continuará habitando” em seu lugar44.

No v. 7 há uma mudança: agora não é mais YHWH quem fala, mas ouve-se uma voz que fala a respeito da ação de YHWH. Aqui se faz um gancho do final dessa primeira seção com o v. 8, onde também não é mais YHWH quem fala, mas alguém que descreve o que ele irá fazer. A fala direta de YHWH retornará em 12,9, como se 12,7-8 fossem um comentário do profeta a tudo o que YHWH acaba de descrever que irá realizar45. O versículo põe em destaque a ação de YHWH. O uso da raiz do verbo “salvar” (ישׁע) em posição enfática, deixa claro isso. Aliás, o destaque para a centralidade de YHWH nesta batalha futura é dado desde o início do oráculo, com a presença do pronome pessoal de forma enfática em 2a e o uso do verbo em primeira pessoa e em posição enfática no v. 3b e 6a46.

Três grupos diferentes são colocados em destaque: as tendas de Judá, a casa de Davi e o habitante de Jerusalém. Normalmente, se esperaria que, por razões de deferência, a casa de Davi fosse nomeada primeiro, mas o autor sagrado esclarece que tal não se dará para que nem a casa de Davi e nem o habitante de Jerusalém se exaltem sobre Judá. A expressão “tendas de Judá” difere daquela utilizada em 4c - Casa de Judá. Segundo Boda, pode-se entender o termo em dois sentidos: ou em sentido bélico, significando as tendas dos acampamentos colocados em batalha; ou em sentido mais amplo, significando a grande região de Judá que poderia abrigar também pequenos vilarejos onde ainda se habitavam em tendas.47 O termo poderia ser, também, apenas uma forma mais arcaica de referir-se a Judá em seu conjunto, assim como Jeremias faz para referir-se ao reino do Norte (Jr 30,18).

Segundo Boda, o texto quer apenas demonstrar que uma igual “honra” (תִּפְאֶרֶת) será atribuída aos dirigentes, talvez sobreviventes da dinastia davídica (1Cr 3), à capital e a toda região de Judá. O autor explica que, num tipo de batalha como esse, a maior glória fica com aqueles que têm um maior status social; por isso se esperaria uma maior honra dada à casa de Davi e ao habitante de Jerusalém, a capital. Contudo, como a vitória será perpetrada por meio da ação de YHWH, o que fica claro no texto, tal honra deve ser atribuída igualitariamente aos envolvidos nessa batalha48. Poder-se-ia até acrescentar que o verdadeiro digno de honra, nesta batalha, é o próprio YHWH, que “tornou” Jerusalém uma taça de vertigem (2a), uma pedra a ser carregada e que fere quem a carrega (3bc), que abriu os olhos sobre Judá (4c) e que tornou seus chefes como um braseiro e uma tocha em meio às árvores (6a).

No contexto do oráculo iniciado no v. 2, que apresenta Jerusalém como uma “taça de vertigem” para os povos estrangeiros, o v. 8 dá continuidade à descrição da salvação para a cidade santa e seus chefes (v. 4d.5ab), iniciada no v. 6c49. Três afirmações estão aí contidas: - Deus protegerá o habitante de Jerusalém; - mesmo quem “tropeça” será como Davi; - a casa de Davi será como Deus, como mensageiro de YHWH. Esses pontos podem ser sintetizados na promessa de proteção para Jerusalém e no engrandecimento da casa de Davi.

A determinação de quem seja o “habitante de Jerusalém” (יְרוּשָׁלִַם יֹשְׁבֵי) não é clara. Em sentido literal, seria o próprio habitante da cidade santa, que, na época do texto, já teria vivenciado o ataque das nações contra ela50. Como, todavia, o termo יוֺשֵׁב poderia ser também entendido em sentido técnico, como referente a agentes da burocracia governante, a expressão poderia indicar que são visados os líderes de Jerusalém51.

As duas comparações presentes no versículo vão num crescendo, a primeira com o termo de comparação “Davi” e a segunda, Deus, o mensageiro de YHWH. A primeira, concernente ao habitante de Jerusalém, evoca provavelmente a proteção que Davi, como eleito de Deus, recebeu de Deus em todas as vicissitudes de sua subida ao trono e de seu governo52: assim ocorrerá com o “habitante de Jerusalém”. A segunda comparação refere-se somente à “casa de Davi”: será “como Deus”, כֵּאלֹהִים, isto é, estará acima dos ataques dos povos inimigos e por isso será glorificada. A especificação “como um mensageiro de YHWH”, que segue à comparação com “Deus”, אֱלֹהִים, parece evocar 2Sm 14,17, em que a mesma comparação é usada para Davi53. Neste último texto, a referência é à capacidade de discernimento do rei numa difícil situação, ou, em outras palavras, diz respeito à capacidade de governar com sabedoria. O uso de אֱלֹהִים e não do tetragrama sagrado relembra o Sl 45,7, onde o termo é aplicado ao rei, no contexto do conjunto de concepções referentes à pessoa do monarca e à sua elevada função como intermediário entre Deus e o povo: o rei pode ser comparado a um “deus” ou aos “deuses”, em sua majestade; não detém, evidentemente, porém, o nome do próprio YHWH54. A comparação com um “mensageiro de YHWH” em referência a um conjunto de pessoas (“diante deles”) relembra os textos em que YHWH e o mensageiro/anjo de Deus estão junto ao povo em seu caminho pelo deserto. Em Ex 13,21, YHWH caminha diante do povo; em Ex 14,19, é o anjo/mensageiro de Deus (מַלְאַךְ הָאֱלֹהִים) que o faz. Tais tradições teriam influenciado o texto de Zacarias, que, no entanto, teria trocado a ordem dos epítetos de Êxodo, usando primeiro só “Deus” e, para o mensageiro, o tetragrama sagrado55.

3. Segunda seção: Zc 12,9 - 13,1

Regido pela expressão “e acontecerá naquele dia”, Zc 12,9-10 dá início à segunda parte da seção, que continuará, com novos desenvolvimentos, em etapas marcadas pela expressão “naquele dia” (12,11; 13,1). O v. 9 retoma o tema do confronto entre Jerusalém e as nações, que caracterizava os primeiros versículos deste capítulo. A construção do verbo בקשׁ + preposição לְ. + verbo em Infinitivo Constructo (הִשְׁמִיד) enfatiza a intenção de realizar algo56, apresentando de forma forte a decisão divina. O yiqtol do primeiro verbo indica algo desejado mais do que propriamente um ato garantido no futuro. A continuação do v. 9c, de outro lado, define a ameaça a Jerusalém de modo independente de uma dimensão temporal: o uso do particípio (בָּאִים), de fato, presta-se a um discurso descritivo, o que é corroborado pela sua função adjetiva atributiva na frase, regido como está, assim como o termo anterior, pelo artigo definido (הַגֹּויִם הַבָּאִים). Trata-se de uma grave destruição (verbo שׁמד hifil) provocada pela invasão de “todas as nações” (12,3): a perspectiva é de uma conjuração universal dos povos contra Jerusalém, aqui só anunciada, mas que será desenvolvida no capítulo 14. À ameaça presente, Deus pretende intervir no futuro.

Nesta ocasião, em que Deus promete agir em favor de Jerusalém, a casa de Davi e o habitante de Jerusalém serão também objetos da ação de YHWH. O v. 10 tem início com a promessa da ação de Deus sobre a casa de Davi e o habitante de Jerusalém. O verbo שׁפך (derramar), com YHWH como sujeito, usado em sentido metafórico, em geral para indicar punição (Jr 10,25; Os 5,10), tem aqui conotação positiva. YHWH infundirá um “espírito de graça e súplica”. Os dois termos empregados derivam da mesma raiz (חֵן e תַּחֲנוּנִים) e aqui se complementam. Enfatizando o primeiro a ideia de favorecer alguém, o “espírito (רוּחַ) de graça” dispõe uma pessoa a ser favorável a outra57. O segundo, indicando a atitude de súplica, de pedir o favor de alguém, implica a ideia de pedido de ajuda, também no sentido de perdão58, o que se entende bem na continuação da frase: eles “olharão para mim”59.

