1 INTRODUÇÃO
As redes interorganizacionais vêm surgindo como uma alternativa estratégica de atuação no mercado (Wincent, Anokhin e Ortqvist, 2010) contribuindo para competitividade das empresas e como possibilidade de geração de valor e de crescimento às empresas (Costa, Silva e Nogueira, 2016). Uma rede interorganizacional pode ser definida como uma possibilidade de auxiliar os participantes de uma organização e tem como método trazer vantagem, assim como o envolvimento dos membros que compunham uma cooperativa, fazer deles seres competitivos e que cooperem em conjunto (Costa et al., 2016). A possibilidade de ganhos para as organizações que se estruturaram em redes é vista em estudos como o de Ende (2004); Wegner, Wittmann e Dotto (2006); Alves (2011); Cunha, Souza, Macau e Alssabak (2016) ; Lima, Carvalho, Guimarães e Medeiros (2016); Centenaro e Laimer (2017).
Entretanto, é relevante considerar que na atuação das empresas em rede existem custos para cooperar (Pesãma, 2007; Lima, 2007), problemas para administrar (Chen, 2008), interdependência das empresas (Mccutchen Jr, Swamidass e Teng, 2008) e outras dificuldades que fazem com que muitas iniciativas de cooperação empresarial (e.g. as redes) não atinjam plenamente seus objetivos (Pereira, Venturini, Wegner e Braga, 2010). Estes são aspectos para os quais as empresas podem não estar preparadas, fazendo com que empresas participantes saiam da rede ou a própria rede seja encerrada prematuramente (Wegner, Zen e Andino, 2008; Pereira et al., 2010; Tonin, Ravanello, Bertóli e Tonin, 2016). Este encerramento prematuro, do qual este artigo trata, significa que os objetivos inicialmente propostos, quando da formação da rede, não foram atingidos e a atividade colaborativa não teve êxito em proporcionar benefícios para os seus cooperados.
Toigo e Alba (2010), analisando a relação entre redes criadas e encerradas no estado do Rio Grande do Sul, encontraram que, de um total de 41 redes criadas no ano de 2000, apenas 26 continuam ativas em 2010. Dessa forma, tendo por base a visão de Lima (2007), Wegner et al. (2008) e Pereira et al. (2010), há um número relevante de empresas que desistem da atividade interorganizacional e que muitas redes de empresas não conseguem consolidar suas atividades, como no caso da rede pesquisada neste trabalho identificada como Rede Alfa. Algumas questões norteadoras para este trabalho foram definidas: (i) quais as características da gestão da rede? (ii) como a saída de empresas da rede pode afetar sua continuidade? e (iii) quais os fatores que, na percepção dos empresários participantes, contribuíram para o insucesso da rede? Diante disso, este artigo tem como objetivo verificar e compreender os motivos que levaram a Rede Interorganizacional Alfa ao insucesso e analisar os principais fatores críticos do caso.
O fato de empresas saírem das redes tem se tornado mais evidente sob ponto de vista empírico, com o qual se observa um número expressivo de empresas saem do processo cooperativo (Lima, 2007; Klein e Pereira, 2014; Xavier Filho, Júnior, Alves e Medeiros, 2015), fazendo com que muitas redes não consigam consolidar suas estruturas e seus modelos de gestão. No entanto, um fato é averiguar a saída de empresas da rede e outro tem a ver com o insucesso desses empreendimentos. Nesse sentido, observa-se que há poucos estudos que buscam compreender os motivos que levam ao insucesso1 desses empreendimentos. Assim sendo, entender os motivos que levam ao insucesso de redes interorganizacionais traz contribuições para gestão dessas estratégias de atuação conjunta e para empreendedores que buscam alternativas semelhantes para atuar no mercado.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Redes interorganizacionais
Uma rede interorganizacional pode ser definida "como a organização composta por um grupo de empresas com objetivos comuns, normalmente relacionadas, com prazo ilimitado de existência" (Verschoore, 2004, p. 25). As redes entre empresas são geralmente formadas quando duas ou mais organizações colaboram entre si (Wegner, Alievi e Begnis, 2015) em resposta a uma ameaça do ambiente para o seu desenvolvimento, ou de uma oportunidade que se apresenta para estas empresas, que não seria Leander Luiz Klein, Antônio Carlos Freitas Filho, Carin Cristiane Reschke possível de alcançar caso atuassem sozinhas (Barringer e Harrison, 2000; Senge, Lichtenstein, Kaeufer, Bradbury e Carroh, 2007). Esses empreendimentos conjuntos buscam internamente benefícios e vantagens, além de uma base de negociação com mercados em que atuam (Chim-Miki e Batista-Canino, 2017).
Na formação de uma rede interorganizacional, Gulati e Gargiulo (1999) colocam que ela pode constituir-se pelas diversas configurações verticais ou horizontais desenvolvidas pelas empresas que formam relacionamentos. Para Klein et al. (2011), em muitos casos, a formação de alianças estratégicas envolve empresas que disponibilizam recursos complemen-tares para suprir necessidades técnicas e de mercado. Nessa relação, há a troca de ativos tangíveis e intangíveis, o que gera novas competências e leva os agentes a um estágio de desempenho superior inacessível até então (Zawislak, 2000).
Uma rede interorganizacional pode ser definida como uma cadeia interligada ou inter-relacionada de empresas (Masteralexis, Barr e Hums, 2009) que atuam em conjunto visando à complementaridade de conhecimentos, recursos e capacidades e à exploração de novas oportunidades e de novos conhecimentos (March, 1991), além de uma interdependência estratégica uma das outras (Gulati, 1995). De acordo com Oliveira, Borges e De Oliveira (2016, p. 67), "em uma rede interorganizacional, as organizações têm se destacado por sua flexibilidade, capacidade de adaptação, o que facilita nova atitude e visão de mercado diferenciada".
