SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.29 issue2Non adherence factors to treatment of people with type 2 Diabetes Mellitus at home. Family caregiver’s viewHIV/AIDS knowledge and occupational risk in primary care health workers from Chile author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

Journal

Article

Indicators

Related links

  • On index processCited by Google
  • Have no similar articlesSimilars in SciELO
  • On index processSimilars in Google

Share


Investigación y Educación en Enfermería

Print version ISSN 0120-5307On-line version ISSN 2216-0280

Invest. educ. enferm vol.29 no.2 Medellín July/Dec. 2011

 

ARTÍCULO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE/ ARTIGO ORIGINAL

 

CataPercepções das agentes comunitárias de saúde sobre o cuidado prénatal

Percepciones de las agentes comunitarias de salud sobre la atención prenatal

Community health workers perception about prenatal care

 

 

Bruna Pedroso Canever1, Daiana de Mattia2, Ariane Maccarini Virtuoso3, Kenya Reibnitz Schmitt4, Maria do Horto Cartana Fontoura5, Simone Coelho Amestoy6, Letícia Lima Trindade7

 

1 Enfermeira, Mestranda em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina. Membro do Grupo de Pesquisa EDEN, Brasil. email: olabruna@gmail.com.

2 Enfermeira da prefeitura municipal de Garopaba. Santa Catarina, Brasil. email: daimattia@gmail.com.

3 Enfermeira formada pela Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil. email:arivirtuoso@hotmail.com.

4 Enfermeira, Doutora em Enfermagem. Professor Titular do Departamento de Enfermagem e do PEN-Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil. email: kenya@ccs.ufsc.br.

5 Enfermeira, Doutora em Enfermagem. Professor Adjunto da Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil. email: horto@ccs.ufsc.br.

6 Enfermeira, Doutoranda em Enfermagem pelo Programa de Pós-graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), membro do Grupo de Pesquisa em Educação em Enfermagem (EDEN). Santa Catarina, Brasil. email: samestoy@terra.com.br.

7 Enfermeira, Doutoranda em Enfermagem pelo Programa de Pós-graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), membro do Grupo Práxis: trabalho, cidadania saúde e enfermagem. Santa Catarina, Brasil. email: letrindade@hotmail.com.

 

Subvenciones: Este artigo é resultado de um trabalho de conclusão de curso de graduação em enfermagem da universidade Federal de Santa Catarina. Declaramos que não tivemos apoio financeiro para o desenvolvimentos do trabalho, o material recebido para o desenvolvimento da pesquisa que resultou na elaboração do manuscrito vieram dos pesquisadores envolvidos neste trabalho.

Conflicto de intereses: ninguno a declarar.

Cómo citar este artículo: Canever BP, Mattia D, Virtuoso AM, Schmitt KR, Fontoura MHC, Amestoy SC, et al. Percepções das agentes comunitárias de saúde sobre o cuidado prénatal. Invest Educ Enferm. 2011;29(2): 204 — 211.

 


 

RESUMO

Objetivo. Descrever as percepções das agentes comunitárias de saúde (ACS) sobre o atendimento pré-natal. Metodologia. Estudo qualitativo do tipo de convergência assistencial, realizado seguindo os princípios pedagógicos de Paulo Freire. Estudaram-se as percepções sobre as dificuldades encontradas na realização das atividades de promoção da saúde de 15 agentes de saúde comunitários que apóiam o atendimento pré-natal num centro de saúde em Santa Catarina (Brasil). A informação se coletou entre março e maio de 2009. Prévio consentimento informado, os agentes de saúde participaram em seis ateliês, nos que se avaliaram suas percepções sobre os conhecimentos e atuações no atendimento pré-natal, tendo em conta a Política de Atendimento Básico do Ministério de Saúde. Os dados foram categorizados utilizando análises de temáticas por Minayo. Resultados. Surgiram três categorias: conhecimento prévio, ações construídas pelos ACS e trabalho em equipe - trabalho solidário. Conclusão. Os ACS possuem conhecimentos prévios, no entanto, não é suficiente para compreender e avaliar a eficácia de suas ações.

