Introdução
Ao considerar as relações que contribuem para a qualidade de vida, acredita-se que o trabalho, devido à sua expressiva significância na vida do indivíduo, além da satisfação das necessidades financeiras e materiais, gera impacto direto no bem-estar, na autoestima e na realização pessoal 1. Por atuar sobre as dimensões sociais e psicológicas, entende-se que o trabalho desempenha fator protetor de saúde, uma vez que possibilita obtenção de recursos que proporcionam estabilidade e desenvolvimento de capacidades individuais e coletivas 2.
A insatisfação com as condições de trabalho, seja decorrente de fatores físicos presentes no ambiente, seja das situações vivenciadas no exercício profissional, pode provocar problemas de saúde 3,4, como lesões musculoesqueléticas, transtornos mentais e emocionais 4, representando consequências negativas para a qualidade de vida do trabalhador. Ademais, pode causar prejuízos para a assistência prestada, podendo ser associada, inclusive, à intenção de abandono da profissão 5. Por consequência, as atividades laborais podem refletir em melhor ou pior qualidade de vida.
No que se refere ao processo de trabalho dos profissionais de enfermagem, as denominadas "cargas de trabalho" - biológicas, químicas, mecânicas, físicas, fisiológicas e psíquicas - são geradoras de desgaste 6 e podem comprometer a satisfação, a qualidade de vida do profissional e prejudicar a assistência ao paciente 7. No ambiente hospitalar, o processo torna-se progressivo e cumulativo, visto que o profissional se expõe simultaneamente a várias cargas ou riscos.
Além das condições laborais, com estruturas físicas inadequadas, escassez no quantitativo de trabalhadores, jornadas excessivas e riscos ocupacionais a que os profissionais de enfermagem estão expostos 8, o tempo dedicado ao autocuidado, ao lazer e às relações sociais tem se tornado cada vez mais reduzido 9. A associação desses fatores, portanto, pode repercutir de maneira negativa na saúde dos profissionais.
A partir desse contexto, compreende-se que a discussão de questões relacionadas à qualidade de vida e à satisfação profissional torna-se essen-cial e determinante para o entendimento do cuidado. Assim, a realização das ações de enfermagem requer a satisfação do conjunto de necessidades da clientela e dos integrantes da equipe que as desenvolvem, podendo influenciar positivamente na qualidade da assistência 10,11.
Nesse sentido, objetivou-se avaliar a satisfação profissional assim como a qualidade de vida dos enfermeiros de um hospital público brasileiro e analisar a relação entre a satisfação no trabalho e a qualidade de vida dos participantes.
Materiais e método
Trata-se de uma pesquisa descritiva, com delineamento seccional, realizada em um hospital público de nível terciário na cidade do Rio de Janeiro, Brasil. A instituição é responsável por prestar assistência onco-hematológica à população.
Estabeleceram-se como critério de inclusão os enfermeiros plantonistas, sendo excluídos os das unidades ambulatoriais e os que não desempenhavam funções diretamente assistenciais. Dessa forma, dos 73 enfermeiros que atuavam nas unidades de internação e no Serviço de Pronto Atendimento, três encontravam-se de licença médica, um de férias durante o período de coleta de dados e um profissional foi excluído por conflito de interesse. Assim, para fins deste estudo, foram elegíveis 68 enfermeiros.
A fase de coleta de dados ocorreu nos meses de março e abril de 2017, por meio da aplicação de três instrumentos: o questionário sociodemográ-fico, o World Health Organization Quality of Life (WHOQOL-Bref) 12 e o Índice de Satisfação Profissional (ISP) 13.
O questionário sociodemográfico foi constituído pelas variáveis: sexo, idade, estado civil, número de filhos, carga horária semanal de trabalho, existência de outro vínculo empregatício, tempo de formação profissional e de serviço na unidade, setor e função de atuação dos profissionais abordados.
