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CES Psicología

On-line version ISSN 2011-3080

CES Psicol vol.8 no.1 Medellín Jan./June 2015

 

Diabetes mellitus: dimensões psicoemocionais à luz da medicina tradicional chinesa

Diabetes mellitus: dimensiones psicoemocionales a la luz de la medicina tradicional China

Diabetes mellitus: psycho-emotional dimensions in the light of traditional Chinese medicine

Elaine Custódio Rodrigues Gusmão1, Michele Bezerra de Lima2, Paloma Santos de Paiva3

1Pós-graduação em Neuropsicologia pela UNIPÊ e Mestrado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte Professora, Mestre, Unidade Acadêmica de Psicologia, Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Brasil. lainecr.psi@hotmail.com.
2 Aluna do curso de graduação em Psicologia, Unidade Acadêmica de Psicologia, Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Brasil. michele_mily@yahoo.com.br
3Aluna do curso de graduação em Psicologia, Unidade Acadêmica de Psicologia, Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Brasil, paloma.paiva@hotmail.com

Forma de citar: Rodrigues G., E.C., Bezerra de Lima, M. & Santos de Paiva, P. (2015). Diabetes mellitus: dimensões psicoemocionais à luz da medicina tradicional chinesa. Revista CES Psicología, 8(1), 47-62.


Resumo

Esta pesquisa tem como objetivo compreender a influência de fatores psicoemocionais em pessoas com Diabetes Mellitus (DM), considerando os conhecimentos da Medicina Tradicional Chinesa (MTC). As emoções são parte integral da vida humana e, quando excessivamente intensas, podem atuar como fatores de adoecimento. O estudo apresenta caráter descritivo com abordagem qualitativa, utilizando entrevista semi-estruturada e análise de conteúdo. Participaram 12 pessoas entre 40 e 80 anos de idade. Os fundamentos da MTC indicam a relação mútua entre os órgãos e uma emoção específica. No DM, os principais órgãos prejudicados são o baço e o pâncreas, relacionados com o pensamento. Os dados indicam importante frequência do sentimento de preocupação na maioria dos entrevistados, diante de problemas. Constatou-se tendência à susceptibilidade psicoemocional, com falta de controle dos pensamentos.

Palavras chave: Acupuntura, Aspectos Psicoemocionais, Diabetes, Medicina Tradicional Chinesa.


Abstract

This research analyzes the influence of psycho-emotional factors in diabetic, considering the knowledge of Traditional Chinese Medicine (TCM). Emotions are an integral part of human life, but also they can influence on disease factors when these are excessively strong. The fundamentals of MTC indicate the mutual relationship between the body organs and a specific emotion. In diabetes, the main affected organs are the spleen and the pancreas, both related to mental aspects. The study presents descriptive and analytical character with a qualitative approach. Data was collected by semi-structured interviews. 12 people aged between 40 and 80 were involved in this research. According to data, most participants indicate an important frequency of concern feelings. Tendency to psycho-emotional susceptibility and lack of control of thoughts were found.

Keywords: Alternative Medicine, Acupunture, Diabetes, Emotions, Psycho-emotional Aspects, Traditional Chinese Medicine.


Resumen

Esta investigación busca comprender la influencia de factores psicoemocionales en personas con diabetes, considerando los conocimientos de la Medicina Tradicional China (MTC). Las emociones forman parte integral de la vida humana y, cuando son excesivamente intensas, pueden actuar como factores de enfermedad. Los fundamentos de la MTC indican la relación mutua entre los órganos y una emoción especifica. En la diabetes, los principales órganos afectados son el bazo y el páncreas, relacionados con el pensamiento. El estudio es de carácter descriptivo, abordaje cualitativo y utilizó el análisis de contenido como estrategia metodológica y la entrevista semiestructurada como técnica de recolección de la información. Participaron 12 personas entre 40 y 80 años de edad. Los datos indican una importante frecuencia de sentimientos de preocupación en la mayoría de los entrevistados. Fue constatada la tendencia a la susceptibilidad psicoemocional, con falta de control de los pensamientos.

Palabras clave: Acupuntura, Aspectos psicoemocionales, Diabetes, Medicina Alternativa, Medicina Tradicional China.


Introdução

O presente artigo foi extraído de uma pesquisa realizada pelo Programa Institucional de Voluntários de Iniciação Científica (PIVIC), na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), com o intuito de compreender as dimensões psicoemocionais -considerando o conhecimento da Medicina Tradicional Chinesa (MTC)- do processo saúde/doença de pessoas acometidas de Diabetes Mellitus (DM).

Existem inúmeras pesquisas sobre alternativas terapêuticas que buscam a integração mente e corpo, com o objetivo de compreendê-las e de proporcionar soluções visando uma melhor qualidade de vida para os indivíduos. Sabe-se que os conhecimentos advindos da Psicologia, de acordo com as suas distintas teorias, têm contribuído de forma significativa, ao evidenciar a analogia que existe entre a mente e o corpo (Gusmão & Resende, 2014; Vectore, 2005).

Faubert e Crepon (1990), Gusmão e Resende (2014) enfatizam que para a MTC a pessoa faz parte de uma só unidade energética, diante isso, não é possível visualizá-la de forma desconectada. Sendo assim, o psíquico não pode ser dissociado do físico, pois os dois abrangem distintas manifestações de uma mesma energia. Dessa forma, no momento em que surgem perturbações no psiquismo ou no organismo, estas devem ser compreendidas de uma forma integral.