Palavras chave: percepção; auxiliares de saúde comunitária; enfermagem em saúde comunitária; cuidado pré-natal.

 


 

RESUMEN

Objetivo. Describir las percepciones de las agentes comunitarias de salud (ACS) sobre la atención prenatal. Metodología. Estudio cualitativo del tipo de convergencia asistencial, realizado siguiendo los principios pedagógicos de Paulo Freire. Se estudiaron las percepciones sobre las dificultades encontradas en la realización de las actividades de promoción de la salud de 15 agentes de salud comunitarios que apoyan la atención prenatal en un centro de salud en Santa Catarina (Brasil). La información se recolectó entre marzo y mayo de 2009. Previo consentimiento informado, los agentes de salud participaron en seis talleres, en los que se evaluaron sus percepciones sobre los conocimientos y actuaciones en la atención prenatal, teniendo en cuenta la Política de Atención Básica del Ministerio de Salud. Los datos fueron categorizados utilizando análisis de temáticas por Minayo. Resultados. Surgieron tres categorías: conocimiento previo, acciones construidas por las ACS y trabajo en equipo - trabajo solidario. Conclusión. Las ACS poseen conocimientos previos, sin embargo, no es suficiente para comprender y evaluar la eficacia de sus acciones.

Palabras Clave : percepción; auxiliares de salud comunitaria; enfermería en salud comunitaria; atención prenatal.

 


 

ABSTRACT

Objective. To describe the perception community health workers (CHW) have about prenatal care. Methodology. Convergent-care and qualitative study, carried out following the Paulo Freire’s pedagogical principles. The perceptions about difficulties found in the development of health care promotion activities of 15 community health workers who support prenatal care, were studied in a health institution of Santa Catalina (Brazil) between March and May of 2009. With a previous informed consent the community health workers participated in 6 workshops, in which their perceptions about knowledge and behaviors in prenatal care were evaluated using the policies of basic care of the health ministry. Data were categorized using the thematic analysis by Minayo. Results. Three categories emerged: previous knowledge, actions built by the CHW and teamwork-supportive work. Conclusion. CHW have previous knowledge about prenatal care, however it is not enough for them to understand and assess the effectiveness of their actions.

Key words:perception; community health aides; community health nursing; prenatal care.

 


 

INTRODUÇÃO

No Brasil, a assistência ao pré-natal vem aumentando nas últimas décadas, no entanto, as desigualdades no uso desta assistência ainda permanecem. As condições de assistência ao pré-natal influenciam diretamente nos coeficientes de mortalidade infantil e materna.1

Em relação às diversas áreas da atenção à saúde sob a responsabilidade das equipes de saúde da família, destaca-se como fundamental a atenção ao pré-natal qualificada e humanizada. Para tanto, a assistência necessita contemplar ações de prevenção e promoção de saúde, além do diagnóstico e tratamento adequado dos problemas que ocorrem no período gravídico.

A Carta de Ottawa define Promoção da Saúde como o processo de capacitação da população, a fim de proporcionar a melhoria da qualidade de vida e saúde, incluindo maior participação no controle deste processo. Neste contexto, a saúde é o maior recurso para o desenvolvimento social, econômico e pessoal, assim como uma importante dimensão da qualidade de vida. Sendo assim, considera-se que a Promoção da Saúde pode ser realizada por meio de estratégias de educação em saúde, as quais devem envolver os profissionais e usuários de saúde, motivando-os para o exercício da cidadania e desenvolvimento do pensamento crítico.2

