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Investigación y Educación en Enfermería

Print version ISSN 0120-5307On-line version ISSN 2216-0280

Invest. educ. enferm vol.30 no.1 Medellín Jan./Apr. 2012

 

ARTÍCULO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE/ ARTIGO ORIGINAL

 

Medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV empregadas por mães de crianças o positivas

Medidas de prevención de la transmisión vertical del VIH empleadas por madres de niños seropositivos

HIV vertical transmission preventive measurements used by mothers of seropositive children

 

 

Aline da Fonseca Leal1

Adriana Roese2

Afra Suelene de Sousa3

 

1 Enfermeira do Hospital São Francisco de Paula. Graduada pela Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal Pelotas, Brasil. email: alinedafonsecaleal@yahoo.com.br.

2 Enfermeira, Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Enfermagem. Professora da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Pelotas, Brasil. email: adiroese@gmail.com.

3 Enfermeira, Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Enfermagem. Professora da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Pelotas, Brasil. email: afrasus@uol.com.br.

 

Subvenciones: ninguna.

Conflicto de intereses: ninguno a declarar.

Cómo citar este artículo: Leal AF, Roese A, Sousa AS. Medidas de prevención de la transmisión vertical del VIH empleadas por madres de niños seropositivos. Invest Educ Enferm. 2012;30(1): 44-54.

 


 

RESUMO

Objetivo. Analisar as medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV empregadas pelas mães de meninos HIV positivos que foram acompanhadas pelo Serviço de Atendimento Especializado (SAE) do município de Pelotas, Rio Grande do Sul (Brasil). Metodologia. Investigação qualitativa com abordagem descritiva e exploratório. Os dados foram coletados através de entrevistas semi-estruturadas a cinco mães de meninos HIV positivo; a análise da informação se fez por categorização temática. Resultados. Observou-se que o principal fator que põe obstáculos a realização de medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV foi a omissão do pessoal de saúde de solicitar a prova do HIV. A maioria das interrogadas mostrou conhecimento sobre a doença e das medidas pára de prevenção da mesma. Conclusão. Existe a necessidade de capacitar aos profissionais da saúde na difusão de medidas preventivas com o fim de melhorar o atendimento pré-natal.

Palavras chaves: HIV; transmissão vertical de doença infecciosa; prevenção primária; saúde pública.

 


 

RESUMEN

Objetivo. Analizar las medidas de prevención de la transmisión vertical del VIH empleadas por las madres de niños VIH positivos que fueron acompañadas por el Servicio de Atención Especializado (SAE) del municipio de Pelotas, Rio Grande do Sul (Brasil). Metodología. Investigación cualitativa con abordaje descriptivo y exploratorio. Los datos fueron recolectados mediante de entrevistas semi-estructuradas a cinco madres de niños VIH positivos; el análisis de la información se hizo por categorización temática. Resultados. El principal factor que obstaculiza la realización de medidas de prevención de la transmisión vertical del VIH fue la omisión del personal de salud de solicitar la prueba del VIH. La mayoría de las encuestadas mostró conocimiento sobre la enfermedad y de las medidas de prevención de la misma. Conclusión. Existe la necesidad de capacitar a los profesionales de la salud en la difusión de medidas preventivas con el fin de mejorar la atención prenatal.

Palabras clave: VIH; transmisión vertical de enfermedad infecciosa; prevención primaria; salud pública.

 


 

ABSTRACT

Objective. To analyze HIV vertical transmission preventive measurements used by mothers of HIV positive children who were supported by the Specialized Attention Service (EAS) of the municipality of Pelotas, Rio Grande do sul (Brazil). Methodology. Qualitative research with descriptive and exploratory approach. Data were collected through semi structured interviews applied to five mothers of HIV positive children. The analysis of the information was made through thematic categorization. Results. It was observed that the main factor that hampers HIV vertical transmission preventive measurements was the healthcare staff omission to order the HIV test. Most of the surveyed mothers showed knowledge about the disease and its preventive measurements. Conclusion. There is a need to train health care professionals in the diffusion of preventive measurements to improve prenatal attention.

Key words: HIV; infectious disease transmission, vertical; primary prevention; public health.