No tocante à racionalidade da Ciência Médica Moderna ou Medicina Ocidental (MO), é importante enfatizar a perda da visão unificadora do indivíduo, reforçando a tendência dos profissionais médicos a tratarem partes específicas do corpo, deixando de conceber o sujeito como um todo. Entretanto, a MTC encontra-se muito mais próxima da abordagem sistêmica, do que da forma cartesiana clássica, afinal ela visualiza o corpo como um sistema que não pode ser fragmentado, pois seus elementos estão interligados (Gusmão & Resende, 2014).

A partir de um ponto de vista holístico, a MTC concebe o corpo humano como uma totalidade. Portanto, qualquer excesso ou falta de substâncias vitais, incluindo Qi4, fluidos5sanguíneos e corporais, causará desarmonia, levando à doença. Dessa forma, o princípio mais importante do tratamento da MTC é restaurar a homeostase corporal por intermédio do uso de remédios naturais (herbalremedies), acupuntura e mudanças no estilo de vida. O seu diagnóstico e tratamento de doenças baseiam-se numa análise geral de sinais e sintomas, o que restabelece o equilíbrio yin/yang6 e a harmonia do Qi e do sangue, desobstruindo os canais7. Por ter uma visão holística, a MTC apresenta algumas vantagens no tratamento do DM, principalmente a possibilidade de aumentar a resistência do paciente diabético à doença, fortalecendo sua imunidade e melhorando o seu metabolismo (Cho, Yue & Leung, 2005).

Para Campiglia (2009), o significado da palavra saúde envolve o resultado do equilíbrio entre o Yin e o Yang. Diante disso, quando eles estão em desequilíbrio, ocorre o processo de adoecimento:

[...] A doença não surge de uma hora para outra; é fruto de uma sucessão de experiências estressantes acompanhadas por uma fragilidade do mecanismo de proteção. Esse processo pode começar a ocorrer no adolescente e só se manifestar na idade adulta ou na velhice. Muitos eventos ficam internalizados e, em uma situação específica, pode ser reativados como um alarme, desencadeando uma reação em cascata que culmina com a doença [...]. O equilíbrio existente entre o Yin e o Yang, entre o indivíduo e o meio e entre os Zang Fu não é estático, mas dinâmico como a própria natureza. Para que ocorra o adoecimento, é necessário que o corpo perca o seu poder de adaptabilidade ao meio externo (p.136).

O termo diabetes é derivado do verbo grego diabeinein, o qual "significa arremessar através de ou atravessar." Originalmente, essa doença se chamava "glicosúria, ou diarreia de açúcar". Para uma melhor compreensão, é importante enfatizar que o pâncreas faz parte do sistema digestivo, exercendo duas funções fundamentais: exócrina e endócrina. A função exócrina é responsável por produzir os sucos digestivos vitais. Na endócrina encontram-se os grupos de células denominadas como placas celulares cuja função é produzir a insulina. Logo, a redução da produção de insulina acarreta os sintomas da doença do açúcar, o diabetes. O DM é uma doença crônica que se caracteriza pelo desequilíbrio da taxa de glicose (açúcar) no sangue, mais precisamente pelo excesso do mesmo, o qual enfraquece ou prejudica o funcionamento do pâncreas. De acordo com a MO, os fatores causadores do DM são herdados (genéticos) e ambientais. Há uma possibilidade ainda da doença surgir mais cedo, quando aliada a outros fatores como a obesidade, traumas emocionais, gravidez, infecções bacterianas, viróticas etc. (Dethlefsen & Dahlke, 2007; Barsaglini, 2008; Gusmão & Resende, 2014; Zagury, Zagury & Guidacci, 2000). Em contraste com essa perspectiva, o Shangai College Of Tradicional Medicine (1996), afirma que:

Diabetes melito é considerada na Medicina Tradicional Chinesa como "doença da sede e da debilitação", cuja etiologia pode estar relacionada à ingestão excessiva de alimentos gordurosos ou doces e fatores emocionais. [...] Manifesta-se o diabetes quando o calor exaure os líquidos orgânicos, lesando o yin. Pode surgir também, quando ocorre deficiência do yang dos rins cuja essência é incapaz de transformar o Qi. O diabetes é classificado em enfraquecimento superior, médio e inferior e estas condições estão intimamente relacionadas com os pulmões, baço/pâncreas e rins, respectivamente (p. 575).

O DM é uma doença que atinge o baço e o pâncreas. Tais órgãos, quando estão em desequilíbrio, indicam que o ser humano possui tendência para enfrentar a vida com sensatez exagerada, não permitindo momentos para vivenciar o prazer e a alegria. Diante disso, o indivíduo percebe o dever como importante, considerando o profissional e o material como as coisas essenciais a sua vida. Logo, falta-lhe na vida aquela doçura de que todo ser humano sente necessidade. Neste sentido, o desequilíbrio do pâncreas pode causar a hiperglicemia (excesso de açúcar no sangue) ou DM (Odoul, 2003; Gusmão & Resende, 2014). Para Odoul:

A presença excessiva de açúcar no sangue exprime que temos dificuldade para gerar, para viver ou para obter doçura na nossa vida. [...] Alguns choques psicológicos fortes, no decorrer dos quais o indivíduo enfrenta a destruição brutal das seguranças ou crenças afetivas, podem ser expressos pela aparição de um diabetes [...] (2003, p. 154).

De acordo com Gusmão e Resende (2014), a maneira da MTC diagnosticar e tratar a doença se fundamenta num exame integrativo de diferenciação de sinais e sintomas, o qual abrange a causa e a natureza da doença, assim como as condições físicas e emocionais do indivíduo, sendo elaborado, posteriormente, um protocolo eficiente direcionado para a recuperação, em longo prazo, dos pacientes diabéticos. Neste sentido, as desarmonias ou desequilíbrios podem ser averiguados mediante sinais físicos e psíquicos, afinal para MTC ambos os aspectos pertencem a uma mesma unidade. Tais sinais fundamentam o diagnóstico, por possuírem a função de conhecer a causa inicial dos desequilíbrios energéticos.