Pode-se evidenciar a Promoção da Saúde como fundamento da Atenção Básica, sendo caracterizada por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde.3 Cabe informar que a Atenção Básica, a qual tem a Saúde da Família como estratégia prioritária para sua organização de acordo com os preceitos do Sistema Único de Saúde (SUS), possui como responsabilidade: possibilitar o acesso universal e contínuo a serviços de saúde de qualidade e resolutivos, integrar as ações programáticas e demanda espontânea; articular as ações de promoção à saúde, prevenção de agravos, vigilância à saúde, tratamento e reabilitação, trabalhar de forma interdisciplinar e em equipe, coordenar o cuidado na rede de serviços; desenvolver relações de vínculo e responsabilização entre as equipes e a população adscrita garantindo a continuidade das ações de saúde e a longitudinalidade do cuidado; valorizar os profissionais de saúde por meio do estímulo e do acompanhamento constante de sua formação e capacitação; realizar avaliação e acompanhamento sistemático dos resultados alcançados, como parte do processo de planejamento e programação e estimular a participação popular e o controle social.3

No que concerne a estrutura de trabalho da Estratégia de Saúde da Família (ESF), salienta-se que a mesma é composta minimamente por um médico generalista, um enfermeiro, um técnico e/ou auxiliar de enfermagem e entre quatro a seis agentes comunitários de saúde por equipe.3 Os

Agentes Comunitários de Saúde (ACSs) representam o elo entro os demais membros da equipe e a comunidade assistida. Isso se fortalece tendo em vista que esse trabalhador deve residir na comunidade em que assiste. Acredita-se que o fato de este profissional estar inserido na comunidade facilita o vínculo e a realização de atividades e intervenções, do que os profissionais que não vivem aquela cultura, aquela realidade periférica, teriam dificuldades de fazer.4

Quanto à promoção da saúde é papel do ACS juntamente com a equipe realizar ações de promoção da saúde e prevenção de doenças. Desta forma, esse trabalhador deve atuar junto à coletividade, considerando suas características e as finalidades do trabalho, com estratégias educativas, de acordo com o planejamento da equipe e por meio de visitas domiciliares. O ACS desenvolve em seu cotidiano de trabalho atividades como orientar famílias quanto à utilização dos serviços de saúde disponíveis; manter a equipe informada, principalmente a respeito de famílias em situação de risco, realizar o levantamento das famílias em situação de risco, entre outras atividades.3

Estudos indicam que com a participação dos ACSs na Estratégia de Saúde da Família (ESF), houve redução dos indicadores de morbi-mortalidade, bem como elevação da qualidade dos serviços,5 dentre eles o acompanhamento pré-natal. Na assistência pré-natal o ACSs busca a promoção da educação da gestante, incentiva e informa sobre a importância da realização do pré-natal, facilita o acesso da gestante à unidade de saúde e estabelece vínculo entre a equipe de saúde da família, a gestante e seus familiares.

O pré-natal consiste em um acompanhamento minucioso de todo o processo de gravidez, o qual implica envolvimento, compromisso, empatia, disponibilidade, respeito, não se reduzindo aos aspectos biológicos da gestação. O acompanhamento deste período é de extrema importância para que sejam identificados fatores de risco que possam representar complicações ao binômio mãe-filho.6

Toda gestante tem direito ao acesso a atendimento digno e de qualidade no decorrer da gestação, parto e puerpério; tem direito de conhecer e ter assegurado o acesso à maternidade em que será atendida no momento do parto; tem direito à assistência ao parto e ao puerpério e que esta seja realizada de forma humanizada e segura, de acordo com os princípios gerais e condições estabelecidas pelo conhecimento médico. Além disso, todo recém-nascido tem direito à assistência neonatal de forma humanizada e segura. 7

Neste sentido, optou-se por desenvolver uma pesquisa sobre a promoção à assistência ao pré-natal com o propósito de identificar o conhecimento das agentes comunitárias de saúde de um Centro de Saúde de Florianópolis em relação ao pré-natal, bem como as dificuldades encontradas por elas na realização das atividades de promoção da saúde nesse contexto.

 

METODOLOGíA

A metodologia deste estudo esta fundamentada em uma pesquisa convergente-assistencial (PCA), de natureza qualitativa, sendo que, suas ações foram conduzidas pelos princípios pedagógicos de Paulo Freire.

