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Cuadernos de Geografía: Revista Colombiana de Geografía

Print version ISSN 0121-215XOn-line version ISSN 2256-5442

Cuad. Geogr. Rev. Colomb. Geogr. vol.31 no.1 Bogotá Jan./June 2022  Epub Sep 06, 2022

https://doi.org/10.15446/rcdg.v31n1.85644 

Artigos

Método de geomorphon aplicado à Antártica: identificação de formas de relevo paraglaciais de macro e meso-escala. Ilha Rei George, Ilhas Shetlands do Sul

Geomorphon Method Applied to Antártica: Identification of Paraglacial Relief Forms of Macro and Meso-Scale, King George Island, South Shetlands Islands

Método de geomorphon aplicados a la Antártica: identificación de formas de relieve paraglacial de macro y meso escala, Isla Rey Jorge, Islas Shetland del Sur

*Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria - Brasil. carinapetsch@gmail.com - ORCID: 0000-0002-1079-0080.

+Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre - Brasil. cleivaperondi@gmail.com - ORCID: 0000-0003-2202-2721.

°Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre - Brasil. katiakellem@gmail.com - ORCID: 0000-0003-0977-9658.

ΔUniversidade Federal Fluminense, Niterói - Brasil. rosemaryvieira@id.uff.br - ORCID: 0000-0003-0312-2890.

Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria - Brasil. lesrobaina@yahoo.com.br - ORCID: 0000-0002-2390-6417.

Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria - Brasil. romario.trentin@gmail.com - ORCID: 0000-0002-0615-2801.


Resumo

Com a retração de geleiras na Antártica marítima, e os cenários de mudanças climáticas, faz-se necessário compreender os processos geomorfológicos atuantes nessas áreas recentemente expostas. O artigo apresenta o Método de Geomorphon aplicado à Antártica (Geomorphon Method aplicado à Antártica - em diante ОМА) voltado ao mapeamento de formas de relevo nas áreas livres de gelo da Ilha Rei George. A avaliação da classificação foi realizada com base na interpretação dos MDE e nos trabalhos de campo realizados em 2015 e 20i6. Os elementos de relevo identificados pelo GMA foram relacionados com as formas erosivas e deposicionais por um lado de macro escala de gênese glacial, como vales, aretês, horns, e por outro lado de meso escala como canais glaciofluviais, morainas de avanço e de recessão, e ainda as de gênese paraglacial e marinha. Morainas de avanço frontais foram identificadas em todas as áreas, com exceção do sistema paraglacial da geleira Ecology, e juntamente com os vales em u mapeados, indicam a antiga direção de fluxo das geleiras, e locais onde havia maior espessura de gelo. A identificação dessas formas contribui para estudos que avaliam a sucessão de mudanças na paisagem com a recente retração dos sistemas glaciais, comprovando a potencialidade do GMA.

Ideias destacadas:

Artigo de pesquisa sobre o mapeamento automático de formas de relevo de origem glacial, marinha e paraglacial, a partir do método inovador chamado Geomorphon Method aplicado à Antártica para as áreas livres de gelo da Ilha Rei George, Ilhas Shetlands do Sul.

Palavras-chave: classificação automática; geomorfologia glacial; Ilhas Shetland do Sul; modelos digitais de elevação; processos paraglaciais

Abstract

With the retraction of glaciers in maritime Antártica, and the climate change scenarios, it is necessary to understand the geomorphological processes at work in these recently exposed areas. The purpose of the article is to present the Geomorphon Method for Antártica (Geomorphon Method Revised to Antártica-GMA) applied to the mapping of landforms in the ice-free areas of King George Island. The classification evaluation was carried out based on the interpretation of the MDE and on the field work carried out in 2015 and 2016. The relief elements identified by the GMA were related to the erosive and depositional forms of the glacial genesis macro scale, as valleys, aretes, horns and meso-scale, such as glaciofluvial channels, moraines of advance and recession, and even those of paraglacial and marine genesis. Frontal advancing moraines were identified in all areas, except for the Ecology glacier paraglacial system, and together with the mapped U-valleys, they indicate the old direction of flow of the glaciers, and places where there was greater thickness of ice. The identification of these forms contributes to studies that evaluate the succession of changes in the landscape with the recent retraction of glacial systems, proving the potential of GMA.

Main ideas:

Research article on the automatic mapping of landforms of glacial, marine and paraglacial origin, using the innovative method called Geomorphon Method Applied to Antártica, in the ice-free areas of the King George Island, South Shetlands Islands.

Keywords: automatic classification; glacial geomorphology; South Shetland Islands; digital elevation models; paraglacial processes

Resumen

Con el retroceso de los glaciares en la Antártica marítima y los escenarios de cambio climático, es necesario comprender los procesos geomorfológicos que actúan en estas áreas recientemente expuestas. El propósito del artículo es presentar el Método geomorphon aplicado a la Antártica (Método Geomorphon aplicado a Antártica-MGA), para el mapeo de las formas de relieve en las áreas libres de hielo de la Isla Rey Jorge. La evaluación de la clasificación se realizó con base en la interpretación de MDE y algunos trabajos de campo realizados en los anos 2015 y 2016. Los elementos del relieve identificados por el MGA se relacionaron con las formas erosivas y depositacionales de génesis glacial, por una parte, de macro escala como valles, crestas, picos y, por otra, de mesoescala, como canales fluvio glaciales, morrenas de avance y de retroceso, así como los de génesis paraglacial y litoral. Se identificaron morrenas frontales que avanzan en todas las áreas, a excepción del sistema paraglacial del glaciar Ecology que, junto con los valles en U mapeados, indican la antigua dirección del flujo de los glaciares y los lugares donde había mayor espesor de hielo. La identificación de estas formas es una contribución para los estudios que evalúan la sucesión de cambios en el paisaje, relacionados con el retroceso reciente de los sistemas glaciares, lo que demuestra el potencial de MGA.

Ideas destacadas:

Artículo de investigación sobre el mapeo automático de los accidentes geográficos de origen glacial, marino y paraglacial, utilizando el método innovador llamado Método geomorphon aplicado a la Antártica en las áreas libres de hielo de la Isla Rey Jorge, Islas Shetlands del Sur.