 


 

INTRODUÇÃO

A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) é uma grande prioridade de saúde global. Tal constatação deve-se a fatores como a inexistência de uma vacina contra o vírus da imunodeficiência humana (HIV), a variedade de formas de transmissão deste agente, seu caráter altamente mutagênico e promoção de degradação imunológica. Associado a isso, problemas de ordem social e econômica tornaram essa epidemia um verdadeiro desafio para a sociedade moderna.1

Embora tenha havido avanços importantes em relação à prevenção de novas infecções pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) e a redução do número anual de óbitos relacionados à doença, desde seu surgimento no início dos anos 80, ela continua a aumentar o número de pessoas vivendo com infecção.

As doenças relacionadas à AIDS permanecem sendo uma das principais causas de morte, e, as projeções são de que continuem sendo uma causa significativa de mortalidade precoce nas próximas décadas.2 Em 2008, a estimativa mundial foi de que havia 33.4 milhões de pessoas vivendo com HIV.3 No Brasil, a AIDS é uma epidemia considerada estabilizada, sendo que em 2008 houve 34 480 novas notificações de pessoas infectadas pelo HIV.4 Desde a década de 90, tem-se observado um aumento no número de casos de infecção pelo HIV no sexo feminino, sendo que há um predomínio de incidência entre as mulheres com relações heterossexuais.5,6

Em 1986, a razão de sexo era de 15 casos de AIDS em homens para cada caso em mulheres e, a partir de 2002, a razão quanto ao sexo estabilizou-se em 15 casos em homens para cada 10 em mulheres. No que diz respeito aos jovens, na faixa etária de 13 a 19 anos, a razão de sexo desde 1988, apresenta uma inversão, configurando-se com 8 casos em meninos para cada 10 casos em meninas.7

Desde o início dos anos 90 até o presente momento, se apresenta nítido o predomínio da prática heterossexual como forma de transmissão do HIV para as mulheres. Várias suposições são levantadas para explicar o aumento no número de casos de HIV em mulheres, uma delas é o fato de que a transmissão do HIV, nas relações heterossexuais, tem maior índice de contaminação nas mulheres.7

As relações de gênero enquanto relações de poder, nas sociedades, são um fato extremamente relevante, é considerado aceitável que os homens tenham múltiplas parceiras sexuais e mesmo quando estas não concordam com o comportamento dos seus parceiros, nem sempre dispõe de meios materiais e simbólicos para sair da relação ou mudar os seus termos. Ainda podemos observar um baixo poder de negociação sexual das mulheres, tornando-as mais propensas a terem relações sexuais desprotegidas.5

Atualmente, a proporção entre homens e mulheres com AIDS é de 1 para 4.2 Dados do Ministério da Saúde4 revelam que a incidência de casos nas mulheres entre 13 e 30 anos, excede a incidência de infecção em homens, nessa mesma faixa etária. Acredita-se que “a heterossexualização é uma das características mais marcantes da epidemia do HIV e o número de mulheres infectadas continua a crescer principalmente entre aquelas com relação estável”.8:330

O crescimento no número de mulheres com HIV/AIDS trouxe como consequência o aumento nas taxas de transmissão vertical do HIV. O Ministério da Saúde (MS) indica que, no Brasil, aproximadamente 84% dos casos de AIDS pediátrica, ou seja, em crianças com até 13 anos de idade, são decorrentes de transmissão vertical.7 Mundialmente, a cobertura de serviços de prevenção da transmissão vertical do HIV (da mãe para o filho) aumentou de 10% em 2004 para 45% em 2008.9 Muitas medidas de prevenção foram desenvolvidas desde que a transmissão vertical entrou em evidência. No ano de 1994, foi publicado o protocolo número 076, que foi desenvolvida pelo Pediatric AIDS Clinical Trials Group (PACTG) que definiu como proposta de intervenção profilática para a transmissão vertical do HIV o uso da Zidovudina (AZT) durante a gravidez, trabalho de parto para o recém-nascido, e a suspensão do aleitamento materno. Essas medidas reduziram a taxa de transmissão perinatal em, aproximadamente, 70%. No Brasil, o PACTG 076 começou ser aplicado em 1996.10,11