Nesse sentido, a abordagem teórica sustenta que, ao se tornarem integrantes de redes interorganizacionais, as empresas podem maximizar variáveis que, caso sejam observadas e geridas, possibilitam à rede alcançar e manter o padrão de desenvolvimento desejável. Entretanto, embora as perspectivas de formar uma rede interorganizacional sejam aparentemente atrativas, estes aspectos nem sempre são precisamente analisados pelos gestores, podendo criar dificuldades para a gestão da rede e a possível insatisfação dos empresários integrantes estimulando o desinteresse. Esses pontos, na visão de Ring e Van de Ven (1994), quando mal combinados e geridos, têm uma tendência a se revelarem infrutíferos após a fase de benefícios iniciais.
Eden e Huxham (2001) procuram corroborar a ideia de Ring e Van de Ven (1994) no momento em que sugerem que falhas na formação de alianças interorganizacionais podem ser resultado de diferentes visões sobre a direção da rede incluindo os objetivos e a finalidade da relação. Nesse sentido, variáveis serão avaliadas na sequência deste estudo como projeção das principais dificuldades e causas do insucesso de redes e em conjunto auxiliar na análise do processo de gestão de redes interorganizacionais.
2.2 Fatores críticos das redes interorganizacionais
Zineldin e Dodourova (2005) colocam que, de maneira geral, os estudos sobre redes de empresas falham em usar indicadores claros para distinguir sucesso e fracasso em alianças estratégicas. Thibault e Harvey (1997) explicam que a estrutura e a gestão de redes não são uma tarefa fácil de organizar devido à complexidade do arranjo, das ligações e das interações necessárias entre as organizações. Park e Russo (1996) colocam que os custos e os esforços de estar-se envolvido em redes interorganizacionais são difíceis de serem avaliados e estimados, além de serem frequentes problemas na sua gestão. "Uma ideia intrínseca nos estudos relacionados à gestão das redes sugere que os conflitos são causados por objetivos organizacionais não alcançados por um membro da aliança" (Pereira e Pedrozo 2004, p. 81).
Na concepção de Sadowski e Duysters (2008), o fracasso da rede tem sua origem em uma parceria mal gerida, em que não há confiança e comprometimento entre os parceiros envolvidos. Lourenzani, Silva e Azevedo (2006) apontam a confiança como um dos fatores que influenciam os relacionamentos interorganizacionais e a consideram como uma condição para que se estabeleça compromisso entre os atores envolvidos. Larsson, Bengtsson, Henriksson e Sparks (1998) apontam que a falta de confiança pode ser uma barreira para a criação do conhecimento e para efetividade do aprendizado oriundo da interação das empresas em rede. Na visão de Kauffmann (1994), para haver cooperação é necessário algum tipo de sinergia entre os parceiros e, caso não exista, a aliança que une as empresas pode acabar. Hastings (1996) evidencia que a sinergia de recursos está relacionada às diferenças inerentes entre seus parceiros possibilitando a redução das incertezas.
Outra questão a ser observada na formação da rede é a diferente orientação estratégica dos sócios. A literatura sobre o assunto salienta que os gestores podem ter motivos e objetivos diferentes para se incorporarem a uma rede. Uma compreensão de modelos da seleção do sócio e sua compatibilidade podem realçar o desempenho da rede e, desse modo, aumentar a vantagem competitiva de uma firma em mercados (Dacin, Hitt e Levitas, 1997).
Na discussão sobre redes interorganizacionais, uma abordagem frequente é a perspectiva de aprendizagem. Segundo Hamel (1991), o insucesso de um empreendimento colaborativo pode ser atribuído ao problema de que uma ou mais empresas não tinham a mesma capacidade de aprender. No processo de construção e na vigência da rede, o não compartilhamento do know-how constituído e circulante na rede pode levar algumas empresas a destoarem do processo visto que é considerado um elemento-chave por oferecer o desenvolvimento de competências (Larsson et al., 1998). À medida que na rede não ocorre a troca necessária de informações, o aprendizado não é construído e repassado para os demais participantes e, assim, a rede se torna fraca (Flecha, Silva, Fusco e Bernardes, 2012).
Seguindo esse raciocínio, aborda-se a questão do oportunismo, estudada por Williamson (1985) na Teoria dos Custos de Transação, que está relacionada à assimetria de informação, para a apropriação de lucros associados à determinada transação (Fiani, 2002). No momento em que as empresas da rede não receberem informações similares e começarem a perceber comportamentos oportunistas, a complexidade e a incerteza da situação comercial aumentarão (Lima, 2007) e os integrantes da rede tenderão a projetar salvaguardas para não serem vítimas das outras (Williamson, 1985).
Outros estudos sobre redes interorganizacionais se referem a fatores financeiros da relação entre empresas. Quando uma empresa está numa rede, dela são exigidos investimentos e a empresa deve comprometer-se e investir (Adler e Kwon, 2002). Quanto a este aspecto, os gestores consideram a relação interorganizacional como positiva se os custos de manter-se na rede forem menores que os resultados obtidos. Para Park e Ungson (2001), "uma rede está apta a sustentar sua estrutura e permanecer como um mecanismo eficiente para transações, enquanto os benefícios econômicos dos parceiros se sobrepuserem aos custos potenciais de gerenciar a aliança" (p.47). Um fator a ser acrescentado é que muitos dos esforços despendidos são difíceis de serem avaliados e, em muitos casos, benefícios como melhoria da imagem no mercado e aumento da credibilidade perante fornecedores só começam a surgir dentro de cinco a dez anos de vida de rede (Park, Chen e Gallagher, 2002) e isto dificulta estimar o retorno sobre os investimentos.
