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Estudios Socio-Jurídicos

Print version ISSN 0124-0579

Estud. Socio-Juríd vol.18 no.2 Bogotá July/Dec. 2016

https://doi.org/10.12804/esj18.02.2016.07 

Doi: http://dx.doi.org/10.12804/esj18.02.2016.07

Direito, violências e sexualidades: a transexualidade em um contexto de direitos

Derecho, violencias y sexualidades: la transexualidad en un contexto de derechos

Law, Violence and Sexualities: Trans Sexuality in a Rights Context

Rosely Aparecida Stefanes Pacheco*, Isabela Stefanes Pacheco**

* Doutoranda em História, UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados); Aluna do Programa para Doutorado em Direito UBA (Universidad de Buenos Aires), Argentina. Professora e Pesquisadora UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul), Brasil. Correio eletrônico: roselystefanes@gmail.com
** Bacharel em Direito (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul). Assessora do Ministério Público Estadual do Estado de Mato Grosso do Sul, Brasil. Correio eletrônico: belacpo@hotmail.com

Para citar este artículo: Stefanes Pacheco, R. y Pacheco, I. (2016). Direito, violências e sexualidades: a transexualidade em um contexto de direitos. Estúdios Socio-Jurídicos, 18(2), 203-228.Doi: http://dx.doi.org/10.12804/esj18.02.2016.07

Fecha de recepción: 2 de Enero de 2016. Fecha de aceptación: 6 de mayo de 2016


Resumo

Este trabalho tem entre seus objetivos analisar a luta pelo direito das pessoas trans a uma Lei de Identidade de Gênero no Brasil, vez que vêm buscando na via Judicial a alteração de seu prenome e gênero no Registro Civil. Destaca-se neste artigo o processo de violência que estas pessoas enfrentam por fazerem parte de uma sociedade que em geral rechaça a diversidade e não (as)os inclui, mas procura a todo custo faze-los(as) ingressarem em um molde genérico bi(normativo), qual seja: homem-mulher. O fato é que grupos, comunidades que por muito tempo foram excluídas do processo de construção do Estado nacional, surgem e (re)surgem exigindo seus direitos enquanto sujeitos de direitos. Para a realização deste trabalho buscamos referenciais em diversas áreas do conhecimento, dentre elas citamos: Direito, Sociologia e História.

Palavras-chave: violência, direito, transexuais.


Resumen

Este trabajo tiene entre sus objetivos analizar la lucha por el derecho de las personas trans a una Ley de Identidad de Género en Brasil, una vez que vienen buscando en la vía judicial la alteración de su prenome y género en el Registro Civil. En este artículo se destaca el proceso de violencia que estas personas enfrentan por formar parte de una sociedad que, en general, rechaza la diversidad y no (las)los incluye, pero intenta por todos los medios hacer que ingresen en un molde genérico bi(normativo): hombre-mujer. El hecho es que grupos, comunidades que por mucho tiempo fueron excluidas del proceso de construcción del Estado nacional, surgen y (re)surgen exigiendo sus derechos en cuanto sujetos de derechos. Para la realización de este trabajo buscamos referenciales en diversas áreas del conocimiento, entre ellas Derecho, Sociología e Historia.

Palabras clave: violencia, derecho, transexuales.


Abstract

This work has among its objectives to analyze the struggle for the right of people to a Trans Gender Identity Law in Brazil once it has been sought through the Judicial the change of his first name and gender in the Registro Civil (Brazilian Vital Records). Stands out in this article the process of violence that these people face for being part of a society that generally rejects diversity and not includes, but try at all costs to make them entering into a generic template binormative, which it is: men and women. The fact is that groups, communities that have long been excluded from the National State building process, appears and reappears demanding their rights as subjects of rights. For this work we seek references in various areas of knowledge, among which we mention: Law, Sociology and History.

Keywords: violence, Law, transsexuals.


Considerações Iniciais

O circo dos conflitos dorme. É preciso audácia para abrir a cortina e saltar na arena junto com tudo o que fingia sossegar, mas nos atormentava tanto. (Luft, 1996).

Um olhar retrospectivo, das últimas décadas sobre a América Latina e em especial o Brasil, aponta que estamos vivenciando profundas e significativas mudanças. Os grandes discursos e as narrativas norteadoras que deram fundamentação às formas de saber, ao modo de organização de vida, à regulação dos procedimentos comportamentais, às praticas uniformes de representação social e às configurações centralizadas da estrutura de poder passaram e passam por questionamentos radicais, por múltiplas redefinições e por realidades emergenciais (Wolkmer, 2003).

Vve-se o declínio e o esgotamento de uma cultura monolítica, linear, determinista hierárquica e totalizante. Assiste-se o desvelar complexo de novos processos identitários com potencialidades criadoras, capazes de instaurar direções múltiplas que favorecem representações conceituais, individualidades subjetivas e fluxos diferenciados.

E, é nesse sentido que se insere a reivindicação de direitos a partir de experiências trans. O fato é que grupos, sociedades que por muito tempo foram excluídas do processo de construção do Estado nacional da modernidade, hoje surgem e (re)surgem exigindo seus direitos enquanto sujeitos de direitos.

Dos caminhos percorridos

Vivemos em uma sociedade que produz e faz circular discursos que funcionam como "verdades", que passam por tal e detêm, por este motivo, poderes específicos. Diante disso, nosso ponto de partida para este trabalho levou em consideração os discursos jurídicos/médicos que têm sido proferidos em uma tentativa de "naturalizar" o tema.

Consideramos que é por meio do discurso jurídico, que na maioria das vezes tenta silenciar a voz dos(as) sujeitos, e, do discurso clínico (realizado sobre os corpos), que a divisão binária masculino/feminino, segundo o sexo torna-se "uma verdade". E, a construção desta divisão biológica, enquanto valor distintivo, passa a não ser questionada, uma vez que esta divisão aparece como "natural".

Assim, além de nos atermos a estes discursos, sentimos que era importante para a realização deste estudo, "escutarmos" às pessoas trans. Dessa manei­ra, intentou-se desenvolver este trabalho, também a partir de testemunhos de pessoas trans, que vêm solicitando via Judicial a alteração de seu prenome e gênero no Registro Civil. Fica evidente em seus relatos a luta que enfrentam cotidianamente por fazerem parte de uma sociedade que em geral rechaça a diversidade e não as inclui, mas procura a todo custo faze-las ingressarem em um molde genérico bi(normativo), qual seja: homem-mulher.

