Introdução
Estimativas da Agência Internacional de Pesquisa sobre câncer sinalizaram que, em 2012, 14,1 milhões de novos casos de câncer ocorreram no mundo, sendo 8 milhões desses casos advindos de países em desenvolvimento. O número total de mortes nesse mesmo ano foi de 8,2 milhões 1.
Mais de dois terços dessas 8,2 milhões de mortes anuais por câncer ocorrem em países de renda média e baixa. Apenas o brics (grupo de emergentes composto por Brasil, Rússia, Índia, China e Africa do Sul) concentrou 42 % desse total, ou seja, quatro em cada dez casos. Os prejuízos às economias desses países somam US$ 46,3 bilhões, aproximadamente R$ 150 bilhões 2.
Os gastos expressivos aliados ao aumento do número de portadores dessa comorbidade demonstram a magnitude desse problema no Brasil, o que o configura como importante problema de saúde pública 3. Para o biênio 2018/19 é esperada a notificação de 600 mil novos casos de câncer anualmente em território brasileiro 4.
Prestar assistência ao portador de câncer, em determinadas situações, também significa lidar com a possibilidade de morte. O paciente com diagnóstico de câncer em fase terminal pode permanecer hospitalizado por um longo período, com consequências em seu estado físico e mental tais como: dor, ansiedade e depressão. A presença de um familiar ou cuidador nesse momento pode proporcionar apoio e confiança, no entanto, esse acompanhante também é tomado por vários sentimentos, dentre eles a dor que partilha com o paciente internado 5. Neste sentido, a enfermagem é responsável por dar atenção, apoio emocional e informações ao acompanhante nesse período crítico 6.
Observa-se formas diferenciadas adotadas pela enfermagem para lidar com a finitude, fazendo com que o profissional por vezes se distancie do paciente e dos familiares, como estratégia de defesa 7. Um estudo de revisão sistemática acerca da literatura nacional brasileira identificou que trabalhadores com maior indicação de estresse fazem maior uso, no contexto laboral, de estratégias como fuga-esquiva, afastamento e confronto. Porém, quando não associado ao estresse, a estratégia de enfrentamento mais utilizada foi a resolução de problemas 8.
Estudos demonstram que a enfermagem direciona sua atenção ao paciente, negligenciando o acompanhante. A falta de apoio emocional aumenta o nível de cansaço e estresse o que resulta em isolamento, insegurança e sobrecarga, com piora substancial da qualidade de vida desses acompanhantes 9,10. A despersonalização gerada em um atendimento da enfermagem, que não considera o acompanhante como parte do processo, recai diretamente sobre o paciente, pois um acompanhante ansioso e inseguro trará consequências negativas sobre o quadro do indivíduo internado 11.
Diante desta problemática, questiona-se: qual a percepção do técnico de enfermagem em relação ao acompanhante do paciente oncológico em fase terminal? Para responder esta questão norteadora, o estudo teve como objetivo compreender a percepção dos técnicos de enfermagem em relação aos acompanhantes de pacientes oncológicos em fase terminal.
Metodologia
Trata-se de uma pesquisa descritivo-exploratória, de natureza qualitativa. A abordagem qualitativa se aplica ao estudo da história, das relações, das representações, das crenças das percepções e das opiniões dos indivíduos 12.
O estudo foi desenvolvido nas Unidades de Internação e no Pronto Atendimento de um hospital público de grande porte, referência para o tratamento do câncer na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais. Foram seguidas as orientações expressas na Resolução MS 466/2012 13 que trata de pesquisas com seres humanos e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (Parecer n° 1.652.086) e também pelo CEP do referido hospital (Parecer n° 1.688.039). Todo o trabalho de campo foi iniciado após a aprovação pelos cep supracitados, respeitando o exigido pela legislação brasileira.
Foram incluídos os técnicos de enfermagem de ambos os sexos dos períodos diurno e noturno com atuação no pronto socorro e na unidade de internação. Foram excluídos os profissionais que estivessem de licença saúde ou férias no período da coleta de dados.
