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Avances en Enfermería
Print version ISSN 0121-4500
av.enferm. vol.29 no.2 Bogotá Jul./Dec. 2011
Vivências dos homens submetidos à hemodiálise acerca de sua sexualidade
Experiencias de los hombres sometidos a hemodiálisis acerca de su sexualidad
Experience of men undergoing hemodialysis about their sexuality
Denilson Fonseca Rodrigues1, Eda Schwartz2, Maria da Gloria Santana3, Juliana Graciela Vestena Zillmer4, Aline da Costa Viegas5, Bianca Pozza dos Santos6, Daiane Lopes Leal Borda7 Juyane Felipette Lima8
1 Enfermeiro pela Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Coordenador Municipal de Saúde Mental do Município de Criciúma/Santa Catarina/Brasil. denilsonrodriguesfonseca@hotmail.com, Santa Catarina, Brasil.
2Enfermeira Doutora em Enfermagem, docente da Faculdade de Enfermagem da UFPel, coordenadora de pesquisa. Integrante do Núcleo de Condições Crônicas e suas Interfaces (Nuccrin). eschwartz@terra.com.br, Pelotas, Brasil.
3Enfermeira Doutora em Enfermagem. glorita2000@uol.com.br, Pelotas, Brasil.
4 Enfermeira. Mestra em Enfermagem pela UFPel. Doutoranda de Enfermagem pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Bolsista de Demanda Social da Capes. Integrante do Núcleo de Estudos e Assistência em Enfermagem e Saúde a Pessoas com Doenças Crônicas (Nucron). juzillmer@gmail.com, Florianópolis, Brasil.
5Acadêmica do 9° semestre da Faculdade de Enfermagem da UFPel. Integrante do Nuccrin. alinecviegas@hotmail.com, Pelotas, Brasil.
6Acadêmica do 9° semestre da Faculdade de Enfermagem da UFPel. Integrante do Nuccrin. Bolsista de Iniciação Científica Pibic/CNPq. bi.santos@bol.com.br, Pelotas, Brasil.
7Acadêmica do 9° semestre da Faculdade de Enfermagem da UFPel. Integrante do Nuccrin. Bolsista de Iniciação Científica Pibic/CNPq. daianelleal@yahoo.com.br, Pelotas, Brasil.
8Enfermeira Mestranda pelo Programa de Pós-graduação em Enfermagem da UFPel. Integrante do Nuccrin. julyane_felipette@hotmail.com, Pelotas, Brasil.
Recibido: 13-12-10 Aprobado:5-08-11
Resumo
Objetivo: Conhecer as vivências dos pacientes masculinos submetidos à hemodiálise acerca de sua sexualidade.
Metodologia: Trata-se de uma investigação exploratória, descritiva, com abordagem qualitativa. Os sujeitos da pesquisa, realizada no primeiro semestre de 2004, foram oito pacientes masculinos que estavam em tratamento hemodialítico. O instrumento de coleta foi a entrevista semiestruturada, utilizando a análise categórica. Como cenário da pesquisa, um serviço de nefrologia, de um município da Região Sul do Brasil.
Resultados: A partir da análise emergiram as seguintes categorias: Aspectos físicos e emocionais acerca do tratamento; As vivências dos pacientes renais crônicos acerca de sua sexualidade; As estratégias para lidar com as limitações relacionadas à sexualidade e A sexualidade dos pacientes renais crônicos após a hemodiálise.
Discussão: O desgaste e o cansaço físico foram atribuídos ao tratamento hemodialítico. A vivência dos pacientes renais crônicos acerca de sua sexualidade está intimamente ligada à relação sexual saudável, tanto no biológico quanto no emocional. Os pacientes que buscam estratégias a fim de minimizar ou até mesmo resolver problemas relativos com sua sexualidade, em decorrência da condição crônica, enfrentam com maior facilidade os obstáculos vivenciados. Os sujeitos apresentaram modificações a respeito da sexualidade, no entanto, percebe-se a busca dos pacientes por estratégias que amenizem e até mesmo restabeleçam suas necessidades sexuais, dentro da dimensão biopsicológica.
Considerações finais: Este estudo é relevante, pois existe necessidade de capacitar profissionais para trabalharem com a sexualidade humana, percebendo o paciente renal crônico sob uma visão holística.Palavras-chave: insuficiência renal crônica; diálise renal; enfermagem; sexualidade.