Apesar de o novo uso da expressão “naquele dia”, no v. 11, marcar uma entrada secundária na seção, os vv. 10-14 conectam-se pela repetição do tema da lamentação, que ocorre com o verbo ספד, “lamentar-se” (vv. 10.12, implícito nos vv. 13-14) e o termo מִסְפֵּד, “lamento” (vv. 10-11), da mesma raiz. Tal lamentação é detalhada nos segmentos seguintes e, no contexto, deriva do “espírito de graça e súplica” derramado por Deus sobre a casa de Davi e o habitante de Jerusalém. O motivo é indicado logo de início: há um “transpassado”. Se o texto leningradense, numa primeira leitura, indicaria Deus como o transpassado (o que exigiria uma leitura metafórica), a mudança do atnach para a preposição do segmento anterior abre a possibilidade de outro personagem60. Outra solução seria considerar os termos אֲשֶׁר אֵת na acepção de “em relação àquele a quem”, de modo que o texto se referiria a olhar para Deus com respeito ao personagem que é transpassado61. O verbo utilizado דקר indica ferir, especialmente com a espada (arma então muito utilizada nas batalhas), daí transpassar, mas sem necessariamente implicar a morte do ferido, e podendo, ainda, incluir a ideia de vergonha (Jr 37,10)62.

É obscura a identificação não só do transpassado, mas também de quem o fere. De um lado, a 3ª pessoa do plural do v. 10c, no fluir do texto, indicaria, de modo mais imediato, a casa de Davi e “o habitante de Jerusalém” (v. 10a). Todos os verbos do versículo teriam, assim, o mesmo sujeito. De outro lado, o contexto da vinda dos povos contra a cidade santa poderia fazer pensar como sujeito de 10c estes povos inimigos. A primeira possibilidade parece mais apropriada, uma vez que a conjuração dos povos contra Jerusalém será, segundo a promessa divina, dominada. Nessa linha, o espírito de graça e súplica e o consequente voltar-se para Deus diz respeito a uma figura contra quem a própria casa de Davi e o habitante de Jerusalém se tinham colocado. Que a ação de transpassar se localiza no passado parece ancorar-se no uso de uma oração em qatal (v. 10c) em meio à cadeia de weqatal que marca o v. 10 (em 10a.b.d). Na época futura (“naquele dia”: v. 9), eles se arrependerão do que fizeram63.

A grande dimensão e profundidade da lamentação é bem caracterizada, no texto, pelos elementos que a qualificam: a comparação com a amargura ligada à lamentação sobre o filho único, sobre o primogênito (v. 10d-e). Tais adjetivações, expressando uma grande dor, reforçam o teor dramático da afirmação, uma vez que o filho único ou o primogênito concentram as mais importantes expectativas familiares.

A lamentação, retomada no v. 11 e localizada em Jerusalém64, é aproximada, em sua gravidade, àquela relativa a Adad-Remon, na planície de Meguido. Adad-Remon reúne dois termos que se assemelham. O primeiro designa um deus arameu da tempestade, associado a Baal, e cujo ritual incluía lamentações (2Rs 5,18); Remon é outro nome da mesma divindade (2Rs 5,18)65. O nome não está regido por עַל e parece não se tratar aqui de um lamento “sobre” a morte da divindade (no inverno, para ressurgir no verão)66. Por outro lado, embora a Escritura mencione diversas vezes Remon como lugar (Js 19,7.13; Jz 20,47; 21,13; 1Cr 4,32), não se pode com segurança situá-lo na planície de Meguido67. De qualquer forma, esta última está fortemente ligada, na Escritura, ao desastre que culminou com a morte de Josias, um rei muito bem conceituado (2Rs 23,1-20.25), sepultado em Jerusalém (2Rs 23,29-30), cuja morte prematura mereceu grande lamentação (2Cr 35,24-25). É assim provável que haja (também) uma referência a Josias68, cuja celebração da morte, conforme o texto de 2Cr, era marcada por cantos fúnebres. Chama a atenção, na passagem de 2Cr, a distinção entre a lamentação feita por homens e mulheres separadamente69, detalhe que foi considerado importante também em Zc 12,12-14. As mulheres têm um lugar reconhecido nos lamentos - também nos lamentos rituais (Jr 9,16-25; Ez 8,14; 32,16).

A terra (הָאָרֶץ), colocada em relação às famílias citadas a seguir (vv. 12-13), designa em primeiro lugar, provavelmente, os habitantes de Jerusalém (v. 11), mas o contexto não exclui outros do território de Judá70. A abrangência da dor é especificada pela menção de diversos clãs (מִשְׁפָּחָה), clã por clã, expressão esta que, em forma de moldura, abre e fecha os vv. 12.14. O lamento é entoado pela totalidade dos clãs, referidos no texto a quatro personagens proeminentes. O clã da casa de Davi aponta certamente para a família dinástica. A casa de Levi indica a linhagem levítica-sacerdotal da época (provavelmente o século V a.C.), a serviço do templo71. Governo real e classe sacerdotal são, assim, mencionados.

Mais difícil é a identificação do clã da casa de Natan, já que há várias personagens que levam este nome na Escritura, sendo a mais conhecida a do profeta da corte de Davi. A dificuldade de que o termo “casa” implica genealogia (e que, por conseguinte, não se poderia referir a figuras proféticas, cuja função não era hereditária, mas baseada num carisma pessoal) pode ser contornada se é considerado que, na época do segundo templo, levitas mencionados como cantores cúlticos desempenham suas funções segundo ordenanças do profeta Natan (além da figura do vidente Gad: 2Cr 29,25)72. De outro lado, o nome “Natan” é ligado também a figuras militares (2Sm 23,36) e igualmente mencionado como um dos filhos de Davi (2Sm 5,14), de modo a poder referir-se à descendência monárquica. Na mesma linha, o assassinato do governador Godolias (colocado pelos babilônios após a conquista de Jerusalém) está associado ao filho de Natanias (nome que representa uma forma teofórica do nome “Natan”: 2Rs 25,23.25; Jr 40,8.14; 41,9), que pretendeu reconquistar o poder na cidade73.

O fato de os “Semeítas” serem relacionados como clã, sem referência a uma “casa” (v. 13) poderia ser considerado somente uma variação estilística, sem que implique uma diferença relevante para com os outros clãs mencionados. O termo tem sufixo gentílico, o que, de certa forma, o equipara aos outros clãs indicados74. Contam-se ao menos quinze personagens com o nome de Semei na Escritura, mas, com sufixo gentílico, o termo ocorre somente aqui e em Nm 3,21, então referido a um descendente de Gerson, da tribo de Levi (1Cr 6,2; 23,7.9.10). A relação com esta tribo aparece também em outros textos pós-exílicos (1Cr 25,3; 2Cr 29,14; 31,12-13; Esd 10,23), de modo que é plausível que em Zc 12,13 indicasse um grupo dentro da classe levítica. Se a casa de Natan fosse considerada também em relação à monarquia, teríamos, nos vv. 12-13, uma organização que apresentaria, por duas vezes, um clã seguido por um subgrupo seu: clã da casa de Davi - da casa de Natan; clã da casa de Levi - dos Semeítas75.