Por se tratar de uma pesquisa qualitativa, as entrevistas foram encerradas quando houve a saturação de dados. O critério de saturação de dados se concretiza assim que o conhecimento formado pelo pesquisador no campo capta a lógica formal do grupo estudado. Em outras palavras, a inserção de novos participantes não resultará na formulação de novas ideias ou categorias empíricas para o estudo 12.
Foram entrevistados 18 profissionais das unidades de internação e pronto socorro do referido hospital. A escolha dessas unidades se deve à sua proximidade com os acompanhantes. O pronto atendimento é o setor no qual o acompanhante e o paciente se inserem no hospital, sendo o primeiro contato com a instituição, especialmente em caso de intercor-rências. Já, na unidade de internação, a permanência do acompanhante é permitida durante o tempo que for necessário, portanto é um local que propicia convivência entre equipe e acompanhante.
Para a realização da coleta de dados foi elaborado um roteiro semiestruturado pelas próprias pesquisadoras e que, após aprovação dos cep citados, passou por uma fase de validação, por meio de 3 pré-testes que não identificaram a necessidade de ajustes. O instrumento de coleta continha dados sociodemográficos como sexo, idade, tempo de atuação na instituição e tempo de trabalho com o paciente oncológico. Também, o roteiro foi dotado de questões que discutiam a percepção dos técnicos de enfermagem em relação à permanência dos acompanhantes com o paciente terminal, além de fatores que poderiam dificultar a interação do profissional e acompanhante.
As entrevistas tiveram a duração de aproximadamente 20 minutos, realizadas em horários previamente agendados com a coordenação de enfermagem. Foram convidados os profissionais que estivessem no plantão diurno e noturno no momento da presença da pesquisadora no campo. A fim de manter a confidencialidade e anonimato dos entrevistados, as entrevistas foram realizadas de forma individual em sala cedida pela instituição, sendo atribuídos códigos identificadores de acordo com a sequência em que ocorreram as entrevistas (TE1, TE2, TE15).
Para a análise das entrevistas, utilizou-se a análise do conteúdo que realiza um conjunto de técnicas de análise das comunicações com o intuito de obter, por procedimentos sistemáticos, a descrição do conteúdo das mensagens e indicadores que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens. A técnica se baseia em três fases fundamentais: a pré-análise, considerada a fase de organização que utiliza leitura flutuante, hipóteses, objetivos e elaboração de indicadores; a exploração do material que engloba codificação a partir de unidades de registro; e a fase de tratamento dos resultados que realiza a categorização desses dados 14.
Resultados
18 técnicos de enfermagem participaram do estudo, sendo 66,7 % (n = 12) do sexo feminino e 33,3 % (n = 6) do sexo masculino. Em relação ao turno de trabalho dos profissionais entrevistados, 44,44 % (n = 8) pertenciam ao turno matutino e 55,56 % (n = 10) pertenciam ao noturno.
A média de idade dos profissionais foi de 35,4 anos, com média de 38,8 anos para o sexo feminino e 28,8 anos para o sexo masculino. O tempo de trabalho na instituição resultou em uma mediana de 5,5 anos e a mediana de tempo de atuação com o paciente oncológico foi de 5 anos.
Após uma breve discussão do perfil dos entrevistados, procedeu-se à análise, em profundidade, das entrevistas na qual foram identificadas duas categorias empíricas:
O conviver cotidiano do técnico de enfermagem e acompanhante do paciente oncológico em fase terminal
Foi demonstrado nos discursos que os profissionais de saúde percebem o acompanhante como essencial na rotina enfrentada pelo paciente em fase terminal:
É muito bom o aconchego familiar, faz toda a diferença, pois faz com que o paciente se sinta confiante [TE1].
Avalio de maneira positiva estar em companhia familiar, acho que o paciente se sente mais seguro. Alguns acompanhantes ficam com o paciente por meses no hospital, acho bem positivo, o paciente se sentir amparado pelo familiar [TE2].