O trabalho desenvolvido foi de natureza qualitativa, utilizando-se a abordagem dialética, na qual se procurou apreender as contradições e dinâmicas desta luta por uma alteração em seus documentos, em especial o Registro Civil. Destaca-se que no desenvolvimento deste estudo, o trabalho de assume grande importância. O campo corresponde ao recorte espacial que contém, em termos empíricos, a abrangência do recorte teórico que compreende o objeto da investigação.

Destaca-se que durante o trabalho de campo, a interação do(a) pesquisador(a) com os sujeitos da investigação é essencial. Nessa fase se estabelecem relações de intersubjetividade, das quais resulta o confronto da realidade vivenciada com os pressupostos teóricos da pesquisa.

Nesse sentido, este trabalho se desenvolveu com a utilização da técnica da observação participativa-etnografia,1 da utilização de fontes orais, bem como de uma revisão bibliográfica acerca do tema. Sobre esta metodologia da observação participativa, (Cardoso, 2000, p. 12), aduz que, estar em campo se dá por meio de três importantes momentos, sendo eles: "[...] Ol­har. Ouvir. Escrever. - como atos cognitivos que são -, além de trazerem em si responsabilidades intelectuais específicas, formam, pela dinâmica de sua interação, uma unidade irredutível".

Ainda, no que diz respeito à etnografia, (Cardoso, 2000) salienta a necessidade de um diálogo entre iguais, considerando haver um "encontro etnográfico", pois não é só o pesquisador quem pergunta, questiona, ob­serva, mas também as "gentes" pesquisadas que estão perguntando, questionando, interagindo com o pesquisador(a).

Uma das vantagens da utilização dessa técnica é a possibilidade de um contato pessoal do(a) pesquisador(a) com o "objeto" de investigação, permitindo acompanhar as experiências diárias dos(as) sujeitos e apreender o significado que atribuem à realidade e às suas ações. Além do que a observação direta é um procedimento científico consolidado na prática antropológica e reconhecido mundialmente no campo das ciências sociais e das humanidades em geral.

Breve digressão sobre o tema trans

Sabemos que os grupos sociais que foram excluídos e marginalizados ao longo da construção do Estado brasileiro, demandam hoje, por novos espaços. E, entender a dinâmica de articulações, redes e encontros nacionais que estes grupos promovem e participam é uma forma de registro de suas estratégias de troca de informações e experiências de politização localizadas, fomentando a emergência de novos grupos e segmentos.2

Durante toda a história humana, verifica-se a existência de cidadãos e cidadãs que não correspondem ao papel social que lhes foi atribuído. Dentre as diversas formas de "transgressão", é nítida e polêmica aquela que diz respeito à identidade de gênero e orientação sexual.

Conde (2004) apud (Rogeria, Vasconcelos, Badaró, e Gonçalves, 2011) argumenta que:

O movimento homossexual brasileiro tem como modelo o estadunidense que, por sua vez surgiu no clima de rebelião imbuído nos movimentos da década de 60, quando a auto expressão e o questionamento da autoridade deram às pessoas a possibilidade de pensar o impensável e agir de acordo com as ideias que surgissem, consequentemente permitindo "sair do armário" (Rogeria et al., 2011, p. 240).

O autor afirma que "a vontade utópica de libertar o desejo foi a grande força motivadora dos anos 60, o grito de guerra de toda uma geração que percebeu a possibilidade de ter uma vida diferente" (Rogeria et al., 2011, p. 241).

No Brasil, as relações afetivo-sexuais estavam então baseadas na hete-ronormatividade que divide o gênero e produz as categorias de identidade chamadas por alguns de complementares. Nesse sentido, a ideia de "terceiro sexo", a pessoa transexual, moldava a percepção da "homossexualidade", termo este que só apareceria e se difundiria mais tarde.
Também Louro orienta que:

Este ambiente de transformações aceleradas e plurais que hoje vivemos, parece ter se identificado desde a década de 1960, possibilitado por um conjunto de condições e levado a efeito por uma série de grupos sociais tradicionalmente submetidos e silenciados (Louro, 2013, p. 44).

A autora esclarece que as vozes desses sujeitos faziam-se ouvir a partir de posições desvalorizadas, ignoradas e ecoavam a partir das margens da cultura e, com destemor, perturbavam o centro. Outra política passava a acontecer, uma política que agora se fazia plural, já que é protagonizada por grupos que se reconhecem e se organizam coletivamente, enquanto identidades culturais, tais como, de gênero, raça, etnia. Seriam as chamadas "novas" identidades, consideradas, segundo (Louro, 2013), como "ex-centricas".3

De acordo com (Rogeria et al., 2011), apesar de existir estudos sobre a temática do Movimento Homossexual no Brasil (Galvão, 2000; Facchini, 2005; Fernandes, 2007; Viana, 2007), pouco tem sido investigado acerca da emergência de movimentos de travestis, transexuais.4

No entanto, investigar e publicizar a história dos movimentos de travestis e transexuais é de grande importância, pois apontam para outros caminhos possíveis frente à marginalização social. "É um ato de reconhecer a nãoconformação de uma população frente à sua localização social e às suas ações frente a esta realidade" (Rogeria et al., 2011, p. 05).

Por certo, "novas" identidades culturais obrigam a reconhecer que a cultura, longe de ser homogênea e monolítica, é, de fato, complexa, múltipla, desarmoniosa, descontínua, ou seja, o centro materializado pela cultura e pela existência do homem branco ocidental heterossexual e de classe média passa a ser desafiado e contestado (Louro, 2013).

(Tauches, 2006), entende que sexualidades são construções sociais. A visão de construção social da sexualidade distingue-se das noções essencialistas de sexualidade. A visão essencialista enxerga sexualidade como algo natural, ou seja, enfatiza a heterossexualidade como algo normal e superior, considerando as demais formas de sexualidades como desviantes e inferiores. A autora descreve que a sexualidade pode ser vista tanto como um ato (comportamento) quanto como uma identidade. Como comportamento, a sexualidade é entendida como um ato que pode ser valorizado e/ou desvalorizado em uma determinada sociedade, mas que não é considerada como uma identidade que definiria um tipo específico de ser humano (Weeks, 2006).