Segundo Maciocia (2007), para MTC um dos pontos mais importantes é identificar a causa da desarmonia do paciente, considerando que a doença "pode estar localizada nos hábitos dietéticos, estilo de vida, prática de exercícios, etc." (p. 195). Diante disso, são diversas as formas de identificar a origem das doenças, como, por exemplo, a anamnese que busca localizar a causa patológica analisando três fases da vida do ser humano: o período pré-natal, a infância e a vida adulta8. Contudo, atualmente existem novas causas patológicas que no período de origem da medicina chinesa não existiam, como: radiação, química nos alimentos, poluição etc. Por isso, é importante na prática de tal medicina acrescentar esses novos fatores como prováveis causas das doenças havendo a necessidade, em certos casos, de associar o diagnóstico da MTC com outros métodos utilizados nos diagnósticos ocidentais com o intuito de localizar tais causas (Gusmão & Resende, 2014).

Apesar da a DM não ser uma doença que leve à morte imediata, uma vez ocorrendo, é muito difícil alcançar uma recuperação completa. Embora a maioria dos pacientes diabéticos sobreviva, eles ainda permanecem com a doença pelo resto de suas vidas. Exercícios, dieta, controle do. peso e ajustes no estilo de vida continuam a ser meios essenciais e eficazes para melhorar a homeostase da glicose (Cho, Yue & Leung, 2005).

Além disso, a visão holística defendida pela MTC destaca que as emoções e os pensamentos estão diretamente relacionados à força vital. Nesse processo, portanto o psiquismo e os órgãos não podem ser visualizados separadamente, pois as perturbações do psíquico, relacionadas às emoções, podem alterar espontaneamente os órgãos, como também as alterações, de ordem orgânica, podem atuar sobre a psique. Dessa forma, a acupuntura considera cinco emoções como a alegria, a tristeza, a reflexão, a cólera e o medo, estando o estado de saúde dependente da harmonia entre essas cinco emoções, ou seja, as alterações emocionais levam aos quadros de excesso ou deficiência (Gusmão & Resende, 2014, p. 103).

Em outras palavras, Maciocia afirma o seguinte:

A relação entre cada órgão e uma emoção em particular é mútua: o estado do órgão afetará as emoções e as emoções afetarão o estado do órgão. O Coração relaciona-se à alegria, o Fígado à raiva, o Pulmão à tristeza e à aflição, o Baço ao pensamento e ao estado de ficar pensativo, e o Rim ao medo [...]” (2007, p. 83).

Pesquisadores enfatizam, em suas teorias, o DM como uma doença psicossomática, por sua etiologia apresentar influências de fatores emocionais. Em decorrência disso, a doença psicossomática poderia ser conceituada como qualquer alteração física ou somática resultante de sofrimentos psíquicos, por outro lado a somatopsíquica significa uma alteração no psíquico devido a um sofrimento físico. Seguindo esse raciocínio a DM poderia ser avaliada como uma doença psicossomática e, também, somatopsíquica (Gusmão & Resende, 2014; Marcelino & Carvalho, 2005).

Segundo Campiglia (2009), foi considerando a abordagem psicossomática e as terapias com enfoque corporal que se passou a dar credibilidade ao fato das doenças físicas (diabetes, gastrite, doenças intestinais, câncer etc.) terem como fundamento alterações emocionais. Diante disso, a autora expressa:

[...] Até certo ponto, isso é importante para que se possam observar as doenças com novos olhos, talvez mais otimistas, uma vez que o paciente tem importante papel a cumprir na profilaxia e no tratamento dos problemas que antes só o médico resolvia. Contudo, o exagero dessa visão pode levar a algumas colocações falsas: "a pessoa tem gastrite porque é nervosa" ou "meu irmão tem câncer, pois está muito magoado" etc. Aquele que acredita nisso tende a crer que tudo se resolve com a cabeça. Ao ficar doente, a culpa será enorme, pois algo de muito errado estaria acontecendo em sua mente e seu coração. O fato é que não é bem assim: pessoas muito bem resolvidas emocionalmente também têm câncer, obesidade, gripe, dor, etc. [...] A visão que a medicina chinesa propõe é a do todo, dos vários fatores causadores de doença que podem agir tanto em um corpo mais frágil como em outro mais fortalecido. A saúde depende das inúmeras interações possíveis entre o ambiente, as emoções, a alimentação, o estilo de vida e a inevitável vulnerabilidade do ser, pois a condição humana inclui a doença e a morte. [...] Considerar que certos tipos de doentes têm apenas doenças mentais e outros, somente doenças físicas, cinde-se mais uma vez o corpo e a mente. Aqui, novamente, tudo indica que corpo e mente são apenas dois aspectos de um mesmo organismo, que não podem ser divididos arbitrariamente (Campiglia, 2009, p. 135-136).

A doença psicossomática ocorre de acordo com a maneira com que o sujeito vivencia suas emoções. As emoções como o medo, a ira, o amor etc. fazem o indivíduo, muitas vezes, passar por experiências novas que causam desequilíbrio no organismo, o qual se prepara para descarregar, espontaneamente, através dos músculos do corpo. Contudo, quando por algum motivo essas emoções não são descarregadas pelos músculos voluntários, pode surgir a doença psicossomática, pois tais emoções passam a ser descarregadas pelos músculos involuntários (estômago, intestino, coração e vasos sanguíneos) (Gusmão & Resende, 2014; Marcelino & Carvalho, 2005).