Em seguida, foi aplicado o WHOQOL-Bref, instrumento autoaplicável de avaliação da qualidade de vida (QV), composto por 26 questões distribuídas em domínios que têm por objetivo analisar a capacidade física, o bem-estar psicológico, as relações sociais e o meio ambiente no qual o indivíduo está inserido, assim como sua QV global 12. Visto que a literatura não descreve pontos de corte válidos para classificar os escores do WHOQOL-Bref em bom ou ruim 14, o que impossibilita normatização em relação à QV, realizou-se análise comparativa das pontuações entre os domínios assim como do percentual de contribuição na QV global.
Para mensurar o nível de satisfação profissional dos participantes, utilizou-se da escala de atitudes do isp, composta por 44 afirmativas, que permite verificar como o trabalhador avalia sua situação atual de trabalho. Os componentes da satisfação profissional avaliados são: autonomia, interação, status profissional, requisitos do trabalho, normas organizacionais e remuneração 13.
Os escores médios dos componentes da referida escala são dispostos em intervalo de um a sete, indicando que valores mais elevados estão associados a maior satisfação com aquela dimensão de seu trabalho 15. Para a interpretação dos resultados, foi utilizado o centro da escala de satisfação profissional como ponto de corte, ou seja, valores acima de quatro indicaram satisfação; pontuações inferiores, insatisfação profissional.
Os dados coletados foram distribuídos em um banco de dados do Microsoft Excel para a análise das variáveis sociodemográficas e ocupacionais, com o objetivo de caracterizar a população do estudo. Após obter os escores médios relativos aos domínios do WHOQOL-Bref e dos componentes do isp, seguiram-se o processamento e a análise das informações pelo software estatístico R Project versão 3.3.1.
Posteriormente, aplicou-se o teste de normalidade de Shapiro-Wilk, considerando um nível de significância de 5 %. Em seguida, foram realizados os testes de hipóteses com as variáveis: sexo, idade, estado civil, quantidade de vínculos empregatícios, tempo de formação profissional e setor de atuação do enfermeiro na unidade pesquisada.
Os testes não paramétricos utilizados foram o Wilcoxon na comparação de até dois grupos e Kruskal-Wallis em variáveis com mais de duas categorias. Os dados com distribuição de normalidade foram submetidos ao t de Student, em análises comparativas de dois grupos, e à ANOVA, quando acima de dois grupos.
Com a finalidade de verificar a magnitude de associação entre satisfação profissional e qualidade de vida, foram utilizados os coeficientes de correlação de Spearman (p) e Pearson (r), respeitando-se a suposição de normalidade.
O estudo atendeu aos preceitos éticos e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto Estadual de Hematologia Arthur Siqueira Cavalcanti, sob o protocolo 1.960.994/2017 e com o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética 65037217.2.3001.5267. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi obtido após a anuência dos participantes e os esclarecimentos quanto à participação voluntária, à confidencialidade e à privacidade de sua identidade.
Resultados
Os participantes deste estudo são predominantemente do sexo feminino (91,2 %), com destaque para os profissionais na faixa etária de 31 a 40 anos (45,6 %). Constatou-se que 30 (44,1 %) são solteiros, 41 (60,3 %) não têm filhos e mais da metade dos participantes (52,9 %) tinha entre seis e dez anos de tempo de formado. No que se refere às características ocupacionais, destaca-se que 35 (51,4 %) enfermeiros possuem dois ou mais vínculos empregatí-cios, dos quais 23 (33,8 %) cumprem carga horária entre 31 e 60 horas semanais.
A Emergência e o Serviço de Pronto Atendimento apresentaram a maior concentração de profissionais, com 18 (26,5 %) e 12 (17,6 %) enfermeiros, respectivamente. Quanto ao tempo de atuação, 28 (41,2 %) participantes afirmaram trabalhar entre dois e três anos nos setores em que se encontram alocados.
A Escala de Atitudes do ISP indicou baixa satisfação profissional geral entre os enfermeiros, com um escore médio de 3,44 pontos. A remuneração (1,66 pontos) configurou o componente de avaliação mais baixa, e o status profissional (5 pontos) destacou-se como o único acima do centro da escala, demonstrando maior satisfação em relação à importância que os participantes atribuem ao seu trabalho.