O Ministério da Saúde, em 2003, desenvolveu um documento intitulado Recomendações para Profilaxia da Transmissão Vertical do HIV e Terapia Anti-Retroviral em Gestantes, com todas as considerações em relação à temática como uso de anti-retrovirais, tipo de parto adequado, dentre outras.12 Também, foi instituído o uso de testes rápidos para diagnóstico da infecção pelo HIV em situações especiais por meio de portaria número 34 da ANVISA em 2005. A oferta do teste rápido anti-HIV, com aconselhamento pré e pós-teste para todas as parturientes não aconselhadas e testadas durante o pré-natal, ou sem pré-natal, é mais uma medida para prevenir a transmissão vertical do HIV devendo a testagem ser igualmente sempre voluntária e confidencial.13 A taxa de transmissão vertical do HIV, sem qualquer intervenção, situa-se em torno de 26%.12

O uso combinado de determinadas intervenções pode reduzir essas taxas para cifras menores que 1%.14 Apesar de todos os avanços conquistados, no que tange a prevenção da transmissão materno-infantil do HIV, muitos casos ainda ocorrem. Estimativas do Ministério da Saúde4 apontam que, a cada ano, cerca de 17 200 gestantes são infectadas pelo HIV, fazendo com que a transmissão vertical, também chamada de perinatal, seja responsável por praticamente todos os casos da infecção em crianças menores de 13 anos.

Levantam-se algumas hipóteses sobre os motivos que dificultam a aplicação das medidas profiláticas para a doença: a não realização do pré-natal8,15 ou este feito de forma inadequada, dificuldades de acesso ao teste anti-HIV, o atendimento despreparado nas maternidades, a falta de aconselhamento pré e pós-teste, a falta de adesão ao tratamento,16 dentre várias outras possibilidades.

No que se refere a Pelotas, no período de 1997 a 2009, há um total de 40 notificações de crianças (0 – 14 anos) com HIV.17 Acredita-se que o panorama da transmissão vertical do HIV em Pelotas não é totalmente conhecido, visto que informações aquém dos números apresentados não são divulgadas.

Espera-se, com esse trabalho, fornecer subsídios para a diminuição da transmissão vertical, visto que, a verificação das medidas que foram falhas na profilaxia da transmissão do vírus, fornecerá dados para um possível melhoramento das ações que não estiverem sendo realizadas de forma adequada. Desta forma, teve-se, por objetivo, analisar as medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV que foram adotadas em crianças acompanhadas pelo serviço de atendimento especializado (SAE). Bem como, conhecer as motivações para realização ou não das medidas de prevenção da transmissão vertical e AIDS com as mães de crianças acompanhadas pelo SAE.

 

METODOLOGIA

O presente estudo se caracteriza como uma pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória. Foi realizado em um ambulatório da cidade de Pelotas-RS, que presta assistência especializada a portadores de HIV/AIDS. O serviço atende crianças de zero a 13 anos, gestantes e adultos portadores do vírus HIV exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde, está em funcionamento desde maio de 1996.

Os sujeitos do estudo foram cinco mulheres que tem filhos portadores de HIV com idade de ate 13 anos, e, que frequentaram o local do estudo de 28 de junho a 05 de julho de 2010. Para participar do estudo as mulheres atenderam aos seguintes critérios: idade superior ou igual há 18 anos e concordar em participar do estudo, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Foi aplicado um instrumento de pesquisa semi-estruturado junto às mães de crianças HIV positivo que se enquadraram como os sujeitos do estudo. Estes foram transcritos e após analisados, a partir da categorização temática. Esta pesquisa respeitou os preceitos da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde18 e do Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem.19 Aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Pelotas, sob o número 113/2010.

 

RESULTADOS

Momento do diagnóstico. O impacto de se descobrir portador de AIDS permeia os aspectos físicos e emocionais e, faz aflorar uma variedade de preocupações pessoais começando pelo medo quando o diagnóstico é confirmado. Esses fatos citados na literatura se traduzem nas falas a seguir: ...foi horrível, eu tive vontade de me atirar embaixo de um caminhão...(E); ... fiquei com muito medo de fazer o exame pra HIV ... quando confirmou fiquei desesperada...(C); ...foi horrível de repente todo mundo doente... Foi muito difícil, descobrir ser soro positivo, eu e minha família inteira com uma doença grave (D).