A PCA requer participação ativa dos sujeitos da pesquisa, e é compreendida e realizada em articulação com as ações que envolvem pesquisadores e demais representativas da situação a ser pesquisada numa relação de cooperação mútua.8 Para sua realização foram convidadas a participar do estudo as ACSs de três equipes de ESF do Centro de Saúde escolhido, totalizando quinze sujeitos. Almejando atender o objetivo proposto optou-se pela realização de oficinas, as quais foram realizadas uma vez por semana, com carga horária de duas horas, tendo como foco a assistência ao pré-natal. O período para coleta de dados foi o primeiro semestre de 2009, nos meses de março a maio.

As oficinas educativas têm por finalidade promover a prática educativa e preventiva, através da troca de conhecimentos acerca do processo de trabalho e suas repercussões tanto nas vidas dos trabalhadores, quanto a população assistida.9 O primeiro encontro objetivou a apresentação da proposta de pesquisa, organização e como seriam desenvolvidos os encontros (dinâmicas de grupo), bem como a familiarização e a reflexão sobre o desenvolvimento das oficinas com intuito de fortalecer a participação dos agentes comunitárias. O momento oportunizou, também, conhecer cada participante e suas expectativas e dificuldades no processo de trabalho durante a assistência pré-natal. A partir desse contato inicial foi possível identificar assuntos de maior relevância, em relação ao tema, a serem discutidos no decorrer dos próximos encontros. Vale ressaltar que se priorizou trabalhar em círculo, em todas as oficinas, com a valorização das falas e escuta atenta.

O trabalho em círculo visa promover o processo de ensino e aprendizagem, representando um momento para o diálogo. Neste círculo, não existe um professor, mas um facilitador das discussões que, como uma pessoa alfabetizada, participa de uma atividade comum, na qual todos ensinam e aprendem.10 As oficinas aconteceram no auditório de reuniões do Centro de Saúde do Rio Vermelho de Florianópolis e teve somente a participação das ACSs e das pesquisadoras. Os temas escolhidos pelas ACSs como de maior interesse foram: rotinas da gestação, gravidez indesejada, cuidados com o corpo, família e a gestação e cuidados com o bebê. De acordo com as participantes, a escolha pelos temas estava relacionada às dificuldades no momento de orientação às gestantes durante as visitas domiciliares.

Realizaram-se seis oficinas, em cada uma delas ficou acordado que as pesquisadoras forneceriam o material teórico pesquisado. Este material foi distribuído antes de iniciar cada oficina. Dessa forma foram confeccionadas pelas pesquisadoras cinco apostilas contendo o aporte teórico para cada encontro. As ACSs colaborariam com seu conhecimento e com suas experiências vivenciadas na comunidade. Ao término de cada exercício eram realizadas dinâmicas, a fim de promover a expressão de suas percepções sobre a experiência vivenciada durante o exercício. A utilização destas informações foi autorizada pelas participantes através da assinatura de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

O desenvolvimento do estudo seguiu as recomendações da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta investigações envolvendo seres humanos. A pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina, sendo aprovado sob o número 396/08. Os encontros foram gravados, com posterior transcrição das falas. Os dados coletados foram analisados a partir do agrupamento das idéias, elementos e manifestações ao redor de uma temática capaz de estabelecer uma classificação, para tanto, utilizou-se a Análise Temática proposta por Minayo.

 

RESULTADOS

As agentes comunitárias de saúde (ACS) que participaram do estudo eram do sexo feminino, com idades de 35 a 40 anos, possuíam ensino médio completo e trabalhavam como ACS há mais ou menos cinco anos. Posterior a análise das falas emergidas nos exercícios surgiram duas categorias temáticas: conhecimentos e ações construídas pelas ACSs e trabalho em equipe, as quais são apresentadas abaixo.