Palabras chave: insuficiência renal crônica; diálise renal; enfermagem; sexualidade.
Resumen
Objetivo: Conocer las experiencias de los pacientes masculinos sometidos a hemodiálisis acerca de su sexualidad.
Metodología: Se trata de una investigación exploratoria, descriptiva, con enfoque cualitativo. Los sujetos de la investigación, realizada en el primer semestre de 2004, fueron ocho pacientes masculinos que se encontraban en tratamiento de hemodiálisis. El instrumento de compilación de datos fue una entrevista semiestructurada, utilizando el análisis categórico. El escenario de investigación fue un servicio de nefrología ubicado en un municipio de la Región Sur de Brasil.
Resultados: A partir del análisis surgieron las siguientes categorías: Aspectos físicos y emocionales acerca del tratamiento; las vivencias de los pacientes renales crónicos acerca de su sexualidad; Las estrategias para lidiar con las limitaciones relacionadas con la sexualidad y la sexualidad de los pacientes renales crónicos después de la hemodiálisis.
Discusión: El desgaste y el cansancio físico se atribuyeron al tratamiento de hemodiálisis. La experiencia de los pacientes renales crónicos acerca de su sexualidad está íntimamente vinculado con la relación sexual saludables tanto a nivel biológico como emocional. Los pacientes que buscan estrategias dirigidas a minimizar o incluso resolver problemas relativos a su sexualidad, como resultado de la condición crónica, enfrentan con mayor facilidad los obstáculos a los que hacen frente. Los sujetos presentaron modificaciones con respecto a la sexualidad, sin embargo, se percibe la búsqueda de los pacientes por estrategias que amenicen e incluso restablezcan sus necesidades sexuales, dentro de la dimensión bio-sicológica.
Consideraciones finales: Este estudio es pertinente, ya que existe la necesidad de capacitar profesionales para que trabajen con la sexualidad humana, percibiendo al paciente renal crónico bajo una visión holística.
Palabras clave: insuficiencia renal crónica; diálisis renal; enfermería; sexualidad. (Fuente: DeCS, BIREME).
Abstract
Objective: To study the experiences of male patients undergoing hemodialysis about their sexuality.
Methodology: This is an exploratory, descriptive research with a qualitative approach. The research was conducted in the first half of 2004, and the subjects were eight male patients who were undergoing hemodialysis. The data collection instrument was a semi-structured interview, using categorical analysis. The research setting was a nephrology department in a municipality located in the Southern Region of Brazil.
Results: Based on the analysis, the following categories arose: physical and emotional aspects about the treatment, experiences of chronic renal patients about their sexuality, strategies for dealing with limitations related to sexuality, and sexuality of chronic renal patients after hemodialysis.
Discussion: The physical exhaustion was attributed to hemodialysis. The experience of chronic renal patients about their sexuality is closely linked to healthy sexual relationship, both biologically and emotionally. Patients seeking strategies to minimize or even solve problems related to their sexuality, as a result of the chronic condition, are better able to overcome these obstacles. The subjects showed changes with respect to sexuality; however, the research showed that patients seek strategies to improve or restore their sexual needs within the bio-psychological dimension. Results: This study is relevant because there is a need to train professionals to work with human sexuality, perceiving chronic renal patients with a holistic vision.
Keywords: chronic renal insufficiency, renal dialysis, nursing; sexuality
INTRODUÇÃO
As condições crônicas de saúde, além de serem situações estressantes, são fontes de várias transformações, incluindo adesão a um tratamento, mudanças no estilo de vida, na realização de atividades diárias e na autoima-gem. Na insuficiência renal crônica (IRC), o paciente vivencia o estresse emocional intenso, resultante das modificações em sua vida (1). Além do impacto que ela proporciona ao indivíduo e à família, tem importante repercussão no campo da saúde pública por causar elevadas taxas de morbimortalidade (2).
A IRC consiste na perda progressiva e irreversível da função renal; diante disso, o organismo perde a capacidade de manter o equilíbrio metabólico e hidroele-trolíticos (3). A fim de suprir a incapacidade de filtração dos rins, existem algumas modalidades substitutivas, sendo uma delas a hemodiálise, que tem por finalidade remover as substâncias tóxicas presentes no sangue e o excesso de líquido nos tecidos por meio de uma máquina, denominada de rim artificial (4).