Provavelmente, de acordo com a visão psicossomática, as pessoas antes de descobrirem o diagnóstico do DM passam por conflitos emocionais, os quais acarretam desequilíbrios (psíquicos e orgânicos) originando a doença. Todavia, quando já sabem que são portadores da doença, o convívio com a doença, também, é marcado por sofrimentos como oscilações de humor e pensamentos negativos, que envolvem o desânimo, a tristeza, os conflitos e a culpa. Dessa forma, tudo isso pode estar agregado aos fatores que contribuem para a falta de perseverança terapêutica, isto é, a não adesão ao tratamento (Gusmão & Resende, 2014; Ribas, Santos, Teixeira & Zanetti, 2009).

O sujeito que têm DM, ao longo do seu tratamento acaba por vivenciar sentimentos e comportamentos que dificultam a aceitação de sua condição de saúde crônica, e, consequentemente, se recusa a aderir a uma qualidade de vida mais saudável, que possa lhe permitir lidar comas limitações físicas, decorrentes desta enfermidade. As principais categorias que são marcadas por essas dificuldades são as referentes à alimentação, medicação, atividade física e sentimentos associados à doença, que, por ser um sentimento vivenciado de forma singular, acaba por fazer com que cada paciente reaja de uma determinada maneira (Péres, Santos, Zanetti & Ferronato, 2007).

Os sentimentos que vêm acompanhando o adoecer são negativos, uma vez que os pacientes se prestam a procedimentos diferentes e invasivos, o que pode acarretar sentimentos de inferioridade, medo, raiva, ansiedade e depressão. O adoecer produz um forte agravo na autoestima do indivíduo. O estresse e a angústia são resultantes de se viver com o DM, sua gestão e suas consequências. Dessa forma, "o emocional também influenciará no controle da doença, uma vez que o diabetes exige um controle intenso para evitar complicações" (Marcelino & Carvalho, 2005, p. 74).

Enfim, é fundamental acrescentar que, para a MTC, as emoções em situações habituais não se constituem causas de doenças, no entanto é muito complicado para o ser humano, em alguns momentos, evitar a sensação de raiva, tristeza, pesar, preocupação ou medo. Portanto, as emoções podem ser consideradas causadoras de doenças quando forem identificadas como muito prolongadas, isto é, quando a pessoa permanece em um estado de conflito emocional por meses ou anos (Gusmão & Resende, 2014).

Apresenta-se, portanto, nesse artigo, a atuação dos aspectos psicoemocionais que podem estar relacionados ao processo de saúde e doença de pessoas diagnosticadas com DM, dando ênfase, principalmente, ao conhecimento veiculado no âmbito da MTC, por esta tratar a relação dos órgãos com os sentimentos, preservando a visão holística do homem, podendo ser uma prática complementar dos profissionais de saúde. Contudo, o presente estudo não descarta a importância do tratamento da MO.

Metodologia

O presente artigo, aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Campina Grande (CAAE: 17596413.7.000.5182), é um estudo descritivo com abordagem qualitativa, por se preocupar em compreender e interpretar aspectos mais profundos e questões particulares da realidade estudada (Minayo, 2004).

Participaram desta pesquisa, 12 (doze) pessoas, sendo 3 (três) homens e 9 (nove) mulheres com diagnóstico de DM, os quais são atendidos e acompanhados no Hospital Universitário (HU) de Campina Grande/Paraíba. Conforme o gráfico 1, a faixa etária dos entrevistados varia de 40 a 80 anos, com predominância entre as idades de 61 a 70 anos.

Utilizou-se, como instrumento de coleta de dados, entrevistas semiestruturadas guiadas por um roteiro temático e aplicadas, posteriormente a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, por parte dos sujeitos da pesquisa. Este tipo de instrumento permite que o pesquisador colha informações contidas nas narrativas dos atores do estudo (Minayo, 2004), através de uma conversação técnica e realizada face a face (Marconi & Lakatos, 1996).

Vale ressaltar que tais entrevistas foram registradas com o uso de gravador, aplicadas individualmente, de acordo com os horários disponibilizados pelos depoentes no Hospital, e, consequentemente, transcritas na íntegra. Os dados foram coletados durante os meses de dezembro de 2013 e janeiro 2014.

Durante o período de entrevistas, também foi utilizado o diário de campo, com o intuito de registrar o contexto em que os sujeitos da pesquisa estão inseridos, suas ações, atitudes, bem como sua linguagem corporal e outras observações presentes no local da pesquisa.

Após transcrição das entrevistas, os dados da pesquisa foram analisados, de acordo com sua natureza, com base em procedimentos qualitativos, através da análise de conteúdo que consta de três etapas e utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens. Na primeira etapa, denominada de pré-análise, foi realizada a leitura flutuante, permitindo ao pesquisador levantar as primeiras impressões. A seguir foi realizada a exploração do material, através da codificação e, posteriormente, foram determinadas as categorias emergentes. Na última etapa foi realizado o tratamento dos resultados, em que se processou a análise e discussão dos dados levantados (Bardin, 2009).

Com a finalidade de preservar a identidade dos sujeitos pesquisados, na análise dos dados, optou-se por utilizar o termo Entrev. que significa entrevistado(a), seguido pelo número que indica a entrevista da pessoa.