Conhecimentos e ações das ACSs no Pré-natal. Com a realização dos exercícios foram emergindo relatos das vivências das ACSs na assistência a gestantes as quais revelara parte de seus conhecimentos sobre o tema e as ações de promoção à saúde realizadas pelas trabalhadoras. Percebeu-se que as ACSs possuem conhecimentos científicos e populares sobre o tema. Fato identificado nos seguintes depoimentos: Aquelas mudanças no corpo ali não é só da mama tá? É o psicológico também, porque muitas mulheres têm aquela dificuldade, principalmente no começo, “agora meu corpo vai ficar feio.” A gente escuta muito isso (ACS1), Cuidar ao coçar a barriga, pois se usar as unhas vai aparecer estrias [...] (ACS10), e: Antigamente precisava tomar vacina porque os partos eram tudo em casa. Tinha mais risco pra pegar infecção ou tétano (ACS 10).

As pesquisadoras tiveram o cuidado de desenvolver as ações de modo que a participação dos ACSs fosse ativa, enquanto seres humanos críticos, reflexivos e capazes de transformar a realidade, no qual estão inseridos. O mesmo pode ser evidenciado no diálogo interativo:

Rotinas da gestação entra a bolsa da gestante? Acho que o primeiro exercício poderia falar sobre isso (ACS 7).
Eu começaria com a gravidez indesejada (ACS 1).
Mas agora ela já ta grávida. O primeiro contato que a gestante tem é que ela recebe a bolsa de gestantes (ACS 2).
Ela já recebe todas as orientações (ACS 4).

Pensando nisso, o desenvolvimento das dinâmicas foi acordado com todo o grupo. Os ACSs optaram por trabalhar de maneira que houvesse uma articulação entre o conhecimento teórico e o prático, a partir de suas experiências: Vocês trazem o material, mostram pra gente como deve funcionar e ai a gente vai mostrar pra vocês como elas são recebidas no consultório e como elas falam pra gente sobre o que elas foram orientadas (ACS 4), e: Vocês trazem como tem que ser e a gente fala como acontece (ACS 3).

Mediante a realização das oficinas, buscou-se fortalecer suas atribuições com o objetivo de deixá-los seguros e cientes das informações essenciais para o acompanhamento gestacional, sempre esclarecendo quais os tipos de dúvidas que elas podem orientar e quais condizem à competência de outros profissionais da equipe: Antes tinha conhecimento de como proceder, algumas coisas tinha dúvidas. Sanei as dúvidas que tinha, achava que não era tão complexo. Dúvidas em relação a muitas coisas, sobre andar de bicicleta, tinha dúvida, sexo na gravidez. Eu aprendi muito mais do que já sabia. Eu tirei minhas duvidas antigas, aprendi com mais detalhes, bem mais explicado, gostei de mais da oficina, aprendi a ser mais vigilante com a gestante, observar melhor o que ocorre sobre o bebê, e sobre elas passei a orientar e ajudar (ASC 15).

As ACSs também revelaram que as informações apresentadas faziam parte do seu conhecimento prévio, através das suas experiências de vida e maiode trabalho. Desse modo, as vivências oportunizadas pela pesquisa incentivaram a comunicação e organização das idéias emitidas fazendo com que elas percebessem seu papel como agentes construtores do conhecimento: Antes sentia muita dificuldade até mesmo no que falar ou como falar. Dúvidas e curiosidades. Depois tive esclarecimentos e aprendizado, foi muito válido e muito importante, pois apesar de saber algumas coisas, de ser mãe de dois filhos eu aprendi ainda mais (ACS 2).

Pode-se observar que as mesmas percebem que as gestantes possuem dificuldades em entender e seguir as orientações oferecidas pelos profissionais de saúde. Nesse momento, recorrem com frequência aos ACSs, que são questionados sobre as rotinas do pré-natal entre outras, necessitando de conhecimentos além de sua formação: Muitas gestantes não tem carteira, não sabem o que é o tal BCF, outras não sabem o que o médico anota. Muitas vezes nós que temos que orientar (ACS 1), e: Às vezes elas consultam com o médico e estão com infecção e o médico receita antibiótico, mas depois elas perguntam pra gente: será que eu posso tomar? Mas eu to grávida, será que não vai fazer mal pro neném? (ACS 2).

