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CES Odontología

Print version ISSN 0120-971X

CES odontol. vol.33 no.1 Medellìn Jan./June 2020

https://doi.org/10.21615/cesodon.33.1.4 

Reporte de caso

Fasceíte necrotizante de origem odontogênica na região cérvico-facial: Relato de caso.

Odontogenic cervico-facial necrotizing fasciitis. A case report

Fascitis necrosante cervical-facial originada por infección odontogénica. Reporte del caso

Klinger de Souza Amorim1 

Anne Caroline Gercina Carvalho Dantas2 

Allen Matheus da Silva Nascimento2 

Andrea Gomes Dellovo2 

Ricardo Luiz Cavalcanti de Albuquerque-Júnior3 

Liane Maciel de Almeida Souza4 

1.Doutorando na Área de Farmacologia, Anestesiologia e Terapêutica da Faculdade de Odontologia de Piracicaba FOP-UNICAMP, Piracicaba, Brasil.Email: klinger.amorim@outlook.com

2. Graduação em odontologia na Universidade Federal de Sergipe, Aracaju, Brasil. Email: annegerc@gmail.com; allen22_matheus@outlook.com; deadellovo@hotmail.com

3.Professor Dr. de Patologia Oral da Universidade Tiradentes, Aracaju, Brasil. Email: ricardo.patologia@uol.com.br

4.Professora Dra. de Anestesiologia e Cirurgia Oral da Universidade Federal de Sergipe, Aracaju, Brasil. Email: odontoliu@gmail.com


Resumo

A fasceite necrotizante é caracterizada como um subconjunto das infecções agressivas da pele e tecidos moles que causam necrose da fáscia muscular e dos tecidos subcutâneos. Tem origem polimicrobiana e apresenta extensa necrose que exibe uma formação gasosa no tecido subcutâneo e fáscia superficial. É fundamental um rápido diagnóstico, seguido de intervenção cirúrgica imediata e antibioticoterapia sistêmica para que se consiga sucesso no tratamento. O objetivo desse artigo é relatar um caso de fasceíte necrotizante em região cérvico-facial com origem odontogênica, ressaltando a importância do diagnóstico e tratamento precoce.

Palavras-chave: Fasceíte Necrotizante; Diagnóstico; Infecção

Abstract

Necrotizing fasciitis is characterized as a subset of aggressive infections of the skin and soft tissues that cause necrosis of the muscular fascia and subcutaneous tissues. It has a polymicrobial origin and presents an extensive necrosis that exhibits gas formation in the subcutaneous tissue and superficial fascia. The management of infected tissues requires rapid diagnosis, immediate surgical intervention accompanied by extensive debridement and systemic antibiotic therapy. The aim of this paper is to relate a case of an odontogenic necrotizing fasciitis of the cervico-facial region emphasizing the importance of early diagnosis and treatment.

Keywords: Necrotizing Fasciitis; Diagnosis; Infection

Resumen

La fascitis necrotizante es una infección rara y de tejidos blandos caracterizada por una infección de rápida propagación del tejido subcutáneo y, en particular, de la fascia. La fascitis necrotizante tiene un origen polimicrobiano y una necrosis extensa que exhibe formación gaseosa en el tejido subcutáneo y la fascia superficial. El manejo de los tejidos infectados requiere un diagnóstico rápido, una intervención quirúrgica inmediata acompañada de un desbridamiento prolongado y una terapia antibiótica sistémica. El objetivo de este trabajo es relatar un caso raro de fascitis necrotizante de la región cervical-fascial, haciendo hincapié en la importancia del diagnóstico y el tratamiento temprano.

Palabras clave: Fascitis Necrotizante; Diagnóstico; Infección.

Introdução

A fasceíte necrotizante (FN) pode ser caracterizada como um subconjunto das infecções agressivas da pele e tecidos moles que causam necrose da fáscia muscular e dos tecidos subcutâneos (1). Quando acomete a região de cabeça e pescoço é considerada como um tipo raro de infecção, que pode se espalhar de maneira rápida pelos tecidos moles (2).

Possuem origem polimicrobiana e extensa necrose que exibe uma formação gasosa no tecido subcutâneo e fáscia superficial (2). As bactérias patogênicas envolvidas geralmente são as espécies Streptococcus e Staphylococcus, especialmente, o grupo β- hemolítico (Streptococcus pyogenes) (3).