Destaca-se que, foi somente a partir do século XVIII que a sexualidade passou a ser considerada como uma identidade e não mais como um comportamento (Weeks, 2006). Contudo, não devemos entender aqui identidade como algo estático e homogêneo. (Plantenga, 2004) argumenta que, identidade deve ser entendida como fragmentada e múltipla, pois mesmo "minorias"5 têm suas identidades interconectadas com outras máscaras identitárias e frequentemente desafiam as estruturas opressivas e quebram as dicotomias.

Das violências

Segundo (Butler, 2010), devemos entender que existe uma matriz heterossexual que atua de forma compulsória, constituindo não somente o que é normal, mas também as identidades e as possibilidades de existência do que pode ser considerado anormal. Além disso, é importante considerar que o poder simbólico se materializa sobre os(as) sujeitos por meio de violência simbólica (Bourdieu, 1975; 2003).

Em relação à violência simbólica, vale ressaltar que esta se instaura por meio de um processo sustentado pela existência e pelo reforço de pensamentos e predisposições alinhados às estruturas impostas (Bourdieu, 1975; 1998; 2003).

Esse tema vêm à tona ao analisarmos os discursos de alguns(as) transe­xuais femininas e masculinos, os(as) mesmos(as) evidenciam que, apesar de se sentirem "diferente" desde cedo, não conseguiam romper com o modelo reprodutivo heterossexual, procurando na maioria das vezes, ajustarem-se as estruturas sociais da matriz heterossexual. Nesse sentido, a violência a que eram e são submetidos(as) é evidente.

Violência, para a Organização Mundial de Saúde, caracteriza-se pelo uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha a possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação (Dahlberg, L., e Krug, E. 2002).

É por meio da incorporação e naturalização do modelo binário de gê­nero que a violência simbólica atua nos(as) transexuais. Conforme destaca um dos entrevistados e titulares de uma Ação de Retificação de Registro Civil, que chamaremos de E1:6

A vida de um transexual é pautada por frustações. Na infância, quando a professora ordenava para se criar duas filas, uma de meninas e outra de meninos, eu me juntava aos meus semelhantes e era puxado pelo braço para ir para a fila correta. Ora essa, eu já estava na fila correta, professora. Você não percebe? Quando você é um homem transexual, cada vez que alguém me tratava no feminino doía mais que um tapa na cara. Menina, ela, dela, com ela, garota. Minha vontade era gritar até ficar sem ar: o que diabos vocês pensam estarem fazendo?

O mesmo entrevistado E 1 continua seu relato:

Aos 17 anos, fui agredido fisicamente por uma pessoa que se sentiu ofendida por eu, nascido biologicamente mulher, ter entrado no banheiro masculino. Em que outro banheiro eu entraria? Tive meu pescoço apertado, minhas pernas chutadas mas o que mais me doeu foi o fato da minha dignidade também ter sido violentada.

Entende-se que, pelo elevado número de vítimas que acarreta e pela magnitude de sequelas orgânicas e emocionais que produz, a violência configura-se no século XXI como um problema de graves consequências. De acordo com o Relatório sobre Violência Homofóbica no Brasil (SDH, 2013), no ano de 2012, foram registradas pelo poder público 3.084 denúncias de 9.982 violações relacionadas à população LGBTI no Brasil- sendo que em uma única denúncia pode haver mais de um tipo de transgressão. O número representa um aumento de 166% em relação ao ano anterior.

Segundo Patrícia Gorisch (2015), presidente da Comissão Nacional de Direito Homoafetivo do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família):

O Brasil hoje é o país que mais mata transexuais nas Américas (de acordo com o relatório da OEA/2014) e um dos que mais mata no mundo. Garantir direitos é o mínimo que o Estado brasileiro tem que fazer.7

Diante destes dados, os organismos das Nações Unidas orientam aos Estados para que tomem medidas urgentes para dar fim à violência e à discriminação contra adultos, adolescentes e crianças lésbicas, gays, bis­sexuais, trans e intersex (LGBTI). Estes organismos enfatizam que todas as pessoas têm o direito de não ser objeto de violência, perseguição, discriminação e estigmatização. As leis internacionais em matéria dos direitos humanos, das quais o Brasil é signatário, por exemplo, estabelecem obrigações jurídicas aos Estados a fim de garantir que todas as pessoas, sem distinção alguma, possam usufruir de tais direitos.

Segundo os organismos internacionais, as pessoas LGBTI enfrentam discriminação e exclusão generalizadas em todos os âmbitos, incluindo formas múltiplas de discriminação com base em fatores como sexo, raça, etnia, idade, religião, pobreza, migração, deficiência e estado de saúde. Crianças, por exemplo, enfrentam bullying e discriminação no âmbito escolar, tanto por sua orientação sexual, quanto por sua identidade de gênero. Os dados também têm demonstrado que a juventude LGBTI, muitas vezes é rejeitada por suas famílias, e, ademais, vivenciam índices alarmantes de suicídio, falta de moradia e insegurança alimentar, dentre outros problemas.

Cotidianamente às pessoas trans é negado reconhecimento legal do gênero com o qual se identificam, e, para consegui-lo, enfrentam abusos, como esterilizações, tratamentos forçados, sem o qual sofrem exclusão e marginalização. Por certo, a exclusão de pessoas LGBTI da elaboração, da implementação e do monitoramento das leis e políticas que lhes afetam perpetua a sua marginalização social e econômica.

Do gênero e da orientação sexual

Bento (2008) assevera que a "transexualidade é uma experiência identitária, caracterizada pelo conflito com as normas de gênero" (2008, p. 8). Em seu turno (Vieira, 2011), aduz que a transexualidade é caracterizada por um conflito entre corpo e identidade de gênero e compreende um arraigado desejo de "adequar" o corpo a aquele do gênero almejado.

Conforme orienta (Chanter, 2011), o gênero não é algo que esteja "dentro", uma essência preexistente, esperando encontrar expressão corpórea. Não há uma verdade interna esperando a realização "autentica" ou "apropriada" em atos corpóreos ou materiais. O gênero é sempre já vivido, gestual, corporal, culturalmente mediado e historicamente construído. Não é que tenhamos uma feminilidade ou masculinidade central. Ao contrá­rio, há ditames culturais de acordo com os quais os sujeitos constroem a si mesmos, apropriando-se de códigos de gênero historicamente situados e, às vezes, reinventando ou subvertendo tais códigos.