Trabalho em equipe/trabalho solidário. Ao passo em que foram realizadas as oficinas, ficou evidente a importância do trabalho em equipe para promover a aprendizagem, aproximação entre a teoria e a prática, resultando no crescimento de todos os envolvidos, ressaltando a solidariedade como instrumento fundamental neste processo: No começo achei que esse negócio de fazer essas oficinas com todas as agentes juntas não ia dar certo, mas no passar do tempo percebi o quanto foi bom ouvir a opinião de todas (ACS 5), e: A parte boa de reunir todo mundo foi porque pudemos ver que cada uma tem uma forma de pensar(ACS 1),

 

DISCUSSÃO

Neste estudo surgiram duas categorias temáticas: conhecimentos e ações construídas pelas ACSs e trabalho em equipe. Na categoria de conhecimentos e ações das ACSs no pré-natal, percebeu-se que as ACSs possuem conhecimentos científicos e populares sobre o tema. Baseando-se nos pressupostos de Freire10 para conduzir os exercícios, as pesquisadoras tiveram o cuidado de desenvolver as ações de modo que a participação dos ACSs fosse ativa, enquanto seres humanos críticos, reflexivos e capazes de transformar a realidade, no qual estão inseridos. Mediante a realização das oficinas, buscou-se fortalecer suas atribuições com o objetivo de deixá-los seguros e cientes das informações essenciais para o acompanhamento gestacional, sempre esclarecendo quais os tipos de dúvidas que elas podem orientar e quais condizem à competência de outros profissionais da equipe.

O processo de conhecimento precisa ser compreendido como tarefa coletiva dos homens, amparado na comunhão e na solidariedade. Assim, entende-se que o conhecimento é construído de maneira coletiva e não individual. O ato de conhecer implica a cumplicidade do sujeito que concretiza. Cumplicidade no que concerne a necessidade de compartilhar seus sentidos e percepções prévias, objetivando aprimorá-las ou refazê-las, transformando o mundo e superando o status quo.11 Portanto, com relação ao conhecimento das ACS no que diz respeito ao pré-natal, salienta-se a importância da contextualização da realidade a partir do já conhecido para construção de um novo saber, mais ancorado no conhecimento científico. Lembra-se que para o trabalho do ACS exigi-se apenas ensino médio completo, entretanto na realidade laboral são exigidos desses trabalhadores uma gama de outros conhecimentos científicos da área de saúde.

As participantes percebem que as gestantes possuem dificuldades em entender e seguir as orientações oferecidas pelos profissionais de saúde. Com isso percebe-se que apesar da atividade do agente extrapolar os conhecimentos ofertados na sua formação, a linguagem do ACS favorece o entendimento e o elo com a comunidade. Por vezes, a linguagem científica dificulta o cuidado, tendo em vista que o usuário pode ter dúvidas quanto às orientações repassadas pelos profissionais de saúde. Dessa forma, evidencia-se que os ACSs possuem uma linguagem que os aproxima dos usuários, todavia lhes faltam recursos (maiores conhecimentos) para fazer frente às demandas trazidas na promoção da saúde no pré-natal. A escassez de recursos para o trabalho do ACSs como capacitações, entre outros, somadas as pressões vividas no trabalho podem representar fonte de desgaste e o adoecimento. Destaca-se, nesse sentido a importância do auto-cuidado e da valorização profissional dos ACSs, uma vez que esses aspectos são essenciais para que possam ter motivação e prazer no trabalho, bem como manter condições físicas e emocionais para prestarem assistência de qualidade aos indivíduos e famílias que atendem.12 Ainda, foi possível identificar a importância de atividades com o foco informativo, visto que a Política Nacional de Atenção Básica13 atribui ao ACS o desenvolvimento de atividades de promoção à saúde. Especificamente, faz parte da sua atuação a educação em saúde, a informação e o incentivo ao pré-natal.

Na categoria de trabalho em equipe/trabalho solidário, percebe-se o trabalho em equipe representa uma estratégia para enfrentar o intenso processo de especialização na área da saúde e fortalecer o trabalho. Esse processo tende a aprofundar verticalmente o conhecimento e a intervenção em aspectos individualizados das necessidades de saúde. Nesse sentido, o trabalho em equipe exige a articulação das ações, a interação comunicativa dos profissionais e a superação do isolamento dos saberes.