Diante da complexidade da IRC, há a necessidade de que os profissionais da equipe de saúde se preparem para cuidar do indivíduo acometido, considerando as suas necessidades humanas básicas dentro de uma concepção holística (5). Dentre essas, está a sexualidade, a qual adquire diversos sentidos e significados que lhes são impostos pelo contexto e a cultura em que os indivíduos estão inseridos. A tendência dos pensadores contemporâneos é considerar a sexualidade como um aspecto intrínseco do ser humano a qual é mais expressiva do que o ato sexual, pois inclui os componentes biológicos, socioculturais, psicológicos e éticos do comportamento sexual (6).
A sexualidade pode ser definida como a satisfação de uma necessidade fisiológica fundamental. Ela é a forma de o indivíduo interagir com o mundo, de se comportar, inerente a todo ser em todos os momentos da sua vida pessoal ou profissional, sadia ou doente (7).
O profissional enfermeiro tem papel importante no cuidado ao paciente renal crônico com relação à sexualidade, pois o conhecimento desse paciente é essencial no que diz respeito às orientações adequadas para o melhor enfrentamento à condição crônica e às limitações que ela pode desencadear. No momento em que o enfermeiro tiver a habilidade de entender o que está asilado no paciente, o cuidado tende a tornar-se mais satisfatório e, consequentemente, serão assistidas suas necessidades visíveis e todas aquelas que se encontrarem encobertas (4).
A partir do exposto, o presente trabalho tem como objetivo conhecer as vivências dos pacientes masculinos submetidos à hemodiálise acerca de sua sexualidade. Visa, dessa forma, contribuir para promover um cuidado holístico que desmistifique mitos e preconceitos relacionados à sexualidade do paciente masculino com IRC, em tratamento hemodialítico.
METODOLOGIA
Trata-se de uma investigação exploratória, descritiva, com abordagem qualitativa. O cenário da pesquisa foi um serviço de nefrologia de um município de porte médio, da Região Sul do Brasil. O referido serviço tem em seu espaço a presença de acadêmicos de Enfermagem de uma universidade federal, devido a um Projeto de Extensão, realizado desde o ano de 1992. Por meio desse projeto são desenvolvidas atividades administrativas, assistenciais, educacionais e de pesquisa, centradas no indivíduo com doença renal crônica e na sua família.
Os sujeitos da pesquisa foram oito pacientes masculinos que estavam em tratamento hemodialítico no momento da coleta de dados, realizada no primeiro semestre de 2004. Como instrumento de coleta utilizou a entrevista semiestruturada, a qual obedece a um roteiro de questões abertas e fechadas, permitindo ao pesquisador maior abrangência do assunto (8). As entrevistas foram previamente agendadas e acordadas com os pacientes, aconteceram em uma sala reservada do próprio serviço e tiveram durações em média de uma hora. Com o consentimento dos pacientes, as entrevistas foram gravadas e, posteriormente, transcritas na íntegra.
Para a análise dos dados, adotou-se a análise categórica, que pode ser empregada em qualquer pesquisa qualitativa. As entrevistas foram analisadas seguindo os passos para essa modalidade de análise, que se constitui das etapas abaixo.
a) Ordenação dos dados. Neste momento, realizou-se um mapeamento de todos os dados obtidos no trabalho de campo. Aqui, estão envolvidas, por exemplo, transcrições de gravações, releitura do material, organização dos relatos.
b) Classificação dos dados. Nesta fase é importante ter em mente que os dados não existem por si só. Eles são construídos a partir de um questionário feito sobre eles, com apoio numa fundamentação teórica. Através de uma leitura exaustiva e a partir do que era relevante nos textos, foram elaboradas as características específicas. Nesse sentido, foi determinado o conjunto ou os conjuntos de informações presentes na comunicação.
c) Análise final. Neste momento, procurou-se estabelecer articulações entre os dados e os referenciais teóricos da pesquisa, respondendo às questões de pesquisa com base em seus objetivos.
No primeiro momento, o de ordenação, as informações coletadas foram lidas exaustivamente e organizadas; a seguir, classificadas e agrupadas em quatro categorias para posterior análise, na qual foi utilizada a abstração em torno dos depoimentos, alicerçados na literatura pesquisada e na discussão dos autores (8).