Palabras clave: clasificación automática; geomorfología glacial; Islas Shetland del Sur; modelos digitales de elevación; procesos paraglaciales

Introdução

O mapeamento geomorfológico glacial permite compreender os processos que ocorrem superficialmente e que registram a evolução da paisagem (Otto e Smith 2013), além disso, pode contribuir para a compreensão dos impactos, tendências e taxas de mudança climática (Bauder, Funk e Huss 2007; Slaymaker 2009; Lopez-Martinez et al. 2016). As formas de relevo erosivas e deposicionais expostas nas áreas livres de gelo constituem registros do padrão de deglaciação, espessura, velocidade e da direção de fluxo de gelo (Ballantyne, 2002; Napieralski, Harbor e Li 2007; Benn e Evans 2010). Nesse sentido, o mapeamento automático de formas de relevo glaciais pode contribuir para o entendimento do padrão de retração de geleiras e contribuir no monitoramento futuro, frente aos cenários de retração de alguns sistemas glaciais (Rückamp et al. 2011).

Embora alguns estudos já tenham utilizado métodos automáticos de classificação de imagens de satélite e modelos digitais de elevação - em diante MDE, para o mapeamento das formas de relevo glaciais (Napieralski, Harbor e Li 2007; Eisank, Smith e Hillier 2014; Robb et al. 2015; Yu, Eyles e Sookhan 2015), não foram encontrados projetos que empregassem o método de elementos de geomorphon para ambientes glaciais. O método, desenvolvido por Jasiewicz e Stepinski (2013), utiliza uma técnica de similaridade textural do MDE que apresenta uma variação de níveis de cinza em relação as células vizinhas. Para este cálculo, os perfis são definidos para as direções principais da célula central lookup distance L extraída de MDE.

A disponibilidade dos MDE, bem como o rápido avanço no campo da tecnologia de Sistemas de Informação Geográfica, oferece novas oportunidades na análise do relevo (Cheng et al. 2004). A avaliação e entendimento da origem das formas é relevante para os estudos ambientais (Cuffey et al. 2000, Stokes e Clark 2003), sendo que os produtos de análise do relevo podem auxiliar na investigação de mudanças morfométricas na paisagem glacial ao longo do tempo (Rosa et al. 2014). Para a Antártica, a qualidade dos MDE tem aumentado, permitindo análises geomorfológicas mais detalhadas. Geralmente, a maioria das experiências indica que as resoluções de pixel entre 5 m e 30 m são mais adequadas para classificações de relevo (Zhang et al. 1994; Kienzle et al. 2004).

O TanDEM-X (TerraSAR-X add-on for Digital Elevation Measurements) está relacionado a uma missão realizada pelos satélites gêmeos TerraSAR-X e TanDEM-X. O TerraSAR-X foi lançado em junho de 2007 e o TanDEM-X em junho de 2010 (Gruber et al. 2012). O REMA (Reference Elevation Model of Antarctic) é construído a partir de centenas de modelos digitais de elevação estereoscópicos extraídos de pares de imagens de satélite WorldView-1, WorldView-2, WorldView-3, e um pequeno número de produtos GeoEye-1, adquiridas entre 2009 e 2017 (Howat et al. 2019). Ambos MDE estão disponíveis para a região subantártica.

Para algumas das áreas livres de gelo da Ilha Rei George -em diante IRG, vários autores realizaram o mapeamento geomorfológico das formas de relevo glaciais por Sensoriamento Remoto (Rosa et al. 2011; Andrade 2013; Rosa et al. 2013; Lopez-Martinez et al. 2016; Kramm et al. 2017; Bonada, Rosa, e Andrade 2018; Petsch et al. 2019a; Perondi, Rosa e Vieira 2019), mas sem a aplicação de métodos automáticos como a classificação de MDE, o que possibilitaria os estudos comparativos da evolução da paisagem paraglacial.

Este artigo apresenta a potencialidade do método de identificação de elementos de relevo denominado geomorphon, através de um método inovador chamado Geomorphon Method aplicado à Antártica. O mapeamento foi gerado para as áreas livres de gelo da IRG e os MDE utilizados foram o TanDEM-X e do REMA e quanto ao detalhe de informações, o estudo objetivou classificar feições de macro e meso-escala.

Caracterização da área

A Ilha Rei George é a maior do arquipélago das Ilhas Shetlands do Sul, localizada no extremo norte da Península Antártica, com área total de aproximadamente 1.250 km2, dos quais mais de 90 % estão cobertos por neve (Osmanoglu et al. 2013), e está dividida em vários domos de gelo conectados (Simões et al. 1999).

Rückamp e Blindow (2012) apontam para uma espessura média do gelo de aproximadamente 240 m, com valor máximo de 422 m, e a elevação máxima é de 720 m acima do nível do mar na porção central da ilha (Rückamp et al. 2011).

A geomorfologia das áreas livres de gelo da IRG inclui diversas formas de relevo características de sistemas pa-raglaciais ativos. Rosa et al. (2011) utilizaram uma metodologia baseada na análise de campo e interpretação visual de imagens Quickbird para realizar o mapeamento de feições erosivas e deposicionais glaciais da área proglacial da geleira Wanda. Rosa et al. (2013), Andrade (2013) e Bonada, Rosa, e Andrade (2018) também utilizaram imagens QuickBird, porém associando a imagens COSMO SkyMed, para identificar visualmente as formas de relevo glaciolacustres, glaciofluviais e marginais ao gelo nas zonas proglaciais das geleiras Wanda, Professor, Dragon, Ecology e Polar Club. Lopez-Martinez et al. (2016) identificaram formas de relevo para várias áreas livres de gelo das Shetlands do Sul utilizando dados de campo e imagens RADARSAT 2. Também foram utilizados parâmetros geomorfométricos, por exemplo, declividade e curvatura de MDE para classificação de formas de relevo (Kramm et al. 2017). Perondi, Rosa, e Vieira (2019) utilizaram imagens Sentinel 2 e WorldView-2 e o MDE TanDEM-x para realizar o mapeamento de formas de relevo glaciais de meso-escala da área livre de gelo do campo Warzawa pela identificação visual. O GMA foi aplicado para as áreas livres de gelo da península Fildes, Potter, Barton e do campo de gelo Warszawa (Figura 1).

Dados: elaborado a partir da base do QuAntártica (Gerrish, Fretwell, e Cooper 2020).

Figura 1 Localização da Ilha Rei George, Antártica e áreas livres de gelo mapeadas. 