Discussão dos resultados

Como já especificado na introdução, o objetivo geral desse trabalho foi compreender a atuação de fatores psicoemocionais no processo saúde/doença de pessoas diagnosticadas com DM. Nesse sentido, de modo específico, objetivou-se investigar através das entrevistas dos usuários, quais os principais aspectos psicoemocionais envolvidos no processo saúde/doença; e averiguar através dos conhecimentos da MTC, qual a relação entre o órgão afetado no DM e os sentimentos da pessoa.

Com base nos dados coletados, apresentam-se os resultados obtidos, elencados em categorias de análise, julgadas imprescindíveis para a compreensão da atuação de fatores psicoemocionais no processo saúde/doença de pessoas diagnosticadas com DM. São elas: o diagnóstico e a importância da família; atividade física, medicação e restrição alimentar; sofrimento passado e desvalorização da vida; e sentimentos.

O diagnóstico e a importância da família

Como em qualquer recebimento de diagnóstico, o DM é uma doença crônica que, quando diagnosticada, pode suscitar diversos sentimentos, reações emocionais e fantasias no portador da doença e no seu contexto familiar (Ferreira, Daher, Teixeira & Rocha, 2013). As narrativas abaixo destacam que, ao receber o diagnóstico, os entrevistados reagiram com choro, desespero, preocupação, nervosismo, desgosto e com tristeza.

"[...] me desesperei” (Entrev.01).

"Quase que eu morro... Ai meu Deus, me desesperei. Fiquei tão triste, eu sei lá e ainda hoje quando eu começo a pensar, sabe eu fico com uma tristeza tão grande, dá vontade de chorar. Eu fiquei muito nervosa visse esses dias que eu recebi a notícia que eu era diabética... Eu fiquei chorando direto, tu acredita? Passei mais de 15 dias num só desespero só, porque é muito triste né... Descobri que estava diabética, ai isso foi uma queda para mim" (Entrev. 04).

"Quando eu soube que era diabética, misericórdia, quase que eu morro de desgosto que eu tive" (Entrev. 06).

"Ai eu fiquei muito preocupada, nervosa, agoniada" (Entrev. 09).

"Faz mais de dez anos... fiquei muito preocupada, muito" (Entrev. 10).

Na maioria das vezes, essas emoções estão atreladas a sentimentos negativos. O diabético, ao ter o conhecimento das situações que terá que enfrentar, pode passar por algumas alterações emocionais que, provavelmente, surgem devido à insegurança em relação ao futuro desconhecido e à adaptação aos novos hábitos de vida. (Ferreira, Daher, Teixeira & Rocha, 2013). Além disso, segundo os autores, esses sentimentos negativos demonstram que a doença é uma condição que independe da sua etiologia e faixa etária, causando profundas alterações biopsicossociais. Estas alterações acarretam muitos sentimentos e comportamentos, dificultando a aceitação do paciente em relação a sua condição de saúde crônica. Além disso, destacam que existe uma cobrança dos profissionais de saúde, familiares e amigos em relação às mudanças de hábitos de vida, fundamentais para o seu tratamento.

No tocante à importância da família, a maioria dos depoentes refere o quanto é fundamental o apoio familiar, seja para levar ao médico, seja para auxiliar na terapia medicamentosa e, principalmente, para dar segurança ao paciente diante dos problemas enfrentados frente à patologia. Diante disso, expressam:

"Eu tenho como se diz, assim, o apoio da minha família... Tem o apoio da minha irmã, a caçula que me leva no médico, me leva para o hospital, fica comigo, tenho meu irmão, para mim tá tudo bem" (Entrev. 01).

"(Filhos) disseram: Mamãe, agora a senhora tem que se cuidar mais, não se aperrear. É que eles sabem que eu sou agoniada, sou ansiosa e isso eu gostaria de deixar e não consigo" (Entrev. 03).

"Quando eu falo ninguém acredita, elas dizem: ô mulher tu não sois não. Ai eu digo: Eu sou, o médico me disse que eu sou diabética. Mas, ninguém acredita não. Ainda a ficha não caiu viu" (Entrev. 04).

"Em relação a meus filhos, eu me sinto muito feliz" (Entrev. 06).

"Ficaram tudo preocupado (familiares), mas não tem o que fazer, porque hoje em dia, quase toda a casa tem" (Entrev. 08).

"Ficaram (familiares) surpresos, aí começaram a aconselhar que tinha que parar de comer aquelas coisas de antigamente, e tocar a bola para frente" (Entrev. 12).

A família é considerada o grupo primário de relacionamento e articulação entre seus membros, sendo imprescindível suapresença no momento da descoberta de uma doença crônica. Na maioria das vezes, as pessoas com DM têm o apoio da família, seja porque já existem outras pessoas no mesmo contexto familiar com a doença ou não. Mesmo assim, muitas vezes, a pessoa que recebeu o diagnóstico tem considerável dificuldade em aceitá-lo (Ferreira, Daher, Teixeira & Rocha, 2013).

Na relação entre a doença crônica e a família, é preciso considerar a extensa duração do tratamento e os obstáculos associados ao estilo de vida cristalizado do doente e seus familiares. Portanto, é essencial entender o processo de viver da família, que é dinâmico e sujeito a alterações ao longo dos distintos estágios do seu ciclo. Percebe-se que o apoio da família pode contribuir no comportamento das pessoas com DM, em relação ao autocuidado, como controle da dieta, exercício físico ou a adesão ao tratamento medicamentoso (Oviedo & Boemer, 2009).

Atividade física, medicação e restrição alimentar

Nas narrativas a seguir é possível destacar que a maioria dos entrevistados sofre frente às novas condições de sua rotina de vida, tendo que encarar grandes mudanças no que se refere à alimentação, o uso de medicamentos e ao início de atividades físicas. Além disso, identificam que o modo como o sujeito expressa e vivencia seus sentimentos irá inferir no seu comportamento frente ao tratamento e aceitação de sua nova condição de vida, mais especificamente à aderência do tratamento e aos novos hábitos alimentares.