A presença do acompanhante é muito importante para o conforto do paciente, pois dá segurança e ele se sente acolhido pela família [TE8].
Alguns profissionais também relataram que os acompanhantes percebem que a hora de seu familiar está próxima e isso resulta em sentimentos:
Eles ficam um pouco deprimidos, impacientes, agitados, intolerantes e alguns choram muito [TE2].
Eles percebem que a hora do paciente está próxima pela forma ainda mais carinhosa que agem com os mesmos [TE7].
Normalmente os acompanhantes ficam desesperados, chorosos ou nervosos. E tem acompanhante que, quando percebe que seu ente querido não passará daquela noite ou dia, ele vai embora. Acredito ser uma fuga [... ] mas ver um paciente falecer sem um parente próximo é muito triste [TE10].
Nessa perspectiva iminente da finitude, boa parte das reações dos acompanhantes são descritas com sentimentos de não aceitação e podem ser esperadas ações por parte da enfermagem:
Aceitação do familiar em relação ao estado do paciente é importante, pois mesmo sabendo que no momento é só conforto, alguns familiares não aceitam [TE4].
Quando o acompanhante já sabe do estado do paciente e mesmo assim quer que todos nós nos desdobremos para salvar a vida dele, não é fácil [TE7].
Os participantes relataram inúmeros fatores que podem influenciar na interação desses profissionais com os acompanhantes. Tais fatores foram agrupados na categoria empírica abaixo:
Fatores dificultadores da interação dos técnicos de enfermagem com os acompanhantes
Os profissionais relatam que a falta de comunicação é um fator que resulta em desentendimentos com os acompanhantes:
A falta de comunicação e de resiliência de ambas as partes. O médico deve sempre ser claro com o acompanhante sobre o estado geral do paciente [TE12].
Os acompanhantes deveriam ser melhor orientados de sua função como acompanhantes, pois, às vezes, eles mais atrapalham do que ajudam [TE13].
Em minha opinião, a falta de informação de muitos deles é o que dificulta um bom relacionamento entre a equipe de enfermagem e os respectivos acompanhantes [TE11].
Contudo, alguns profissionais relataram o que deve ser feito a fim de reduzir os problemas de comunicação entre eles e os acompanhantes:
Passar as orientações para os acompanhantes no ato da admissão, quanto às regras do setor [TE11].
O médico deve sempre ser claro para o acompanhante sobre o estado geral do seu familiar [TE12].
Outro fato levantado nos discursos foi a falta de preparo do profissional de enfermagem para lidar com esse momento de dor e angústia da família na ocasião da perda do ente querido:
O sofrimento da família, às vezes, deixa o trabalho da enfermagem difícil, pois muitas vezes não sabermos confortar a família, nem ter solução para aquele paciente em fase terminal [TE8].
Eles percebem, e imediatamente, que a hora de seu familiar se aproxima e comunicam a nós, da enfermagem, sobre as alterações, pedem para encontrarmos uma solução! [TE11].
Portanto, percebe-se a necessidade de um apoio psicológico ao paciente e aos familiares, como evidenciado nos discursos:
O acompanhante deveria ter acompanhamento de um psicólogo na fase terminal, pois é um momento difícil para a família [TE14].
Devia ter acompanhamento do psicólogo as 24 horas e fisioterapeuta à noite, pois facilitaria o trabalho [TE17].
Outro fator que influencia de forma negativa todo o processo durante o plantão é a sobrecarga de trabalho. Alguns acompanhantes demandam muita atenção da enfermagem o que dificulta o trabalho do profissional, já que a escala de plantão geralmente é limitada em recursos humanos:
Quanto a nós da enfermagem, alguns são super educados e reconhecem a minuciosidade de nosso trabalho. Já outros, não querem saber a quantidade de pacientes que temos dentro do PA e querem atendimento urgente [TE11].