Tão logo nascemos (ou até mesmo antes), somos identificados como menina ou menino. E sistematicamente treinados de acordo com nosso gênero. Os quartos são pintados de azul celeste e decorados com móbiles de aviões, ou rosa "pink" e decorados com flores. Ou são dadas bonecas para brincar e vestidos com rendas e babados, ou bolas de futebol para chutar e calças para vestir.

Chanter (2011) também argumenta que, nascemos com uma determinada genitália, de acordo com a qual nossos gêneros são lidos. Expectativas são formadas, ideologias culturais são absorvidas, e se espera que aquelas que sejam identificadas anatomicamente como garotas ajam como garotas, e que aqueles que sejam identificados como garotos ajam como garotos. No entanto, como já podemos observar vários fatores "complicadores" entram na composição deste quadro.

O termo orientação sexual, se refere a como nos sentimos em relação à afetividade e sexualidade. Para (Chanter, 2011), existem quatro tipos de orientação afetivo-sexual: os bissexuais que se sentem atraídos pelos dois gêneros; os heterossexuais, pelo gênero oposto; e os homossexuais, pelo mesmo gênero e os assexuados, que representam um caso singular, uma vez que podem apresentar uma orientação romântica, porém não sexual, direcionada a algum dos gêneros (ou a ambos), ou não apresentarem orientação romântica e nem sexual.8

Embora a maioria das mulheres se reconheça no gênero feminino e a maioria dos homens no masculino, isto nem sempre acontece. Falamos, então, de pessoas cujo sexo biológico discorda do gênero psíquico: são as travestis e transexuais, ou transgêneros (Chanter, 2011). Na verdade, as identidades transgenéricas, incluindo a intersexualidade, a transexualidade e outros termos híbridos, põem em questão fórmulas já testadas e confiáveis e produzem a necessidade de um novo pensar no que se refere a estas categorias e direitos.

Conforme expõe (Butler, 2003) [...] a matriz cultural por meio da qual a identidade de gênero se torna inteligível exige que certos tipos de "identidade" não possam "existir", isto é, aquelas em que o gênero não decorre do sexo e aquelas em que as práticas do desejo não "decorrem" nem do "sexo", nem do "gênero". (Butler, 2003, pp. 38-39). Desse modo, algumas identidades de sexo e gênero são "significadas" como falhas do desenvol­vimento ou impossibilidades lógicas, porque divergem, ou não se conformam, às normas de "inteligibilidade cultural". Com estes referenciais, que valorizam e convencionam certas significações em detrimento de outras, um grande número de mulheres e homens são excluídos e submetidos a preconceitos, pela sua maneira particular de sentir prazer, desejar e porque não estão de acordo com as normas hegemônicas.

Com estes conceitos minimamente delineados, pode-se trabalhar a tutela jurídica das pessoas trans na questão referente a seu direito à identidade pessoal e de gênero (direito ao prenome e a alteração de gênero, também reconhecida no espaço do direito, como "o sexo jurídico", assim entendido como aquele que consta de seus documentos de identificação pessoal).

Do direito e da Dignidade da Pessoa Humana

A dignidade da pessoa humana constitui fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1°, inc. III, CF), sendo assegurado a todos(as) a inviolabilidade da intimidade e da honra das pessoas (art. 5°, inc. X, CF). A identificação sexual, enquanto direito da personalidade, é irrenunciável e intransmissível e não pode ser objeto de ameaça ou lesão, conforme dispõe os artigos 11 e seguintes do Código Civil Brasileiro.

Faz-se presente nestes Códigos o reconhecimento da dignidade humana plena, que corresponde ao livre exercício da sexualidade, dos direitos da personalidade (direito à intimidade e ao próprio corpo), da capacidade de proferir consentimento informado sobre o que se deseja de forma in­equívoca realizar e, especialmente, da autonomia e da auto determinação do(a) transexual, para que este possa ver-se sujeito pleno de direitos constitucionais ou civis.

Mesmo com este conjunto de normas jurídicas destinado à proteção das pessoas, determinados grupos são excluídos do convívio social, vítimas de preconceito, sofrendo abusos de toda sorte. A intolerância ainda é maior quando o assunto é relativo à mudança de sexo. Segundo (Dias, 2011, p. 09), "A sociedade estabelece modelos muitos rígidos, nos quais o mundo é dividido entre homens e mulheres". Se a pessoa não se "encaixa" em uma dessas categorias, está sujeita à exclusão social.

Ignorar a difícil circunstância vivida pelas travestis e transexuais, no dia-adia, sugere infração ao princípio da dignidade da pessoa humana, insculpido no inciso III do art. 1° da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Nesse sentido, também cabe citar o art. 1° da Declaração Universal dos Direitos Humanos adotada pela Organização das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948: "[... ] todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Dotados de razão e consciência, devem agir uns para com os outros em espírito e fraternidade". A respeito do tema orienta Sarlet:

[... ] o fato de os seres humanos (todos) serem dotados de razão e consciência representa justamente o denominador comum a todos os homens, expressando em que consiste a sua igualdade. Também o Tribunal Constitucional da Espanha, inspirado igualmente na Declaração universal, manifestou-se no sentido de que "a dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que leva consigo a pretensão ao respeito por parte dos demais (Sarlet, 2001, pp. 43-44).

Sobre a não discriminação, torna-se importante enfatizar que negar o direito das pessoas trans a terem modificados no seu registro civil o gênero e prenome é uma forma de discriminação. E, o direito internacional define a discriminação como qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência ou qualquer tratamento diferencial direta ou indiretamente baseado em um motivo proibido para discriminação e que tem a intenção ou efeito de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo, ou exercício, em pé de igualdade, dos direitos garantidos pelo direito internacional.9

Da questão do Registro Civil à Lei de Identidade de Gênero

No Brasil, o único meio de se conseguir a alteração do gênero e do prenome no Registro Civil é por meio de autorização judicial. Como o Brasil não possui uma Lei específica de Identidade de Gênero, apesar de dispor de diversas normas nacionais e internacionais que garantem o direito à identidade, logo após a cirurgia, os(as) transexuais brasileiros têm de ingressar via Judicial para, depois de um longo processo, ter a sua pretensão deferida. Isto se o julgador, no caso o(a) Juiz(a) for de orientação considerada mais "avançada" para o "universo" jurídico, pois, o que temos observado em muitos processos judiciais que acompanhamos é que posicionamentos baseados em princípios morais e religiosos têm muitas vezes permeados as decisões judiciárias.