"[...] tem muitas coisas que você não pode fazer, você não pode comer. Porque se você comer, pronto por exemplo, tá baixa, ela tá baixa né, a glicose baixou você pode comer um pedacinho de doce. Se você comer mais de um pedaço ela já sobe de vez a minha é assim, ai é complicado eu passei um mês aqui, eu passei um mês e 2 dias internada para controlar ela... Eu tomo a insulina que é uma tristeza porque é furada" (Entrev. 01).

"Teve que ficar fazendo tratamento, fiquei tomando comprimido... Aí se cuidar direitinho, tomar remédio, remédio de pressão, tomar a insulina e tal...Já hoje eu tomei, mas não gosto não" (Entrev. 02)

"Tô tomando medicamento que o médico passou pra mim, então agora seja o que Deus quiser" (Entrev. 04).

"[...] tomando minha cervejinha, e até isso proibiram deu tomar" (Entrev. 07).

"É que a gente fica pensando assim, nunca vamos poder nos alimentar do que a gente gosta. Ter uma coisa que não vai bem, um negócio assim. A gente fica meio triste quando vê os outros que come aquilo, como isso e a gente não pode. Fica um negócio tão ruim" (Entrev. 08).

"É no remédio direto, e nunca fica bom... eu sei que não fica não" (Entrev. 09).

"Eu pedia, pelo amor de Deus doutor, não passe insulina pra mim, que eu não tomo com medo de injeção... Eu tenho um irmão lá em casa que toma, chega a barriga é igual a isso aqui mesmo, dura, de tomar tanta insulina, todo dia, de manhã e de noite" (Entrev. 10).

O sujeito que tem DM, ao longo do seu tratamento, acaba por vivenciar sentimentos e comportamentos que dificultam a aceitação de sua condição de saúde crônica, e consequentemente, se recusa a aderir uma condição de vida mais saudável, que possa lhe permitir lidar com as limitações físicas que serão decorrentes da presente enfermidade (Péres, Santos, Zanetti & Ferronato, 2007). Assim, as principais categorias que são marcadas por essas dificuldades são as referentes à alimentação, medicação, atividade física e sentimentos associados à doença, que, por ser um sentimento vivenciado de forma singular, acaba por fazer com que cada paciente reaja de uma determinada maneira.

O sujeito, ao ser diagnosticado com o DM, acaba por se deparar com um choque emocional, tendo que estar preparado para mudanças radicais diante de uma nova rotina, sendo necessário se organizar de maneira súbita frente às novas limitações impostas pela sua condição. "A modificação do estilo de vida não se instala magicamente, mas no decorrer de um percurso que envolve repensar o projeto de vida e reavaliar suas expectativas de futuro" (Péres, Santos, Zanetti & Ferronato, 2007, p. 02). Sendo assim, tendo que se organizar e mudar toda sua rotina de vida, assumindo novas responsabilidades, junto com uma disciplina rigorosa de dieta, incremento de atividade física, uso contínuo de medicação, faz com que haja a necessidade de entender seus sentimentos, desejos e crenças, sobre sua nova condição.

A mudança de vida é um processo lento e complicado, principalmente no que se refere à alimentação, já que são hábitos arraigados em sua cultura de vida, situações econômicas, situações sociais, por isso a pessoa com DM deve sempre estar atenta a estas questões. Além disso, é muito comum os pacientes encontrarem dificuldades referentes à medicação, sobretudo relacionadas ao número de medicamentos utilizados, aos efeitos adversos, ao seu alto custo, e às crenças e mitos construídos em torno destes (Péres, Santos, Zanetti & Ferronato, 2007).

Há necessidade de controle da doença para evitar complicações como: "problemas de visão (retinopatia), problemas nos rins (nefropatia) e problemas neurológicos (neuropatia). Podem-se notar distúrbios como: cefaleia, inquietude, irritabilidade, palidez, sudorese, taquicardia, confusões mentais, desmaios, convulsões e até o coma" (Marcelino & Carvalho, 2005, p. 72)..

Sofrimento passado e desvalorização da vida

Nas narrativas a seguir o diagnóstico está relacionado ao surgimento de sintomas após momentos perturbados da vida dos sujeitos, identificando a existência de uma estreita relação entre o DM e a emoção.

"Teve a morte da minha irmã que me chocou muito, quase que eu ficava em depressão né, a gente era muito unida né" (Entrev. 04).

"Antes do diabetes eu pedia a Deus pra quando eu tivesse indo pra casa, um carro ou um caminhão me pegasse, pra não ter que chegar em casa. Porque quando chegava tava os meninos esperando que eu levasse alguma coisa de comer, e não tinha. Sofri muito, sofri muito. / Meu marido fez uma cena na minha vida...minha afilhada se apresentou a mim com um caroço, e eu gastei tudo o que tinha na minha vida pra ajudar, eu fiquei de pedir na casa dos outros comer, porque eu não tinha mais nada... e hoje meu marido vive em casa também, mas mora com ela" (Entrev. 06).

"Antes do diabetes foi o período em que me separei da mãe de meus filhos, aí passei por uma tribulação muito grande, uma tribulação enorme, onde houve a separação, depois disso veio a diabetes, passou um pouco tempo aí veio a diabetes" (Entrev. 11).