Para obter-se obter sucesso no tratamento desse tipo de infecção é fundamental um rápido diagnóstico, acompanhado de uma intervenção cirúrgica agressiva e antibioticoterapia sistêmica. Caso esse tratamento não seja instituído de maneira precoce, há uma possibilidade alta de choque séptico, insuficiência múltipla de órgãos e até mesmo óbito (2-5). Cirugies bucomaxilofaciais podem se deparar com casos de fasceíte necrotizante, em sua rotina, pois a infecção de origem odontogênica uma das etiologias mais comuns associadas a ocorrência de fasce te necrotizante em régio cervical (6).

Este artigo tem como objetivo relatar um caso raro de fasceíte necrotizante na região cérvico-facial de origem odontogênica, descrever a evolução e pós-tratamento dessa infecção, ressaltando a importância do diagnóstico e tratamento precoce.

Relato de Caso

Paciente do gênero feminino, 19 anos, leucoderma deu entrada no Hospital Dr. Pedro Garcia Moreno Filho em Itabaiana-SE com histórico de infecção odontogênica. A priori, havia sido atendida em um serviço onde não havia cirurgião bucomaxilofacial, no qual foi apenas prescito o tratamento somente medicamentoso, com Amoxicilina 500mg e anti-inflamatório Diclofenaco de sódio 50mg, ambos por via oral a cada 8 h. Entretanto, nenhuma intervenção havia sido realizada, tendo por consequência uma evolução negativa do quadro.

Ao exame clínico, observou-se extensa lesão necrótica com excreção purulenta na região submandibular esquerda, de odor fétido, com destruição de fáscia muscular (figura 1). No exame radiográfico panorâmico, observou-se, extensa lesão cariosa na unidade 37 e a unidade 38 inclusa (figura 2). Apresentava desidratação, letargia, dor intensa, apatia, febre, edema, disfagia e linfadenopatia. Nos exames laboratoriais amesma apresentava leucocitose (22.000 leucócitos), níveis de sódio, ureia e creatinina aumentados, glicemia dentro dos padrões de normalidade e sorologia para HIV negativa.

Figura 1 Extensa área necrótica expondo fibras musculares com excreção purulenta em região submandibular esquerda 

Figura 2 Radiografia panorâmica apresentando extensa lesão cariosa nas unidades 37 e 47 e presença das unidades 38 e 48 inclusas 

Fechou-se o diagnóstico de fasceíte necrotizante e a paciente foi internada e submetida à abordagem cirúrgica para a remoção das unidades 37, 38 (associadas a lesão necrótica), 47 e 48 (figura 3), visto que os segundos molares inferiores apresentavam lesões cariosas, sendo foco de infecção e os terceiros molares inferiores estavam em comunicação com o espaço infectado. Além disso, foi realizado o desbridamento da lesão (figura 4). Foi instituído o seguinte esquema terapêutico: hidratação com 2500 ml de soro glico fisiológico, antibioticoterapia com Ceftriaxona sódica 1g intravenosa (IV) 12/12horas e Metronidazol IV 500mg 8h/8horas, controle álgico com Tramadol 100mg diluído em 100ml de soro fisiológico 0,9%, IV de 12/12h, suplementação vitamínica com vitamina B e vitamina C diluída em 250ml de soro fisiológico de 12/12h, curativos com sufadiazina de prata três vezes ao dia e controle da febre com antipirético dipirona 1g diluido em água destilada IV de 6/6h.

Figura 3 Unidades 37, 38, 47 e 48 após abordagem cirúrgica. 

Figura 4 Desbridamento cirúrgico da lesão. 

Ao oitavo dia teve alta hospitalar com resolução do processo infeccioso e presença de tecido cicatricial na região da lesão (figura 5), foi orientada quanto a realização de curativos diários com Sulfadiazina de prata duas vezes ao dia e retorno após 1 mês. Após retorno, verificou-se o fechamento da lesão e bom aspecto cicatricial (figura 6).

Figura 5 Oitavo dia de pós-operatório com presença de tecido cicatricial na região da necrose anterior. 

Figura 6 Um mês de pós-operatório com fechamento da área anteriormente necrosada. 