Andrade (2013) e Bonada, Rosa, e Andrade (2018) mapearam a localização de praias elevadas na península Potter, e Petsch et al (2019a) mapeou a localização de vales deglaciarizados, morainas de avanço e de recessão na Península Fildes. As formas de relevo identificadas revelam o contexto paloeclimático local. De acordo com Sudgen e Lapperton (1986) e John (1972), a deglacia-ção das Ilhas Shetland do Sul começou antes de 10 mil anos Antes do Presente -em diante AP. Por volta de 9 mil anos AP, as geleiras retraíram para as porções mais altas e deixaram pequenos fiordes gerados por fluxos tributários e porções terrestres da IRG começaram a se tornar áreas livres de gelo (Mäusbacher et al. 1989). Os autores ainda propõem que houve uma deglaciação por volta de 10 mil anos AP, um reavanço por volta de 7 mil AP e uma maior deglaciação entre 6000-5000 anos AP. A diminuição do volume de gelo e a elevação isostática regional da porção continental durante o Holoceno permitiram a formação progressiva de séries de praias elevadas em áreas costeiras da península Fildes, localizadas em elevações inferiores a 20 m. É comum encontrar uma sequência de três a oito praias sendo mais desenvolvidas na costa leste onde a erosão marinha não é tão forte (Vale, Montalti e Inbar 2002; Watcham et al. 2011; Michel et al. 2014). Quanto à idade de sua formação, as praias holocênicas datam de aproximadamente 7.300 anos na linha de 6 m de altitude (John 1972). Contudo, Barsch e Mäusbacher (1986) ressaltam que todas as praias holocênicas, situadas entre a linha de costa atual e 20 m de elevação, foram formadas durante os últimos 6000 anos.

O clima é do tipo marítimo e relativamente ameno, com baixa variabilidade anual das temperaturas médias do ar (Smith et al. 1996). Destaca-se que entre 1981 e 2010, a estação Antártica Bellingshausen apresentou a maior temperatura média anual na PA (Turner et al. 2020). Quanto a precipitação na ilha, esta se caracteriza pela alta variabilidade anual, com uma média de 701,3 mm (1968-2011) (Kejna, Arazny e Sobota 2013). Os ventos provenientes de noroeste e oeste são mais frequentes, alcançam as velocidades mais altas e são relativamente quentes (Rakusa-Suszczewski et al. 1993).

A tundra mal desenvolvida compreende grande parte da vegetação da área de estudo e consistem quase exclusivamente em criptógamas, líquens e musgos (Olech 2001). Segundo Petsch et al (2019b) a vegetação de musgos se fixa principalmente nas porções de fundo dos vales em u, onde predominam sedimentos finos e aporte de água líquida. De acordo com Michel et al. (2014), os solos da península Fildes são bem desenvolvidos para padrões antárticos, sendo os criossolos dominantes relacionados a crioturbação e processos da camada ativa.

Metodologia

Dados

O MDE TanDEM-x foi processado por interferometria, referenciadas e validadas com base em medidas DGPS e fornecido por Braun, Betsch, e Seehaus (2016), com resolução espacial de 12 m, para toda a IRG a partir de imagens TanDEM-x, de janeiro de 2012. Como base, o MDE TanDEM-x, fornecido pela DLR, possui um erro vertical relativo global de <2 m para áreas de baixa declividade e de 4 m para as áreas de alta declividade (Rizzoli et al. 2017; Wessel et al. 2018).

O REMA (Reference Elevation Model of Antártica) é construído a partir de imagens de satélite Digital Globe adquirido entre 2009 e 2017, sendo a maioria adquirida em 2015 e 2016, durante as temporadas de verão austrais (principalmente dezembro a março) (Howat et al. 2019). O MDE REMA 8 (Howat et al. 2019), possui uma resolução espacial de 8,8 m e um erro vertical relativo global de 0,6 m (Tabela 1).

Tabela 1 Caracterização dos MDE utilizados para aplicação do método de delimitação de elementos de geomorphon 

Sensor Resolução espacial (m) Acurácia vertical (m) Fonte
TANDEM-X 12 2-4 Braun, Betsch, e Seehaus (2016)
REMA 8 8,8 0,6 Howat et al. (2019)

Metodologia

A metodologia utilizada na classificação de geomo-porphon foi baseada em Jasiewicz e Stepinski (2013). Os autores utilizaram a similaridade textural do MDE que apresentou a variação de níveis de cinza em relação às células vizinhas. Para este cálculo, os perfis são definidos para as direções principais da célula central look up distance L extraída do MDE. Foram utilizados dois MDE: TanDEM-X e REMA 8. Ressalta-se que o processamento do MDE foi realizado no http://sil.uc.edu/geom/app. As formas de relevo classificadas são (Figura 2): plano (fiat), pico (peak), crista (ridge), ressaltos (shoulder), crista secundária (spur), encosta (slope), escavado (hollow), base de encosta (footslope), vales (valley) e fosso (pit). O método de identificação dos geomorphon (Jasiewicz e Stepinski, 2013) foi aplicado para as quatro áreas livres de gelo: nas penínsulas Fildes, Potter, Barton e na área livre de gelo em frente ao campo de gelo Warszawa.

Com base na interpretação dos MDE e nos trabalhos de campo, realizados em 2007, 2015, 2016 e 2019, é proposto um mapeamento pelo método de classificação de formas de relevo GMA para as condições dos sistemas paraglaciais. Foi realizada a classificação semi-automática para feições de relevo erosivas e deposicionais de macro e meso escala (maior que 3 m de extensão) presentes em sistemas para-glaciais. O método envolve a reclassificação do resultado da aplicação do método de geomorphon e a aplicação de critérios no processamento digital para obter o mapeamento geomorfológico glacial das áreas livres de gelo. Os trabalhos de campo foram realizados com auxílio da Marinha Brasileira durante as Operantares XXXIV e XXXV, em projeto do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia da Criosfera1. As classes foram adaptadas da seguinte forma (veja a figura 2): plano (planícies glaciofluviais provenientes da retração da geleira ou de derretimento da neve), pico (horns), crista (abrange as classes de arêtes, morainas e plataformas marinhas), ressaltos (plataformas marinhas), crista secundária (arêtes), encosta (encostas), escavado (vales em circo), base de encosta (praias elevadas), vales (vales em u), e fosso (depressão). Foram utilizadas variáveis morfométricas de declividade, exposição da vertente, direção de fluxo, área de acumulação de água e distância da geleira para a classificação digital (veja a figura 2).

Fonte: modificado de Jasiewicz e Stepinski (2013, 150).