Cabe relatar que uma entrevistada tomou conhecimento de sua soropositividade durante uma gestação, ao realizar os exames de pré-natal, sem nunca ter cogitado a possibilidade de ser portador de HIV: ...quando meu filho estava com dois anos eu engravidei de novo, não foi planejado sabe tava tomando remédio para amamentar, mas ai aconteceu e comecei o pré-natal e o teste foi pedido e eu fiz e deu positivo (D). A “C” também teve o diagnóstico na gestação, mas diferentemente da situação da entrevistada D, já suspeitava de sua soropositividade: ...o meu marido era usuário de droga, ai quando eu engravidei fiquei com muito medo de fazer o exame pra HIV, ai enrolei bastante por isso eu comecei o pré-natal tarde com quase 6 meses, ai eu e meu marido descobrimos da doença mas eu já pensava que podia ter (C).

Outro fato encontrado na pesquisa foi o de uma entrevistada obter o diagnóstico HIV positivo em uma internação hospitalar. Sua filha portadora de HIV só foi diagnosticada com a doença, anos mais tarde, em uma nova gravidez da mãe, que já estava em tratamento. O profissional que realizou o pré-natal da filha mais moça de “E” foi quem cogitou a possibilidade da filha mais velha de “E” ser portadora de HIV: ...descobri porque eu fiquei doente, tive umas coisas na garganta ai fiquei internada, primeiro pensaram em câncer e depois que descobriram isso... ...da minha filha que descobriram que ela também tinha foi depois quando eu engravidei de novo que pensaram que minha filha mais velha poderia ter ...(E). Muitas mulheres tomaram conhecimento da própria soropositividade quando descobriram que seu filho estava infectado, situação também relatada nas falas: ...junto com o dele [se referindo ao filho], em 2001. Ele estava sempre doente, internou muitas vezes com pneumonia, quem suspeitou que podia ser isso [se referindo ao HIV] foi a vó dele porque o pai era usuário de drogas ai ela falou com o médico que pediu minha autorização e meu filho fez o exame que deu positivo (A); ...eu sei que o diagnóstico dela foi feito através da criança, pois ela [a criança] vivia doente com tudo que é infecção, ai o médico fez o exame nele [a criança] que deu positivo e ai ele fez nela [mãe] também. Depois do diagnóstico a ela ficou cada vez mais fraca e morreu (B).

Outro dado a se considerar é a descoberta de possuir HIV por toda da família: ...foi ai (na gravidez) eu e meu marido descobrimos da doença... (C); ...foi horrível de repente todo mundo doente. Foi muito difícil, descobrir ser soro positivo eu e minha família inteira com uma doença grave... (D).

Conhecimentos sobre transmissão vertical do HIV. Algumas das mulheres demonstraram ter conhecimentos sobre o assunto, demonstrados nas seguintes falas: Eu sei que é de mãe para o bebê,quando se engravida e não se faz o tratamento a criança pode nascer com o vírus, mas sei que se faz tudo certo, o pré-natal, tomar os remédios, a criança pode nascer sem, eu li uma vez que é quase certo o bebê nascer bem, ah não pode amamentar também (A); Ah a transmissão de mãe para filho sei que tem que fazer pré-natal e tomar remédio pra evitar que o bebê pegue (B); Que passa da mãe para o bebê, li que se fizer tudo certo desde o início a chance do bebê nascer com a doença é pequena... ...fazer tudo, pré-natal, uso da medicação, não amamentar, levar nas consultas (C).

A entrevistada “D” demonstrou dúvidas sobre alguns termos utilizados nos questionamentos, mas demonstra, em seu discurso, conhecer alguma questões referentes a AIDS e transmissão vertical do HIV: Eu sei que tem que se cuidar, usar preservativo pra não pegar e na gravidez fazer tudo direitinho... ...fazer o pré-natal e tudo mais que o médico mandar, pra ele não adoecer eu cuido pra ele se alimentar direitinho, não pegar frio e tomar os remédios (D). “E” foi a que demonstrou menor aporte de conhecimento sobre a temática, além disso, relatou sua descrença nas medidas de prevenção: Não sei bem, mas acho que se tem que pegar pega, não acredito muito..., ...acho que tem que cuidar pra não ficar doente, mas também não sei eu cuido bastante e ela teve toxoplasmose cerebral, ficou muito ruim (E).