Zc 13,1 fecha a seção retomando a casa de Davi e os “habitantes de Jerusalém” mencionados anteriormente (v. 5.7.8.10.12). Considerada a frase em seu conjunto, a preposição לְ indica o motivo da promessa aí mencionada76. Ligada a realidades negativas (“pecado” e “imundície”), em virtude do sentido de purificação relacionado muitas vezes às águas (Ex 29,4; Lv 16,4.24), a fonte conota aqui a purificação, com a eliminação desses elementos. Embora com vocábulos diversos, o uso da imagem das águas ligadas à purificação evoca o dilúvio, tanto mais que é usado o mesmo verbo “abrir” (פתח), em ambos os casos em nifal passivo (Zc 13,1; Gn 7,11). Nos dois casos, as águas servem para eliminar o mal77. A fonte em Jerusalém remete a Geon, que é também mencionada no relato de Gn 2 como um dos quatro rios do Éden (Gn 2,13). Tal evocação põe em relevo o status privilegiado de Jerusalém na criação, trazendo à baila, assim, a concepção de Jerusalém como centro do mundo78. De outra parte, a ligação da fonte com a “casa de Davi e os habitantes de Jerusalém” relembra a unção de Salomão junto à fonte de Geon, na cidade santa (1Rs 1,32-40.45), de modo que poderia estar em jogo a ideia de uma purificação, nos tempos futuros, da monarquia79: tanto os davídidas, que reaparecem, embora temporária e obscuramente no início do domínio persa (de modo mais claro com Zorobabel, Ag 2,21-23), como os líderes a eles subordinados80.

Esta última identificação é fruto da compreensão da raiz ישׁב no sentido técnico de “governar”81. Considerado o conjunto da perícope, é possível verificar se realmente, em Zc 13,1, a expressão יְרוּשָׁלַםִ יֹשְׁבֵי tem este sentido. Quanto a esse ponto, o que chama a atenção é, nesses versículos, o uso tanto do singular quanto do plural do particípio יֹשֵׁב:

  • 12,5: habitantes de Jerusalém (יְרוּשָׁלַםִ יֹשְׁבֵי: plural) - distinguem-se dos “chefes de Judá” (יְהוּדָה אַלֻּפֵי) - a ideia é de integração entre os clãs de Judá e os habitantes de Jerusalém;

  • 12,7: habitante de Jerusalém (יְרוּשָׁלַםִ יֹשֵׁב: singular) - em ligação com a “casa de Davi”, cujo fausto, assim como o do “habitante de Jerusalém” não se deve engrandecer diante das “tendas de Judá” - há uma oposição entre o habitante de Jerusalém e Judá;

  • 12,8: habitante de Jerusalém (יְרוּשָׁלַםִ יֹשֵׁב: singular) será protegido - alguns de seus membros ou sua totalidade (“aquele que tropeça”) são comparados a Davi;

  • 12,10: habitante de Jerusalém (יְרוּשָׁלַםִ יֹשֵׁב: singular) - a casa de Davi aparece ligada ao habitante de Jerusalém ao receber o “espírito de graça e súplica”, olhar para Deus e ao lamentar o que foi transpassado;

  • 13,1: habitantes de Jerusalém (יְרוּשָׁלַםִ יֹשְׁבֵי: plural) - participarão da purificação.

As indicações acima mostram que:

  • O uso do particípio no singular coordena-se bem com a casa de Davi, de modo a poder significar os líderes do governo que estão em seu entorno;

  • o uso no plural, em 12,5, provavelmente não se refere a esses chefes, já que eles se distinguem dos chefes de Judá;

  • a partir de 12,5, o uso no plural, em 13,1, não deveria restringir-se à classe burocrática governante. O plural abre e fecha a ocorrência das menções do particípio ligado à cidade de Jerusalém.

Se tais considerações são corretas, melhor seria ver na expressão no plural uma referência mais ampla que à burocracia de Jerusalém; o candidato natural seria, então, membros do povo ou, por metonímia, o povo em geral como referido no plural do particípio. Dessa forma, a purificação futura, em 13,1, diria respeito tanto à casa monárquica quanto ao povo em seu conjunto. Esta interpretação, por sua vez, poderia ser corroborada se considerados os versículos imediatamente anteriores. Pressupondo o lamento mencionado em 12,10-14, com suas distinções de clãs ligados a figuras relevantes, de um lado, e a clãs em geral (“clã por clã”: v. 12a.14a), a promessa de 13,1 retomaria a classe dominante (a casa de Davi e as outras ali mencionadas) e o povo em geral (“clãs restantes”, v. 14a). Com a evocação da purificação, 13,1 serve de transição para a próxima seção.

4. Terceira seção: Zc 13,2-6

A purificação anteriormente mencionada e realizada por Deus é descrita a partir de 13,2. Inicia-se com o extermínio dos nomes dos ídolos da terra, sendo até mesmo sua memória cancelada. No pensamento semita a existência do nome equivale à existência daquilo que ele designa. Sendo assim, se o fato de invocar o nome de uma divindade é o reconhecimento da existência dessa divindade, exterminar o nome dos ídolos equivale a negar a existência e o poder das divindades representadas pelo nome82. De fato, em todos os casos em que se utiliza o vocábulo “nome” em conjunto com “exterminar” na BH, a implicação é clara: «exterminar nomes significa destruição ou não existência (por exemplo, Js 7,9; Is 14,22; 48,19), e, ao contrário, ter um ‘nome eterno’ significa que aqueles com tal nome perdurarão, nunca serão eliminados (Is 56,5; cf. Rt 4,10)»83.

O v.2 fala também do desaparecimento dos profetas, entendidos na leitura da Septuaginta como sendo falsos profetas (ψευδοπροφήτας), e do “espírito impuro” ou de “impureza” (רוּחַ הַטֻּמְאָה), expressão esta que só aparece aqui na BH e que, ao contrário, abunda no Novo Testamento o que pode corroborar uma datação mais recente do escrito84.

O vocábulo טֻמְאָה é frequentemente usado para se referir ao estado de impureza ritual, especialmente na legislação sacerdotal. No entanto, a distinção entre impureza ritual e pecado moral, na cosmovisão sacerdotal, não é muito clara. Além disso, fica patente, no texto, que os pecados da idolatria e das falsas profecias espalharam impureza sobre a terra85. O termo רוּחַ provavelmente «se refere a uma força espiritual que deve ser removida da terra e que está ligada aos ídolos e profetas. Isso contrasta com os espíritos que YHWH derrama em 12,10 para começar o processo de renovação»86. Tal oposição põe em relevo a importância do extermínio dos elementos impuros mencionados.

No que se refere à temática profética em 13,2, apesar de a Septuaginta sugerir uma distinção entre os profetas que falam em nome de Deus e os falsos profetas, 13,387 pareceria acusar todos os profetas (13,3a) de mentirem em nome de YHWH (13,3d), o que os levaria a serem mortos pelos próprios genitores se profetizarem (13,3c-e)88, dando a entender que 13,2 sugerisse a eliminação da instituição profética enquanto tal. No entanto, para Boda,

o uso da palavra profeta (nāḇîʾ) não significa que se está a falar da profecia legítima, uma vez que este termo aparece regularmente sem um adjetivo pejorativo em contextos onde está claramente se referindo à falsa profecia, seja ligada ao Yahwismo (ver especialmente Jr 28) seja a deuses estrangeiros (ver esp. 1Rs 18). O fato de que este texto se refira à falsa profecia é confirmado pelos cenários fornecidos por 13,3-4, que se referem a falar falsamente e enganar. A interseção entre a falsa profecia (adivinhação) e os deuses ilícitos (idolatria) já foi destacada em 10,1-2, e pode ser vista em Jr 23,9-40 e Dt 13 (cf. Dt 18,20). O impacto dessas práticas se estende para mais além da cidade de Jerusalém, atinge a terra como um todo89.

Petersen, por sua vez, sugere a coexistência de duas correntes opostas no que se refere à profecia no momento da composição do texto. Uma que constatava e defendia a existência da profecia e outra que via a profecia, pelo menos como existiu nos períodos monárquico e exílico, como algo do passado e que só retornaria no futuro, como sugerem Jl 2,28-29 e Ml 3,23. Para Petersen, estas duas correntes estariam representadas no texto de Zc 13,2-6. Aquela que auspicava a eliminação da instituição profética, talvez influenciada pelo aumento de autoridade da literatura profética, podendo-se até mesmo falar em um status protocanônico dos Livros Proféticos, com tendência para o fechamento do seu cânon, e que, portanto, não admitiria a existência de outros profetas, a qual estaria representada por 13,2-3; e outra que postularia a permanecia da instituição profética, a qual estaria representada por 13,4-6, texto que pressuporia a continuação da existência dos profetas90.