Nota: foram adaptadas para formas encontradas nas áreas livres de gelo da Ilha Rei George, que são resultantes dos processos erosivos e de deposição dos domos de gelo.

Figura 2 As classes do método geomorphon. 

Resultados

Os elementos de relevo identificados pela metodologia de geomorphon foram relacionados com as formas erosivas e deposicionais de macro escala de gênese glacial como vales, aretês, horns, e de meso escala como canais glaciofluviais, morainas de avanço e de recessão (Tabela 2), e ainda as de gênese paraglacial (encosta ou tálus) e marinha.

As áreas de planícies glaciofluviais não foram identificadas em todas as áreas, visto que se trata de outra escala de análise, a micro. As áreas de picos foram reclassificadas como sendo de horns, estruturas que se apresentam com formato triangular, resultante do processo de intemperismo físico e fraturamento de rochas em três faces. Os picos também ocupam uma área reduzida, menos de 5 %. A forma identificada com o método geomorphon, classificada como sendo crista, pôde ser subdivida em arêtes, morainas e plataformas marinhas. Essas três formas apresentam disposição espacial similar, e sua diferenciação foi obtida utilizando os parâmetros de declividade e proximidade da geleira. As morainas devido a essa divergência entre as classes, foram identificadas segundo um critério de distância da linha de frente da geleira, sendo de 100 m. As áreas de ressalto também se configuram no terreno como sendo de antigas plataformas marinhas. As cristas secundárias caracterizam áreas de arêtes, porém com menor declividade em relação às cristas.

As encostas representam os depósitos de tálus (detrítico) correspondem a áreas de declividade entre 5 % e 15 % e ocupam áreas de vertentes entre formas de vales e cristas/arêtes. As áreas de escavados formam no relevo glacial os vales de circo, associadas a erosão de massas de gelo menores, abrigadas nas paredes de um afloramento rochoso. As bases de encosta do método original correspondem às praias elevadas na IRG, outra forma de deposição ligada à momentos de elevação do terreno por glacioeustasia. Os vales em u ocupam cerca de 13 % da área mapeada.

Aplicação do método de geomorphon utilizando os MDE Tan DEM-X e REMA

Os resultados são apresentados para cada uma das áreas livres de gelo mapeadas. Ressalta-se que o método GMA foi aplicado a dois diferentes MDE para analizar sua eficiencia em produtos de diferente escala vertical. Nos mapas as planícies glaciofluviais são abreviadas PG: horns (Н), arêtes (A), morainas (M), plataformas marinhas (PM), arêtes (AR), encostas (E), vales em circo (VC), praias elevadas (PE), vales em u (vu) e depressão (D).

Tabela 2: Formas classificadas com o método geomorphon, proposta de reclassificação do GMA e indicativo ambiental da presença dessas feições 

A península Potter se caracteriza por apresentar a altitude entre 0 m e 200 m com as maiores declividades (acima de 20 %) localizadas na porção central. Comparando a classificação de geomorphon obtidas com os MDE TanDEM-X e REMA, verifica-se que para a classe planícies glaciofluviais o primeiro MDE não identificou essas áreas, e para o segundo 1 % da área foi classificada como sendo pertencente a essa classe; para a forma horns a porcentagem de área classificada foi 1 % e 1 %, para o TanDEM-X e REMA, respectivamente; para a classe arêtes a porcentagem classificada foi de 1 % e 2 %; para a classe de morainas a porcentagem representada foi de 9 % e de 11 %; para a classe plataformas marinhas, o TanDEM-X permitiu classificação de 2 % da área e o REMA não identificou a feição; na classe arêtes a porcentagem representada referente a essa classe foi de 29 % e de 27 % para cada um dos MDE; para a classe encostas foi identificado 33 % e 32 % da área como sendo pertencente a esta forma; para a classe vales em circo a identificação foi de 11 % e de 13 %, para os MDE TanDEM-X e REMA, respectivamente; para a classe praias elevadas foi identificada 1 % e 1 % da área; para a classe vales em v a porcentagem classificada como sendo dessa classe foi de 11 % e de 13 %; e para a classe lagos a área identificada foi de 0 % e de 1 % (Figura 3).

Dados: elaborado a partir de imagem SRTMGL1.

Figura 3 A mostra a aplicação do método de geomorphon para a península Potter, utilizando o MDE do TanDEM-x; В demonstra a aplicação do método GMA com o MDE REMA. 

Na península Fildes (Figura 4) as principais áreas de maior elevação são dois planaltos vulcânicas, a Meseta Sul com 167 m de elevação no promontório Schenke e a Meseta Norte com 155 m no pico São Francisco (Mora et al. 2017) e duas áreas de erosão e deposição localizadas na porção central, separadas por um pico rochoso. A declividade varia entre 0 % e 75 %, com os maiores valores presentes nas paredes das mesetas norte e sul.

Dados: elaborado a partir de imagem srtmgl1.

Fotografias de Petsch, fevereiro de 2015.

Figura 4 a demonstra o mapeamento com o gma para a península Fildes, utilizando o mde Tandem-x; b indica a classificaçao das formas de relevo com o mde rema. 

Quanto a caracterização das formas utilizando o método GMA, a forma "planícies glaciofluviais" foi classificada somente no MDE REMA com 1 %; a classe de horns foi representada como sendo 4 % da área para o MDE TanDEM-X e 3 % para o REMA; a forma de arête foi representada com a porcentagem de 8 % e 7 %, respectivamente para os MDE TanDEM-X e REMA; a classe de morainas foi representada com a porcentagem de 3 % e de 4 %; a classe de plataformas marinhas foi identificada com 9 % e 6 % para os dois MDE, respectivamente; a forma de arêtes foi classificada com porcentagem de 23 % e de 20 %; a classe de encostas foram representadas como sendo de 17 % e de 23 % da área; a forma de vales em circo refere-se à 21 % e 17 % da área, para os MDE TanDEM-X e REMA, respectivamente; as praias elevadas foram representadas como sendo de 3 % e de 2 % da área; as formas de vales em u correspondem a 12 % e 13 % da península Fildes; a classe de lagos e alagados foram identificadas somente no MDE REMA com 4 % (Figura 4). As fotografias 1, 2 e 3 (Figura 4) demonstram um vale em u, área de escavado e um vale em u com arête, respectivamente.