Discussão

A fasceíte necrotizante requer um tratamento multidisciplinar e dividido em etapas condicionadas à resposta individual, à infecção e aos tratamentos propostos, sendo fundamental a abordagem de uma equipe com experiência em cuidados intensivos (7). Este, consiste basicamente em internação hospitalar, seguida de antibioticoterapia sistêmica, debridamento cirúrgico radical, monitoramento constante, suporte eletrolítico, manutenção das vias aéreas e remoção do foco infeccioso, assim que possível (8).

Quando se suspeita ou o diagnóstico de FN é fechado, o paciente deve ser internado e ter sinais vitais monitorados. A manutenção das vias aéreas é fundamental, pois a FN pode produzir edema e necrose na região cervical (9,10).

A exploração cirúrgica também é indicada nesses casos, devido à alta possibilidade de septicemia potencialmente fatal. Por conta disso, toda a fascia necrótica, músculos, bem como a pele subjacente, devem ser excisados. Geralmente as feridas não devem ser fechadas, e um dreno pode ser utilizado para facilitar uma necessidade futura de re-exploração (7). Em caso de propagação da infecção, mesmo após o debridamento inicial, o paciente deverá retornar à sala de cirurgias quantas vezes forem necessárias para mais debridamentos cirúrgicos. O recobrimento do tecido exposto, contudo, somente poderá ser realizado, quando não mais houver sinais de infecção, e assim que os parâmetros clínicos e laboratoriais estiverem normalizados (11). No presente caso, foi realizada a remoção da causa e desbridamento da zona necrótica, a cicatrização ocorreu por segunda intenção não necessitando de enxertia posterior ao controle da infecção.

A seleção inicial de antibióticos deve ser baseada na necessidade de abordar uma infecção de natureza polimicrobiana. Se a FN é suspeita, então uma combinação de antibióticos de amplo deve ser selecionada. A terapia antibiótica deve ser precocemente instituída. A droga de primeira escolha geralmente é a penicilina endovenosa.Entretanto, alguns casos requerem esquemas de combinações de antibióticos, compostos por penicilina resistente à penicilinase/meticilinase, aminoglicosídio, ou uma cefalosporina de terceira geração e para bactérias gram-negativas anaeróbias, é recomendada cobertura com Clindamicina ou Metronidazol (12-14) A terapia antibiótica de escolha para o caso foi uma cefalosporina de 3ª geração juntamente com metronidazol.

O cuidado com o suporte nutricional do paciente com fasceite necrotizante é extremamente importante e deve ser iniciado precocemente. Para o cálculo calórico, deve-se considerar o fato de que esses pacientes terão um aumento nas demandas de calorias e proteínas devido o seu estado hipermetabólico e da ferida que se encontra aberta. Para isso, as vitaminas A, C e B devem ser incluídas na dieta destes pacientes para facilitar o processo de cicatrização (7,15).

Os curativos também representam uma importante etapa no tratamento final. A cicatrização através do meio úmido previne a desidratação do tecido, acelera a angiogênese, estimula a epitelização e a formação de tecido de granulação, facilita a remoção de tecido necrótico e fibrina, e serve como uma barreira antimicrobiana. O curativo com sulfadiazina de prata age diretamente na membrana citoplasmática da célula bacteriana, exercendo ação bactericida imediata, e ação bacteriostática residual (16). A paciente foi orientada a realizar o curativo com sulfadiazina de prata duas vezes ao dia.

Considerações Finais

Excepcionalmente, as infecções orais podem culminar em quadros graves e potencialmente fatais como a fasceíte necrotizante. A evolução dessa condição é rápida, principalmente, quando associada a fatores predisponentes. Assim, o adequado tratamento deve contemplar o diagnóstico precoce, a antibioticoterapia de largo espectro e a intervenção cirúrgica, uma vez que a remoção da causa pode determinar o controle da infecção.

Referências

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Forma de citar: Amorim KS, Dantas ACGC, Nascimento AMS, Dellovo AG, Albuquerque-Júnior RLC, Souza LMA. Fasceíte necrotizante em região cérvico-facial de origem odontogênica: Relato de caso. Rev. CES Odont 2020; 33(1): 30-36.

Recebido: Agosto de 2018; Aceito: Dezembro de 2019

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