[...] a sobrecarga e o grau de dificuldade dos pacientes muito dependentes, isso dificulta [TE17].
Gostaria que tivesse mais respeito ao profissional, com menos sobrecarga de serviço [TE16].
O que dificulta é eles pensarem em questão de exclusividade para o paciente, não somos exclusivos! [TE15].
Discussão
Foi evidenciado nos discursos que os profissionais de saúde percebem que o acompanhante proporciona segurança e acolhimento, sendo essencial sua permanência junto ao paciente em fase terminal. No momento em que um diagnóstico de câncer é confirmado, a dinâmica familiar passa por transformações e rearranjos em sua organização interna, a fim de atender às necessidades do indivíduo acometido pelo câncer. Nesse momento de vulnerabilidade do paciente, a família é aliada no enfrentamento da hospitalização, por meio da partilha de apoio e segurança junto à equipe 15.
Os profissionais de saúde devem inserir o acompanhante nesse processo para que este se sinta simultaneamente acolhido e corresponsável pelo processo de cuidar 16. A interação desse acompanhante com o paciente em fase terminal deve ser estimulada pela equipe que pode encorajá-lo a demonstrar seu afeto pelo paciente por meio de toques e gestos; tal fato pode fortalecer a relação entre ambos 17.
No entanto, também foi evidenciado que o acompanhante possui dificuldades quanto à aceitação da perda desse paciente/familiar. O enfrentamento do estresse desencadeado pela situação geradora de conflitos depende de atributos pessoais de natureza cultural e emocional, baseado nas experiências de vida de cada indivíduo e em sua personalidade 18. Dessa forma, o coping é uma estratégia de enfrentamento que objetiva o controle do estresse emocional a partir de comandos cognitivos 19.
No presente estudo, a estratégia de fuga e esquiva era comumente utilizada, diante da possibilidade da morte daquele paciente. Em contrapartida, estudo realizado com acompanhantes evidenciou que a reavaliação positiva (com foco no crescimento pessoal e dimensão religiosa) e o suporte social foram as estratégias de coping mais utilizadas para o enfrentamento das situações estressoras no cotidiano hospitalar, sendo a fuga e esquiva as menos utilizadas 20. Observa-se a necessidade de a instituição de saúde ofertar serviços de apoio religioso e emocional às famílias, contemplando crenças religioso-espirituais dos familiares, de forma a estimular estratégias de coping positivas. Intervenções em grupo podem diminuir a sobrecarga emocional de familiares e cuidadores, conferindo maior satisfação e promovendo interação com a equipe 21.
Sintomas comuns nos cuidadores, como humor deprimido e insónia, podem ser evitados por meio de intervenções de cunho psicológico 22 direcionadas para a manutenção da esperança ao cuidar de um paciente em fase terminal, pois a manutenção dessa esperança é fator protetor contra a sobrecarga em cuidadores 23. Ademais, o humor do cuidador possui relação direta e significativa com a qualidade emocional do paciente, ou seja, se o humor do cuidador piora, o mesmo ocorre com o estado emocional do paciente. Portanto, ambos devem ser foco de intervenções por parte da equipe de enfermagem 24.
As abordagens nocivas também podem ser usadas pela equipe de enfermagem, já que esta lida diariamente com agentes estressores em sua rotina diária. Há um despreparo dos profissionais de saúde em lidar com a terminalidade, classificando-a da forma biologista como falência das funções vitais. Ao utilizar essa abordagem reducionista, os profissionais experimentam sensações de impotência e frustração diante da morte 25. De fato, isso foi evidenciado nos discursos dos técnicos de enfermagem quando os mesmos relataram que o sofrimento da família era algo que os sensibilizava e acarretava sensação de impotência diante da situação do paciente em fase terminal.
O processo de perda elaborado de forma inadequada pelos profissionais faz com que os mesmos se distanciem do paciente e dos acompanhantes, como estratégia de proteção contra o sofrimento. O trabalho da enfermagem com acompanhantes de pacientes em fase terminal em ambiente hospitalar é um processo desafiador para a equipe, pois esse distanciamento pode resultar em limitações e desqualificação do processo de cuidar 7.