Ainda assim, depois de uma longa caminhada em busca de seus direitos, mesmo que a pessoa trans obtenha sentença favorável em 1a instância, ela corre o risco de ver sua decisão revertida em Tribunais superiores de 2a instância. Insta indagar o motivo pelo qual o Estado brasileiro opõe tantas barreiras ao reconhecimento dos direitos das pessoas trans, mesmo quando se trata de alteração do prenome e de mudança de gênero, uma vez que não existe o Estado democrático de direito, enquanto existir uma parcela da sociedade brasileira como segmentos-alvo de exclusão. Ao desconsiderarem os direitos das pessoas trans, nega-se a sua condição humana e cidadã. Entende-se que a negação de uma série de direitos pode ser vista como uma violência simbólica que acaba provocando violências as mais diversas, inclusive letais.

Em uma tentativa de minorar o sofrimento ao qual são submetidas estas pessoas, tramita na Câmara Federal um Projeto de Lei n. 5002/13, que estabelece o direito à identidade de gênero - definida como a vivência interna e individual do gênero tal como cada pessoa o sente, que pode corresponder ou não com o sexo atribuído após o nascimento. Tal proposta obriga o Sistema Único de Saúde (SUS) e os planos de saúde a custearem tratamentos hormonais integrais e cirurgias de mudança de sexo a todos(as) os interessados(as) maiores de 18 anos, aos quais não será exigido nenhum tipo de diagnóstico, tratamento ou autorização judicial.

O exercício do direito à identidade de gênero pode envolver a modificação da aparência ou da função corporal através de meios farmacológicos, cirúrgicos ou de outra índole, desde que isso seja livremente escolhido, e outras expressões de gênero, inclusive vestimenta, modo de fala e manei-rismos, estabelece o Projeto de Lei 5002/13.

A proposta também libera a mudança do prenome para os maiores de 18 anos, sem necessidade de autorização judicial. Da mesma forma, libera a mudança do sexo(gênero) nos documentos pessoais, com ou sem cirurgia de redesignação de sexo. A orientação legal é que os números dos documentos deverão ser mantidos, e os nomes originais totalmente omitidos do documento.

Conforme o Projeto, as pessoas trans também terão o direito de adotar um nome social diferente do que figura na carteira de identidade, sem necessidade de fazer a retificação dos documentos em cartório. Esse nome terá de ser respeitado por órgãos públicos e empresas privadas.10

Este projeto de 2013, foi elaborado tendo como base a experiência da Lei de Identidade de Gênero promulgada na Argentina. A Lei de Identidade de Gênero argentina prevê a alteração do registro civil sem que haja neces­sidade de cirurgia ou de qualquer processo judicial. Menciona também a proteção das pessoas trans em vários âmbitos como na escola e no trabalho.

A Lei de Identidade de Gênero argentina, promulgada em 2012, e estabelece que "toda pessoa tem direito ao reconhecimento de sua identidade de gênero, ao livre desenvolvimento de sua pessoa, a ser tratada de acordo com sua identidade de gênero e a ser identificada desse modo nos instrumentos que credenciam sua identidade".

A legislação argentina, não exige requisitos específicos, salvo requerimento do interessado, e não são necessários diagnósticos médicos, psiquiátricos ou cirurgias, dando assim prioridade à "experiência interna e individual do gênero como cada pessoa o sente", que pode ou não corresponder ao sexo atribuído à nascença.

Nos termos desta proposta, as pessoas trans serão capazes, não só de ter acesso ao reconhecimento do seu gênero por um simples procedimento administrativo, sem qualquer tipo de exigência, mas também a tratamentos hormonais e cirúrgicos dentro do sistema de saúde público, com a única exigência de um consentimento informado.

Importante destacar que conforme o Projeto de Lei n. 5.002/2013, para que a pessoa trans tenha alterado seu prenome e gênero nos documentos: "Em caso nenhum será exigida uma cirurgia de mudança de sexo total ou parcial, terapias hormonais ou outros tratamentos psicológicos ou médicos". Esse é um tema que sem a aprovação desta Lei, tem causado uma série de transtornos às pessoas trans, como podemos observar da decisão do 19° Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Conforme o Jornal Conjur de Boletim de notícias de 05 de abril de 2015:

A 19a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Janeiro negou um pedido feito por transexual para alterar o gênero no registro civil. Ele não fez a operação de mudança de sexo. Segundo o relator, desembargador Guaraci de Campos Vianna, a alteração do registro em relação ao sexo depende da cirurgia de redesignação sexual. A decisão foi unânime.11

Mesmo contrariando toda orientação legal que dispõe a Constituição Federal de 1988, que, em seu art. 3°, determina que o objetivo do Estado brasileiro é "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação", e somando-se ao que conta dos Tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, assim entendeu o colegiado de desembargadores do referido Tribunal:

Em que pese o apelante se perceber como mulher, fisiologicamente é um homem e é esta a condição que deve constar de seus assentos, até que seja feita a cirurgia, marco identificador maior para o processo de adequação do sexo biológico ao sexo psicossocial.

É inegável o avanço nos direitos das pessoas trans. Entretanto, como contraponto às propostas destes movimentos pelo direito à diversidade, vemos a permanência, no campo das práticas jurídicas, de um discurso extremamente preconceituoso. Nos deparamos com um Judiciário aparentemente impermeável a qualquer mudança. E, nesse sentido (Streck e Baratta, 2009) nos orienta que "há uma urgente necessidade de mudança no imaginário dos juristas", capaz de romper com o paradigma inscrito na dogmática jurídica, paradigma, este sim, por constituição, excludente.

Percebe-se que no caso brasileiro, há uma grande lacuna entre o direito que está posto e o que se almeja. Ademais existe uma grave omissão legislativa, capaz de consubstanciar a mentalidade conservadora, retrógrada, que ainda impera no imaginário social, a qual, por sua vez, reflete de forma acrítica, no chamado sentido comum dos juristas (Warat, 1995) em grave descompasso com a trajetória de uma sociedade extremamente plural, dinâmica e complexa (Morin, 2008).