A península Barton apresenta altitude entre 0 m e 260 m, sendo os pontos mais altos próximos à geleira. A declividade predominante ocorre entre 0 % y 20 %, chegando a pontos de 75 %. A classe de planícies glaciofluviais corresponde a 1 % utilizando o GMA para o MDE REMA. O MDE TanDEM-X não identificou essa feição; a classe de horns foi identificada com 3 % e 2 % da área com os MDE TanDEM-x e REMA, respectivamente; para a feição de arêtes a porcentagem identificada foi de 3 % e de 2 %; as morainas foram representadas com 8 % e 6 % da área; a classe de plataformas marinhas corresponde a 2 % na classificação utilizando o MDE TanDEM-x. O MDE REMA não identificou essa feição; os arêtes correspondem a 21 % e 20 % da área; para a forma de encostas a porcentagem mapeada foi de 28 % e de 37 %; a classe de vales em circo corresponde a 17 % e 16 % da península Barton; a forma de praias elevadas corresponde a 4 % e 3 % da área; os vales em u ocupam 5 % e 12 % da área, respectivamente para a classificação com os MDES TanDEM-X e REMA, respectivamente; os lagos e alagados foram identificados como sendo 3 % e 1 % da área (Figura 5).

Dados: elaborado a partir de imagem SRTMGL1.

Nota: fotografias de Petsch, fevereiro de 2015.

Figura 5 A mapeamento com GMA realizado para a área da península Barton, utilizando o MDE TanDEM-X; В demonstra o mapeamento realizado com o método geomorphon utilizando o MDE REMA. 

A área livre de gelo entre a geleira Ecology (Figura 6) e o mar apresenta altitudes entre 0 m e 210 m. A de-clividade predominante é de 12 %. A classe de planícies glaciofluviais não foi identificada na classificação GMA para os MDES TanDEM-x e REMA; as formas de horns correspondem a 1 % e 1 % da área mapeada; a classe de arêtes possui a porcentagem de 1 % e 1 % considerando os MDE TanDEM-x e REMA, respectivamente; a forma de morainas foi representada com 12 % e 17 % de porcentagem da área; as formas de plataformas marinhas foram identificadas pelo MDE TanDEM-X com 2 % da área; para a classe de arêtes as áreas classificadas foram de 15 % e 16 %; a forma de relevo de encostas corresponde a 35 % e 34 % da área classificada, respectivamente para os MDE TanDEM-X e REMA; os vales em circo correspondem a 15 % e 9 % da área mapeada; a classe de praias elevadas possui a porcentagem de 5 % e 2 % na classificação; a forma de vales em u possui 13 % e 11 % da área mapeada; a classe de lagos e alagados possui 3 % e 7 % da área de classificação.

Dados: elaborado a partir de imagem SRTMGL1.

Nota: fotografias de Petsch, fevereiro de 2015.

Figura 6 A demonstra o mapeamento de formas utilizando o MDE TANDEM na Península Warszawa; В indica o mapa de formas de relevo com o MDE REMA. 

Discussões

Península Potter

A classificação para a península Potter demonstra uma diversidade de formas glaciais erosivas e deposicionais, além de uma rede de drenagem glaciofluvial, fluvial e glaciolacustre inseridas nos vales. O método GMA, limitado aos MDE utilizados, somente detectaram os vales fluviais e vales glaciais mais profundos e estreitos. Foi classificada somente uma área de planície glaciofluvial próxima a um lago proglacial, utilizando o MDE REMA. Estas feições, existentes também na porção sudeste e sudoeste, conforme registradas por Bonada, Rosa, e Andrade (2018), não foram identificadas GMA. Nesta área, o método classificou erroneamente como vale em u, pois as planícies estão inseridas junto ao talvegue de vales fluviais e mais amplos.

A classe de picos se refere a horns ou picos de montes rochosos de gênese vulcânica na área de estudo. O afloramento rochoso Three Brothers também foi caracterizado como sendo área de crista. A classe de cristas não está relacionada a arêtes, sendo que estes não estão presentes na área de estudo, mas principalmente se referem a cordões morâinicos latero-frontais extensos (mais de 3 metros de comprimento e mais de 1 metro de elevação) e formados pela deposição de sedimentos durante o avanço da geleira. Provavelmente, as morainas demarcam cronologicamente, a maior extensão em área da geleira, durante a Pequena Idade do Gelo -em diante PIG, e estão formadas sob áreas rochosas. Estas feições foram melhor identificadas do MDE TanDEM-X.

Cristas morainas de recessão, com depósitos descontínuos na área de estudo, somente foram identificadas na classificação a partir do REMA (na classe arêtes), e aquelas feições que ocorrem na porção central marginal ao gelo, onde atuam no represamento de grandes lagos proglaciais. A classificação com o MDE TanDEM-X apresentou erros ao delimitar morainas de recessão da zona proglacial marginal da geleira Polar Club, identificando nesta área as classes de plataformas marinhas e praias elevadas. Como ocorre a penetração do sinal na banda X, os terraços alinham o fluxo de água e degelo, que por sua vez formam canais entrelaçados, modificando a interação do sinal de radar. Entre esses canais se formam pequenas cristas, que dificultam a classificação da área ocorrendo confusão entre classes de praias elevadas e cristas.

A classe de cristas secundárias, correspondente a arêtes, apresentam divergências com áreas de cristas, o que é aceitável já que a diferenciação seria somente o grau de retrabalhamento dessas feições rochosas. Para a classe de encostas, o resultado do GMA no REMA mostra uma área maior (37 %) porque não há classificação de pixels isolados como ocorre com o mapeamento a partir do TANDEM. A classe encostas são consideradas áreas deposicionais de talus detrítico e continuidade de grandes morainas na área de estudo. Nem todas as bases de encostas foram detectadas. Na área marginal ao gelo, a base da encosta detectada pode ser depósito de kame, ou depósito subglacial exposto.

A classe de escavados está associada a formas de vales em circo, denotando a ação erosiva da base da geleira no substrato rochoso e posterior retrabalhamento por processos paraglaciais e periglaciais. Na porção praial é possível encontrar áreas mapeadas como escavados, o que pode ter associação com a ação marinha e a bacias lacustres. Os MDE demonstraram resultados similares.