Por fim, pode-se dizer que muitos problemas em redes ocorrem a partir da constatação de que os objetivos iniciais e benefícios não foram correspondidos (Mccutchen Jr. et al., 2008; Corsten, Gruen e Peyingaus, 2011; Chao, 2011; Sadowski e Duysters, 2008). As empresas se unem por objetivos comuns que estão centrados, principalmente, no acesso ao conhecimento e à aprendizagem, na redução de custos, na ampliação da escala de competitividade, na adaptação às mudanças, na diminuição de riscos, na complementação de ativos e no desenvolvimento de capacitações (Ebers, 1997). Caso algum destes objetivos, ou outros, não sejam correspondidos, conflitos poderão ocorrer e ocasionar a insatisfação e o desentendimento entre parceiros levando a possível desestruturação da rede e, talvez, ao consequente insucesso.
O Quadro 1 mostra de forma simplificada e resumida os problemas e os possíveis motivos apresentados neste estudo, seus significados e pressupostos, que podem levar ao insucesso de redes interorganizacionais.
Quadro 1 Fatores críticos na governança e gestão de redes interorganizacionais

Fonte: elaborado pelos autores.
Verifica-se dessa maneira que diversos fatores devem ser observados durante a formação e vigência da rede. A falta de algum desses aspectos pode gerar outros fatores negativos para a rede e para seus integrantes fazendo com que a cooperação não seja mais valorosa para seus integrantes. Os fatores descritos no Quadro 1 serviram de base para elaboração do protocolo da pesquisa e dos procedimentos metodológicos, que são melhor descritos na seção 3 deste artigo.
3 MÉTODO DA PESQUISA
O presente artigo se caracteriza como um estudo de tipo exploratório e de caráter qualitativo, que utilizou como estratégia de pesquisa o estudo de caso. Este trabalho possui tais particularidades porque, de acordo com Sampieri, Collado e Lucio (2006), os estudos exploratórios buscam explorar e entender um problema em profundidade e avançar no conhecimento sobre temas pouco pesquisados. A abordagem qualitativa adotada para este artigo se sustenta em função de, na visão de Richardson (1999), ser uma "forma adequada para entender a natureza de um fenômeno social", e por descrever e tentar compreender determinado fenômeno com base nos relatos dos atores sociais (Sampieri et al., 2006).
Considerando o objetivo deste artigo, julgou-se adequado utilizar o estudo de caso como método de pesquisa. Essa estratégia, para Yin (2009), é um método de pesquisa que aprofunda um ou poucos objetos de estudo visando a conhecê-lo detalhadamente. Além disso, este trabalho é uma investigação empírica que observa um fenômeno contemporâneo em profundidade e em seu contexto real, em que não há clara evidência dos limites entre o fenômeno e o contexto, o que também o caracteriza como um estudo de caso (Yin, 2009; Halinen e Tõrnroos, 2005). Na visão de Eisenhard (1989), o estudo de caso é uma estratégia utilizada para o entendimento de uma dinâmica de configuração única.
O caso escolhido para estudo foi uma rede de construção civil localizada na região central do estado de Rio Grande do Sul, no sul do Brasil. Foi investigado este caso por este ter sido uma iniciativa conjunta em um ramo de atividade pouco característico de redes interorganizacionais: a construção civil. As empresas que faziam parte dessa rede eram de diferentes tamanhos, faturamentos e tempos de existência. Algumas delas foram constituídas há 40, 50 anos enquanto que outras eram empresas novas com menos de 10 anos de funcionamento. Seis empresas que faziam parte desta rede foram selecionadas e representam, para este artigo, a unidade de análise definida para pesquisa. Procurou-se entrevistar tanto empresários com mais anos de experiência na construção civil quanto aqueles que há pouco haviam iniciado nessa atividade, com o intuito de obter todas as informações possíveis sobre o caso e verificar se a percepção destes era diferente daqueles. A escolha das empresas selecionadas para compor a unidade de análise se procedeu de maneira intencional, por conveniência. Esta forma de seleção na visão de Sampiere et al. (2006) supõe um procedimento de seleção informal.
Com relação à coleta dos dados, utilizou-se como instrumento de coleta de dados a entrevista semiestruturada. Este instrumento, para Britten (1995), permite investigar um tema com mais detalhes por possuir uma estrutura flexível composta por questões abertas na área a ser explorada. O roteiro de entrevista foi desenvolvido com base nas variáveis contidas na literatura sobre o assunto, resumidas no Quadro 1, estruturado com os estudos dos autores referendados. Este roteiro serviu como guia da entrevista para instigar os entrevistados a exporem os problemas ocorridos na rede e o porquê de seu encerramento prematuro. Os seis empresários donos das empresas que compõem a unidade de análise foram entrevistados em seus próprios escritórios de trabalho. Algumas empresas da rede tinham mais de um sócio, mas se julgou necessário entrevistar apenas um deles, pois, como eles diziam, as respostas e informações que tanto um quanto o outro iriam fornecer seriam as mesmas. Quanto ao número de empresários entrevistados, ponderouse como suficientes as seis entrevistas realizadas, pois a partir da 5a entrevista se passou a verificar certa similaridade nas respostas dos respondentes. Os entrevistados foram denominados, para fins de análise de suas falas, como E1, E2, E3, E4, E5 e E6, respectivamente. As entrevistas foram gravadas e a duração delas foi em torno de 60 minutos.