Em estudo de revisão integrativa, foi demonstrado um incremento de publicações brasileiras acerca da temática morte/morrer nos últimos anos. No entanto, o assunto ainda tem sido pouco discutido pelas instituições de ensino formadoras, fazendo com que tanto profissionais de enfermagem quanto acadêmicos recorram a formas inadequadas para lidar com o estresse e o sofrimento gerados pelo momento vivenciado. Por vezes, os profissionais podem se comportar de forma impessoal e tecnicista a fim de elaborar o processo da perda 25. Podem até mesmo ocultar a verdade sobre o real quadro do paciente ou desviar o assunto, pois não se sentem aptos para abordá-lo 26.
Observa-se que boa parte dos cursos de enfermagem não dispõe de disciplinas que contemplem o tema morte com a ênfase necessária, diante de sua grande complexidade 25. Como resultado, a percepção do processo morte/morrer por parte do profissional é limitada o que atrapalha a sua abordagem e discussão sobre o tema de forma acolhedora 23,27.
A fim de minimizar esse problema no meio hospitalar, estratégias como educação continuada da equipe, gestão participativa e reuniões periódicas que discutam as suas dificuldades no processo, podem ser utilizadas pelo gestor para promover mudanças positivas de comportamento. Com isso, ocorre redução do absenteísmo no trabalho, aumento da produtividade e redução dos riscos ocupacionais, com repercussões positivas na qualidade do cuidado prestado 28.
A falta de clareza das informações a serem dadas aos familiares e ao paciente com câncer e a falta de comunicação quanto ao real quadro do familiar em estágio terminal, também foram relatados pelos depoentes da pesquisa, o que causou conflitos na relação profissionais/acompanhantes. Há falhas na comunicação entre profissionais e acompanhantes, pois não destinam tempo suficiente para se comunicarem 29. As principais preocupações do acompanhante se relacionam às necessidades de informação, além das necessidades emocionais e psicológicas 30,31.
A fim de promover essa interação com o acompanhante, a comunicação é essencial para que a confiança seja estabelecida nessa relação 32. Ao envolver o acompanhante no processo, verifica-se que a ênfase da equipe recai sobre orientações educacionais acerca do contexto vivenciado, menos discussões relacionadas apenas à execução das tarefas, com estreitamento do vínculo entre as partes 33.
A equipe de enfermagem deve conter atributos que a façam ser reconhecida por sua capacidade de transmitir segurança aos pacientes e acompanhantes, tanto no âmbito técnico quanto no âmbito emocional. Características como a escuta diferenciada e a abordagem do outro com dignidade foram citados por pacientes e acompanhantes como estratégias de comunicação utilizadas pelo enfermeiro a fim de executar de forma holística a assistência, focando de forma adequada na termi-nalidade 34.
É evidenciado que os anos de experiência de trabalho em enfermagem influenciam na percepção do enfermeiro no que tange às necessidades dos acompanhantes e pacientes no fim da vida; sendo aqueles com maior tempo de trabalho na saúde dotados de maior percepção dessas necessidades e desenvolvimento de diálogos mais efetivos 35.
Obteve-se no estudo uma mediana de 5 anos de atuação dos profissionais com o paciente oncológico, entretanto, esse tempo não resultou na tomada de atitudes baseadas em segurança e diálogo com o acompanhante. Dessa forma, faz-se necessária a identificação de um rol de competências para a atuação dos profissionais na área da oncologia. Os gaps identificados na formação do profissional possibilitarão o desenvolvimento de competências necessárias à sua atuação. De fato, experiências anteriores auxiliam na aquisição de competências, mas não as garantem sem capacitações direcionadas pela organização e também por meio de aperfeiçoamentos realizados pelo próprio profissional 36.