Respeitaram-se as normas para pesquisa envolvendo seres humanos, estabelecidas pela Resolução n. 196/1996 do Conselho Nacional de Saúde. Os sujeitos concordaram em participar do estudo e deram anuência no Termo de Consentimento Livre e Informado. Para manter o anonimato, buscou-se preservar a identidade dos pacientes, identificando-os por pseudônimos escolhidos pelos mesmos, acrescidos da idade e tempo de he-modiálise.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir da análise, emergiram as seguintes categorias: Aspectos físicos e emocionais acerca do tratamento; As vivências dos pacientes renais crônicos acerca de sua sexualidade; As estratégias para lidar com as limitações relacionadas à sexualidade e A sexualidade dos pacientes renais crônicos após a hemodiálise.
Aspectos físicos e emocionais acerca do tratamento
A IRC e o tratamento hemodialítico podem afetar a au-topercepção, a conduta e os relacionamentos com outras pessoas; diversos projetos de vida podem ser abolidos ou modificados pela situação vivenciada (1). A adesão ao tratamento está associada também ao fato de o paciente assumir sua condição crônica e de aceitá-la no seu cotidiano (9).
Vivenciar um diagnóstico de IRC revela-se como um dos momentos mais difíceis para o paciente, em que diariamente é experienciada uma diversidade de sentimentos, como a tristeza, a ansiedade e até mesmo o medo da morte. No presente estudo, identificaram-se possíveis aspectos relativos a situações físicas e emocionais acerca da aceitação do tratamento recebido. Nos relatos dos sujeitos Prata e Garopa, sentimentos como a tristeza e a ansiedade são algumas das alterações emocionais que o tratamento pode ocasionar às pessoas que dependem dele.
Emocionado, qualquer coisinha começo a chorar. (Prata, 57 anos)
Deprimido, nervoso, não me sinto bem; faço hemodiálise porque a família deseja. (Garopa, 67 anos)
O sofrimento que a IRC e a hemodiálise proporcionam, por ser este um tratamento longo, pode trazer ao indivíduo resultados incertos e, somadas as revelações também de ordem sexual, pode incapacitar a pessoa para agir com independência e autonomia. Além de interferir no trabalho, interfere também no vigor físico, na liberdade de alimentar-se, afetando assim a sua autoestima.
Os indivíduos com IRC convivem com uma série de limitações e modificações em seu cotidiano, envolvendo aspectos relacionados a processos familiares fragilizados pela condição crônica, relacionamento social afetado, dificuldade para trabalhar, atividades de lazer diminuídas, ocorrendo também alterações físicas, incluindo as sexuais (5). Eles sofrem alterações significativas no que se refere à capacidade física, ocorrendo, de tal modo, restrições em sua vida diária. Acontecem consideráveis desordens nos sistemas cardiovascular, gastrintestinal, epitelial, muscular e esquelético. Como consequência dessas mudanças, advêm perdas, não somente físicas, mas pessoais e psicológicas, trazendo ao indivíduo sentimentos de tristeza, frustração, depressão e raiva (10).
As modificações no estilo de vida e a impossibilidade de fazer o que se gosta ou dá prazer são relatadas pelos pacientes como dificuldades decorrentes da IRC e da hemodiálise. A incapacidade física para realizar as atividades diárias relacionadas ao trabalho ocasiona sentimentos que interferem negativamente na sua maneira de ser e existir na família e na sociedade. Podendo ser constatado no depoimento do sujeito Anedno:
Péssimo! E por esse motivo eu estou tratando, para ver se faço o transplante. Por enquanto eu passo muito ruim fazendo hemodiálise, tem dias que me dá mal estar, eu tenho que chegar em casa, tomar um café quente e me deitar, que eu fico cansado. Não sei se é pela idade, mas me cansa de estar fazendo a diálise. (Anedno, 67 anos)
Diante do exposto, evidencia-se que os aspectos físicos, representados por manifestações clínicas do organismo, e emocionais parecem estar intimamente ligados à situação da doença e ao que advém com o tratamento. O sujeito atribui o desgaste físico, o cansaço como con-sequências da hemodiálise.
A vivência dos pacientes renais crônicos acerca de sua sexualidade
Para discutir sobre sexualidade é necessário um reconhecimento dos pensamentos, ideias, fantasias, medos, receios que existem em cada um de nós e atuam mesmo que nossa postura seja de silêncio. Diante disso, define-se sexualidade como algo dinâmico que envolve aspectos físicos e psíquicos, podendo ser traduzida em esperanças e motivações. Seu significado é histórico, dinâmico, mo-dificando-se a cada época e lugar, construindo, assim, diferentes interpretações. Sexo, amor, paixão, desejo, prazer e excitação, todos têm um significado de sexualidade, mas muitas vezes separados em blocos distintos (11).