Após a coleta de dados, as entrevistas foram transcritas e, posteriormente, analisadas por meio da técnica de análise de conteúdo (Bardin, 2010). Segundo a autora, essa técnica pode ser considerada como um conjunto de técnicas de análise que, por meio de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição dos relatos dos entrevistados, busca indicadores sobre o que está por trás da fala. O processo de codificação das entrevistas foi realizado a partir da similaridade das falas dos entrevistados. Nesse sentido, definiram-se categorias de análise não a priori que surgiram a partir dos relatos dos entrevistados, critério este utilizado para constituição das categorias de análise. Isto facilitou a identificação dos principais motivos que, na percepção dos empresários entrevistados, levaram ao insucesso da rede e possibilitou a comparação dos dados empíricos obtidos na pesquisa de campo com a teoria sobre redes interorganizacionais. Esses resultados são descritos e discutidos nas seções seguintes, nas quais são apresentados os achados desta pesquisa sobre o tema.
4 O CASO DA REDE DE CONSTRUTORAS DE SANTA MARIA
Diversas redes de empresas foram criadas nos últimos anos, pela possibilidade de obter melhores condições de compra, realizar campanhas de marketing compartilhadas, dentre outras atividades relacionadas às empresas integradas. No caso da Rede Alfa, no início de 2006, treze empresários donos de empresas de construção civil se uniram com a intenção de realizar atividades conjuntas. Para as etapas iniciais de formação da rede, os empresários que a integraram contaram com o apoio de um agente externo do programa Redes de Cooperação: um professor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), que participava das reuniões e auxiliava nas atividades a serem desenvolvidas.
No intuito de contribuir para o fortalecimento da confiança e para o aumento da interação entre os empresários foram realizadas reuniões e encontros informais antes do lançamento da rede. A expectativa dos gestores entrevistados era de que conseguissem um poder de barganha maior nas negociações com seus fornecedores; facilitassem o treinamento de funcionários; e, por consequência, conseguissem melhores condições para atuar no mercado. Essas considerações quanto aos propósitos da rede podem ser constatadas no trecho do relato de E1 apresentado a seguir:
Olha, os propósitos eram bons. A ideia de todo mundo se ajudar e cooperar em obras, de poder contar com outras empresas do mesmo ramo para comprar junto, para conseguir descontos, fazer treinamentos de pessoal em conjunto, era uma boa pra todos (E1).
Para a constituição da rede, os empresários adotaram critérios pouco objetivos para seleção dos integrantes. Este fato, aparentemente, é relevante, pois, dentro da rede certas atividades específicas são realizadas, e em alguns casos, as empresas são limitadas por sua capacidade e recursos em potencial. Os critérios podem ser vistos na fala E6:
Ah, os critérios eram ser associado da Sinduscon, e os outros critérios eram a solidez no mercado e a idoneidade da empresa, basicamente esses itens (E6).
Verifica-se que esses critérios parecem ser limitadores e não houve preocupação em aceitar a participação de outras empresas, cujos empresários tivessem interesse nos propósitos perseguidos pela rede. O objetivo neste instante parecia ser simplesmente o de formar a rede. Após a constituição da rede, foram definidas as normas e os regimentos da rede. Foi eleito um presidente e os demais ocupantes dos cargos de sua estrutura, como vice-presidente e diretores, de acordo com o padrão estabelecido pelo agente externo. Essa eleição ocorreu de maneira consensual: era indicado um empresário da rede para determinado cargo e, caso todos entrassem em acordo quanto àquela indicação, tal pessoa era eleita.
Depois de alguns meses de atuação, a rede perdeu o apoio do agente externo devido ao afastamento da UFSM do Programa Redes de Cooperação no final de 2006 (Sedai, 2009). As atividades eram coordenadas pelo presidente e pelo diretor financeiro mais diretamente, sendo que as decisões não rotineiras e específicas eram tomadas em reuniões e assembleias gerais, nas quais, em geral, eram reunidos os demais empresários.
Após certo tempo de atividades conjuntas, começaram a ocorrer divergências desgastantes entre os empresários participantes da rede. Alguns passaram a ver a rede como uma forma de obter outros benefícios que simplesmente a compra conjunta. Houve a divisão interna do grupo devido a discordâncias sobre o processo decisório e as finalidades da rede. Alguns aspectos dificultavam a gestão do empreendimento conjunto, como a falta de comprometimento e de organização das atividades. Os participantes passaram a ficar descontentes com a relação conjunta e, depois de um ano e quatro meses, a rede encerrou suas atividades, em junho de 2007.
5 ANÁLISE DOS RESULTADOS: CATEGORIAS DE ANÁLISE
Nesta seção são apresentadas as categorias de análise não a priori definidas a partir dos relatos dos entrevistados, por meio da codificação dos elementos por analogia (Bardin, 2010). Buscou-se com a adoção de categorias de análise não a priori aproveitar todas as informações dos entrevistados para entender o caso. Nesse sentido, constatou-se que a categoria Fatores que não influenciaram no insucesso da rede vai de encontro ao objetivo deste trabalho, mas se ressalta sua importância em função da influência sobre a percepção dos entrevistados. Assim, para contribuir com o raciocínio descrito nessa análise, julgou-se como adequado apresentar esta categoria inicialmente. As categorias definidas foram: (1) fatores que não influenciaram no insucesso da rede, (2) dificuldades na gestão e organização das atividades da rede, (3) diferentes perspectivas sobre a finalidade da rede.