Dificuldades encontradas para realização das medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV. Estes problemas são representados nos relatos a seguir: ...a dificuldade é que não me pediram o exame, mas o resto é fácil, aqui no SAE mesmo é bem fácil ter médico e eu sei que pra grávida é mais fácil ainda (A); Aqui não é difícil, comecei o pré-natal no posto da pequena, né e daí diagnosticaram lá e já vim pra cá, minha filha é saudável. Esse que tem HIV eu fiz o pré natal lá também, mas era outro médico e não pediram o exame, eu fico triste por ele porque ele podia nascer sem o vírus (D) e; Acho fácil, quem quer fazer faz, só é difícil assim que nem eu que fiz o pré-natal, mas não fiz o exame, né (E).

Outra dificuldade levantada durante a pesquisa é ir ao serviço pelo medo de esse fato revelar o diagnóstico HIV positivo.

Esse temor se traduz na fala da entrevistada: ...ah desde o início eu acho difícil ir no serviço, nem todo mundo sabe que tenho HIV, ai se alguém me vê aqui fico com vergonha, hoje uma senhora me perguntou sobre que remédio eu ia pegar ai desconversei fiquei cismada, eu acho que junto com outras coisas fica muito misturado (C). Uma situação interessante citada por todas as entrevistadas, e, traduzida na fala de “B” é a qualidade do atendimento do SAE: ...acho que não, aqui no SAE eu sei que é fácil de fazer tudo direitinho, nos outros lugares eu não sei (B).

Percepção dos benefícios frente às medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV. O entendimento das medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV esteve presente em todas as entrevistas e se evidenciou nas falas a seguir: É muito importante porque se eu tivesse feito, se eu soubesse o que fazer meu filho poderia nascer sem a doença... ...se soubesse na época eu faria tudo, não fiz porque não tinha...(A); ...que é pro bem deles né, minha outra filha nasceu sem a doença, então vale a pena, é pena que na gravidez dele eu não sabia, é bravo ele já teve um monte de problema um monte de vez no hospital, mas agora ta bem (D) e; ...acho que vale a pena tentar para o bebê não tem nada, tem uma amiga minha também que fez tudo que falaram e o filho dela não tem (E).

A entrevistada “A” demonstra entender os benefícios da realização das medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV se baseando em seus conhecimentos sobre o assunto, diferentemente de “D” e “E” que acreditam, por terem vivenciado uma situação de sucesso dessas medidas.

Estas mulheres soropositivas têm recebido a informação de que as medidas preventivas diminuem a chance da transmissão. Esta informação possibilita que a mulher manifeste mais abertamente o seu desejo de engravidar, como nos casos: ...eu penso em ter mais filho, assim que eu tiver alguém... ...eu cuido dele, ele é saudável sabe, mas acho que pro próximo filho vai ser muito bom já ter tudo o tratamento que ai ele nasce sem o HIV (A) e; ...se ficasse grávida novamente faria tudo direitinho (C).

A preocupação em realizar todas as medidas possíveis para evitar a transmissão vertical do HIV e também do agravamento do quadro das crianças portadores do vírus fica evidente nas entrevistas a seguir: ...ah se o filho nascer sem a doença é uma benção, muito bom (E); Ele é uma criança saudável, ainda não precisa tomar remédio, não sei se foi por isso, mas eu faço o que eu poder pra ver meu filho bem (C); ...acho que é boa [se referindo as medidas de prevenção], tudo que posso fazer faço por toda minha família (D) e; ...é muito importante porque a criança é doente tem que tomar remédio é muito ruim pra ele (B).

 

DISCUSSÃO

Momento do diagnóstico. A AIDS ainda hoje é uma doença permeada por representações negativas ligadas a conflitos, culpa, sofrimento, castigo e morte.20,21 O impacto de se descobrir portador dessa patologia permeia os aspectos físicos e emocionais e, faz aflorar uma variedade de preocupações pessoais começando pelo medo quando o diagnóstico é confirmado.