Os sentimentos que seguem o adoecer são negativos, pois as pessoas ao se depararem com algo diferente e invasivo evidenciam sentimentos de medo, raiva, menos valia, inferioridade, ansiedade e até depressão. O adoecer produz um forte agravo na autoestima do indivíduo (Silva, 1994). De acordo com Odoul (2003), situações que envolvem fortes impactos psicológicos, como a destruição brutal das seguranças oucrenças afetivas, podem resultar no surgimento de um quadro de DM.

Há narrativas que apontam o diagnóstico como determinante da redução do prazer de viver. Pode-se dizer que o comprometimento do prazer pode estar diretamente relacionado ao fato dos diabéticos, em geral, não terem oportunidade de expor seus sentimentos. As narrativas reincidentemente discorrem sobre isso:

"[...] eu levo minha vida assim para mim tanto faz como tanto fez. É assim tanto faz tá viva como o mesmo tempo não tá... eu não tenho vontade assim de viver. Ah eu tenho dois filhos para cuidar, tem isso não" (Entrev. 01).

"Eu sai de casa hoje triste, triste e as vezes eu não tenho nem vontade de comer, você acredita, não tenho vontade de comer, minha vontade é de tá deitada, mais isso ou já é um inicio de depressão e eu não quero mais viver desse jeito, não quero" (Entrev. 03).

"Saio não minha filha... quando saio é na casa de uma irmã, ou um passeiozinho assim" (Entrev. 08).

"Eu não gosto de sair não... eu não gosto não. Parece que assim, fechou o circulo, tá entendendo. Assim, a minha vontade é só está dentro de casa" (Entrev. 12).

A angústia é algo ainda mais corriqueiro. O estresse e angústia são resultantes de se viver com o DM, sua gestão e suas consequências. Dessa forma, "o emocional também influenciará no controle da doença, uma vez que o diabetes exige um controle intenso para evitar complicações" (Marcelino & Carvalho, 2005, p. 74). Sabe-se que o indivíduo com DM apresenta uma quantidade excessiva de açúcar no sangue, o que pode indicar dificuldade para gerar, viver ou obter doçura na vida (Odoul, 2003). Dependendo da forma que o DM surge e do significado que o indivíduo direciona à doença, esta pode atingir o seu 'eu', a sua autoestima, a sua qualidade de vida, a sua capacidade de amar, a sua esperança, as suas possibilidades e qualidades nas relações pessoais. Enfim, o DM causa sofrimento e, como outras doenças, nunca o seu diagnóstico será bem recebido, pois mesmo em casos que aparentam mais adaptação, sempre existe uma dose de revolta, afinal ninguém quer ficar doente (Grupo de Estudos em Endocrinologia & Diabetes [Geed], 2001).

Sentimentos

Pesquisas realizadas revelam que a doença do DM está estritamente relacionada com o estado emocional de seus portadores, uma vez que, sendo uma doença psicossomática, foi verificado que as causas mais comuns são os traumas emocionais vivenciados ao longo da vida, perda dos pais e/ou entes queridos, através de morte ou separação, modificações externas violentas e relações conflituosas profissionais (Marcelino & Carvalho, 2005).

Embora não seja possível generalizar os dados, foi possível destacar que a maioria dos entrevistados se refere aos sentimentos negativos, de angústia, perda e sofrimento, identificando o sentimento da preocupação em primeiro lugar, refletindo, possivelmente, o uso demasiado do pensamento e da reflexão. Este sentimento, segundo a MTC, tem relação com o baço e o pâncreas, os quais são estruturas distintas, mas que executam a mesma função. Nesse contexto, é importante acrescentar que a relação entre os órgãos e uma emoção específica é mútua, pois o estado do órgão afetará as emoções e as emoções afetarão o estado do órgão (Odoul, 2003; Vectore 2005; Maciocia, 2007).

"A preocupação, porque assim tem vez que eu não tenho paciência não ai vem a irritação eu fico muito irritada" (Entrev. 01).

"Eu não tenho medo, às vezes eu fico um pouco nervosa, assim meia, umas coisas. Às vezes eu me estresso um pouco, mas não é num sabe? Pouco estresse e me preocupo mais assim em casa porque eu cuido do almoço, trabalhar, trabalho muito cedo, descansar e eu vou fazer almoço fico preocupada meu filho chegar na hora certa está tudo pronto" (Entrev. 02).

"Preocupação... Eu me preocupo com o dia-a-dia, eu não gostaria que fosse assim, eu gostaria de viver cada dia, um momento, e é isso... Depois vem o medo, porque a gente vive hoje numa cidade violenta, não sabe se sair de casa se chega vivo, neh?! O que a gente vê na televisão é só isso. O medo é esse, mais medo de nada tenho não... É mais preocupação mesmo" (Entrev. 03).

"Raiva, a maioria é do meu marido (risos), é meu marido mesmo que me faz, porque uma pessoa muito chata, chata, chata. Ai pronto... Preocupada sou demais, sou uma pessoa que me preocupo com tudo... Assim qualquer probleminha fica na minha cabeça sabe. Eu fico muito preocupada mesmo" (Entrev. 04).

"Preocupação...depois só raiva, raiva, raiva" (Entrev. 06).

"Preocupação... quando a gente vai fazer uma coisa que não pode, a gente fica preocupado... quando chega o dia do cabra receber, e nada" (Entrev. 07).

"Eu tenho assim, muita raiva do meu esposo, porque assim, ele é muito danado, ele bebe, ele anda muito e assim, tem horas que a gente se desentende, ai de vez enquanto eu sinto raiva" (Entrev. 08).

"Fico assim, mais preocupada. Preocupada com meu filho, com a netinha quando sai pra escola" (Entrev. 09).