5.1 fatores que não influenciaram no insucesso da rede
Na atuação de empresas em redes, diferentes fatores estão relacionados ao processo de troca e de colaboração. Na visão de Pereira et al. (2010), não há um consenso quanto aos fatores que levam ao fracasso de alianças estratégicas, como no caso das redes. Entretanto a análise dos fatores que levam ao sucesso (ou que não influenciaram no insucesso) podem fornecer importantes indicadores para entender determinado caso (Wegner, 2011). Nesse sentido, duas subcategorias foram consideradas para análise como fatores que não influenciaram no insucesso da rede: a confiança e o processo de aprendizagem.
A confiança entre os integrantes de redes interorganizacionais, na visão de Bromiley e Cummings (1995), está relacionada às situações em que o participante da rede atua de uma maneira previsível e age e negocia de forma justa, quando a possibilidade de agir de maneira oportunista está presente. Para Verschoore e Balestrin (2008), a confiança é um fator primordial na formação das redes interorganizacionais, pois a partir dela os interessados na atuação conjunta se aproximam e, dessa forma, as relações acabam extrapolando o plano econômico. Os empresários entrevistados comentam que a confiança entre os integrantes da rede existia e com a qual não se preocupavam, conforme pode ser observado nas falas a seguir:
Tinha confiança sim, sem dúvida. Nunca houve problema, questão de ética, de comportamento, sempre foi tranquilo. Também como te disse, as pessoas já se conheciam, já participavam dentro do Sinduscon, então tinha essa afinidade, essa confiança. E essas empresas são todas empresas sólidas, nenhuma conhecida por falcatrua (E4).
Referente à aprendizagem interorganizacional, Kogut (1988) sugere que esta é essencial nas redes, pois elas surgem como uma resposta estratégica das organizações às mudanças ambientais, as quais exigem melhoria das habilidades, práticas e conhecimentos. Na visão de Pardini, Santos e Gonçalves (2008) a aprendizagem interorganizacional não é promovida isoladamente, mas resulta do confronto e união dos conhecimentos disponíveis por meio das experiências das organizações.
Mozzato e Bitencourt (2014) destacam que a aprendizagem surge por meio da troca de experiência entre os envolvidos e é gerida por processos dentro das organizações. Nas falas de E4 e E2, pode-se verificar que a aprendizagem entre os empresários que participavam da rede ocorreu e, por isso, não foi razão para o insucesso do empreendimento conjunto.
Houve bastante troca de informações entre as empresas, até a questão de mão-de-obra, qualidade dos materiais que cada um estava empregando, até se buscava uma uniformidade nisso, porque no momento que tu compra junto, tem que ser o mesmo material. Então isso aí foi bem interessante (E4).
Sempre que nós nos reuníamos, a gente trocava figurinhas. O que é isso? Estou com um determinado problema, eu comento aquele problema e alguém me diz: "olha, pode fazer tal coisa". Assim, vivíamos conversando e se encontrando (E2).
Nas relações interorganizacionais, à medida que as empresas se comunicam e trocam informações sobre práticas e experiências diárias de trabalho, elas podem aprender e adotar novas rotinas que possibilitam mais agilidade na execução de uma atividade e/ou redução de custo (Mellat-Parast e Digman, 2008). O compartilhamento do conhecimento possibilitou às empresas integrantes criarem valor a partir de transformações e melhorias nas suas rotinas e procedimentos.
5.2 Dificuldades de gestão e organização da rede
A gestão de redes, na visão de Hibbert, Huxham e Smithring (2008), refere-se às práticas e processos realizados pelos integrantes, direcionados para alocação e implementação de recursos e que direcionam a rede. Em uma rede de empresas, a gestão é o resultado de um processo de negociação entre os respectivos dirigentes das empresas participantes no acordo (Wegner e Padula, 2010). Para Wegner (2011), a gestão da rede objetiva sua perpetuação, que será possível à medida que os empresários percebem a participação na rede como positiva e necessária. A gestão e a organização da rede de empresas envolvem entre outros aspectos a dedicação e o tempo para a coordenação das atividades. A falta de tempo para gerir o novo negócio foi uns dos aspectos citados pelos entrevistados como um aspecto relevante para o insucesso da rede, como pode ser observado na fala de E2:
Um caso que eu aponto como determinante é que nós necessitaríamos ter um profissional independente para gerir a coisa. O que acontecia? A gente montou uma diretoria, com presidente, com vice, eu era diretor financeiro - eu acho -, na época, mas nenhum de nós disponibilizava um tempo para fazer as coisas acontecerem. Teria que ter uma pessoa contratada, um profissional contratado, remunerado por essas empresas, que dão uma estrutura mínima para ele organizar essas compras (E2).
Este aspecto gerou dificuldades para o andamento da rede. O presidente e o diretor financeiro, principais encarregados pela gestão da rede, eram responsabilizados pela organização das atividades e por resultados. No entanto, para tal fim, eles precisavam despender tempo e, em alguns momentos, deixar as atividades de sua própria empresa em segundo plano. Park e Ungson (2001) afirmam que a dificuldade inerente ao processo de gestão de uma rede se deve ao fato que esta demanda grandes esforços de coordenação. No trecho da fala de E5 pode ser constatado esse aspecto:
Como eu te disse: ah, tenho meu trabalho e tenho que estar negociando pros outros. (...) Estou me estressando com isso, estavam me cobrando, eu ia às reuniões e não vinham muitas pessoas, e o pessoal me cobrando resultado, daí quer saber de uma coisa? Eu vou tocar meu negócio. Essa rede tava me dando vantagem, mas tava me tirando muito mais energia. Então, eu disse: se é pra ficar trabalhando pros outros, vou parar. Foi por esse motivo que eu larguei de mão (E5).