Quando questionados sobre o que é sexualidade, os sujeitos do estudo relacionaram-na ao ato sexual, algo como essencial, química e até mesmo obrigatória. Nos relatos parece ficar evidenciada a compreensão do que o termo "sexualidade" tem para os pacientes. Embora seja uma palavra polissêmica, contempla a maioria das manifestações, impulsos, desejos, sentimentos presentes nas relações interpessoais e que podem ser diferenciados conforme o envolvimento com a parceira.
No depoimento de Prata, o termo "sexualidade" é identificado como transar com a esposa, ou seja, em outro momento fora da relação marido e mulher, esse conceito pode mudar, pois mudam as relações, os sentimentos, os desejos e as manifestações da sexualidade.
É transar com a esposa, talvez seja. (Prata, 57 anos)
É sexo. (Dourado, 20 anos)
Somos seres sexuais, com desejos e emoções, com corpos sensíveis que respondem a estímulos, que vibram, exalam cheiros, atraem, buscam prazer. Sexualidade é movimento, transformação e, em suas manifestações, está contida a incessante procura pela felicidade (11). Observa-se no depoimento de Pedra que a sexualidade está ligada à necessidade do organismo.
Sexualidade é uma necessidade química que todos precisam. Penso que é uma coisa essencial na vida do ser humano, é isso que acho. (Pedra, 50 anos)
A sexualidade se apresenta como elemento fundamental, possui uma característica peculiar no seu significado, está sempre ligada ao desejo e às manifestações íntimas do ser humano.
No depoimento de Anedno, percebe-se a questão cultural ligada ao gênero masculino, dos mitos que rodeiam o homem e do seu poder. Evidenciam-se a importância da sexualidade e o seu significado para ele.
Isso está em cada um. Eu acho que nós como machos, masculinos, têm que procurar fazer de tudo para melhorar. E a sexualidade é obrigatória existir na família, é a melhor coisa que existe. (Anedno, 67 anos) É tudo, essencial para uma vida conjugal que não é só penetração, tem muito pensamento com as mulheres e estímulo visual. (Garopa, 67 anos)
A sexualidade não se limita a práticas sexuais e não está ligada apenas à função da reprodução e procriação da espécie. Permanece um mito em torno da sexualidade que declara que ela se refere somente ao ato sexual. Porém, muitos outros fatores estão associados a essa terminologia, como o sentimento da pessoa em relação ao seu corpo, como ela se comunica com outras pessoas e de que maneira ela constrói seus relacionamentos. A sexualidade envolve outros aspectos, não menos importantes que o ato sexual, como o toque, o abraço, o beijo e o envolvimento com o outro (12).
Percebeu-se nos relatos que a questão da sexualidade está intimamente ligada à relação sexual saudável, tanto no biológico como no emocional, mostrando sua importância para o homem/mulher, quando descrevem termos/expressões como "essencial", "obrigatório", "é tudo", "é a melhor coisa que existe".
As estratégias para lidar com as limitações relacionadas à sexualidade
Tendo em vista um grande número de informações que se tem disponível nas diversas mídias e uma grande variedade de profissionais especializados nesta área, pretende-se verificar quais estratégias são utilizadas para lidar com as limitações relacionadas à sexualidade, por parte dos pacientes com doença renal crônica.
Quando questionados sobre o que utilizavam para minimizar ou tentar resolver seus problemas acerca da sexualidade, relataram estratégias como o uso de medicamentos, orientações de profissionais, busca pela melhora na autoimagem e na autopercepção, além da procura pelo apoio de familiares e amigos.
Na fala a seguir, percebe-se uma das estratégias que o paciente utiliza para ter a função sexual restabelecida, como, por exemplo, o uso do Viagra, o que pode ocasionar riscos à saúde quando não for utilizado adequadamente, sob supervisão médica.O Viagra funcionou uma beleza, mas a minha pressão começou a mudar. (Anedno, 67 anos, 6 anos de HD)
O Viagra, que tem como princípio ativo citrato de sildenafil, age diretamente na disfunção erétil, resultando em uma resposta natural à estimulação sexual. Tendo como principais efeitos colaterais os relacionados com o sistema cardiovascular, como a elevação dos níveis tensionais. Ademais, é desaconselhado o uso desse medicamento por pessoas que possuem os níveis pressóri-cos alterados tanto para mais quanto para menos, pois o princípio ativo possui forte interação com muitas das drogas reguladoras da pressão arterial (13).