Diferentemente de quando o indivíduo procura um serviço para realizar o exame anti-HIV, uma mulher fez o teste por ser um procedimento da rotina para a gestação e não por se sentir em situação de risco. Esse fato causa emoções contraditórias que se chocam violentamente neste momento que a gestante pensa que não vai suportar. No entanto, passada a fase inicial, ela percebe que ser mãe é mais forte do que seu próprio medo e preconceito.22 Essas mulheres necessitam de um suporte emocional e um apoio institucional ainda maiores devido à situação de vivenciarem o diagnóstico em um período em que outro ser está envolvido e, em uma situação de risco. Nesse momento, especialmente, há a necessidade de atuação multiprofissional e interdisciplinar no atendimento aos pacientes com a infecção pelo HIV, e que, considere a abordagem tanto da dimensão psicossocial quanto do contexto sociocultural em que vivem.23

Em estudo realizado, muitas mulheres tomaram conhecimento da própria soropositividade quando descobriram que seu filho estava infectado,24 situação encontrada também no nosso estudo. Sobre o assunto, acredita-se que, em decorrência do aumento da vulnerabilidade feminina, aumentou também a vulnerabilidade de crianças em relação à epidemia da AIDS, o sistema familiar torna-se o alvo principal para o desenvolvimento do HIV.25 Durante as entrevistas percebeu-se que o momento do diagnóstico, sem dúvida foi uma situação difícil para todas as mulheres entrevistadas. O preconceito e o temor envolvidos no HIV e na AIDS ainda estão presentes em grande parte da população. O aconselhamento pré e pós testagem anti-HIV se torna indispensável para tornar o momento do diagnóstico o menos traumático possível.

Conhecimentos sobre transmissão vertical do HIV. A transmissão vertical do HIV é um “tipo de transmissão do vírus HIV que ocorre da mãe para o bebê, durante a gestação, o parto ou o aleitamento”.26:46 Acredita-se que dispor de conhecimento sobre uma patologia é muito importante para fortalecer e subsidiar o cumprimento das medidas de prevenção. Em relação à transmissão vertical do HIV, o fato de as gestantes terem conhecimentos relacionados ao assunto poderia ter evitado a contaminação de seus filhos e, com certeza, poderia evitar futuros casos de contaminação pelo HIV e de transmissão vertical.

Para evitar a transmissão vertical do HIV é fundamental a captação precoce no pré-natal, um pré-natal de qualidade, o uso de antirretrovirais a partir da idade gestacional adequada, assim como durante o trabalho de parto e parto, suspensão da amamentação, via de parto adequada, dentre outras medidas.27 Algumas das mulheres participantes em este estúdio demonstraram ter conhecimentos sobre o assunto.

Em relação ao grau de escolaridade, as entrevistadas têm a maior escolaridade e demonstraram pesquisarem sobre o assunto e conhecerem a temática, porém tem a mesma formação e demonstraram conhecimentos com conteúdos diferentes. A mulher sabe discursar corretamente sobre o assunto transmissão vertical do HIV, tornando o fator escolaridade não determinante para avaliar conhecimento sobre o assunto.

Um estudo realizado em serviços de saúde especializados em AIDS, em São Paulo, demonstrou uma alta proporção de mulheres que não foi informada de que poderia transmitir o vírus para o bebê (25%). Além disso, 27% delas não sabiam que o vírus se transmitia durante o parto ou durante a amamentação e, 24% de que existe medicação específica para a mãe durante a gestação e para o bebê.28

A literatura a respeito de conhecimentos sobre transmissão vertical do HIV é muito restrita, podendo demonstrar pouco interesse sobre o assunto por parte dos pesquisadores. Essa situação evidencia o desinteresse em promover e avaliar as medidas de educação e saúde oferecidas a população estudada. Cabe ressaltar que, no presente estudo, as crianças em questão tinham entre 11 e 13 anos, o que pode apontar que houve uma melhora na condição de pré-natal no Município.

Dificuldades encontradas para realização das medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV. Há hoje, no Brasil, uma disponibilidade de testes e medicação profilática, porém as crianças continuam a ser infectadas. Isso se deve ao fato de que muitas mulheres chegam às maternidades sem terem frequentado o pré-natal e, ao fato da cobertura do teste para a infecção pelo HIV durante o pré-natal estar abaixo de 40% no Brasil.21

Em estudo nacional, concluiu-se que os estrangulamentos do sistema nacional de saúde estão se reproduzindo em todas as etapas do processo, desde a inclusão da gestante para o acompanhamento pré-natal até a ausência de pedido do teste sorológico para HIV e, a falta de conhecimento do resultado do teste antes do parto.29 Esse problema representa-se nas falas da uma proporção das entrevistadas.