Outro aspecto que gerava dificuldades para a gestão conjunta da rede era a questão do comprometimento. No entendimento de Wegner (2011), a gestão está apoiada no envolvimento e comprometimento das organizações participantes. O comprometimento se traduz em lealdade com os parceiros, sendo considerado um fator influenciador do sucesso do relacionamento (Koza e Lewin, 2000). Para Castro, Bulgacov e Hoffmann (2011), quando o parceiro é comprometido com o relacionamento, ele irá despender esforços para que este tenha sucesso. Na Rede Alfa, a fala de E1 mostra esse problema.
(...) às vezes vinham poucos nas reuniões e chegou um momento que eram sempre os mesmos e o resto só tirava proveito. Eles diziam que não sabiam da reunião e sempre estavam viajando e não mandavam ninguém pra representar. Aí complica, né? Quando eu não podia, eu mandava alguém daqui, senão como é que eu ia ficar sabendo das coisas da rede? Mas não tinha como esperar algo dos colegas (E1).
Wegner (2011) contribui com a ideia ao colocar que nem sempre a formação de uma rede, a partir da colaboração de um grupo de empresários, é compreendida por estes como a constituição de uma nova firma com suas próprias necessidades de gestão. O comprometimento, segundo Isabella (2002), é necessário para formação e manutenção da relação interorganizacional.
Dificuldades também foram detectadas pela fala dos entrevistados em relação à comunicação entre os integrantes da rede. Na visão de Wegner (2011), a gestão se refere a um conjunto de práticas adotadas pela rede, entre as quais estão o planejamento e a comunicação. Para Estivalete (2007) e Sadowski e Duysters (2008), a comunicação ineficaz entre os atores da rede é um fator que dificulta o processo de troca de conhecimento e a atuação conjunta e limita as oportunidades existentes. O trecho de E6 evidencia as colocações acima.
Aí, era complicada, muita coisa a gente não ficava sabendo, muita informação diferente, as coisas vinham por e-mail e por telefone e também presenciais. De vez em quando era uma confusão e, quando tinha que mudar algo de repente, ninguém acabava tendo a informação certa e muita coisa tinha que ligar várias vezes pra resolver. No início, era mais fácil, mas depois começou a dar muito problema, pois não tinha comunicação entre as empresas da rede e da empresa com a rede, entende? Daí, acabava que cada um dizia uma coisa (E6).
Verifica-se que os empresários tinham informações diferentes a respeito de determinado fato ou circunstâncias, ou nem as recebiam. Dessa forma, a atuação conjunta e a conectividade entre os membros ficavam difíceis. Esta falha na comunicação entre os integrantes da rede impedia um alinhamento e um padrão nas informações recebidas pelos gestores e acabava gerando dificuldades para a gestão.
Nas redes interorganizacionais, a complexidade gerencial aumenta em virtude de certas características e necessidades específicas de cada empresa participante. Verschoore (2004, p. 37) menciona que a gestão das redes de empresas traz consigo dificuldades relacionadas principalmente à heterogeneidade dos integrantes, que envolvem um conjunto amplo de necessidades, expectativas e objetivos. No caso da Rede Alfa, cada participante possuía diferentes necessidades e momentos de compras diferentes e também certas especificidades que dificultavam a realização de atividades conjuntas. O que ocorria é que as obras das empresas integrantes da rede eram de diferentes tamanhos e possuíam determinadas peculiaridades, bem como também se encontravam em diferentes estágios de construção. Na fala de E3, pode-se compreender estes aspectos.
A construção civil é um pouco diferente comparando com as redes de supermercados; nestes um kg de carne é o mesmo. Em um kg de filé, o filé é igual. Agora o azulejo que eu vou comprar pra minha empresa não é igual da outra empresa. Cada um tem seu DNA, suas particularidades. E mesmo coisas iguais, como ferro ou cimento; pode ser que eu estou no inicio da minha obra e tu, na fase final; daí, tu não quer isso. Aí, nós dois não... não fecha, sabe? (E3).
Dessa forma, os empresários não conseguiam formar um grupo grande para comprar determinados materiais para suas obras. Pode-se, aparentemente, relacionar esta dificuldade ao pequeno número de integrantes da rede. Caso ela possuísse um número maior de empresas integrantes, maior seria a possibilidade de reunir um grupo dentro da própria rede que tivesse as mesmas necessidades de compra e mais fácil seria para exercer determinadas atividades conjuntas. Assim, as empresas também conseguiriam maior poder de barganha e de descontos e isso poderia possibilitar o crescimento da rede e das próprias empresas.
5.3 diferentes perspectivas sobre a finalidade da rede
Nas redes de empresas, diferentes aspectos podem gerar empecilhos para sinergia do grupo. A divisão do grupo, em muitos casos, surge da dificuldade em reconhecer que as perspectivas e expectativas dos integrantes podem mudar com o passar do tempo (Pereira, 2005). Para Dacin et al. (1997), um dos problemas das empresas atuarem em grupo ocorre devido à dificuldade em perceber que as diferentes finalidades e objetivos que cada integrante pode ter ao integrar-se em uma rede. Esta dificuldade, segundo Pereira et al. (2010), surge à medida que a aliança evolui e pode levar a diferentes motivações em investir na relação.
Para Douma, Bilderbeek, Idenburg e Looise (2001), um dos problemas está em ajustar as estratégias às empresas relacionando aspectos como o equilíbrio complementar de informações, benefícios recíprocos e a harmonia de interesses entre as empresas integrantes. Verschoore e Balestrin (2008) explicam que a rede pode tornar-se harmoniosa quando há uma possibilidade de todos se tornarem parte do processo, com seus objetivos e interesses sendo explorados. A atuação conjunta, na percepção de alguns entrevistados, tornava-se muito restrita à realização de compras conjuntas e pouco atraente quanto a outros objetivos e resultados da rede. Os interesses de alguns empresários eram mais amplos, como se pode verificar na fala de E4:
Entre alguns, a gente falava muito em tentar se fortalecer na rede conseguindo mais clientes e ampliar o que a gente tinha, né? Pegar obra em conjunto, fazer treinamento de pessoal, mas acabou ficando só na conversa. Cada empresa tava lá pra fazer parceria e defender o seu, né?... Era difícil pensar só na rede em si, daí muita gente tratava de comprar, e deu, Pra mim, em uma rede se pode conseguir mais (E4).
Outro fator relacionado à integração do grupo, na visão de Anderson, Lodish e Weitz (1987), é a possibilidade de todos participarem do processo decisório, podendo expor suas opiniões e ter suas expectativas e objetivos analisados. Na Rede Alfa, podem-se verificar divergências quanto ao processo decisório. Alguns entrevistados mencionam que algumas circunstâncias não eram avaliadas por todos, como, por exemplo, na estipulação do local de entrega e preço do frete de determinada mercadoria que foi comprada em conjunto. Além disso, o presidente influenciava muito no processo. Isso pode ser constatado no trecho do relato de E1.
Tinha coisas que a gente decidia todo mundo junto né, mas tinha muita coisa que não passava por todos. E nem todos ficavam sabendo das decisões, que nem na compra: quando comprávamos junto, o local de entrega era tal, mas e por que não lá, sabe. Daí, não tinha o mesmo frete pra todos já que era mais perto de uns do que de outros, né? Isso pra exemplificar, porque havia mais casos, eu acho (E1),
Com base nestes depoimentos, pode-se dizer que em alguns momentos o processo de decisão não envolvia todos os participantes e que nem todos tinham a mesma possibilidade de participação nas decisões. Isso pode ter acarretado o descontentamento e o desinteresse de alguns integrantes.
No entanto, outros entrevistados evidenciam que o problema não estava na rede, e sim no interesse de cada empresário, pois todos eram avisados e convidados a participar das reuniões. A fala do entrevistado E5 mostra esse aspecto, destacado por outro grupo dentro da rede.
Ah, muito relativo, sabe? Da mesma forma que, quando tu me perguntaste do comprometimento, tinha uns que se interessavam e vinham nas reuniões e participavam das decisões. Mas, agora, os outros, como poderiam participar, os cara não vinham (...). A gente acabava que decidia entre os que estavam lá, íamos fazer o quê? (E5).
Motta e Vasconcelos (2002) argumentam que a organização deve definir os critérios que abrangem o processo de decisão e o número de alternativas disponíveis que os participantes poderão considerar antes de decidirem por uma alternativa satisfatória, que poderá não ser boa. Segundo Simon (1965), o processo decisório pode ser deliberadamente modificado e a direção da organização (rede) deve fornecer referências (conhecimentos, valores) que se correlacionam aos objetivos organizacionais e possibilitem as escolhas corretas.
6 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS: O INSUCESSO DA REDE
A constituição de redes interorganizacionais surge, conforme discutido anteriormente, do interesse dos participantes em alcançar uma relação de custo x benefício favorável a sua permanência na rede. No momento em que essa relação se torna desfavorável, as empresas participantes da rede passam a questionar a formação do grupo (rede) e sua forma de organização. A partir dos relatos dos entrevistados, é possível identificar alguns fatores que contribuíram para o insucesso da Rede Alfa. A Figura 1 a seguir permite visualizar esses principais fatores.
A Figura 1 mostra a interligação entre a dificuldade de gestão da rede e a divisão interna do grupo, bem como a influência de uma sobre a outra. A partir dessa ligação, pretende-se evidenciar que o conjunto de fatores identificados nas categorias de análise apresentadas estão relacionados entre si e que todo esse conjunto levou, neste caso, os empresários a uma projeção pessimista de resultados futuros e ao insucesso da rede. A falta de investimentos na rede, como em um espaço físico para estruturação de um escritório e a contratação de um profissional que pudesse organizar as compras e demais atividades da rede, gerou dificuldades para organização interna do empreendimento.
Os principais responsáveis pela organização das atividades na rede tinham que dividir seu tempo entre a rede e suas próprias empresas, o que exigia um esforço adicional para algo que não estava gerando o retorno esperado. Para Adler e Kwon (2002), as redes, como um tipo de relações, requerem muitas vezes investimentos específicos, além de esforços e tempo para gestão e para que possam ser criadas e mantidas. Chen (2010) explica que nas redes há uma necessidade de serem especificadas as funções e responsabilidades, definir e coordenar as tarefas de cada parceiro na operação do dia a dia para, assim, coordenar e decidir as operações dirigidas mutuamente e os objetivos acordados.
Isso, aparentemente, está relacionado às diferentes visões e percepções dos empresários sobre a finalidade da rede e as divergências sobre o processo decisório, entre alguns dos integrantes da rede, o que contribuiu para a divisão do grupo. Alguns integrantes viam outros benefícios e finalidades para a atividade conjunta em rede e também não estavam satisfeitos quanto ao processo decisório. Outros integrantes falaram que o processo decisório era democrático e que faltava comprometimento de alguns integrantes. A gestão compartilhada de redes, na qual não existe uma estrutura formal e exclusiva de gestão e onde as empresas integrantes trabalham e organizam a rede, como no caso da Rede Alfa, está sustentada, entre outros aspectos, no comprometimento e no envolvimento dos participantes. A falta de comprometimento foi um dos principais aspectos que se pode constatar na fala dos empresários como determinante para o insucesso da rede.
Voltando ao caso de insucesso da rede, a falha na comunicação interna entre integrantes foi outro aspecto que gerou maiores dificuldades para gestão da rede. Os empresários afirmaram que a comunicação era um problema, pois recebiam muitas informações diferentes e faltava organização. Strobel (1998) menciona que um fator essencial em uma rede é a eficiente comunicação entre os participantes para possibilitar e tornar transparentes todas as atividades desenvolvidas e também reforçar a relação emocional dos integrantes com a rede. Talvez este fato também estivesse relacionado à falta de investimentos em estrutura e na contratação de uma pessoa que organizasse as atividades.
Por fim, o ramo de construção civil, segundo os próprios empresários integrantes da rede, apresenta certas especificidades que dificultavam a gestão, a organização e a execução das atividades conjuntas. Eles explicaram que cada empresa possui suas peculiaridades e que as obras de cada uma delas geralmente se encontravam em diferentes estágios de construção. Aliado a isso está o pequeno número de participantes da rede. Caso o empreendimento feito pelos empresários tivesse um maior número de participantes, maiores seriam as possibilidades de um grupo de integrantes terem suas obras em um mesmo momento e, assim, poderiam ser feitas mais compras e outras atividades conjuntas.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O artigo aborda um aspecto pouco explorado nos estudos sobre colaboração interorganizacional: os motivos que levam uma rede de empresas ao insucesso. O objetivo deste estudo foi analisar os motivos que levaram a Rede Alfa ao insucesso do empreendimento conjunto. Para tanto, identificaram-se diversos fatores por meio da codificação das falas dos entrevistados. Primeiramente, quanto às características de gestão da rede, a Rede Alfa se caracterizava por ter uma gestão compartilhada entre seus integrantes, na qual os próprios empresários administravam e organizavam as atividades. No entanto, eles não estavam preparados e não dispunham de tempo para gerenciar tal empreendimento.
Conforme os relatos dos entrevistados, eles deveriam ter investido em pessoas qualificadas para coordenarem suas necessidades de compras e demais atividades relacionadas. Pequenas empresas, como neste caso, geralmente apresentam, na visão de Wegner et al. (2008), diversas dificuldades com o seu próprio negócio e terão ainda mais dificuldades para gerenciar a rede interorganizacional em que pode haver interesses e motivações diferentes (Hastings, 1996; Dacin et al., 1997). A dificuldade de gestão se tornava ainda maior devido a fatores como a falta de comprometimento dos integrantes, a falha na comunicação interna e a falta de organização das atividades.
Referente aos fatores que contribuíram para o insucesso da rede, podese verificar que, além das dificuldades de gestão e dos fatores relacionados, a Rede Alfa teve dificuldade em conseguir novos membros durante sua vigência e formar um grupo maior devido à falta de critérios objetivos e claros adotados quanto ao processo de seleção dos parceiros. Isto limitou a execução de uma maior quantidade de atividades conjuntas, como a compra de materiais para as obras. Da mesma forma, diferentes visões quanto à finalidade da rede e à forma como o processo decisório estava sendo executado levaram à divisão interna dos integrantes da rede fazendo com que alguns dos integrantes se desanimassem. Os fatores apresentados resultaram afetando a continuidade da rede, e não foi especificamente a saída de integrantes que afetou seu insucesso.
Por fim, processos e fatores que dificultam a continuidade do empreendimento conjunto podem surgir a partir de relações interorganizacionais que não podem compensar os investimentos. Uma vez formado o grupo, mesmo que não haja uma avaliação objetiva e mensurável dos resultados que a rede proporciona, os empresários estabelecem uma relação custo x benefício para decidir entre permanecer ou não na rede. Isto coloca algumas questões difíceis como: que tipos de habilidades e competências empreendedoras dos gestores são necessários para evitar problemas para a própria empresa e para a rede? Até que ponto as empresas estão dispostas a investir em redes? Ou até que ponto a ajuda de um consultor externo é significativa para as redes? Qual forma de gestão pode minimizar discordâncias e conflitos?
Ressalta-se que o presente trabalho não busca ser normativo no sentido a indicar categoricamente os motivos que levam ao insucesso das redes. O artigo verificou os fatores que levaram uma rede específica ao insucesso buscando contribuir com fatores e aspectos relevantes e que necessitam atenção na formação, no desenvolvimento e na gestão de redes. Revisar periodicamente a forma de organização e a gestão da rede quanto a processos decisórios, ao envolvimento e às percepções dos integrantes e à comunicação interna pode contribuir para o alinhamento das atividades desenvolvidas e os interesses dos empresários participantes. A constituição de uma rede de empresas pode trazer e gerar benefícios a seus parceiros, mas estes necessitam estar cientes quanto a aspectos fundamentais, como os analisados neste estudo, que estão relacionados à escolha de atuarem conjuntamente no mercado na forma de redes e despender esforços para a sua continuidade.
Estudos que avancem nessas questões devem ser desenvolvidos para aumentar a compreensão sobre o assunto e as possibilidades de sucesso desse tipo de empreendimento, em especial no que diz respeito àqueles formados por empresas de pequeno porte que geralmente possuem maiores dificuldades na gestão de suas atividades. Quanto às limitações do estudo, tem-se como a principal delas o fato de ser baseado no caso de uma única rede de empresas. A sugestão é a de que novos estudos nessa área, que envolvam outras redes que tiveram insucesso ou que perderam seus participantes, sejam realizados visando a solidificar um arcabouço teórico sobre o fenômeno.