Um resultado representativo da aplicação do GMA no MDE REMA foi a identificação de praias elevadas para a área. As praias elevadas foram formadas durante o Holoceno, devido à elevação isostática que ocorreu depois do Último Máximo Glacial (Fretwell et al 2010). A classificação a partir do MDE TanDEM-X apresentou erros, com pixels classificados erroneamente na área de praia, enquanto o REMA apresentou maior linearidade e consistência com as formas já mapeadas por Bonada, Rosa, e Andrade (2018). Os vales demonstram a antiga direção de fluxo da geleira e atualmente estão sendo preenchidos por sedimentos transportados por vários canais entrelaçados. A classe de depressão foi interpretada como sendo de bacias lacustres, e os dados representam consistência com a análise visual para classificação a partir do MDE REMA. A classe de depressão se relaciona a ambientes atualmente deposicionais, provavelmente lacustres, que podem ter sido formados por diferentes gêneses associadas a processos periglaciais, glaciais e tectônicos.

Península Fildes

O mapeamento gerado para a península Fildes revela a predominância de macroformas erosivas, como distintos vales, os quais se encontram em progressiva acumulação sedimentar alúvio-coluvionar, tornando-os pouco profundos e mais amplos. Vale em u e em circo foram identificados satisfatoriamente na classificação GMA. Há também vales fluviais identificados na classe escavados.

Para as áreas de planícies glaciofluviais, identificadas em campo, o MDE REMA as identificou erroneamente inseridas na classe de plataformas marinhas, devido elevação do nível de base dos talvegues dos vales. Os vales na porção sudeste da península Fildes são, na sua maioria, encaixados, e classificados como sendo vales em u e em circo pelo geomorphon, enquanto que nas porções central e norte todos são vales em u e amplos. Para os vales encaixados o método GMA usou a distância entre os talvegues como principal variável para diferenciação dos tipos de vales, em u ou circos (formas associadas a erosão).

As formas de arêtes e horns se encontram retrabalhadas e delimitam a configuração dos sistemas glaciais entre o Último Máximo Glacial -em diante UMG, e PIG. As formas mapeadas para este setor da ilha, assim como os demais, foram criadas, na sua maioria, em ambiente subglacial e com a retração das geleiras pós UMG, estas foram expostas. A exceção são as formas de morainas de avanço, que segundo Hall (2007), referem-se a um avanço durante a PIG e as áreas de planície glaciofluviais que são formas planas de despejo de sedimentos e que atualmente ainda ocorrem. Há cristas morâinicas laterais, as mais proeminentes e contínuas lateralmente, foram identificadas na classificação, ainda que estejam na classe arêtes.

A área de cristas secundárias e escavadas é maior na porção da meseta norte do que na sul, o que pode estar ligado à geologia local. As rochas silicificadas e calcificadas (Birkenmajer 1989; Barton 1995) dificultam a formação de arêtes com maior taxa de retrabalhamento.

As morainas de recessão existentes na área de estudo, cristas que se apresentam descontínuas lateralmente, não foram identificadas pelo método devido a escala espacial e vertical dos MDE aplicados. Formas glaciofluviais como flutings (menos de 1 m de elevação), que foram identificados por Petsch et al. (2019a), em seu mapeamento da área de frente da geleira Collins, não foram classificadas pelo método GMA. Isso se deve a resolução espacial e vertical dos MDE utilizadas. As macroformas e as mesoformas, como as morainas de avanço, com aproximadamente 15 m de altura e comprimento de mais de 600 m, foram delimitadas, segundo ambos MDE. Para as morainas de avanço (mais de 3 m de comprimento e elevação), a classificação em MDE REMA apresentou maior coerência. Além disso, as feições de microescala (menos de 1 metro) se alteram rapidamente, sendo necessário produtos de melhor escala temporal, para identificação dessa dinâmica.

As plataformas marinhas foram representadas corretamente pelo MDE REMA, sendo que o TanDEM-X classificou alguns pixels erroneamente nas áreas de praia da península, como já observado para a península Potter. Isso ocorre em decorrência da interação do sinal de radar TanDEM-x na transição de mar para ambiente terrestre. A diminuição do volume de gelo e a elevação isostática regional da porção continental durante o Holoceno permitiram a formação progressiva de séries de praias marinhas elevadas em áreas costeiras da península Fildes, localizadas em elevações inferiores a 20 m (Vale, Montalti e Inbar 2002; Watcham et al. 2011; Michel et al. 2014). Para a forma de fossos, estes correspondem a áreas de depressões de lagos e alagados na península. O MDE REMA mostrou um resultado significativo na identificação de lagos, que vão ao encontro com a pesquisa de Petsch et al. (2019a).

A classe de encostas, delimitadas pelo GMA, englobam as áreas de solos em padrão e depósitos de areias e cascalhos associadas a praias holocênicas mapeadas por Lopez-Martinez et al (2016). Algumas das áreas da classe "encostas" representam as paredes de montes rochosos e cabeceira de vale em circo e, desta forma, poderiam ser agregadas para fazer parte da classe vale em circo e ou pico rochoso.

Península Barton

A península Barton apresenta um relevo plano e menor diversidade de formas glaciais, quando comparado às outras áreas livres de gelo. Os resultados vão ao encontro de Lopez-Martinez et al. (2016), que identificam como formas predominantes na península as áreas de cristas e escarpas associadas a till glacial e afloramentos rochosos. O mapeamento demonstra que há muitos aretês, e estas formas podem estar associadas às formas subglaciais da geleira, e quando a mesma retraiu estas ficaram expostas na área livre de gelo. Os arêtes mais retrabalhados, com menor declividade, apresentam-se em maior área, em relação aqueles de maior declive, o que comprova a hipótese de ser uma área retrabalhada desde o UMG. Ainda assim, a península Barton se situa nas partes altas da Ilha Rei George e há a presença de rochas vulcânicas e sedimentos metamorfoseados de baixo grau (Tokarski 1987).

O método GMA permitiu identificar linhas de cordões morâinicos que representam diferentes posições frontais da geleira em fases de avanço. Contudo, duas feições classificadas como sendo de deposição morâinica, provavelmente se associam a cabeceiras de antigos vales em u, com áreas escavadas similares a vales em circo, e que atuavam como divisores de drenagem. Além disso, é possível verificar várias áreas de vale em u na região entre a frente da geleira e a moraina. Possivelmente seja uma área de planícies glaciofluviais, que, entretanto, foram mapeadas como sendo de vales em u. Essa porção proglacial apresenta a atuação de processos paraglaciais constituindo uma zona de instabilidade quanto à presença de água de derretimento e sedimentos. Algumas classes são mais instáveis e dinâmicas, portanto, análises multiescalares, são frequentemente necessárias para desenvolver um entendimento abrangente das formas e processos das áreas livre de gelo (Levin 1992).