Não podemos olvidar que, muitas vezes no campo do pensamento jurídico, temos posicionamentos que tentam reproduzir as condições responsáveis pela perpetuação de um sistema monolítico devastador da diversidade.

A questão do "nome social"12

Importante destacar, conforme propõe (Bento, 2010), que ao lado do recurso da via judicial, outra alternativa que surge é o uso do "nome social".

Entretanto, a própria autora discorre sobre o quadro confuso e quase surreal que nos é apresentado quando discutimos esse tema, bem como o risco que corremos de transmutarmos o respeito à identidade de gênero a uma simples redução ao "nome social". Universidades, escolas, ministérios e outras esferas do mundo público aprovam regulamentos que garantem às pessoas trans a utilização do "nome social". Entretanto,

Mudar sem alterar substancialmente nada na vida da população mais excluída da cidadania nacional. Assim, por exemplo, uma estudante transexual terá seu nome feminino na chamada escolar, mas no mercado de trabalho e em todas as outras dimensões da vida terá que continuar se submetendo a todas as situações vexatórias e humilhantes e portar documentos em completa dissonância com suas performances de gênero (Bento, 2014, p. 175).

Entende-se que estas estratégias, normatizações expõem um dilema, que merece ser mais cuidadosamente analisado para que possa parecer como uma proposta emancipadora, inclusive, como estratégia discursiva. Afinal, já sabemos que nenhum discurso é inocente. Foucault (1983) já nos alertava para as maneiras como as práticas discursivas ou não discursivas produzem ou objetivam os objetos.

Destaca-se que, a crítica que se faz ao uso do "nome social" é que este não dá conta das demandas da população trans, que deseja muito mais que ter um prenome alterado em seus documentos. O desejo é de serem considerados(as) sujeitos de direitos com todas as prerrogativas que a cidadania inclui.

Algumas considerações sobre o direito à cirurgia de transgenitalização

No ano de 1997, o Conselho Federal de Medicina (CFM) editou a Resolução n°.1.482/97, com o propósito de regulamentar a realização da cirurgia de redesignação sexual. Esta resolução estabelecia os critérios mínimos norteadores do diagnóstico do "transexualismo"13 (ou "transge-nitalismo"), quais sejam: a) Desconforto com o sexo anatômico natural; b) Desejo expresso de eliminar os genitais, perder as características primárias e secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto; c) Permanência desse distúrbio de forma contínua e consistente por, no mínimo, dois anos; d) Ausência de outros transtornos mentais.

Para a efetiva realização da cirurgia, que teria nítida finalidade terapêutica, a Resolução mencionada também estabelece requisitos outros a serem observados, ao dispor no seguinte sentido: "a seleção dos pacientes para cirurgia de transgenitalismo obedecerá a avaliação de equipe multidisciplinar constituída por médico-psiquiatra, cirurgião, psicólogo e assistente social, obedecendo aos critérios abaixo definidos, após dois anos de acompanhamento conjunto", e enumerar os critérios referidos: a) Diagnóstico médico de "transexualismo"; b) Indivíduo maior de 21 (vinte e um) anos; c) Ausência de características físicas inapropriadas para a cirurgia.

Sobre a questão do acesso à cirurgia e o direito à saúde, o art. 196 da Constituição Federal de 1988, aduz que: a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Esta vinculação entre o tema da transexualidade e a efetivação do direito à saúde, além das fortes pressões e reivindicações, levou o Ministério da Saúde, em 19 de agosto de 2008, a editar a Portaria N°. 457, que incorporou o que convencionou chamar de "processo transexualizador" ao âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). A partir de então, aqueles que tivessem interesse em realizar a "mudança de sexo" contariam com a possibilidade de concretizá-la de forma inteiramente gratuita, subsidiada e tendo o seu pleito atendido pelo SUS (Sistema Único de Saúde).14

Seguindo no rol de políticas públicas destinadas às pessoas trans, no ano de 2013 o Ministério da Saúde no Brasil publicou uma Portaria n° 85915 que visava reduzir de 21 para 18 anos a idade mínima para cirurgia de redesignação de sexo na rede pública de saúde. Adolescentes de 16 anos poderiam iniciar os tratamentos hormonais e psicológicos que iriam anteceder o procedimento cirúrgico, e que normalmente duram até dois anos. Além disso, a Portaria incluía na lista de serviços do SUS cirurgia de redesignação de sexo feminino para masculino.

Entretanto, em 31 de julho do mesmo ano o Ministério da Saúde anunciou a suspensão da Portaria n° 859. Em nota publicada, o Ministério da Saúde informou que a portaria está suspensa até que sejam definidos os protocolos clínicos e de atendimento no processo transexualizador. O governo, segundo o Ministério da Saúde, anunciou que convidará representantes dos serviços de saúde que trabalham com o tratamento e outros especialistas para definir os critérios de avaliação do candidato, de obtenção da autorização dos pais e responsáveis, no caso de menores de idade; e de acompanhamento multidisciplinar ao paciente e aos parentes.16

Destaca-se que esta Portaria n. 859, que significava um avanço no que tange aos direitos das pessoas trans, sofreu uma série de críticas e questionamentos por segmentos da sociedade brasileira. Um dos questionamentos refere-se à chamada "reserva do possível estatal".17 Os defensores desta teoria argumentam que não se justificaria a realização desta cirurgia para redesignação sexual, uma vez que existem outras prioridades que exigem uma maior atenção do Estado brasileiro. Assim, denominam a cirurgia de transgenitalização como sendo algo "frívolo", supérfluo ou desnecessário.

Considerações sobre a (des)patologização da identidade trans

Tratando-se de um tema que também envolve direitos e políticas públicas para pessoas trans, torna-se importante destacar algumas discussões apontadas por Bento (2012). Segundo a autora, existe hoje um grande embate dentro da teoria social contemporânea de que: se, por um lado temos teorias que questionam as identidades fixas, por outro, se percebe a necessidade de um sujeito político para reivindicação de direitos, o que acarreta certo "essencialismo estratégico" por parte dos movimentos sociais. E, é dentro desse amplo debate sobre identidades que se insere a questão da despatologização (ou não) das identidades transexuais. (Bento, 2012, p. 89) esclarece que:

[... ] desde que o gênero passou a ser uma categoria diagnóstica, no início dos anos 1980 (4a. versão do DSM), é a primeira vez que ocorre um movimento globalizado pela retirada da transexualidade do rol das doenças identificáveis como transtornos mentais.