Outro fator evidenciado foi a orientação fornecida pelos profissionais de saúde quanto à utilização ou não de medicamentos com o propósito de restabelecer uma relação sexual satisfatória. Fato demonstrado no relato de Pedra:
O médico me orientou a programar o sexo, não tomar an-tidepressivo um dia antes de fazer sexo. (Pedra, 50 anos, 3 anos e 4 meses de HD)
Nesse sentido, quando um indivíduo procura orientação de um profissional especializado, família, amigos ou qualquer outro meio, este necessita abster-se de certos preconceitos, deixar de lado o conservadorismo, a fim de resolver o seu problema. Buscar também apoio de pessoas com quem se identifica, em quem tem confiança, e que vivenciam a hemodiálise por um período maior.
Conversei [sobre sexualidade] com pessoas e amigos que estavam na diálise há mais tempo. (Pedra, 50 anos, 3 anos e 4 meses de HD)
No entanto, dos sujeitos entrevistados, havia dois que procuravam uma companheira. Nos relatos a seguir, constata-se que, além da carência e do afeto familiar por parte de alguns sujeitos, existia um sentimento de solidão, pois os mesmos salientaram a vontade de encontrar uma companheira para dividir suas mágoas e angústias. Dessa forma, procuravam melhorar a aparência física a fim de encontrar uma pessoa para compartilhar a realidade vivenciada e preencher algumas das necessidades humanas.
Estou tentando conseguir para mim uma companheira, porque a pessoa sozinha é brabo. Estou dando um jeito de arrumar os dentes. Ah!, eu tenho procurado muito [uma companheira], mas é os meus irmãos para me ajudar me dar uma força, mas eles moram longe. (Rosa, 41 anos, 3 meses de HD)
Evidencia-se, portanto, que os pacientes que buscam estratégias a fim de minimizar ou até mesmo resolver problemas relativos com sua sexualidade, em decorrência da condição crônica, enfrentam com maior facilidade os obstáculos vivenciados, o que implica modificações positivas na vida dessas pessoas.
A sexualidade dos pacientes renais crônicos após a hemodiálise
Nesta categoria serão discutidas as vivências dos pacientes frente à sua sexualidade, após iniciarem o tratamento hemodialítico. O paciente renal crônico sofre um desgaste físico com o tratamento, porque são necessárias três sessões semanais, com duração média de quatro horas de diálise por dia. Dentre as complicações da doença e tratamento está a anemia que, com toda a sua sintomatologia, aumenta o cansaço.
A rotina de tratamento dialítico é contínua e prolongada, levando o indivíduo a depender de uma máquina para sobreviver, trazendo-lhe desgaste psicológico e físico, geralmente sendo observados, como consequência, o cansaço ou a falta de energia após as sessões de hemo-diálise (14).
A fadiga pode ser um dos elementos determinantes para os problemas relacionados com a sexualidade. Evidencia-se, no relato de Rosa, que o cansaço e a tristeza o impedem de realizar atividade sexual.
Sinto muita diferença. Assim a pessoa não tem vontade de fazer agora, esse negócio que se faz, sexo. Então fico já meio ruim, me sentindo meio mal. E não tenho mais vontade para isso. Me sinto triste, cansado e meio ruim. (Rosa, 41 anos, 3 meses de HD
Os aspectos físicos e emocionais estão intimamente ligados. Essa situação tende a causar um verdadeiro círculo vicioso: as sessões de hemodiálise provocam cansaço/fadiga, o tratamento impõe um impacto emocional nos indivíduos, que podem interferir no desempenho sexual, acarretando disfunções sexuais importantes. A disfunção erétil é uma condição que leva à incapacidade de obter e/ou manter uma ereção suficiente para um desempenho sexual satisfatório, considerada multifato-rial, sendo causada por inúmeros fatores de ordem física, social e emocional (15, 16).
Com a terapia medicamentosa imposta para auxiliar no tratamento da IRC, tornam-se frequentes alterações fisiológicas que levam ao declínio da relação sexual, devido à redução da libido e/ou disfunções sexuais, trazendo como consequência a depressão.