Seja como for, 13,4-6 afirma que os profetas sentirão constrangimento em serem considerados como tais, sendo que a profecia não só será algo de que alguém se deve envergonhar, mas também o próprio profetizar será equivalente a mentir (13,4bcd). Este constrangimento vem reafirmado em 13,5 com expressões que remetem a Am 7,10-17. Primeiramente, a frase “eu não sou profeta” (לֹא נָבִיא אָנֹכִי), que repete literalmente Am 7,14b, mas também aquela que remete à vergonha de ser considerado alguém que vive da profecia, presente em Zc 13,5cd, que parece ser uma ressonância de Am 7,14de, onde o profeta afirma ter meios para se sustentar. Vê-se ainda este constrangimento em 13,6, no qual se nega que as feridas que os profetas trazem na mão sejam fruto de incisões produzidas por estes, provavelmente durante rituais e êxtases, como em 1 Rs 18,2891.

Note-se que em 13,4-6, que se inicia com וְהָיָה בַּיֹּום הַהוּא, não há nenhuma declaração divina, podendo-se afirmar que, provavelmente, se está diante de um discurso do próprio profeta. Se for esse o caso, aqui não é mais YHWH e não são mais os pais a punir o profeta como em 13,2-3, que também se inicia com a mesma fórmula; é o profeta a condenar a si mesmo ou a expressar algum tipo de culpa92. Diante desses indícios pode-se afirmar que a perícope está formada por duas partes: um oráculo divino de juízo (13,2-3) e um discurso profético (13,4-6).

Em suma, pode-se apreender desta perícope a situação em que se encontra a profecia neste contexto, onde provavelmente não se tem simplesmente um embate entre profetas autênticos e falsos profetas, mas onde é a própria instituição e a prática profética que é colocada em questão, a ponto de tornar-se algo constrangedor ser identificado como profeta93.

Tal situação, apresentada com palavras duras por Zc 13,2-6, qual seja, o descrédito em que havia caído a profecia no momento histórico da composição do texto, tem provavelmente quatro motivos:

  1. O distanciamento entre a Palavra de Deus e as palavras e a vida dos profetas, o que leva a serem considerados como quem se reveste do múnus profético para proclamar falácias;

  2. A interpretação de muitos entre o povo de que os profetas se haviam enganado devido ao não cumprimento de suas profecias, que anunciavam um futuro melhor;

  3. A vinculação da instituição profética às lideranças, que são criticadas (os pastores) em Zc 11,4-17;

  4. Uma certa ligação, mencionada em 13,2, entre a profecia e a idolatria94.

5. A renovação de Judá / Jerusalém

a. A perspectiva de futuro no texto

Logo após o versículo 12,1 de Zacarias, que tem a função de introduzir as duas principais subseções do bloco formado pelos capítulos 12-14, a partícula הִנֵּה de Zc 12,2 começa, com seu aspecto de proclamação muito apropriado para o contexto, a descrição de tudo aquilo que YHWH está prestes a realizar em prol de Judá e Jerusalém, da renovação da casa de Davi e da renovação religiosa de todo o povo. O uso do הִנֵּה seguido de um particípio (הִנֵּה אָנֹכִי שָׂם) é construção frequente na literatura profética anterior a Zacarias e sempre indica o tempo futuro, ou, mais exatamente, um futuro iminente (futurum instans)95.

Um outro fator que contribui para salientar a perspectiva futura da forma final de Zc 12,1-13,6 é a utilização da fórmulaבַּיּוֹם הַהוּא , “naquele dia”, que perpassa todo o texto, estando presente na sua forma mais breve em Zc 12,4.6.8.11;13.1, e na versão mais longa בַּיּוֹם הַהוּא וְהָיָה, “acontecerá naquele dia”, em 12,3.9;13,2.496, uso esse que contribui significativamente para a retórica do texto enquanto é um lembrete constante da dimensão futura das palavras proféticas nela contidas, acentuando a importância deste dia vindouro que terá um impacto expressivo no destino do povo de Judá e de Jerusalém, assim como naquele da casa de Davi97.

Esta ênfase no futuro surge provavelmente com a extinção da participação da casa de Davi na administração interna de Yehud, a qual ocorreu entre a primeira metade ou meados do séc. V, em um período no qual se poderia tentar datar o Dêutero-Zacarias ou a sua compilação. Sendo assim, como a intensificação da representação escatológica da independência da Judeia e, inclusive, seu domínio universal são fruto de uma situação diametralmente oposta no que diz respeito à realidade política vivida naquele período por Judá e Jerusalém, provavelmente, também a ênfase na casa de Davi poderia ter surgido de uma situação histórica inversa na qual a casa de Davi perdeu o pouco prestígio de que ainda gozava98.

Deve-se reconhecer, porém, que a inversão da realidade histórica que caracteriza essa perspectiva futura não é uma simples projeção das realidades do passado, cuja leitura certamente influenciou sobremaneira o redator de Zacarias, fazendo com que apresentasse uma visão do futuro com uma linguagem ousada. No entanto,

esse futuro nunca é uma réplica direta de circunstâncias históricas. O passado é considerado sagrado, mas não é idealizado uniformemente; suas deficiências são demasiado evidentes nas fontes tradicionais, proféticas e deuteronômicas, as quais aparentemente moldaram a compreensão do profeta a respeito dos séculos de governo monárquico em Israel. Assim, a representação do futuro pelo profeta envolve distanciamentos significativos daquilo que existiu no passado de Israel99.

A análise exegética de Zc 12,1-13,6 permite identificar os aspectos da restauração futura da nação segundo a perspectiva do texto. Tal restauração considera fundamentalmente três elementos: a integração entre Jerusalém e Judá; a renovação da casa de Davi; a renovação religiosa do povo em seu conjunto.

b. A integração entre Judá e Jerusalém

O texto de Zc 12,1-8 parece ter como no seu transfundo histórico alguma possível situação de rivalidade entre Judá e Jerusalém, hoje já não mais alcançada historicamente, pelo menos até o momento. Tal afirmação costuma ser feita, em virtude da insistência do profeta, particularmente em 12,7, a respeito da iniciativa de YHWH de salvar as “tendas de Judá” em primeiro lugar, a fim de que a glória da casa de Davi e de Jerusalém não se engrandecessem sobre Judá. Boda admite que o oráculo de Zc 12 fosse, talvez, primitivamente, uma breve profecia que tinha como foco o cerco contra Jerusalém. Paulatinamente, tal texto teria sofrido ampliações, servindo para transmitir, dentre outros temas, o do restabelecimento ou fortalecimento dos laços entre Judá e Jerusalém. A dificuldade de se conhecer ou determinar a situação histórica precisa que subjaz a esse modo de se expressar do oráculo, não impede, contudo, de se apreender a sua teologia.

Tal modo de apresentar a interligação entre Judá e Jerusalém se expressa na forma como o autor sagrado desenvolve a temática ao longo dos versículos: no v. 2, são apresentadas as duas localidades - Judá e Jerusalém; o v. 3 centra-se sobre Jerusalém, tornada instrumento do juízo de YHWH para os povos; o v. 4, por sua vez, atém-se à menção de Judá; as duas localidades serão mencionadas, novamente, nos vv. 5-7, levando-se em conta que, enquanto nos vv. 5-6 fala YHWH, no v. 7, onde a conciliação e/ou interligação torna-se mais explícita, fala o profeta, como que interpretando o sentido de toda a fala de YHWH. Olhando particularmente para os vv. 5-7, podem-se notar os sinais que expressam que forma terá a integração entre Judá e Jerusalém.