Um dos principais fatores que dificultaram a identificação do HIV durante o pré-natal foi o não oferecimento do teste para HIV, por inadequada qualidade da informação por parte dos profissionais que realizam o pré-natal. Prevalece, ainda, o desconhecimento da recomendação de oferecer o teste para HIV a todas as gestantes. Ressalta-se a necessidade de se relativizar esse fato, pois os filhos das mulheres entrevistadas têm mais de 11 anos e, acredita-se que o sistema de saúde tenha evoluído nesses últimos anos, especialmente quanto a prevenção da AIDS.

Ainda, as condições socioeconômicas favorecem a desinformação das gestantes sobre a importância do teste e comprometem a percepção do risco da infecção pelo HIV. Destacam-se os problemas para efetivação do teste e obtenção dos resultados após a solicitação pelo profissional de saúde, por conta de disponibilidade insuficiente de exames na rede e centralização excessiva da realização da sorologia.21,27

A decisão de se fazer o teste rápido em todas as parturientes, independente de já terem feito a sorologia no pré-natal, mostra-se fundamental. As gestantes podem estar em período de janela imunológica ou mesmo terem se infectado após a realização do mesmo e perderiam a oportunidade de se enquadrar no protocolo estabelecido. Neste contexto, os novos testes rápidos para o diagnóstico da infecção pelo HIV certamente são instrumentos de grande utilidade para a redução da transmissão vertical do HIV, principalmente, devido ao fato, de que o período de maior transmissão (entre 50 e 70%) ocorre próximo ao parto ou durante o mesmo.30

Outra dificuldade levantada durante a pesquisa é ir ao serviço pelo medo de esse fato revelar o diagnóstico HIV positivo. O fato de não revelar a condição de portadora é uma saída diante dos problemas emergentes da situação de soropositividade. A preocupação com a revelação de estar infectado, muitas vezes, é auto-imposta pelo medo que o portador tem de ficar sujeito a preconceitos e estigmatização.21

A satisfação com o serviço facilita a adesão ao tratamento, facilita a educação em saúde e também fornece ao usuário maior confiança com os profissionais de saúde a fim de auxiliar a construção do tratamento.11 As principais dificuldades encontradas no estudo, para a realização das medidas de prevenção do HIV, estão de acordo com as literaturas consultadas. As mulheres entrevistadas são uma pequena parcela da população que convive com dificuldades relatadas na discussão do assunto. Dessa forma, é imprescindível uma melhor estruturação dos serviços de saúde para possibilitar a redução da transmissão vertical do HIV e uma maior adesão ao tratamento para a doença.

Percepção dos benefícios frente às medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV. Com a realização das medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV, de forma combinada, as taxas de transmissão do vírus permeiam números menores de 1%.11 O entendimento desses benefícios esteve presente em todas as entrevistas. Uma entrevistada mostrou entender os benefícios da realização das medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV se baseando em seus conhecimentos sobre o assunto, diferentemente de outras que acreditam, por terem vivenciado uma situação de sucesso dessas medidas.

Diante de poder usufruir dos benefícios e melhorias no controle da transmissão vertical do HIV, algumas mulheres expuseram o desejo de ser mãe. A mulher soropositiva quando engravida, tem o receio de transmitir o vírus HIV ao filho, possibilidade concreta durante todo período gestacional. Por outro lado, estas mulheres também têm recebido a informação de que as medidas preventivas diminuem a chance da transmissão.31 Esta informação possibilita que a mulher soropositiva manifeste mais abertamente o seu desejo de engravidar, como em nossos casos.