Quanto à distribuição do escore médio dos componentes do ISP (Figura 1), é notável a insatisfação com a remuneração e as normas organizacionais. Observa-se em comum, além da simetria entre as caixas, a concentração dos dados em escores menores, todos abaixo do patamar de quatro pontos, evidenciando que nenhum dos participantes assume caráter indeciso ou satisfatório em relação a esses componentes.
![](/img/revistas/aven/v39n1//0121-4500-aven-39-01-52-gf1.jpg)
Fonte: elaboração própria.
Figura 1 Boxplot: distribuição do escore médio dos componentes do índice de Satisfação Profissional dos enfermeiros. Rio de Janeiro, 2017
No que concerne à satisfação com a execução das tarefas e das atividades inerentes ao exercício profissional, ou seja, os requisitos do trabalho, os dados assumem comportamento mais disperso, inclinando-se a patamares inferiores (3,30 pontos), assim como na interação enfermeiro-médico 3,36. Nota-se que cerca de 75 % dos participantes demonstram níveis de insatisfação em relação a ambos os componentes.
Visto que o instrumento prevê distinção na análise da interação, o relacionamento enfermeiro-enfermeiro representou o único componente a atingir patamares máximos de satisfação. Destaca-se que tanto esse componente como o status profissional evidenciaram mediana ao nível de cinco pontos, com concentração de mais de 75 % dos participantes acima do ponto de corte que aponta para a satisfação.
Após a aplicação do Shapiro-Wilk entre os componentes do ISP e o escore total dos participantes, procedeu-se à análise sociodemográfica com a realização dos testes de hipóteses entre os grupos existentes nas variáveis sexo, idade, estado civil, quantidade de vínculos empregatícios, tempo de formação proissional e setor de atuação do enfermeiro na unidade pesquisada, de acordo com os componentes e o escore total do ISP (Tabela 1).
Tabela 1 Resultados do p valor após a associação entre os componentes do ISP e as variáveis sociodemo-gráficas dos enfermeiros. Rio de Janeiro, 2017
![](/img/revistas/aven/v39n1//0121-4500-aven-39-01-52-gt1.gif)
*Correlação significativa para p valor < 0,05.
Fonte: elaboração própria.
Observa-se uma diferença estatística significativa, com p valor igual a 0,03, entre a variável sexo e a remuneração. Do mesmo modo, o setor de atuação revelou-se signiicativo em relação às normas organizacionais, aos requisitos do trabalho, à autonomia, à interação e ao valor total encontrado no ISP.
Quanto à qualidade de vida dos enfermeiros, foi evidenciada maior média geral no domínio físico (65,9 %). Todavia, as facetas relacionadas à dor e à necessidade de tratamento médico na vida diária obtiveram as piores avaliações mensuradas pelo WHOQOL-Bref.
Em seguida, no domínio das relações sociais a média foi de 65,7 %. As facetas mensuradas avaliaram as interações, o suporte/apoio social e a ativi-dade sexual dos investigados.
A avaliação do campo psicológico resultou em 64,4 % de contribuição na QV. Esse domínio indicou a auto-percepção dos enfermeiros a: sentimentos positivos e negativos, capacidade de pensar, aprender, memorizar e concentrar-se. Outrossim, a autoestima, a imagem corporal e a espiritualidade contribuíram para a consideração dessa dimensão.
O meio ambiente apresentou a menor contribuição na QV dos enfermeiros (55,1 %). Nesse aspecto, avaliaram-se questões de segurança física, disponibilidade/qualidade dos cuidados de saúde, oportunidades de adquirir informações, aspectos relacionados à poluição/clima, aos meios de transporte, à habitação, à disponibilidade de recursos financeiros e a oportunidades de lazer. As três últimas destacaram-se por apresentarem baixa avaliação do ponto de vista dos investigados.