Ainda de acordo com Berenice (Bento, e Pelúcio 2012), as reivindicações desse movimento giram em torno de cinco pontos: retirada do TIG (Transtorno de Identidade de Gênero) do DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - 4a edição) e CIE-11 (Cadastro Internacional de Enfermidades); retirada da menção de sexo dos documentos oficiais; abolição dos tratamentos de normalização binária para pessoas intersex; livre acesso aos tratamentos hormonais e às cirurgias (sem a tutela psiquiátrica); e luta contra a transfobia, propiciando a educação e a inserção social e laboral das pessoas transexuais. Para Bento,

[...] a patologização caminha de mãos dadas com a universalização. O desejo em produzir um diagnóstico diferenciado para transexuais, anunciado precariamente na década de 1960, ganhou concretude nos anos 1980. A sua inclusão no Código Internacional de Doenças, em 1980, foi um marco no processo de definição da transexualidade enquanto uma doença (2012, p. 91).

É nesse sentido que o movimento a favor da despatologização vai rebater alguns argumentos que justificam a permanência da transexualidade em códigos de enfermidades. E dentre estes argumentos, Berenice Bento e Pelucio (2012) discutem, por exemplo, os que amparados nas "conces­sões estratégicas" por meio das quais se alega que, se a transexualidade e a travestilidade não forem consideradas doenças, o Estado não vai custear transformações corporais; outro argumento é o de que se a autoridade científica, por meio da qual se afirma que: se a transexualidade está no DSM-IV e no CID (Cadastro Internacional de Doenças), significa que ela é de fato uma doença.
Diante disso Bento (2012) concluiu:

Por que diagnosticar o gênero? Quem autoriza os psicólogos, psiquiatras, endocrinologistas e outras especialidades que fazem parte das equipes multidisciplinares a avaliarem as pessoas transexuais e travestis como 'doentes'? Se não existe nenhum exame clínico que conduza a produção do diagnóstico, como determinar a ocorrência do 'transtorno'? Quais são e como estabelecer os limites discerníveis entre "os transtornados de gênero" e 'os normais de gênero'? O único mapa seguro que guia o olhar do médico e dos membros da equipe são as verdades estabelecidas socialmente para os gêneros, portanto, estamos no nível do discurso. Não existe um só átomo de neutralidade nestes códigos. Estamos diante de um poderoso discurso que tem como finalidade manter os gêneros e as práticas eróticas prisioneiras à diferença sexual (Bento, 2012, p. 100).

Portanto, o debate está posto e não pretendemos reduzi-lo, mas apresentá-lo como um campo aberto de possibilidades, no qual se inserem os(as) sujeitos políticos em busca do reconhecimento de seus direitos.

Considerações Finais

Um dos objetivos deste artigo foi analisar a luta pelo direito das pessoas trans a uma Lei de Identidade de Gênero, como uma proposta importante diante da urgente necessidade de incluir todas as pessoas sem distinção de identidade e orientação sexual. Além do que, tentou-se evidenciar neste trabalho a violência a que estas pessoas são constantemente submetidas.

Esta violência está diretamente relacionada com a matriz heterossexual binária de gênero, na qual a normalidade é estabelecida como heterossexual e fundada em um gênero binário, constituído por apenas duas possibilidades opostas e excludentes entre si: masculino versus feminino, e, que na maioria das vezes é reforçado por discursos médicos-jurídicos.

Uma mirada na legislação de outros países permite reconhecer o quanto ainda falta avançar para dizer que se vive em um Estado democrático de Direito que prioriza a dignidade humana e tem a liberdade e a igualdade como princípios fundantes.

Ao Estado brasileiro cabe garantir e efetivar os direitos fundamentais de seus cidadãos(ãs), independentemente de gênero e orientação sexual que possam ter, sob pena de não ser considerado um estado Democrático de Direito, uma vez que a democracia impõe aos seus cidadãos(ãs) o direito à liberdade de expressão; viver com dignidade; tratamento igualitário em deveres e direitos, e, isso diz respeito, também, à liberdade de expressão do gênero e orientação sexual. Ademais, se temos assegurados o direito ao trabalho, à educação, dentre outros, também temos assegurado o direito à identidade de gênero e ao próprio corpo.

Segundo Bento (2010), tanto os corpos dos(as) transexuais e dos(as) não transexuais são fabricados por tecnologias precisas e sofisticadas que têm como um dos mais poderosos resultados, nas subjetividades, a crença de que a determinação das identidades está inscrita em alguma parte dos corpos. A experiência transexual realça que a primeira cirurgia que nos constituiu em corpos-sexuados não conseguiu garantir sentidos identitários, apontando os limites discursivos dessas tecnologias e a possibilidade de se criar fissuras nas normas de gênero.

Não obstante, entende-se que nessas disputas, o que está em jogo é o próprio conceito de humanidade. Não nos interessava pensá-lo como uma categoria abstrata, universal, mas feita de carne, osso e sangue e que encontra sua materialidade no conceito de cidadania e da dignidade da pessoa humana. A humanidade pode encontrar assim, no respeito ao "outro(a)" a possibilidade de existência, ou de inteligibilidade. Trata-se de considerar a "lógica" do(a) "outro(a)", sem reduzir o(a) "outro(a)" à fórmula do mesmo. Este é o critério da ação ética, pois nele reside o elemento ontológico que nos vincula ao mundo e não nos subtrai dele.

Em suma, a pessoa humana é muito mais do que sua genitália. Afinal, não se pode genitalizar a pessoa humana, o que significa dizer que não se pode colocar a existência de uma genitália ou de determinados genes como "indispensável" para definição de sua identidade sexual (e pessoal), tendo em vista que a identidade de gênero depende da forma como a pessoa se identifica relativamente ao gênero que assume como seu, o, que, pode também no decorrer de sua caminhada cambiar. Até porque, a identidade se constitui como um dos direitos da personalidade, que por sua vez se caracterizam como concretizações do princípio da dignidade da pessoa humana.
Enfim, as palavras de E1 são autoexplicativas:

Meu sonho é entregar minha identidade18 sem questionamentos. Como um garoto normal. Porque é exatamente isso que eu sou. Um garoto e normal. Pela primeira vez na vida, eu estou vendo, mesmo que ainda distante, meus sonhos serem realizados. Sinto que estou no meio de uma floresta e estou com muita sede, e quanto mais eu chego perto da água, mais ansioso eu fico. A possibilidade de beber dessa água me transborda, inunda minha alma e meu coração com uma felicidade sem precedentes.