O primeiro sinal de uma integração entre Judá e Jerusalém está expressa no v. 5, quando os chefes de Judá reconhecem interiormente que os “habitantes de Jerusalém” são para eles uma “fortaleza”. Ao tornar Jerusalém instrumento de juízo sobre as nações (v. 3), YHWH abrirá os olhos sobre Judá e, poderíamos acrescentar, abrirá também os “olhos de Judá” a fim de que reconheça que pode encontrar proteção, ideia veiculada pelo uso do termo “fortaleza” (אַמְצָה), à sombra de Jerusalém, centro da restauração futura que será promovida por Deus (Zc 14). Note-se que a ação bélica que será descrita no v. 6 é precedida por tal integração, cujo aspecto interior e, por isso, mais profundo, é colocado em realce.

A integração vem expressa, ainda, no v. 6, quando a ação de YHWH, através dos chefes de Judá, explicitada com elementos de comparação - braseiro de fogo, tocha de fogo - levará Jerusalém a estar, outra vez, ou a continuar, em seu lugar. Quando o profeta, por fim, toma a palavra em Zc 12,7, ele sintetiza o que foi dito por YHWH nos versículos anteriores, ou seja, a “salvação” não vem pela força das armas, mas pela ação do próprio Deus. Em virtude disso, não cabe uma exaltação maior dos líderes, dos chefes ou habitantes da capital, sobre o território de Judá. Ao contrário, a salvação começará pelo território mais amplo de Judá e depois chegará à capital, a fim de que igual glória, embora o termo não seja aplicado a Judá em Zc 12,7, possa estar sobre todos ou ser atribuída a todos. Em síntese, a glória da vitória final não pertencerá a esta ou àquela região, nem a este ou àquele grupo social, mas sim a YHWH, que é quem, na perspectiva do profeta, realmente realiza a salvação, ainda que se utilize de Jerusalém e dos chefes de Judá como seus instrumentos. No conjunto dos caps. 12 - 14, tal integração entre Judá e Jerusalém serve como uma espécie de moldura, tendo em vista que o binômio é retomado, também com contornos positivos, em 14,14.21.

c. A renovação da casa de Davi

A renovação de Judá/Jerusalém inclui a da realeza. A primeira menção da casa de Davi, em 12,7 previne contra uma supremacia indevida sua e do “habitante de Jerusalém”, isto é, os líderes ligados aos descendentes davídicos, sobre Judá. Relativiza-se, dessa maneira, as classes consideradas superiores, em favor, ao contrário, da valorização do conjunto da nação e da ação decisiva de Deus na época futura. Nesta, a casa de Davi e seu entorno terá lugar, mas não usufruirá de uma exaltação indevida. Pode-se supor que governará - conforme ao complexo de ideais e expectativas conexas à monarquia - como submissa a Deus, baseada numa aliança entre YHWH e o rei (2Sm 23,5; Sl 89,4), que faz do rei um mediador entre Deus e o povo (2Rs 11,17), o primeiro responsável pelo bem-estar da nação (Sl 72).

De outro lado, a figura de Davi é retomada como modelo de poder. Também os mais fracos e vacilantes (os que “tropeçam”, v. 8) dentre aqueles que cercam os descendentes davídicos serão protegidos por Deus e terão força e poder de modo análogo ao grande rei. Os davídidas mesmos, todavia, terão força e poder análogo ao de Deus, guardando, portanto, sua especificidade frente ao conjunto da nação e à burocracia monárquica. Se é Deus quem, segundo sua promessa, aniquilará os povos que vêm contra Jerusalém (v. 9), é a casa de Davi, contudo, que será, com isso, colocada em primeiro lugar. Com isto, é possível postular que o texto preveja, para o futuro, a restauração da monarquia, tanto dos davídidas como dos líderes a eles ligados, numa hierarquia que espelha a dos tempos clássicos da realeza ao mesmo tempo que a leva a uma realização ideal.

Diante da ameaça inimiga (v. 9), anuncia-se a nova atitude que os davídidas e seu entorno tomarão, resultado da intervenção divina sobre eles (v. 10a). Trata-se de voltar-se para Deus em oração, que pode incluir, se considerado o termo “súplica” (תַּחֲנוּנִים), o pedido de perdão. No centro desta mudança está o transpassado, sobre o qual choram e se lamentam. Trata-se de um profundo arrependimento por uma ação contra alguém não identificado no texto. Exatamente tal obscuridade permite considerar tais enunciados como afirmações que superam uma precisa situação histórica e abrem possibilidades de interpretação para tempos ainda não experimentados. Adquirem, assim, segundo a terminologia de P. Grech, o status de uma descrição “modelo” do futuro100. Tal descrição “modelo” tem, segundo este autor, seu Sitz im Leben no culto, o que parece ser confirmado pela menção detalhada dos lamentos, nos vv. 11-14, que, quando dizem respeito a uma questão “nacional”, têm um lugar muito próprio no culto.

d. A renovação religiosa do povo em seu conjunto

Junto com a renovação da casa de Davi espera-se, assim, uma renovação espiritual do povo em seu conjunto, que tem Deus por motor e é detalhada tanto nos vv. 11-14 como em 13,2-6. Em 12,11-14, se todo o povo toma parte no lamento, isso significa que todos participam da mesma atitude da casa de Davi em seu arrependimento e em seu voltar-se para Deus. A distinção de clãs proeminentes enfatiza a grave dimensão da situação que exige uma tão grande reparação e mostra como todos partilham de igual atitude. Fica claro, dessa maneira, que, ligada à renovação da casa davídica está a de toda a nação. Isso é corroborado por 13,1, que, com a menção do “pecado” e da “imundície”, inclui, junto com a renovação da casa de Davi, os habitantes de Jerusalém.

Zc 13,2-6, por sua vez, descreve a realização dessa regeneração espiritual anunciada em 12,10-13,1 e que tem por Deus autor. Tal regeneração inclui não somente a extirpação da idolatria, mas sugere uma intervenção de YHWH que eliminará a própria instituição profética que Zc 13,2 parece relacionar com a idolatria e com o espírito impuro. De fato, Zc 13,2-6 permite vislumbrar uma situação extrema em que se encontra a profecia, situação essa que mais do que provocar um embate entre profetas autênticos e falsos profetas, deixa a profecia em si em uma situação de descrédito e constrangimento, pondo, provavelmente, em risco a mesma existência dos profetas e da prática profética.

Considerações finais

Pela análise exegética empreendida, importantes conclusões puderam ser obtidas para a compreensão da passagem de Zc 12,1-13,6. Mencionando tanto Judá quanto Jerusalém como objeto do cerco, em contrapartida, o texto apresenta uma forte teologia sobre Jerusalém como centro, uma possível releitura da teologia de Sião presente em diversos âmbitos dos escritos veterotestamentários. Não obstante, se a ação de YHWH através dos clãs de Judá reverterá a situação de opressão sofrida por Jerusalém, 12,4 se prende mais à ação de YHWH do que ao poderio bélico de Judá ou Jerusalém, de tal forma que o verdadeiro digno de honra, nesta batalha, é o próprio YHWH. Mesmo se 13,2-6 permite vislumbrar uma situação extrema em que se encontra a profecia - possivelmente refletindo uma situação de descrédito e constrangimento -, quando o profeta salienta que a salvação não vem pela força das armas, mas pela ação do próprio Deus. Com isso, a esperada renovação da Casa de Davi e a do povo (com a eliminação da idolatria e da instituição profética) devem-se integrar nesse projeto mais abrangente. O ideal de uma sociedade de paz, contando com os meios humanos, mas tendo como fator decisivo a ação de YHWH acolhida pelo povo, demonstra um dos pontos que, em todos os tempos, devem ser considerados pelas sociedades e pelas nações.

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1Hervé Gonzalez, «Zechariah 9-14 and the Continuation of Zechariah during the Ptolemaic Period»,Journal of Hebrew Scriptures13, vol. 9 (2013): 1-5; Rex Mason, «The Use of Earlier Biblical Material in Zechariah 9-14: A Study in Inner Biblical Exegesis», en Bringing out the Treasure Inner Biblical Allusion in Zechariah 9-14, ed. Mark J. Boda, Michael H. Floyd e Rex Mason (London; New York: Sheffield Academic Press, 2003), 3. Al Wolters, «Book of Zechariah», en Dictionary of the Old Testament: Prophets», ed. Mark J. Boda e J. Gordon McConville (Downers Grove, IL; Nottingham, England: IVP Academic; Inter-Varsity Press, 2012), 890 prefere dividir o conjunto Zc 1-8 (“Proto-Zacarias”) em dois blocos distintos: Zc 1-6 em torno principalmente das oito visões noturnas de Zacarias; e Zc 7-8 em torno de exortações e admoestações suscitadas por uma questão acerca do jejum.

2Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14: A New Translation with Introduction and Commentary (New Haven; London: Yale University Press, 2008), 27; Hervé Gonzalez, «Zechariah 9-14 and the Continuation of Zechariah during the Ptolemaic Period»: 21-23.

3David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary (Louisville, Kentucky: Westminster John Knox Press, 1995), 1. Na p. 2 Petersen analisa como esses textos estão integrados, havendo três seções identificáveis em torno do termo מַשָּׂא (“oráculo”): Zc 9-11; Zc 12-14; e Malaquias. Muito da exegese patrística - como por exemplo o comentário de Dídimo o Cego - era caracterizada por uma interpretação alegórica como “tentativa de escapar” a essa “impenetrabilidade”; não obstante, há a grande exceção de Teodoro de Mopsuéstia, o qual expôs uma interpretação mais histórica e literal - e alguns comentaristas siríacos como Efraém interpretaram Zc 9-14 como referindo-se primariamente à história de Israel antes da vinda de Cristo, especialmente na época dos Macabeus (Al Wolters, «Book of Zechariah», 897).

4Hervé Gonzalez, «Zechariah 9-14 and the Continuation of Zechariah during the Ptolemaic Period»: 3.

5Rex Mason, «The Use of Earlier Biblical Material in Zechariah 9-14: A Study in Inner Biblical Exegesis», 131.

6Tendo em consideração a dimensão do artigo, prescindiu-se de apresentar aqui algumas etapas metodológicas que, todavia, foram trabalhadas para que se pudesse desenvolver adequadamente a organização do texto e o comentário exegético. A tradução suposta e a crítica textual são apenas tangenciadas dentro do comentário exegético conforme a necessidade: Maria de Lourdes C. Lima, Exegese Bíblica: Teoria e Prática (São Paulo: Paulinas, 2014), 75-76.

7Elizabeth R. Achtemeier, Nahum-Malachi (Atlanta, GA: John Knox Press, 1986), 160; Michael Floyd, Minor Prophets: Part 2 (Grand Rapids, MI: William B. Eerdmans Publishing Company, 2000), 505; Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14 (New York: Doubleday, 1993), p. 310; Hinckley G. Mitchell, A Critical and Exegetical Commentary on Haggai and Zechariah (Edinburgh: T&T Clark, 1999), 320; David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 109. Para Floyd, a primeira unidade textual dentro da grande seção de 12,1 - 13,6 começa em 12,1b.

8Mark J. Boda, The Book of Zechariah (Grand Rapids; Cambridge: William B. Eerdmans Publishing Company, 2016), 681; David J. Clark; Howard A. Hatton, A Handbook on Zechariah (New York: United Bible Societies, 2002), 305; John Goldingay; Pamela J. Scalise, Minor Prophets II (Grand Rapids, MI: Baker Books, 2012), 295; Thomas E. McComiskey, «Zechariah», en The Minor Prophets: An Exegetical and Expository Commentary, ed. Thomas E. McComiskey (Grand Rapids, MI: Baker Academic, 2009), 1207; Richard D. Patterson; Andrew E. Hill, «Minor Prophets, Hosea-Malachi», en Cornerstone Biblical Commentary, Vol 10, ed. Philip W. Comfort (Carol Stream, IL: Tyndale House Publishers, 2008), 585; Ralph L. Smith, Micah-Malachi (Dallas: Word Incorporated, 1998), 274. Smith e Boda consideram Zc 12,1 um título para a seção que compreende Zc 12 - 14, semelhantemente ao que acontece em Zc 9,1.

9Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 682.

10Tal “corte” é semelhante ao que acontece na seção dos capítulos 9 - 11 (ver 10,1-3; 11,1-3.7). Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 681. Não obstante, C. Stuhlmueller inclui todo o contexto de 13,7-9 com o título de “The New Covenant through Victory over the Nations, Cleansing, and Mourning”: Carroll Stuhlmueller, Rebuilding with Hope: A Commentary on the Books of Haggai and Zechariah (Grand Rapids; Edinburgh: W.B. Eerdmans; Handsel Press, 1988), 142.

11J. W. Rogerson, «Zechariah», en Eerdmans Commentary on the Bible, ed. James D. G. Dunn e John W. Rogerson (Grand Rapids, MI; Cambridge, U.K.: William B. Eerdmans Publishing Company, 2003), 727.

12Mark J. Boda, The Book of Zechariah, p. 685-686. Segunda Boda, o objetivo desta ampliação seria, em primeiro lugar, a integração entre Judá, Jerusalém relativamente a figuras reais davídicas. Um segundo objetivo seria mostrar que Judá, Jerusalém e a casa de Davi se apresentam em condição de humilhação (Zc 12,7), pois que se lamentam, num ato de súplica (Zc 12,12-14). A submissão das nações em Zc 14 seria já numa Jerusalém purificada.

13David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 109.

14Tal fato ocorre também no capítulo 14, nos vv. 7.16.17 (em referência, respectivamente, aos vv. 6 e 13). Tais ocorrências, porém, não são aqui consideradas por já se ter demonstrado que este capítulo forma uma seção à parte no conjunto dos capítulos 12 a 14.

15 Luis Alonso Schökel, Dicionário Bíblico Hebraico-Português (São Paulo: Paulus, 1997), 404-405.

16F. Stolz, «נשׂא», en Theological Lexicon of the Old Testament, ed. Ernst Jenni e Claus Westermann (Peabody, MA: Hendrickson Publishers. 1997), 773. Tal compreensão do termo se coaduna com o que São Jerônimo afirma em seu comentário a Naum: “massa (...) id est grave onus, eo quod eam adversus quam videtur, premat, nec sinat elevare cervicem”. Avelino D. García (trad.), Obras completas de San Jerónimo. IIIb: Comentarios a los Profetas Menores (Madrid: Biblioteca Autores Cristianos, 2003), 10. Estudando o termo em Zc, M. J. Boda chega à conclusão que, em Zc 9,1; 12,1, o termo evoca a passagem de Jr 23,33-40, na qual o vocábulo está em relação com a palavra de YHWH. Em meio às diversas vozes proféticas que surgiram no período persa, o profeta bíblico procuraria indicar, com o uso do termo, que suas palavras são realmente provenientes do Senhor. M. J. Boda, «Freeing the Burden of Prophecy: Massa’ and the Legitimacy of Prophecy in Zech 9-14», Biblica 87 (2006): 338-357, especialmente 352-356.

17Ralph L. Smith, Micah-Malachi, 275.

18Deve-se notar, todavia, que em Pr 3,19 o autor sagrado não utiliza a raiz נטה, mas a raiz כון para indicar que YHWH “firma os céus”. A terminologia é um pouco diferente, mas conserva-se o sentido.

19Sl 69,35; 89,12; 115,15. Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 312.

20Smith classifica v. 1bcd como “fragmento hínico” ou “doxologia”. Ralph L. Smith, Micah-Malachi, 275.

21Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 312-313.

22Marvin A. Sweeney, The Twelve Prophets, v. 2, 685; Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 316; David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 112.

23Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 701. Há autores, contudo, que acreditam que o versículo em questão reflita algum conflito, antigo ou presente, entre Judá e Jerusalém. Esta é a opinião, por exemplo, de Sicre Diaz e Alonso Schökel: “A rivalidade entre a província (Judá) e a capital (Jerusalém) pode refletir situação nova, desconhecida por nós, ou ela pode ser reminiscência de velhas rivalidades surgidas por ocasião da ascensão de Jerusalém a capital nacional perante Hebron, Betel, Gabaon etc. Também em Miqueias se opunham os direitos de Belém aos de Jerusalém (4,8 e 5,1). É pelas aldeias de Judá que se iniciará a salvação; ela, e não a capital, será as primícias da libertação.” Luis Alonso Schökel; José L. Sicre Diaz, Profetas I (São Paulo: Paulus, 1988), 1234.