Metodologia muito utilizada atualmente para a aquisição de competências e que visa aprimorar o processo de ensino-aprendizagem é a simulação realística. Pesquisas têm demonstrado que os profissionais se beneficiam do método na medida em que atuar em um ambiente controlado que simula situações clínicas do cotidiano resulta em aquisição de conhecimentos, redução da ansiedade e aumento de autoconfiança profissional 37,38.
Nos depoimentos também foi evidenciado que há a sobrecarga de trabalho permeando todo o processo na oncologia o que influencia, de forma negativa, toda a dinâmica organizacional instituída. A sobrecarga surge como principal razão de insatisfação no processo de trabalho em oncologia 39. Além da sobrecarga de trabalho, há outros fatores estressantes, dentre eles podem ser citados as duplas jornadas, ausência de estrutura física e baixos salários, resultando em despersonalização, desgaste emocional e incompetência por parte dos profissionais que assistem os pacientes oncológicos 40.
De fato, medidas que visam aprimorar a escala de plantão com melhorias na estrutura física institucional podem ter efeitos positivos na sobrecarga de trabalho da equipe. Além disso, incentivar a autonomia dos enfermeiros e a remuneração adequada de técnicos de enfermagem podem ser considerados fatores de satisfação profissional em oncologia 41 e constituir em estratégias utilizadas pelo gestor para a melhoria do processo de trabalho.
Conclusão
O acompanhante do paciente oncológico em fase terminal vivencia momentos difíceis e pode experimentar sentimentos como angústia, medo e tristeza diante da terminalidade de seu familiar. Entretanto, sua presença no ambiente hospitalar pode promover a aceitação do paciente frente à sua finitude, além de constituir um elo desse indivíduo com o mundo exterior e seu meio social nesse período tão delicado.
A pesquisa evidenciou o acompanhante como fundamental no processo de cuidar, proporcionando ao paciente segurança e acolhimento. Os conflitos gerados nesse período se devem a inúmeros fatores, dentre eles, o mais citado foi o fator comunicação. A comunicação é um instrumento essencial do cuidado, seja ela verbal ou não verbal, por meio de gestos ou toques.
A partir do momento em que se estabelece uma comunicação efetiva entre o técnico e o acompanhante, com uma escuta qualificada, ocorrerá a identificação das necessidades dos membros envolvidos, com redução de desentendimentos e desgaste das relações. Fornecer orientações aos acompanhantes acerca de seu papel é essencial, pois essa definição de papéis e dos limites de atuação de cada um podem reduzir situações conflitantes na prática diária.
Além do repasse insuficiente de informações, o acompanhante não recebe suporte emocional adequado o que pode resultar na utilização de estratégias inadequadas para lidar com as diversas situações vivenciadas. Nota-se que o técnico de enfermagem também não recebe tal suporte emocional. Como resultado desse despreparo em lidar com a finitude, ocorrem conflitos que resultam em sentimentos de frustração e impotência, com possibilidade de levar esse profissional a adoe-cimentos e comprometimento de sua saúde mental.
Propiciar espaços nas instituições que favoreçam a troca de experiências entre os profissionais que lidam diariamente com a terminalidade favorece a elaboração coletiva de enfrentamentos adequados direcionados às situações de estresse vivenciadas. Dessa forma, rodas de conversa conduzidas por psicólogos podem resultar em melhora do estado emocional dos profissionais envolvidos. Outra forma de efetivar essa troca de experiências entre os profissionais é a simulação realística na qual há interação entre os profissionais envolvidos com tomada de decisões de forma adequada no contexto em saúde. Simular situações de estresse vivenciadas no cotidiano resulta em comunicação efetiva entre a equipe, aprimoramento teórico-prático, além da melhora no preparo emocional desses profissionais.
De forma semelhante, o acompanhante também necessita de espaços de interação que estimulem a convivência entre os próprios acompanhantes e os profissionais da equipe. Como resultado, a criação de vínculos por meio da comunicação se efetiva com melhorias na qualidade da assistência prestada.