Notas

1 A observação participante foi selecionada como uma das técnicas de coleta de dados neste estudo, devido à possibilidade de se captar uma variedade de situações às quais não se teria acesso somente por meio de perguntas realizadas às pessoas envolvidas.
2 Apesar da relevância dos tema sobre a história e mobilização social e política de travestis e transexuais, não discutiremos aqui, tendo em vista o objetivo e limites de páginas proposto neste trabalho. Sugerimos a leitura de Ávila, S. Transmasculinidades: a emergência de novas identidades políticas e sociais. Rio de Janeiro: Multifoco, (2014), Elias Veras Ferreira. Carne, tinta e papel (2015), (Programa de Pós Graduação em História), UFSCAR, Florianópolis; Rogeria, T. (et, al). O movimento de travestis e transexuais: construindo o passado e tecendo presentes (2011).
3 Conforme registra o dicionário, excêntrico é aquele ou aquilo que está fora do centro; é o extravagante, o esquisito; e é também, o que tem um centro diferente, outro centro.
4 Ver: Ávila, S. Transmasculinidades: a emergência de novas identidades políticas e sociais. Rio de Janeiro: Multifoco, 2014, Elias Veras Ferreira. Carne, tinta e papel. (2015) (Programa de Pós Graduação em História), UFSCAR, Florianópolis; (Rogeria et al., 2011)
5 Entende-se minorias sociais como coletividades que sofrem processos de estigmatização e discriminação, resultando em diversas formas de desigualdade ou exclusão sociais, mesmo quando constituem a maioria numérica de determinada população.
6 Por questão de segredo de Justiça e para resguardar a privacidade denominamos de Entrevistado 01 (Um). Trata-se de um trans masculino, que deseja obter da justiça brasileira o direito de ver seu gênero e nomes alterados no Registro Civil e consequentemente nos demais documentos. Ação de Retificação que tramita na 2a Vara de Registros Públicos da cidade de Campo Grande, Estado de Mato Grosso do Sul, Brasil.
7 Direitos das pessoas Trans chegam à pauta do STF (Supremo Tribunal Federal), disponível em <http://www.ibdfam.org.br/noticias/5843/Direitos+das+pessoas+Trans+chegam+%C3%A0+pauta+do+STF>, acesso em [20 de dezembro de 2015].
8 Sobre este tema ver Tese de Doutorado em Educação (2014). Elisabete Regina Baptista Oliveira. "Minha vida de ameba": os scripts sexonormativos e a construção social das assexualidades na internet e na escola. USP, SP.
9 Comitê de Direitos Humanos, Comentário Geral n° 18, parágrafo 7 e Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Comentário Geral n° 20, par. 7. Ver a Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial, artigo 1°, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, artigo 1°, e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, artigo 2°.
10 Em Decreto publicado no Diário Oficial da União em 29/04/2016, o Estado brasileiro reconhece, indiretamente, o direito à identidade de gênero. Determina que Travestis e transexuais que trabalham na administração pública federal poderão ter seu nome social descrito em crachás e demais formulários funcionais. "Os órgãos e as entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, em seus atos e procedimentos, deverão adotar o nome social da pessoa travesti ou transexual, de acordo com seu requerimento e com o disposto neste decreto. É vedado o uso de expressões pejorativas e discriminatórias para referir-se a pessoas travestis ou transexuais". Entretanto, apesar do avanço, enfatizamos que esse reconhecimento ocorre de forma "precária", não contempla a demanda da maioria. Isso ocorrerá quando for aprovada e sancionada a Lei de Identidade de Gênero.
11 Sem cirurgia de mudança de sexo, transexual não pode alterar registro civil, disponível em http://www.conjur.com.br/2015-abr-05/cirurgia-transexual-nao-alterar-registrocivil, acesso em [20 de junho de 2015].
12 Em Decreto publicado no Diário Oficial da União em 29 de abril de 2016, o Estado brasileiro reconhece, de certa maneira, o direito à identidade de gênero. Determina que Travestis e transexuais que trabalham na administração pública federal poderão ter seu nome social descrito em crachás e demais formulários funcionais. "Os órgãos e as entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, em seus atos e procedimentos, deverão adotar o nome social da pessoa travesti ou transexual, de acordo com seu requerimento e com o disposto neste decreto. É vedado o uso de expressões pejorativas e discriminatórias para referir-se a pessoas travestis ou transexuais". Entretanto, apesar do avanço, enfatizamos que esse reconhecimento ocorre de forma "precária", não contempla a demanda da maioria.
13 Transexualismo é a palavra que consta da Resolução n°.1.482/97. Importante destacar que a palavra transexualismo, apesar de toda carga de preconceito que carrega, pela patologização do termo, esta ainda é recorrente nos discursos médicos e jurídicos.
14 Destaca-se que o número de candidatos(as) que desejam realizar este tipo de cirurgia ultra­passa os limites impostos pelo SUS, isso significa que uma pessoa que deseja realizar tal cirurgia pode ficar há espera por anos ou até mesmo décadas. Atualmente, há apenas quatro centros cirúrgicos aptos a fazer a cirurgia pela rede pública, ligados às Universidades Federais de Goiás, São Paulo, do Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.
15 Documento oficial de ato administrativo, baixado por autoridade pública e destinado a dar instruções ou fazer determinações de várias ordens.
16 Até o presente momento não se detectou nenhuma discussão por parte do Ministério da Saúde no que tange ao estudo dos critérios do candidato(a), ou de acompanhamento multidisciplinar do paciente.
17 Os defensores desta teoria, nascida na Alemanha nos anos 1970, e transportada para o pensamento jurídico brasileiro, defendem que os direitos sociais que exigem uma prestação de fazer estariam sujeitos à reserva do possível no sentido daquilo que o indivíduo, de maneira racional, pode esperar da sociedade, ou seja, justificaria a limitação do Estado em razão de suas condições socioeconómicas e estruturais.
18 Documento de Registro Civil.


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