Constata-se, nos relatos de Anedno e Garopa, o estado depressivo imposto pelo tratamento hemodialítico, que reduz o nível energético e o impulso sexual. Também se percebe a convicção dos pacientes de que a dis-função erétil é uma consequência do tratamento aliada ao uso de medicamentos.
Agora que está falhando, não é mais como era antes. Foi depois, com o medicamento que eu comecei a tomar para baixar a pressão, aí que eu comecei a notar que também estava influenciando. Depois que comecei com o problema de diálise a coisa piorou. Vontade eu tenho de voltar ao normal, mas é difícil. (Anedno, 67 anos, 6 anos de HD)
A ereção diminuiu 90%, acho que é o remédio. (Garopa, 67 anos, 3 anos e 4 meses de HD)
Diante do exposto e com base nos relatos, percebe-se que alterações no fluxo sanguíneo, tanto arterial quanto venoso, podem estar na origem das disfunções eréteis, alterações estas causadas por doenças primárias da IRC, como hipertensão e diabetes, aliadas ao uso da farmaco-terapia para estas patologias, capazes de potencializar o risco de disfunção erétil. Outras causas envolvem fatores psicológicos, tais como: ansiedade, baixa autoestima e depressão, assim como fatores orgânicos (17).
Evidencia-se, neste estudo, que todos os sujeitos apresentaram modificações acerca da sexualidade após o início do tratamento hemodialitico. No entanto, percebe-se a busca dos pacientes por estratégias que amenizem e até mesmo restabeleçam suas necessidades sexuais, dentro da dimensão biopsicológica.
Essa complexidade que envolve a sexualidade do paciente renal crônico induz a necessidade de estabelecer cuidados diretos, de modo a evitar a decadência na qualidade de vida. Por isso, é importante investigar os seus cuidados de saúde, aliados a crenças e aos aspectos culturais, obtendo informações para que se possa orientá-los de forma humana e efetiva (18).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo objetivou conhecer as vivências dos pacientes masculinos submetidos à hemodiálise acerca de sua sexualidade. Ela foi compreendida como necessidade física, emocional e de partilha em seus relacionamentos, na qual as questões do carinho, do gostar, do amor e do compartilhar apareceram concomitantemente.
A partir da análise dos dados, evidenciou-se que o entendimento da sexualidade, pelos sujeitos do estudo, estava atrelado também ao ato sexual e ao envolvimento com a parceira. Quanto à orientação e à ajuda de pessoas, verificou-se a presença de familiares e profissionais de saúde. No que se refere às estratégias para lidar com as limitações da sexualidade, identificou-se a presença da terapia medicamentosa, de amigos que estavam há mais tempo realizando o tratamento hemodialítico, e percebeu-se também a importância da orientação dos profissionais, para que tivessem uma vida sexual saudável.
Diante desse contexto, ressalta-se que o desenvolvimento dessa pesquisa oferece subsídios para a atuação dos profissionais da área da saúde, em especial o enfermeiro, que é um dos integrantes da equipe que está mais próximo do paciente, com o intuito de contribuir para a promoção da atenção integral ao paciente renal crônico, em todas as dimensões do cuidado, incluindo a sexualidade. Acredita-se que este estudo é de grande relevância para o direcionamento dos profissionais, no que diz respeito à necessidade de capacitação e sensibilização dos mesmos para abordar e desenvolver intervenções para os déficits da sexualidade e, com isso, perceberem o paciente renal crônico sob uma visão holística, atendendo suas necessidades humanas básicas.
Ainda, a partir das informações que emergiram do presente estudo, ressalta-se a importância do cuidado do enfermeiro para desenvolver atividades que auxiliem na vivência e na aceitação das modificações ocasionadas pela condição crônica, englobando não só os pacientes, mas também suas companheiras, familiares e amigos.
Uma das potencialidades dos serviços de saúde é o trabalho interdisciplinar, que visa colaborar na qualificação da assistência à saúde. Assim, acredita-se que essa metodologia contribuiria na designação de estratégias a fim de colaborar no cuidado ao paciente renal crônico.
Enfatiza-se sobre a importância do desenvolvimento de trabalhos científicos que abordem a temática da sexualidade humana no processo de adoecimento, com o intuito de compreender as modificações que ocorrem nessa etapa da vida das pessoas acometidas por doenças, inclusive as crônicas. Dessa forma, há possibilidade de serem desvendadas estratégias que possam contribuir para o enfrentamento das modificações impostas pela doença.
REFERÊNCIAS
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