No entanto, o trabalho em equipe não pressupõe abolir as especificidades dos trabalhos, pois as diferenças técnicas expressam a possibilidade de contribuição da divisão do trabalho para a melhoria dos serviços prestados, à medida que a especialidade permite aprimoramento do conhecimento e do desempenho técnico em determinada área de atuação, bem como maior produção. Dessa forma, os profissionais têm a possibilidade de realizam intervenções próprias de suas respectivas áreas, mas também executam ações comuns, nas quais estão integrados saberes provenientes de distintos campos como: recepção, acolhimento, grupos educativos, grupos operativos e outros.14

O trabalho na ESF requer a construção de um projeto assistencial comum com complementaridade dos trabalhos especializados, em que os agentes envolvidos estabeleçam interação entre si e com os usuários. O trabalho em equipe pressupõe, portanto, uma relação recíproca de comunicação e interação. A comunicação em busca de consenso entre os profissionais traduz-se em qualidade na atenção integral às necessidades de saúde da clientela. Diante disso, o trabalho em equipe no contexto da atenção básica ganha uma nova dimensão no sentido da divisão de responsabilidades do cuidado entre os membros da equipe, na qual todos participam com suas especificidades contribuindo para a qualidade da prestação da assistência.15

Nesse contexto destaca-se a problematização do conhecimento através da educação participativa, a qual proporcionou aos trabalhadores e usuários a troca de experiências. O mesmo aconteceu ao longo dos exercícios com os ACSs através da teorização das suas práticas. Isso aponta para o significado da força coletiva, promovendo a segurança e o fortalecimento de cada integrante, valorizando as atuações de cada um, evidenciando que as repercussões das discussões no grupo influenciam para além da construção do conhecimento naquele momento, mas para seu processo de trabalho. Salienta-se a necessidade de outras vivências dessa natureza, as quais também resgatem os demais membros da equipe de Saúde da Família, para que possam compartilhar as potencialidades e fragilidades da realidade laboral em que atuam.

Torna-se imprescindível destacar o papel do ACS realizando educação em saúde, para tanto, o mesmo necessita conhecer a realidade da comunidade, em que presta assistência, e ainda estar aberto para o estabelecimento de processos dialógicos efetivos. O diálogo como essência da educação e como prática de liberdade caracteriza-se em um fenômeno humano, que não deve ser diminuído ao simples depósito de idéias de um sujeito no outro, porque representa o encontro entre as pessoas, para problematizar situações e modificar a realidade.16

O estudo em questão ressalta a importância de capacitar esse trabalhador, por meio da implantação de projetos de educação permanente, para que o mesmo esteja apto a atuar no seu ambiente de trabalho, suprindo as necessidades de saúde populacional. Cabe aos ACSs que orientam ações de pré-natal considerar a singularidade, multidimensionalidade e o contexto cultural das gestantes, a fim de promoverem sua autonomia, cidadania e bem-estar social.

O trabalho em equipe objetiva influenciar os diferentes fatores que interferem no processo saúde-doença. A ação interdisciplinar pressupõe a possibilidade da prática de um profissional se reconstruir na prática do outro, ambos sendo transformados para a intervenção na realidade em que estão inseridos. Desse modo, a abordagem integral dos indivíduos/famílias é facilitada pela soma de olhares dos distintos profissionais que compõem as equipes inter-disciplinares.15 Em virtude disso, enfatiza-se que o trabalho em equipe deve disponibilizar subsídios às atividades dos ACSs, fortalecer o vínculo entre os profissionais de saúde e os usuários, amenizar as angústia do trabalho e promover a assistência de qualidade.