24Gerhard Lisowsky, Concordantiae Veteris Testamenti (2. ed. Stuttgart: Württembergische Bibelanstalt, 1958), 1350.

25Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 699-703.

26Marvin A. Sweeney, The Twelve Prophets, v. 2, 685.

27David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 116.

28Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 316.

29Gerhard Lisowsky, Concordantiae Veteris Testamenti, 841.

30Marvin A. Sweeney, The Twelve Prophets, v. 2, 686.

31David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 112-113.

32Ex 15,1; Jr 51,21; Ez 23,12.

33J. Conrad, «נכה», en Theological Dictionary of the Old Testament v. 9, Revised Edition., ed. G. Johannes Botterweck, Helmer Ringgren e Heinz-Josef Fabry (Grand Rapids, MI; Cambridge, U.K.: William B. Eerdmans Publishing Company, 1998), 420-421.

34Luis Alonso Schökel, Dicionário Bíblico Hebraico-Português, 486.658.704.

35David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 114. Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 319.

36Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 319.

37Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 319.

38D. Vetter, «ראה», en Theological Lexicon of the Old Testament, ed. Ernst Jenni e Claus Westermann (Peabody, MA: Hendrickson Publishers. 1997), 1178-1180.

39Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 702.

40Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 322

41Gerhard Lisowsky, Concordantiae Veteris Testamenti, 109.

42Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 323. Meyers entende, ainda, que a expressão יֹשְׁבֵי יְרוּשָׁלִַם deve ser traduzida como “líderes de Jerusalém” e não simplesmente como habitantes. Ele acredita que, embora não haja mais monarquia e as estruturas que a acompanhavam, Zacarias está usando uma forma de falar própria das estruturas do passado para apresentar o que será o futuro salvífico preparado por YHWH. O autor não afirma isso, mas talvez prefira traduzir assim para criar um paralelo com a expressão “chefes de Judá” (אַלֻּפֵי יְהוּדָה) de 5a. Tal teoria é passível de algum questionamento, porque se quisesse ser claro para se referir a líderes de Jerusalém o profeta poderia utilizar o mesmo termo que utilizou em 5a e, não um que será utilizado em 7b para referir-se a uma entidade que não é necessariamente uma estrutura de liderança, uma vez que está no singular e que o versículo trará de modo explícito a expressão “Casa de Davi”.

43Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 326.

44Luis Alonso Schökel, Dicionário Bíblico Hebraico-Português, 481.

45Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 702.

46É verdade que em 6a o verbo vem precedido pela expressão בַּיּ֣וֹם הַה֡וּא, mas isso porque, diferentemente do que ocorre em 3a, ela é apresentada de forma mais reduzida, sem o verbo הָיָ֣ה, que a tornaria um segmento independente.

47Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 702.

48Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 703.

49Antes, de fato, Jerusalém (com os “chefes de Judá”) é apresentada em sua relação com os outros povos, como a instância que os dominará (vv. 3-6b).

50David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 118.

51Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 323-324. Para confirmação desta interpretação, Meyers faz uso dos textos de Jr 18,23 e 20,21: nessas duas passagens também é usada a metáfora do “tropeçar”, que é ligada aos oficiais (Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 331). Sobre esse ponto, ver mais adiante a análise do uso, na seção, do singular e plural do particípio יוֹשֵׁב.

52Meyers, no entanto, para quem o texto demonstra preocupação com a distinção entre verdadeira e falsa profecia, entende que Davi seria tomado em comparação por ter ouvido fielmente os profetas a ele enviados (Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 331).

53David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 119; Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 339.

54Segundo a ideologia real em Jerusalém, o rei, como lugar-tenente de Deus para com o povo, teria (ou deveria ter) características morais semelhantes (retidão, justiça, cuidado com os mais desamparados (Sl 72,1-4); daí a possibilidade de, no Sl 45,7, ser-lhe dado o título אֱלֹהִים.

55Assim Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 333.

56Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 333.

57Hans J. Stoebe, «חנן ḥnn Ser compassivo», en Diccionario Teológico Manual del Antiguo Testamento, v. 1, ed. Ernst Jenni e Claus Westermann (Madrid: Cristiandad, 1978), col. 819-821.

58Hans J. Stoebe, «חנן ḥnn Ser compassivo», col. 823-824.

59Assim o texto leningradense, que é corroborado pela Setenta, por Teodocião, pela Vulgata e pela Peshitta, como apresenta o aparato crítico da Biblia Hebraica Quinta e seu comentário. A pontuação do texto leningradense criou uma dificuldade de compreensão que se tornou uma verdadeira “crux interpretum” devido à ligação da forma preposicional com o verbo que segue (דקר, transpassar).

60Assim a Neo Vulgata resolve a questão, ao trazer a pausa (atnach) da linha seguinte para este ponto, de modo a traduzir: “et aspicient ad me. Quem confixerunt, plangent quasi planctu super unigenitum et dolebunt super eum, ut doleri solet super primogenitum”.

61Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, p. 333.

62Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 338; Herbert Wolf, «דָּקָר», en Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, ed. Robert L. Harris, Gleason L. Archer Jr., Bruce K. Waltke (São Paulo: Vida Nova, 1998), 322.

63A identificação do “transpassado” é uma crux interpretum. Como o presente estudo tem outros objetivos, não será aqui tratada.

64Para Marvin A. Sweeney, The Twelve Prophets, v. 2, 689, a lamentação do v. 11 é diversa daquela referida no v. 10: esta última sobre o transpassado e a do v. 11 sobre Jerusalém. No entanto, o uso, no v. 11, da preposição בְּ, que tem amplo espectro de sentido, e sua ligação a um nome de lugar, induz de modo mais imediato a uma conotação em sentido espacial ou geográfico. Diferentemente, no v. 10, o termo “lamentação” é ligado à preposição עַל, que funciona para indicar o objeto/pessoa sobre o qual se faz a lástima.

65William White, «רִמּוֹן II», en Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, ed. Robert L. Harris, Gleason L. Archer Jr., Bruce K. Waltke (São Paulo: Vida Nova, 1998), 1432.

66Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 344.

67Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 343.

68Gonzalez, Hervé, «Zechariah 9-14 and the Transformations of Judean Royal Ideology during the Early Hellenistic Period», en Transforming Authority Concepts of Leadership in Prophetic and Chronistic Literature, ed. Katharina Pyschny e Sarah Schulz (Berlin; Boston: Walter de Gruyter, 2021), 124-125.

69Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 344; David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 122.

70A ideia de que a terra aqui se refira o mundo subterrâneo, que lamenta seus mortos, não parece adequada, se considerada a totalidade dos vv. 12-14 (diferentemente Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 345).

71E não a tribo de Levi (Js 18,7), já que o termo utilizado é “clã”.

72Também 2Cr 35,15 associa os cantores do templo com a figura de um vidente. Assim: Marvin A. Sweeney, The Twelve Prophets, v. 2, 691. Jacob M. Myers, II Chronicles (New York: Doubleday, 1965), 170, focaliza particularmente a figura de Davi, também presente em 2Cr 29,25. Que os levitas estivessem ligados ao cântico cúltico o demonstra também 2Cr 20,19.

73Com esses argumentos, Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 347 defende que a menção da casa de Natan, em Zc 12,13, se referiria à linhagem monárquica.

74Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 348.