Quanto à QV referida e à satisfação com a saúde, os participantes apresentaram média de 59 %. Essa autoavaliação e a análise dos domínios físico, psicológico e das relações sociais indicaram que, pelo menos, 75 % dos participantes atribuíram pontuação de no mínimo 50 % de tais aspectos em sua QV.
Para todos os domínios presentes na análise do instrumento, as medianas foram dispostas acima da linha média no gráfico (Figura 2). Todavia, o domínio relações sociais, no centro do gráfico, apresentou o comportamento mais disperso.
![](/img/revistas/aven/v39n1//0121-4500-aven-39-01-52-gf2.jpg)
Fonte: elaboração própria.
Figura 2 Boxplot com as medianas dos domínios da QV dos enfermeiros, conforme o WHOQOL-Bref. Rio de Janeiro, 2017
Quando analisados os resultados do WHOQOL-Bref, a partir das covariáveis do questionário sociode-mográfico (Tabela 2), percebe-se que o sexo em relação ao domínio psicológico não apresentou distribuição simétrica entre os pares (p = 0,01). Similarmente, constatou-se que o setor de atuação do enfermeiro sugeriu diferença estatística tanto no domínio ambiente (p = 0,04) quanto no escore total do WHOQOL-Bref (p = 0,03). Entretanto, nas demais variáveis, nenhuma associação foi demonstrada.
Tabela 2 Resultados do p valor após a associação entre os domínios do WHOQOL-Bref e as variáveis socio-demográficas. Rio de Janeiro, 2017
![](/img/revistas/aven/v39n1//0121-4500-aven-39-01-52-gt2.gif)
*Correlação significativa para p valor < 0,05.
Fonte: elaboração própria.
No que se refere à análise da magnitude de correlação entre os componentes relativos à percepção da satisfação profissional com os domínios de avaliação da QV por parte dos enfermeiros investigados, os testes de correlação de Pearson e Spearman revelaram associação positiva. Vale destacar que, apesar de o aumento de uma variável determinar o incremento da outra (Figura 3), o caráter de tal associação é fraco (r = 0,27).
Discussão
A avaliação da satisfação proissional indicou que os enfermeiros se encontram insatisfeitos com sua situação laboral. A análise da QV, por sua vez, demonstrou ter maior contribuição do domínio físico dos investigados. Houve demonstração de uma relação positiva entre a satisfação no trabalho e a QV dos participantes, entretanto uma associação de baixa magnitude.
A investigação revelou diferença estatística signi-icativa do sexo dos enfermeiros investigados em relação aos resultados do domínio psicológico e da remuneração. Dessa forma, é possível inferir que há variação na avaliação entre fatores da qualidade de vida e da satisfação proissional pelos pares.
Como possíveis aspectos de impacto psicológico negativo sobre a vida privada do proissional estão as exigências como longas jornadas de trabalho, a inexistência ou a escassez de pausas para o repouso e o ritmo laboral acelerado. Esses fatores podem acarretar falta de atenção nas responsabilidades familiares e se tornar fonte de culpa e sofrimento, sobretudo para a mulher 16.
No que concerne ao tempo de atuação proissional, destaca-se que a participação dos enfermeiros no mercado de trabalho reduz pela metade após os dez primeiros anos do exercício proissional, com taxa de evasão de 10 % logo no primeiro ano de atuação. Assim, a insatisfação laboral é apontada como um dos motivos que culminam no abandono da carreira e na rotatividade da força de traba lho de enfermagem 10,17,18, gerando perdas nos âmbitos social e económico, além de perda para os serviços de saúde 10,17.
Esse alarme anuncia a gravidade de se obter satisfação proissional insuiciente, que se encontra em patamares baixos entre os investigados. Assim, em relação às fontes de insatisfação, a frustração com os proventos ou a defasagem remuneratória pode contribuir naturalmente para os níveis baixos de satisfação profissional. Esse resultado, conforme apontado em outros estudos 15,19, justiica a pior avaliação do componente remuneração, reconhecida como incompatível com a responsabilidade associada à proissão.