Como considerações finais deste estudo se observa nos exercícios, que os ACSs possuem diversificados conhecimentos sobre o pré-natal e consciência da importância do acompanhamento às gestantes por parte da equipe de ESF. Entretanto, as ACSs não possuíam informações e ferramentas suficientes para compreender e avaliar a efetividade das suas ações. Desta forma, considera-se importante a realização de trabalhos de educação permanente, não só para esses trabalhadores como também para os outros profissionais da equipe de saúde da família.

Os ACSs são sujeitos ativos do processo de construção do conhecimento e para isso é necessário que sejam estimulados e incentivados a assumirem suas atividades com responsabilidade e consciência social. Considera-se que este trabalho foi importante para que esses sujeitos dedicassem mais atenção e avaliassem suas posturas como agentes promotoras de saúde da família, bem como destacassem a relevância desta em sua vivência. Tais participantes se sentiram enriquecidas com conteúdos teóricos e principalmente estimuladas a aprimorar suas práticas, respeitando suas atribuições e trazendo resultados positivos ao acompanhamento do pré-natal.

 

REFERENCIAS

1. Coimbra L, Silva A, Mochel E, Alves M, Ribeiro V, Aragão V et al. Fatores associados à inadequação do uso da assistência pré-natal. Rev. Saúde Pública. 2003;37(4):456-62.        [ Links ]

2. Bass P. Promoção da saúde e qualidade de vida. Ciênc. Saúde coletiva. 2000;5(1):163-77.        [ Links ]

3. Brasil. Ministério da Saúde. Caderno de Atenção Básica: Programa de Saúde da Família. Brasília: Ministério da Saúde; 2001.        [ Links ]

4. Furlan P. Veredas no Território: análise da prática de Agentes Comunitários de Saúde. São Paulo: Lemos; 2008.        [ Links ]

5. Espíndola F, Costa I. Agentes Comunitários de Saúde do PACS e PSF: uma análise de sua vivência profissional. Rev. odontol. Univ. Cid. Sao Paulo. 2006;18(1):43-51.        [ Links ]

6. Zampieri M, Garcia O, Boehs A, Verdi M. Enfermagem na Atenção Primária à Saúde da Mulher. Atenção ao Pré-natal. Florianópolis: UFSC/NFR/SBP; 2007.        [ Links ]

7. Brasil. Mistério da Saúde. Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento. Programas e Projetos - Saúde da Mulher. [internet]. Brasil: Ministério da Saúde; [acceso 2010 abr 2]. Disponible en: www.saude.gov.br        [ Links ]

8. Trentini M, Paim L. Pesquisa Convergente Assistencial. 2a ed. Florianópolis: Editora Insular; 2004. p.143.        [ Links ]

9. Frota M, Albuquerque C, Linard A. Educação popular em saúde no cuidado à criança desnutrida. Texto & contexto enferm. 2007;16(2):246-53.        [ Links ]

10. Freire P. Conscientização: teoria e prática da libertação – uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. Rio de Janeiro: Cortez & Moraes; 1979.        [ Links ]

11. Boufleuer J. Conhecer/conhecimento. En: Streck D, Redin E, Zitkoski J. Dicionário Paulo Freire. Belo Horizonte: Autêntica Editor; 2008.        [ Links ]

12. Trindade L, Gonzales R, Beck C, Lautert L. Cargas de trabalho entre os agentes comunitários de saúde. Rev. gaúch. enferm. 2007;28(4):473-9.        [ Links ]

13. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção à Saúde. Política nacional de atenção básica. Brasília: Ministério da Saúde; 2006. p.59.        [ Links ]

14. Peduzzi M. Equipe multiprofissional de saúde: conceito e tipologia. Rev. Saúde Pública. 2001;35(1):103-9.        [ Links ]

15. Araujo M, Rocha P. Trabalho em equipe: um desafio para a consolidação da estratégia de saúde da família. Ciênc saúde coletiva. 2007;12(2):455-64.        [ Links ]

16. Freire P. Pedagogia do Oprimido. 47ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2005.        [ Links ]

 


Fecha de Recibido: 23 de junio de 2010. Fecha de Aprobado: 14 de febrero de 2011.

Creative Commons License All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution License