Introdução
O surgimento da Atenção Primária à Saúde (APS) relaciona-se à necessidade de mudança organizacional dos serviços de saúde com foco na cura e reabilitação para a promoção da saúde e prevenção de doenças [1]. Nessa concepção, a APS institui-se por atributos essenciais (atenção ao primeiro contato, longitudinalidade, integralidade e coordenação) e derivados (atenção centrada na família, orientação comunitária e competência cultural) [2, 3]. Essa organização relaciona-se a melhores condições de cuidado, fluxo dos usuários dentro do sistema, utilização de práticas preventivas, satisfação dos usuários, indicadores de saúde e iniquidades [3].
Dentre os instrumentos disponíveis para avaliar a APS, o Primary Care Assessment Tool (PCATool) destaca-se por sua capacidade de medir a presença e extensão dos atributos da assistência, por possuir componentes específicos para fases do ciclo da vida e por incluir aspectos de estrutura, processo e resultados que são determinantes da qualidade dos cuidados [1, 2]. Considera-se que avaliações por meio do PCATool possibilitem comparar e sistematizar resultados sobre o desempenho dos serviços de saúde em contextos diferentes [1, 4, 5].
No Brasil, a Estratégia Saúde da Família (ESF) constitui a principal alternativa de reorganização da APS [3, 4, 5]. As avaliações da Estratégia, apesar do uso de instrumentos diferentes [5], sugerem fragilidades que questionam seu caráter substitutivo, a exemplo de precariedade no desenvolvimento tecnológico, gerencial e científico; visão vertical dos programas; omissão de política trabalhista adequada; uso rotineiro exagerado dos recursos; e não apropriação das equipes de saúde em termos de completude, funcionalidade e formação dos profissionais [5, 6]. Resultados adicionais são necessários para a compreensão mais apurada dessa conjuntura e dos desafios impostos, sobretudo por meio do PCATool que predomina como instrumento de avaliação [2, 4, 5]. Para a população infantil, a avaliação da APS pode ser especialmente relevante à compreensão das internações por condições sensíveis à atenção primária como consequência da eficiência do serviço [7].
Este estudo objetivou avaliar a assistência à saúde da criança e analisar fatores associados na ESF de dois municípios do estado da Paraíba.
Métodos
Tipo de estudo
Trata-se de uma pesquisa de cunho transversal para avaliar os atributos da APS relacionados aos cuidados de crianças menores de cinco anos atendidas por equipes de saúde da família no Brasil.
Universo, população e amostra
O estudo foi conduzido em dois munícipios da Paraíba, Nordeste do Brasil. A escolha dos municípios considerou suas semelhanças quanto a posição geográfica (localização na região metropolitana da capital do Estado com acesso à rede de serviços nela disponibilizados), grau de urbanização (de quase 100 %), indicadores demográfico-sociais (índice de desenvolvimento humano de nível médio - 0.748 no Município 1 e 0.649 no Município 2) e tradição na organização de serviços primários de saúde (cobertura populacional da ESF de quase 100 %). O Município 1 tem população de 57 944 habitantes, dos quais 4596 são crianças menores de cinco anos, e possui sistema de saúde composto por 19 equipes da ESF. O Município 2 tem população de 99 716 habitantes, dos quais 7862 são crianças menores de cinco anos, e possui sistema de saúde composto por 28 equipes da ESF. Entretanto, no Município 1 o número de profissionais de saúde (médicos, pediatras, enfermeiros, nutricionistas), para cada 1000 habitantes, no Sistema Único de Saúde, é maior do que no Município 2.
A população de estudo foi composta por mães de crianças menores de cinco anos atendidas por equipes da ESF dos municípios em estudo. Para o cálculo do tamanho amostral foram empregados parâmetros que resultaram da avaliação da qualidade da atenção à saúde da criança na ESF, conforme a visão de usuários no município de Montes Claros, Minas Gerais [8]. No estudo, constatou-se avaliação negativa das equipes formadas por médicos e enfermeiros com residência em Saúde da Família de 41.9 %, e de 58.1 % daquelas compostas por profissionais sem esta formação específica. Assim, considerando-se prevalência esperada de avaliação negativa dos serviços de saúde pelos usuários de 41.9 %, no Município 1 (com melhor composição de profissionais de saúde), e de 58.1 %, no Município 2, nível de 95 % de confiança, poder de 80 %, 10 % de acréscimo para compensar eventuais perdas e efeito do desenho de 1.2, obteve-se a necessidade de entrevistar 157 sujeitos por município.
A amostra foi selecionada por conglomerados em dois estágios. No primeiro, foram sorteadas aleatoriamente as equipes de saúde da família e no segundo estágio um número fixo de mães de forma intencional. Em cada município foram selecionadas nove equipes da ESF, que representaram cerca da metade das equipes do Município 1 e 1/3 das do Município 2. Cada equipe contribuiu, em média, com 18 mães para o total da amostra que obedeceu a dois critérios: i. uma amostra intencional, composta por todos os atendimentos nas consultas de puericultura no dia da coleta de dados, em um dia típico de trabalho; ii. uma amostra de crianças encaminhadas aos serviços de saúde pelos Agentes Comunitários de Saúde, conforme rotina de trabalho, das quais selecionaram-se aletoriamente a quantidade que permitisse completar o total previsto para cada equipe de saúde. No final do período de coleta de dados, a amostra constituiu-se de 321 mães de crianças menores de cinco anos, das quais 153 do Município 1 e 168 do Município 2.
Fontes e instrumentos de coleta de dados
Para a coleta de dados foram aplicados dois instrumentos às mães das crianças: um com dados sociodemográficos das famílias e outro validado (PCATool) [9] para apreender a percepção materna dos serviços de saúde prestados pelas equipes da ESF aos seus filhos menores de cinco anos. O questionário da situação sociodemográfica contemplou as seguintes informações: sexo e idade da criança, idade e alfabetização materna, condições do domicílio em relação à presença de esgoto domiciliar e número de pessoas, benefício do Programa Bolsa Família e renda familiar. Além disso, a segurança alimentar da família foi medida por meio da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar [10].
Na validação do PCATool para sua aplicação em crianças, foram identificadas oito dimensões com o α de Cronbach variando de 0.74 a 0.88 por análise fatorial. Assim, o instrumento ficou constituído por 45 itens e oito atributos (acesso de primeiro contato, continuidade, coordenação, três atributos de integralidade, orientação familiar e comunitária). Estes resultados indicaram adequada validade e confiabilidade do PCATool para seu uso na avaliação dos serviços da APS para crianças [11].
O PCATool [9] foi usado na versão destinada às crianças, contemplando os componentes de acesso de primeiro contato - utilização, acesso de primeiro contato - acessibilidade, longitudinalidade e integralidade - serviços prestados. As respostas do instrumento são do tipo Likert [12], com escore de 1 a 4 para cada elemento que compõe o atributo: com certeza sim [4]; provavelmente sim [3]; provavelmente não [2]; com certeza não [1]. Para as perguntas C2, C4, C5 e D10, por serem elaboradas de maneira inversa (quanto maior o valor, menor a orientação para a atenção primária), os seus valores foram invertidos (valor 4=1, valor 3=2, valor 2=3, valor 1=4), conforme especificações do instrumento. Para cada atributo, foram calculados os escores e a partir dos mesmos o escore geral. Nos casos de respostas para apenas três atributos, o cálculo do escore geral desconsiderou o atributo não avaliado. Mães que responderam apenas as questões de dois dos atributos em análise foram excluídas, o que correspondeu a três casos no Município 1 e 11 no Município 2 e totalizou 307 questionários válidos para as análises. Após consolidação das respostas para cada atributo, os valores foram transformados em uma escala contínua, variando entre zero e dez, por meio da fórmula: Escore ajustado = [(escore obtido-1) / [4-1]] x 10. Valores de escore geral < 6.6 foram considerados baixos ou insatisfatórios (menores do que três segundo a escala Likert) [12].
A coleta foi realizada nas unidades de saúde entre julho e dezembro de 2014. A equipe foi formada por profissionais e estudantes da área de saúde, com experiência prévia em trabalho de campo, o qual foi supervisionado por profissional capacitado. O controle de qualidade do estudo incluiu: treinamento e padronização dos entrevistadores, construção de Manual de Instruções e teste prévio dos entrevistadores e do questionário socioeconômico.
Processamento e análise dos dados
Os dados coletados foram organizados em planilhas eletrônicas e digitados em dupla entrada. O aplicativo Validate do software Epi Info versão 3.3.2 foi usado para analisar a consistência dos dados gerando o banco final que foi utilizado nas análises estatísticas.
Nas comparações entre os municípios, utilizaram-se os testes qui-quadrado e “t” de Student para analisar diferenças nas proporções das características sociodemográficas e nas médias dos escores de avaliação dos atributos, respectivamente. A associação das variáveis independentes (características sociodemográficas) com a variável dependente (escore geral da avaliação materna dos serviços de saúde) foi verificada por meio do teste do qui-quadrado, enquanto diferenças entre municípios nas proporções de baixo escore geral segundo categorias das variáveis independentes foram analisadas por meio do teste de igualdade de proporções (teste com estatística Z).
A Regressão de Poisson com variância robusta utilizou-se para estimar as razões de prevalência (RP) e seus respectivos intervalos de confiança de 95 % (IC95 %) para avaliar a associação entre as características sociodemográficas e o escore geral insatisfatório dos serviços de saúde. O modelo explicativo considerou as variáveis com nível de significância de até 25 % (p<0.25) nas análises bivariadas. A presença de confusão e interação foi explorada a partir de modelos de regressão, realizada com procedimento backward. Partiu-se de um modelo saturado contendo todas as potenciais variáveis modificadoras de efeito e seus respectivos produtos-termo, além das candidatas a confundimento. Consideraram-se modificadoras de efeito as variáveis que apresentaram resultados estatisticamente significantes (p < 0.05), segundo o teste da razão de máxima verossimilhança. As variáveis de confusão foram aquelas que produziram alteração abaixo da média na medida pontual das outras associações testadas.
Em todas as análises, o nível de significância admitido foi de 5 %. Utilizou-se o software Stata versão 12.0.
Aspectos éticos
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual da Paraíba, com o protocolo de número 19689613.3.0000.5187. Todos os participantes da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido como condição necessária e concordância relacionada à participação no estudo.
Resultados
O perfil sociodemográfico das famílias envolvidas no estudo está compendiado na Tabela 1. Em ambos os municípios, a maioria das crianças possuía idade inferior a 25 meses. Observaram-se frequências maiores do que 50.0 % para ausência de rede pública de esgoto domiciliar, mínimo de quatro pessoas no domicílio, renda familiar mensal inferior a dois salários mínimos e benefício do Programa Bolsa Família. As frequências de insegurança alimentar moderada/grave foram de 41.3 %, no Município 1, e 49.7 %, no Município 2. Nenhuma das variáveis relacionadas à situação sociodemográfica apresentou diferença entre os municípios. Nessa mesma tabela, observa-se que a proporção de mães que avaliaram positivamente a APS foi superior no Município 1 (54.0 %) quando comparado com o Município 2 (24.2 %) (Tabela 1).
SM: Salário Mínimo (R$724,00); * Teste do qui-quadrado para proporções; ** Escore Geral da Atenção Primária à Saúde.
Os escores dos atributos da APS para os dois municípios estão na Tabela 2. Ambos os municípios apresentaram valores de escores satisfatórios (≥ 6.6) para a utilização, e insatisfatórios (< 6.6) para a acessibilidade e a longitudinalidade. O escore da integralidade (ações de promoção e prevenção) foi satisfatório no Município 1 e insatisfatório no Município 2. Para todos os atributos, as médias dos escores foram superiores no Município 1. Segundo critérios específicos, apenas o encaminhamento a especialista, na utilização, e o tempo de espera para consultas, na acessibilidade, não apresentaram diferenças entre os municípios. Na análise conjunta dos atributos, os valores de escore geral foram < 6.6 nos dois municípios, sendo significativamente mais elevado no Município 1 (Tabela 2).
A prevalência de baixo escore geral foi maior entre as famílias com crianças de 25-60 meses de idade (76.9 %) em comparação aquelas com idade inferior aos 25 meses (55.9 %); bem como entre as famílias com renda familiar >= 2 salários mínimos (73.2 %) quando comparadas aquelas com renda familiar < 2 salários mínimos (56.6 %). Essas mesmas diferenças foram constatadas para a idade da criança no Município 2 e para a renda familiar no Município 1. Segundo os resultados da estatística Z, a condição materna de não saber ler, escrever nem fazer contas; a ausência de rede pública de esgoto no domicílio e a renda familiar < 2 salários mínimos foram as categorias que atuaram isoladamente como condições discriminantes das diferenças entre os municípios nas proporções de escore geral baixo (Tabela 3).
SM: Salário Mínimo (R$724,00); * Teste do qui-quadrado para proporções; ** Teste de igualdade de proporções (teste com estatística Z).
As análises da Regressão de Poisson apresentadas na Tabela 4 confirmaram os resultados não ajustados. Mães de crianças de 25-60 meses de idade atribuíram piores escores aos atributos da APS do que as mães das crianças menores de 25 meses (RP=1.42 e IC95 %=1.21-1.93). Por sua vez, o baixo escore geral da APS foi mais frequente entre crianças de famílias com renda >= 2 salários mínimos do que entre crianças de famílias com renda familiar < 2 salários mínimos (RP=1.30 e IC95 %=1.11-2.39) (Tabela 4).
Discussão
O presente estudo permitiu aferir a percepção de mães sobre a qualidade dos serviços primários de saúde oferecidos aos seus filhos menores de cinco anos, por meio de instrumento validado. Os achados ressaltam, primeiramente, que trata-se da avaliação de famílias socioeconomicamente vulneráveis, o que corresponde com o perfil da população que preferencialmente utiliza a ESF [12, 13]. A proximidade da moradia às unidades de saúde pode estar relacionada à escolha dos serviços oferecidos na ESF para acompanhar a saúde da criança [12].
Resultados de pesquisas anteriores têm destacado avaliações abaixo do esperado para a atenção à saúde da criança na ESF [12, 14, 15, 16, 17], o que foi similarmente constatado nos dois municípios do atual estudo. A compreensão desses achados deve ser reforçada segundo indícios sobre a redução das iniquidades em saúde e melhorias do perfil de morbidade, inclusive a hospitalização por condições sensíveis [3, 18].
Em relação aos escores de cada atributo da APS, a utilização destacou-se por alcançar valores altos nos dois municípios, enquanto, com exceção da integralidade no Município 1, todos os outros atributos foram marcados pelos baixos escores. Esses resultados convergem com os de estudos anteriores específicos para os cuidados direcionados às crianças [14, 16, 17, 19], bem como com a avaliação geral da ESF que tem destacado avanços importantes no componente demanda, não observados no enfoque às necessidades de saúde [5].
No atributo de acessibilidade, os baixos escores observados indicam que ainda existem barreiras que dificultam o acesso das crianças aos serviços de saúde. Esse fato também foi identificado em estudos semelhantes [12, 14, 16, 17, 19, 20]. O tempo de espera para a consulta foi o critério com pior avaliação, o que vem sendo apontado como um dos principais motivos de insatisfação dos usuários do SUS [21]. Além de promover uma percepção negativa sobre o atendimento, longos períodos de espera podem, particularmente, prejudicar a saúde da criança, uma vez que nessa fase da vida adoecer é mais frequente, principalmente por afecções agudas [12].
Embora com escore superior à acessibilidade, a presença da longitudinalidade também mostrou-se insatisfatória, concordando com resultados de pesquisas similares [14, 17]. No entanto, há relatos de estudos nos quais a longitudinalidade tem sido avaliada positivamente [12, 15, 22, 23]. A garantia da longitudinalidade na infância constitui um fator essencial como fonte regular de atenção à saúde associado a maior vínculo e responsabilização [3, 18]. Nesse sentido, cabe ressaltar a importância da formação dos profissionais de saúde ser adequada às condições de vida e saúde da população para o alcance desse atributo [3]. No Brasil, a qualificação e capacitação dos profissionais de saúde constitui, consensualmente, um dos aspectos críticos do processo de transformação do modelo assistencial [1, 24], caracterizando, assim, prejuízos na continuidade do cuidado. Segundo a percepção das mães deste estudo, os aspectos da longitudinalidade relacionados ao conhecimento dos profissionais sobre as características das famílias estiveram entre os de menor escore, fato que enfatiza o desafio que esse problema impõe e destaca possíveis consequências negativas no atributo de orientação familiar.
Adicionalmente, há que destacar que o comprometimento da longitudinalidade prejudica a produção de diagnósticos e tratamentos precisos, levando a encaminhamentos desnecessários para especialistas ou para a realização de procedimentos de maior complexidade [3, 18]. Nessa conjuntura, os altos índices de Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária entre as crianças brasileiras menores de cinco anos questionam a efetividade da APS, associado a problemas na continuidade da atenção [25, 26]. A necessidade de maior interação com a família e com a história de vida da criança reverte à longitudinalidade mais importância, no que se refere à assistência à saúde da criança [12, 18].
Em relação à dimensão da integralidade – serviços prestados, observou-se valor do escore aquém do ideal no Município 2, o que também foi observado em estudos desenvolvidos em outras localidades do país [15, 17, 20, 22, 27]. Sugere-se que a integralidade da assistência seja um dos atributos mais comprometidos do SUS [5], sendo questionada com base nos modos antagônicos de pensar e agir que feormam parte das práticas dos profissionais de saúde no contexto da APS [28, 29]. A integralidade implica na necessidade de potencializar formas mais amplas de intervir em saúde com capacidade de ações intersetoriais e de atuação sobre seus determinantes sociais [3]. No cuidado à criança na APS, características pessoais e do processo de trabalho dos profissionais de saúde são reconhecidos como fatores importantes das práticas integrais de cuidado [18]. Esses argumentos permitem recomendar a necessidade de ações de orientação às mães relacionadas à criança, principalmente sobre crescimento, desenvolvimento e saúde que foram as que atingiram menores escores no Município 2.
A pesar da importância de compreender os fatores que determinam diferenças no desempenho da APS em contextos geográficos diferentes [24], percebe-se uma literatura carente para esses fins. Os resultados deste estudo apontaram piores escores da ESF entre as famílias com melhores rendimentos, o que pode ser justificado pela maior dependência dos serviços entre famílias mais vulneráveis, como sugerido por outros pesquisadores que obtiveram resultados similares analisando a situação socioeconômica da família [15]. Explicação similar pode ser presumida em relação aos melhores escores atribuídos pelas mães de crianças de menor idade, uma vez que nesse grupo se prescinde de maior quantidade de consultas, seja de rotina ou por maior acometimento de adoecimentos.
Outros dois estudados também analisaram a associação das condições socioeconômicas com a avaliação da APS, segundo a percepção de cuidadores das crianças. Neles, a escolaridade materna mostrou-se associada positivamente com a avaliação dos serviços [8, 12], o que não foi constatado no atual trabalho. No entanto, os achados deste estudo indicaram diferenças nas proporções de baixo escore geral da ESF explicadas pelos riscos condicionados à pior situação de escolaridade materna, bem como a menores rendimentos e saneamento domiciliar inadequado. Revela-se, assim, a importância de discriminar a qualidade dos serviços considerando essas condições e implica na necessidade de ações focalizadas que direcionem esforços relacionados à minimização de tais efeitos.
Considerando que a qualidade do cuidado é resultante de uma complexa interação de fatores, os resultados deste estudo devem ser interpretados ponderando a limitação imposta pela assunção apenas da faceta relacionada aos usuários. Apesar da importância da avaliação dos usuários na medida em que constitui o grupo que efetivamente experimenta o serviço, em seus aspectos positivos e negativos, e que tende a realizar uma avaliação mais crítica, os profissionais possuem conhecimentos científicos que podem revelar e valorizar características inerentes à dinâmica social que expressem necessidades potenciais efetivas à qualidade.
Conclusões
Os resultados apresentados apontam a necessidade de melhorar a qualidade da APS em termos de acessibilidade, longitudinalidade e integralidade. Essa melhoria implica em reformulações de alguns aspectos na organização dos serviços, no vínculo dos profissionais com as famílias e no processo de trabalho relacionado com a oferta de ações de promoção e prevenção.
Contribuições
DFP contribuiu na concepção, análise e interpretação dos dados; redação do artigo e revisão crítica do conteúdo intelectual; aprovação final da versão a ser publicada. ISS contribuiu na interpretação dos dados; revisão crítica do conteúdo intelectual; aprovação final da versão a ser publicada.