Península Warszawa

A classificação do MDE REMA mostra muitos vales, sendo a maioria em formato de "u". O vale glacial em u Italian, por exemplo, foi identificado corretamente pelo método GMA, enquanto é erroneamente classificado no MDE TanDEM-X como vales em circo. Ressalta-se também que essa área está exposta há pouco tempo, de acordo com Rosa et al. (2013), o que configura formas recentes e suscetíveis a alto retrabalhamento de suas morfologias.

O MDE REMA apresenta melhor mapeamento dos lagos em relação ao TanDEM-X. Como já levantado no parágrafo anterior, esse processo de instabilidade e retração da geleira deve contribuir com o aumento de lagos e o método GMA pode auxiliar na identificação, sendo possível mapear as áreas de possível acumulação de água.

A classificação para as feições vales, cristas arêtes e morainas contínuas espacialmente apresenta-se satisfatória pelo método, quando se compara aos dados de campo (2007 e 2019) e aos mapeamentos geomorfológicos de Szilo e Bialik (2018) e Perondi, Rosa e Vieira (2019). A crista rochosa chamada Dutkiewiez, próximo ao vale glacial em u Italian, foi identificado corretamente pelo método GMA na classe crista. A classe horn ficou subestimada, mas o método identificou muitas destas feições, como o Pico Jardine. O método possui resultados insatisfatórios para áreas planas.

De forma geral, a diferença observada entre os MDE se deve a origem da sua construção e sua escala espacial. O MDE TanDEM-X (Braun, Betsc, e Seehaus 2016) gerado a partir de interferometria das imagens SAR (Radar de Abertura Sintética) e com menor escala espacial, apresenta maiores inconsistências classificando erroneamente algumas classes, principalmente nas áreas de vale de circo, vale em u e morainas.

As cristas de sucessivas morainas de recessão não foram identificadas, devido à limitação de acurácia vertical e resolução dos MDE. Apenas as morainas laterais mais expressivas foram classificadas, mas com divergências em relação aos arêtes. A classe arête engloba cristas morâinicas nesta área de estudo, o que se deve a menor altura dessas morainas, comparando com as de avanço da península Fildes.

Áreas de planícies glaciofluviais foram delimitadas com maior precisão pelo MDE TanDEM-X enquanto, o REMA não identificou essa feição. O MDE REMA apresentou resultados gerais da classificação das feições mais próximos do que foi observado em campo. As classes de plataformas marinhas e praias elevadas foram identificadas somente com a classificação a partir do MDE REMA, mas o recorte espacial do REMA não inclui toda a área inserida até a linha de costa em alguns setores da ilha. A classe praia elevada subestima a área existente no local.

Quanto a escala vertical dos MDE apresentados algumas reflexões podem ser feitas. Os apontamentos de Zhang et al. (1994) e Kienzle et al. (2004) que ressaltam que MDE entre 5 m e 30 m proporcionam melhor resultado no mapeamento de formas glaciais, podem ser questionados. De fato, os mapeamentos por classificação digital incluíram feições de mesoescala, como morainas de menor extensão e elevação, canais glaciofluviais, vales que podem ser de ravinamento (na península Potter), contudo a acurácia vertical e a forma de aquisição dos dados são fundamentais para obtenção do resultado final. Além disso, a dinâmica da área associada a processos paraglaciais interfere no resultado, visto que os produtos de elevação possuem somente poucas datas de mapeamento, não sendo possível acompanhar a evolução da paisagem pós retração da geleira, utilizando MDE.

Considerações

As formas morâinicas, horns, vales em u e arêtes demonstram coerência na classificação por GMA. Feições de horn somente são encontradas nas áreas livres de gelo deglaciarizadas mais recentemente, em detrimento do Sul e centro da península Fildes, onde estas formas já foram retrabalhadas. Morainas de avanço frontais foram identificadas em todas as áreas, com exceção do sistema paraglacial da geleira Ecology, e vão ao encontro do observado em campo. A identificação dessas formas contribui como suporte para trabalhos de reconstrução paleoglacial e também para os estudos que avaliam a sucessão de mudanças na paisagem com a recente retração dos sistemas glaciais.

A classificação a partir do MDE REMA mostrou um resultado significativo na identificação de lagos. As áreas de fossos possuem, na sua maioria, sua formação ligada às áreas planas onde o derretimento da geleira ou de áreas de deposição de neve formam uma série de canais entrelaçados, que drenam água para esse local. Ambientalmente essa forma pode indicar áreas de retração da geleira com atuação de processos paraglaciais, devido ao alto grande fluxo de água de degelo e sedimentos. Portanto, o método GMA pode auxiliar na identificação dos processos que atuam na área livre de gelo pós-retração.

Os vales em circo e planícies glaciofluviais apresentaram maior dificuldade na identificação. Isso possivelmente está ligado à escala espacial adotada, além da complexidade de formas do ambiente glacial. O vale em circo se confunde com outras formas como encostas e até com paredes das vertentes dos vales em u. Os vales em u mapeados indicam antiga direção de fluxo das geleiras, e locais onde havia maior espessura de gelo, fazendo assim a incisão no terreno.

A ação marinha nas áreas soerguidas, que tiveram processos glacio eustáticos, é verificada em campo principalmente na porção leste da península Fildes, e remete à processos que ocorreram há cerca de 7 mil anos. As plataformas planas e alongadas são mapeadas segundo o método de GMA como sendo áreas de ressalto e de cristas, dependendo da declividade. As bases de encosta correspondem às praias elevadas, e na península Fildes é possível observar uma sequência de feições que correspondem a momentos diferentes de ascensão do terreno pós-deglaciação.

As formas localizadas em áreas deglaciarizadas há mais tempo são descaracterizadas e dificultam a identificação pelo método. Quanto às classes de arêtes e horns, algumas áreas apresentam essas formas pouco preservadas devido à ação de processos periglaciais de retrabalhamento da superfície ou ainda aos avanços da frente da geleira. Nesse sentido, pode-se observar, principalmente na área da península Fildes, a ação temporal intempérica na evolução da paisagem. Muitos arêtes, foram classificadas como sendo cristas secundárias, o que se diferencia da classe de cristas devido à declividade da forma e também está ligada diretamente ao retrabalhamento pós UMG.