Outrossim, os resultados insatisfatórios da remuneração, verificado no ISP, corroboram com a menor média observada em relação ao domínio ambiente do WHOQOL-Bref, visto que a indisponibilidade de recursos inanceiros, que pode estar relacionada à remuneração insuiciente, é avaliada em tal domínio. Do mesmo modo, as oportunidades de lazer insuficientes, que podem ser atribuídas a características ocupacionais como o regime de plantões, associadas à ausência de benefícios, tais como plano de saúde, serviço de transporte e estabilidade profissional, contribuem para os piores resultados na QV.
Ainda dentro do aspecto do ambiente, o setor de atuação demonstrou variação significativa por parte dos profissionais, permitindo depreender que alguns serviços na estrutura hospitalar podem ser mais desgastantes do que outros 16,20-22. Esses achados reforçam a menor contribuição do ambiente na QV, resultado congruente ao verificado em pesquisas desenvolvidas com outros prois-sionais da saúde 20,22.
A lacuna entre as decisões administrativas e a necessidade real da enfermagem também aponta para o descontentamento com as normas organizacionais, principal fator de insatisfação para os enfermeiros 15,23,24. A existência de normas rígidas gera limitação ou impedimento da autonomia, o que pode explicar a baixa satisfação encontrada nesse componente.
A falta de poder necessário, apoio organizacional e reconhecimento de habilidades clínicas, e o modelo hospitalar centrado nos médicos contribuem para a desmotivação e a vontade de deixar a profissão 25,26. Como são aspectos passíveis de avaliação e intervenção por parte de gestores, envolver os enfermeiros na participação das discussões e decisões institucionais pode favorecer a motivação, a produtividade e o reconhecimento profissional, aumentando a dedicação e a satisfação com os componentes autonomia e normas organizacionais 27,28.
Ainda sobre os aspectos insatisfatórios, os requisitos do trabalho apresentam relação direta com as condições laborais da enfermagem, bem como com os riscos ocupacionais e com o estresse a que os enfermeiros estão expostos 24. Portanto, a insatisfação dos participantes pode ser decorrente de estressores já identificados em outras pesquisas 1,29-32, que os relacionam à natureza do trabalho, ao volume de atividades, ao dimensionamento inapropriado de profissionais para o serviço, ao relacionamento com familiares dos pacientes, ao ambiente físico inadequado, à própria assistência ao paciente e ao trabalho burocrático e administrativo de atribuição do enfermeiro.
A maior satisfação percebida no componente status profissional pode ser influenciada pela atuação diretamente assistencial dos participantes, o que lhes confere motivação, senso de responsabilidade e orgulho associado ao desempenho de tarefa socialmente nobre. O ato de cuidar, salvar vidas e ser útil a quem é cuidado caracteriza o senso de identidade profissional e resulta no reconhecimento social 33. Além disso, o cenário do estudo possui imagem social nacionalmente notável, visto que funciona como uma unidade de referência na área de hematologia e hemoterapia, o que pode refletir em maior autoestima aos profissionais, pela sensação de ser notado positivamente pela sociedade 33.
No contexto geral da percepção da situação atual com o trabalho, os enfermeiros indicaram baixa satisfação laboral, embora consonante ao apontado na literatura, apresentou-se inferior quando comparada às demais 15,23. Dessa forma, é possível conjeturar que as características dos pacientes podem influenciar a satisfação no trabalho, visto que as necessidades assistenciais variam conforme a especialidade, acarretando tipos e intensidades distintas de esforços físicos e emocionais, cargas e graus de impacto variados sobre a saúde do trabalhador.
No que se refere ao WHOQOL-Bref, os resultados observados na literatura são muito distintos 16,20,22, uma vez que a concepção de QV dispõe de um conceito subjetivo, que envolve diversos aspectos da vida. Assim, haveria um espectro de variáveis em interação para resultar na QV, no qual se insere a satisfação profissional. Dessa forma, cada sujeito, sendo único, tem sua visão diferenciada do seu ambiente laboral que refletirá em sua QV.