A infecção pelo HIV, muitas vezes, não altera a intenção das mulheres, em se ter filhos, mas os serviços não estão preparados para discutir e ajudar a mulher a fazer esta opção de forma consciente. É necessário, portanto, que receba o máximo de informações para tomar a decisão, conscientemente. A ausência de sintomas da AIDS e o uso dos medicamentos têm dado esperança às pessoas com HIV de poder cuidar dos filhos e criá-los, e, se possível, um dia, obter a cura da doença.24

Embora as escolhas reprodutivas feitas pelas mulheres possam diferir no mundo inteiro, os contextos sociais e culturais são mais determinantes que o próprio conhecimento do estado sorológico. Os fatores que afetam as decisões reprodutivas incluem: expectativas de gênero, raça, crenças religiosas, rede de suporte familiar, valor atribuído à maternidade, desejo de ter filhos, disponibilidade dos antirretrovirais e o apoio dos serviços de saúde. No Brasil, o desejo de uma mulher portadora do HIV ter filhos pode estar baseado em dois aspectos: a queda significativa no risco de transmissão materno infantil, proporcionado pelo uso dos antirretrovirais disponíveis, gratuitamente, a todos os brasileiros portadores do HIV; e, o valor atribuído pela cultura brasileira à maternidade, em especial, entre os segmentos de menor poder aquisitivo.32

A preocupação em realizar todas as medidas possíveis para evitar a transmissão vertical do HIV e também do agravamento do quadro das crianças portadores do vírus das mulheres. A possibilidade de crescer, brincar e ter uma vida saudável estimula as mães a realizarem as orientações dos profissionais de saúde para diminuir a chance da infecção na criança. O acompanhamento ao recém-nascido é uma estratégia recomendada a todas as crianças de risco, não só aos que foram expostos à transmissão vertical do HIV. O acompanhamento em ambulatório especializado é preconizado pelo Ministério da Saúde11 como uma medida importante para o recém-nascido exposto à transmissão vertical, uma vez que determina as ações a serem tomadas.

As mães vêem, como benefício da adesão aos procedimentos profiláticos, a possibilidade do filho ter um desenvolvimento saudável e normal, sendo essa percepção preponderante na adesão ao tratamento.21 A percepção dos benefícios permite uma perspectiva futura de realização das medidas de prevenção da doença em possíveis gestações futuras dessas mulheres. Sugere-se que um dos motivos possa ser a qualidade do serviço na qual elas estão realizando acompanhamento.

Ao retomar os objetivos dessa pesquisa, considera-se que estes foram alcançados. Das mulheres entrevistadas no estudo, mais da metade não realizaram as medidas de prevenção, devido a falhas no pré-natal, onde não foi solicitado o exame anti-HIV. Essa situação encontrada na pesquisa, também é relatada na literatura utilizada e evidencia o despreparo dos profissionais de saúde, demonstrando assim a necessidade de treinamento de todas as pessoas envolvidas no pré-natal.

Observou-se que o grau de escolaridade demonstrou-se importante para a percepção sobre o tema, mas não determinante sobre o conhecimento e, principalmente, sobre a vontade de aprender para manter o filho saudável. O momento do diagnóstico se revelou uma situação difícil para todas as mulheres, independente de quando aconteceu a descoberta da doença. Em relação às medidas preventivas da transmissão vertical do HIV, a maioria das mães não teve oportunidade de realizá-las, sendo a principal dificuldade para tal foi a falta de pedido de teste anti-HIV.

A preocupação com os filhos e a família se sobressaiu às dificuldades de ter HIV, e, tornar a vida de seus filhos melhor, com mais qualidade, é desejo preponderante encontrado na fala dos sujeitos da pesquisa. Todas as mulheres entrevistadas demonstraram perceber a importância e a eficácia das medidas de prevenção da transmissão perinatal do HIV e algumas expressaram o desejo de engravidar novamente. Elas relatam acreditar que com o tratamento adequado na gestação terão filhos sem HIV. Enfim, a qualidade de vida das crianças portadoras de HIV melhorou bastante devido a muitos avanços em relação à doença, porém prevenir a AIDS e a transmissão vertical do HIV são a mais eficaz e mais sabia estratégia a ser realizada.

Muitas são as medidas que devem ser utilizadas para reduzir a transmissão vertical do HIV e, dessa forma, ter-se-á propiciado à gestante todos os métodos de prevenção para que seu filho não venha a contrair HIV por via vertical. Para isso, é fundamental a educação dos profissionais da saúde e da população para que todos saibam de suas obrigações e deveres, assim como uma melhora nos atendimentos prestados pelos serviços de saúde.

 

REFERÊNCIAS

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Fecha de Recibido: 16 de junio de 2011. Fecha de Aprobado: 13 de diciembre de 2011.

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