75Assim Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 348. D. R. Ulrich resume a temática ao apresentar as duas linhas principais que aglutinam o pensamento dos autores. A primeira identifica Davi e Levi como representantes da realeza e da função sacerdotal; Natan (2Sm 5,14; 1Cr 3,4) e Semei (Ex 6,17; 1Cr 6,17) como descendentes, respectivamente, de uma e outra. Na segunda, Levi, Natan e Semei seriam representantes de funções na corte de Davi: o múnus sacerdotal, o corpo profético e os sábios. Depois de apontar os pontos frágeis destas duas linhas, Ulrich defende que os nomes mencionados em Zc 12 vêm a propósito da crítica que o livro de Zacarias, nos c. 10-11, faz aos “pastores”, os reis judaicos. Nesse sentido, as figuras de Levi, Natan e Semei têm relação com a atribulada sucessão de Davi, com os vários problemas em torno da figura de Salomão, que, para ascender ao trono, eliminou diversas personagens. Os três clãs mencionados em Zc 12 se refeririam a contemporâneos da sucessão Davi - Salomão. Natan, seria o profeta da corte (2Sm 7,2; 12,1), que interfere na sucessão; Levi representaria a classe sacerdotal dividida (1Rs 2,27.35); e Semei seria identificado com o descendente de Saul que maldisse Davi (2 Sm 16,5-8; 1Rs 2,8-9). D. R. Ulrich, «Two Offices, Four Officers, or one Sordid Event in Zechariah 12:10-14?», Westminster Theological Journal 72 (2010): 251-265, aqui 252-259. De outro lado, não deixa de ter interesse que em 1Rs 1,8 ocorram os nomes de Natan, Sadoc e Semei, os dois primeiros, respectivamente, profeta e sacerdote. Todavia, o personagem Semei aí mencionado não poderia ser, pelo contexto, o mesmo que maldisse Davi.

76Funciona como um complemento circunstancial com sentido de acerca ou em referência a alguma coisa; expressa uma relação. Assim Luis Alonso Schökel, Dicionário Bíblico Hebraico-Português, 331; Paul Joüon, Grammaire de l’Hébreu Biblique (Roma: Institut Biblique Pontifical, 1923), § 133d.

77Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 363.

78Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 363.

79Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 363.

80Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 364.355. Sobre Zorobabel, ver Jan A. Soggin, Storia d’Israele (Brescia: Paideia, 2002), 345-356. Este último cita 1Cr 3,19-24 (que relaciona os descendentes de Davi) como argumentação para o fato que os davídidas ocuparam a função de governador de Judá até perto do final do século V a.C.

81Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 363; Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Haggai, Zechariah 1-8 (New York: Doubleday, 1987), 9-16. O verbo é usado também para indicar a subida ao trono (1Rs 1,46; 2,12; Jr 22,4; Est 1,2: Ludwig Kohler; Walter Baumgartner, Hebräisches und Aramäisches Lexikon zum Alten Testament (Leiden: Brill, 1995), 424). Luis Alonso Schökel, Dicionário Bíblico Hebraico-Português, 298-299: “ser rei, juiz, funcionário”, dentre outras acepções.

82Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 368-369; Ralph L. Smith, Micah-Malachi, 280.

83Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 369.

84Ralph L. Smith, Micah-Malachi, 280-281.

85Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 725.

86Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 726.

87“Este versículo é cuidadosamente elaborado para, de várias maneiras, manchar a reputação daqueles que tentam profetizar. Primeiro, eles devem ser vistos como imaturos, ainda sujeitos à autoridade dos pais. Em segundo lugar, como com Dt 21,18-21 (a lei concernente ao filho obstinado e rebelde), o profeta deve ser morto. Em terceiro lugar, ao contrário do estipulado em Dt 21, aquele que profetizar deve ser morto imediatamente por seus pais, sem sequer serem enviados perante a assembleia legal dos anciãos. Quarto, segundo este autor o ato de profecia pode ser comparado a uma violação a um mandamento do Decálogo, o de não falar falsamente em nome de YHWH (Ex 20,7). Este autor aparentemente pensa que alguém que diz: ‘Assim diz o Senhor’, está falando mentiras em nome de YHWH, uma formulação ainda mais forte do que ocorre no Decálogo. É difícil imaginar uma interpretação mais negativa de atividade profética”. David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 126.

88Ralph L. Smith, Micah-Malachi, 280.

89Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 726-727; Também Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 371.

90David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 126-128.

91Ralph L. Smith, Micah-Malachi, 280.

92David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 126-127.

93J. M. Asurmendi Ruiz, «Deutero-Zacarías», en Comentario Bíblico Latinoamericano - Antiguo Testamento - Libros proféticos y sapienciales. Vol II, ed. por A. J. Levoratti (Estella: Verbo Divino, 2007), 579; David L. Petersen, Zechariah 9-14 and Malachi: A Commentary, 126.128.

94P. R. Andiñach, «Zacarías», en Comentario Bíblico Internacional: Comentario católico y ecuménico para el siglo XXI, ed. por William R. Farmer (Fonasa: Verbo Divino, 1999), 1087.

95Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 313.

96Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 695.

97Mark J. Boda, The Book of Zechariah, 696.

98Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 356.

99Carol L. Meyers; Eric M. Meyers, Zechariah 9-14, 356.

100Prosper Grech, «Reinterpretazione interprofetica ed escatologia veterotestamentária», en Ermeneutica e teologia bíblica, Prosper Grech (Roma: Borla, 1986), 5-39, aqui p. 8. Uma “escatologia de modelo”: “è più una filosofia della storia che può essere riapplicata ad ogni situazione contingente simile a quella da cui prese origine; il suo ‘Sitz im Leben’ è il culto nel tempo [sic] specialmente nei periodi di tribolazione; ogni generazione sperimenta una parziale realizzazione di questo tipo di profezie, ma anche questo non esaurisce l’ampiezza e la portata del modelo che fluisce nella coscienza del popolo di Israele esortandolo ad avere sempre fiducia in Jahvé, il Dio del Futuro”.

Para citar este artículo: Corrêa Lima, Maria de Lourdes; Brandão de Oliveira , Samuel; da Silveira Siqueira, Fabio y Ferreira Belem, Doaldo «Didáctica y Enseñanza de la Filosofía en el Globo. Análisis Comparativo de Estados del Arte 1990-2022». Franciscanum 181, Vol. 66 (2024): 1-44.

*Este escrito é parte da parceria nos estudos, discussões e reflexões realizados regularmente nas atividades do Grupo de Pesquisa “Tradição e literatura bíblica”, sob a liderança da Profa. Dra. Maria de Lourdes Corrêa Lima, com registro no CNPq.

**Doutora em Teologia Bíblica pela Pontificia Università Gregoriana (1997), com estágio pós-doutoral no Pontifício Instituto Bíblico (2004/2005); professora de tempo integral da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro; professora do Instituto Superior de Ciências Religiosas da Arquidiocese do Rio de Janeiro; coordenadora do Grupo de Pesquisa “Tradição e literatura bíblica” credenciado junto ao CNPq; membro titular da Academia Brasileira de Filosofia. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0169981461007918. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2382-1058. Contato: mllima@puc-rio.br

***Doutor em Teologia (Área Bíblica) pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) com estágio pós-doutoral na mesma instituição; professor da Faculdade Católica de Fortaleza; pertence ao Grupo de Pesquisa “Tradição e literatura bíblica” credenciado junto ao CNPq. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/2492617295437766. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7385-2974. Contato: samuel_msc@hotmail.com

****Doutor em Teologia (Área Bíblica) pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Professor de Teologia Bíblica do Departamento de Teologia da PUC-Rio, participando atualmente de dois grupos de pesquisa credenciados junto ao CNPq: “Tradição e literatura bíblica” e “Análise Retórica Bíblica Semítica”. Desenvolve um projeto de pesquisa intitulado “Sacerdócio, Culto e temas correlatos no AT: aspectos históricos e teológicos”. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5937857218924211 e ORCID ID: https://orcid.org/0000-0002-5671-3347. Contato: padresiqueira@gmail.com

*****Doutor e Mestre em Teologia (Área Bíblica) pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Professor de Teologia do FIBE, participando atualmente de dois grupos de pesquisa credenciados junto ao CNPq: “Tradição e literatura bíblica” e “Análise Retórica Bíblica Semítica”. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/1868740647289262; ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1431-0125. Conta to: doaldofb@uol.com.br

Recebido: 17 de Junho de 2023; Aceito: 18 de Setembro de 2023

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