Quanto aos resultados obtidos com a classificação utilizando os dois MDE, salienta-se que o REMA apresentou melhores resultados, exceto para áreas de interflúvios, talvegues fluviais e ravinas. O TanDEM-X se apresenta com melhor aplicabilidade na distinção de algumas formas de relevo características de sistemas paraglaciais, mas a resolução espacial e acurácia vertical maiores em relação aos outros MDE, proporcionaram uma classificação final de maior detalhe para a distinção dos compartimentos geomorfológicos glaciais. Contudo, é importante considerar o uso dos dois MDE visto que áreas de planícies glaciofluviais foram identificadas somente com o TanDEM-X, e classes de plataformas marinhas e praias elevadas somente com o REMA. Sendo assim, os resultados se complementam.

As morainas frontais de avanço foram classificadas com grande acurácia comparando com as fotos dos trabalhos de campo. Ressalta-se que a identificação das morainas de recessão está ligada, além da escala espacial, também à escala vertical. Para a detecção de feições de meso-escala e micro-escala, como flutings e morainas de recessão, recomenda-se comparar, ainda, os resultados com MDE de maior acurácia, como os obtidos a partir de imageamen-to e processamento de dados de sensores relacionados a DRONES, VANT e LIDAR. Mas, para determinadas formas de relevo, em função da gênese e escala, MDE adquiridos com dados de elevados intervalos temporais podem trazer classes distintas devido às rápidas transformações que podem ocorrer no sistema paraglacial.

Quanto as fragilidades do método GMA, as áreas de vales classificadas entre morainas não são vales, e sim ambientes deposicionais. Dentro da classe arête há feições deposicionais como as cristas morâinicas. Dessa forma, uma nova reclassificação dos resultados da aplicação do método pode ser proposta, a partir destas contribuições, visando possibilitar distinguir entre gêneses dasdas cristas e dos tipos de vales. As classes de arête, vales em u, cristas secundárias possuem a necessidade de uma pós-classificação com base em regras de decisão como diâmetro, profundidade, comportamento espectral ou valores de retroespalhamento, raio, diâmetro, alongamento, distância de outras feições, enquanto que a classe encosta é considerada um elemento do relevo e se recomenda ser agregada às classes de horns, aretes, e ou à cabeceira de vales em circo.

De forma geral, o resultado obtido com o GMA demonstra resultados condizentes com o relevo observado em campo. Outros métodos de classificação digital de MDE podem ser comparados em análises futuras, visando contribuir para o mapeamento geomorfológico glacial por método automático aplicado à detecção de mudanças na paisagem paraglacial.

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1Estudos da variabilidade climática e ambiental nas Ilhas Shetland Do Sul e Península Antártica por meio de registros sedimentares terrestres e marinhos - Chamada n.° 64/2013-MCTl/CNPq/FNDCT-Ação Transversal - Programa Antártico Brasileiro-PROANTAR.

CÓMO CITAR ESTE ARTÍCULO Petsch, Carina; Perondi, Cleiva; Rosa, Kátia Kellem da; Vieira, Rosemary; Robaina, Luís Eduardo de Souza; Trentin, Romario. 2022. "Método de geomorphon aplicado a Antártica: identificação de formas de relevo paraglaciais de macro e meso-escala. Ilha Rei George, Ilhas Shetlands do Sul." Cuadernos de Geografia: Revista Colombiana de Geografia 31 (1): 108-127. https://doi.org/10.15446/rcdg.v31n1.85644.

Carina Petsch Possui graduação em Geografia pela Universidade Estadual de Maringá (2011), mestrado em Geografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2014) e doutorado em Geografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2018). Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em Geografia Física, principalmente nos seguintes temas: Antártica, monitoramento de geleiras, Ensino Polar, Geomorfologia glacial, Sensoriamento Remoto e Cartografia.

Cleiva Perondi Possui graduação em Geografia pela Universidade Federal da Fronteira Sul, Campus Erechim, RS (2014). Mestre em Geografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2018). Atualmente é doutoranda em Geografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Participa de projetos de pesquisa vinculados ao Centro Polar e Climático (UFRGS) relacionados ao monitoramento de mudanças ambientais glaciais.

Kátia Kellem da Rosa Doutora pelo Programa de Pós Graduação em Geologia Marinha, Universidade Federal do Rio Grande do Sul-UFRGS. Professora no Departamento de Geografia da UFRGS. Professora na Pós Graduação em Geografia e do Pós Graduação em Sensoriamento Remoto da UFRGS. Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em ambientes glaciais, atuando principalmente nos seguintes temas: Sensoriamento Remoto, Geoprocessamento, Antártica, Geologia e Geomorfologia, Sedimentologia, Glaciologia, Paleoclimatologia e monitoramento de mudanças ambientais.

Rosemary Vieira Possui graduação em Geografia pela Universidade Federal Fluminense, UFF (1987), mestrado em Geografia pela Universidad de Chile, uc (2002), doutorado em Geociências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS (2006). Pós-Doutorado no Centro Polar e Climático, iGEO-uFRGS. Atualmente é Professora da UFF, sendo credenciada para orientação nos programas de pós-graduação em Geografia da UFF e UFRGS, atuação na área de Geologia, Geomorfologia Glacial, Sedimentologia, Paleoclimatologia e Mudanças Climáticas.

Luís Eduardo de Souza Robaina Possui graduação em Geologia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (1984), mestrado e doutorado em Geociências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS (1990 e 1999) e Pós-Doutorado na Universidade do Porto, Portugal e na Universidade du Maine, Le Mans/França. Atualmente é professor da Universidade Federal de Santa Maria. Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em estudos geomorfológicos, geoambientais e de desastres naturais.

Romario Trentin Possui Graduação em Geografia Licenciatura pela Universidade Federal de Santa Maria (2004), Mestrado em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria (2007) e Doutorado em Geografia pela Universidade Federal do Paraná (2011). Atualmente, é Professor da Universidade Federal de Santa Maria. Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em Geotecnologias, principalmente nos temas: Bacia Hidrográfica, Arenização, Geomorfologia, Uso e Ocupação da Terra, Caracterização Geoambiental e Áreas de Risco.

Recebido: 10 de Março de 2020; Revisado: 28 de Outubro de 2020; Aceito: 23 de Julho de 2021

a Endereço postal: Carina Petsch, Lageolam, Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, Av. Roraima 1000, prédio 17, sala 1009 97105 900 - Santa Maria, RS, Brasil.

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