Em última análise, ao correlacionar satisfação profissional e QV, constatou-se interação positiva, sendo razoável depreender que patamares elevados naquela poderiam impactar de maneira positiva nesta. Entretanto, não foi possível observar esse desfecho entre os participantes, visto que, para esse grupo, a associação entre tais variáveis apresentou um caráter fraco, não sendo determinante ou suiciente para estabelecer repercussões de uma variável sobre a outra.
Divergindo do desfecho encontrado nesta pesquisa e corroborando a hipótese alternativa do presente estudo, associações estatisticamente significativas entre os domínios da QV e os componentes da satisfação profissional foram obtidas entre enfermeiros intensivistas. De modo geral, verificou-se que os profissionais com melhores níveis de satisfação proissional também apresentaram os maiores índices de QV 15.
De qualquer forma, as contradições e as singularidades do ser humano podem ser descritas na satisfação subjetiva dos diversos aspectos envolvidos na vida profissional 34 e na QV. Isso implica dizer que alguns trabalhadores apresentam QV deteriorada, ao passo que outros submetidos às condições de trabalho similares apresentarão parâmetros superiores, conforme sua capacidade de adaptação e superação.
Em contrapartida às contribuições, é necessário mencionar que, entre as limitações, está o uso do WHOQOL-Bref, mesmo mundialmente aceito e recomendado pela Organização Mundial da Saúde, que pode sugerir comportamento de respostas de direção favorável pelo participante, com vistas a evitar atitudes não aprovadas socialmente.
Por consequência, os resultados sujeitam-se às inúmeras dimensões e particularidades do indivíduo. Por essa razão, é preciso ser sensível ao realizar a identificação e a análise dos fatores relacionados ao trabalho, bem como esses podem melhorar a vida dos trabalhadores para além do ambiente laboral 34. A compreensão desses aspectos compõe etapa substancial para o maior conhecimento da área e de futuras propostas de intervenção na saúde do trabalhador.
Sugere-se, então, para estudos posteriores, ampliação da amostra de participantes em unidades de maior porte constituída por diversas especialidades. Propostas para a avaliação do impacto das características organizacionais sobre os trabalhadores também são pesquisas válidas para efetivar modiicações educativas, políticas, económicas e sociais capazes de gerar efeito sobre as percepções em relação à QV e à satisfação profissional no ambiente laboral.
Conclusões
A análise da satisfação profissional revelou baixo índice entre os enfermeiros de um hospital onco-hematológico brasileiro. O status profissional destacou-se com a melhor avaliação; na direção oposta, a remuneração, as normas da organização, a autonomia e as atribuições inerentes à proissão apontaram caráter insatisfatório. Esses aspectos podem representar obstáculos para a assistência e para a percepção da satisfação laboral, sendo capazes, inclusive, de culminar na intenção de abandono da carreira.
A menor contribuição do meio ambiente na avaliação do WHOQOL-Bref sugere necessidade de investimento público e aplicação de recursos em fatores que afetam a QV dos indivíduos, como a falta de segurança, a poluição, as condições de habitação, o acesso a serviços de saúde e ao meio de transporte.
Por fim, identificou-se uma associação positiva entre satisfação profissional e QV, porém de caráter fraco. Portanto, não é suficiente inferir, do ponto de vista estatístico, que a baixa satisfação prois-sional seja determinante nos domínios da QV.
Conhecer o perfil de enfermeiros que trabalham com portadores de distúrbios hematológicos e compreender o valor que atribuem aos componentes envolvidos na satisfação laboral podem subsidiar o desenvolvimento de estratégias gerenciais. Além disso, ao se repensar a assistência a partir de uma nova proposta de cuidar, espera-se construir um ambiente de trabalho mais saudável e eicaz. O enfoque sobre o integrante da equipe, com vistas à sua atuação com maior bem-estar, integração, autonomia e satisfação, pode contribuir para a qualidade da assistência e para a segurança do paciente.