"A preocupação... é com meu irmão que tô mais preocupada com ele, de ele vir pra minha casa, chegar e dizer na minha cara que não tá satisfeito na minha casa, que se soubesse que era desse jeito não tinha vindo" (Entrev. 10).

"Tristeza, tristeza, triste... preocupação e raiva" (Entrev. 11) .

"A preocupação do dia-a-dia, que a gente sente, que tem aquela preocupação de correr atrás, de realizar os seus desejos, os seus sonhos. Essa é minha preocupação" (Entrev. 14).

Conforme citado anteriormente, os sentimentos que vem acompanhando o adoecer são negativos, uma vez que os pacientes se prestam a procedimentos diferentes e invasivos, o que pode acarretar sentimentos de inferioridade, medo, raiva, ansiedade e depressão (Marcelino e Carvalho, 2005). Possivelmente, os indivíduos antes de descobrirem que são diabéticos passam por conflitos emocionais que acarretam desequilíbrios (psíquicos e orgânicos) causando a doença. Contudo, quando é diagnosticado que eles são portadores da doença, o convívio com o DM, também, é marcado por sofrimentos como oscilações de humor e pensamentos negativos, que envolvem o desânimo, a tristeza, os conflitos e a culpa (Péres, Santos, Zanetti & Ferronato, 2007).

Algumas características são marcantes na personalidade da pessoa que possui DM, possuindo certo grau de amargura e tristeza, que nem sempre poderão ser notados pela expressão facial (Valcapelli & Gasparetto, 2006). Os mesmos autores evidenciam que esses pacientes apresentam baixa autoestima e um elevado grau de dependência, possuindo uma característica de sofredores silenciosos, que geralmente expressam seus sentimentos de uma forma que as outras pessoas não os percebam. Além disso, se sentemressentidos em relação ao que não fizeram no passado e cheios de culpas inconscientes, são reféns da melancolia. "Os melancólicos, apesar de comumente afáveis, tranquilos e simpáticos, deprimem-se com facilidade. Se por um lado denotam meticulosidade e tendência ao perfeccionismo, por outro revelam acentuada inclinação ao isolamento, inadequação, desamparo, pessimismo e submissão [...]" (Valcapelli & Gasparetto, 2006, p. 149).

Para a MTC, as emoções, em princípio não se constituem como causas de doenças, porém é muito complicado para o indivíduo, em certos momentos, evitar a sensação de raiva, tristeza, pesar, preocupação ou medo. Contudo, as emoções podem passar a atuar como fatores causadores de doenças, nos momentos em que a pessoa permanece em um estado de conflito emocional por meses ou até anos (Gusmão & Resende, 2014).

Enfim, estudiosos destacam que o funcionamento do baço e do pâncreas está prejudicado pelo excesso de açúcar no sangue. Dessa forma, de acordo com a MTC, estes órgãos estão diretamente relacionados ao DM, os quais relacionam-se ao estado de ficar pensativo (reflexão, preocupação). Diante disso, percebe-se nos depoentes a forte presença dos fatores psicoemocionais, destacando, principalmente, o sentimento da preocupação. Os relatos demonstram que os sujeitos passam por uma transformação violenta, gerando conflitos, em relação a sua segurança ou crença afetiva, estando mais susceptíveis ao desenvolvimento de uma doença (Vectore, 2005; Cho, Yue & Leung, 2005; Barsaglini, 2008; Zagury, Zagury & Guidacci, 2000); Odoul, 2003; Maciocia, 2007, Gusmão & Resende, 2014).

Entretanto, apesar de existir uma relação muito forte entre a doença e as emoções, considerando o ser humano em sua totalidade, é importante também observar os outros fatores relacionados à etiologia do diabetes (Gusmão & Resende, 2014).

Conclusões

Tendo em vista os aspectos observados no estudo, constatou-se que o DM é uma doença que acarreta fortes impactos psicoemocionais, os quais repercutem direta ou indiretamente na vida do indivíduo. Ficou evidente que ao receber o diagnóstico de DM, as emoções negativas contribuem para a dificuldade em aceitar a doença e o seu tratamento. Entretanto, a família surge como base de apoio, proporcionando uma ressignificação ao processo saúde doença, através de seu papel de cuidadora. Quando a pessoa com DM encontra essa rede de apoio há uma maior compreensão em relação ao processo saúde/doença.

Por conseguinte, destacou-se, no presente estudo, que o sofrimento do diabético, frente às novas condições de vida, expressa muitos conflitos, pois a doença interfere na qualidade de vida e, muitas vezes, torna a convivência mais difícil, afinal a pessoa precisa aprender a viver com determinadas limitações e condições que demandam domínio de si mesma.

A análise dos dados possibilitou e reforçou a afirmação, à luz dos estudos da MTC, de que existe uma relação extremamente importante entre a doença e as emoções. Afinal, o ser humano deve ser compreendido em sua unicidade. Sendo assim, de modo a não generalizar, a maioria dos entrevistados se identificou com o sentimento da preocupação, sentimento este que, de acordo com a MTC, tem relação com os órgãos, baço e pâncreas, os quais são debilitados com o surgimento do DM.

Ao término da pesquisa, foi possível destacar que todos os objetivos foram atingidos, afinal foi possível identificar e analisar a atuação dos fatores psicoemocionais no processo saúde/doença de pessoas com DM, alcançando, especificamente, através das histórias/experiências de vida, os principais aspectos psicológicos envolvidos no referido processo, assim como averiguar através da MTC a relação entre o órgão afetado no DM e os sentimentos da pessoa. Por fim, percebeu-se durante o trabalho que há carência de estudos nesta área. Por isso, é importante realizar outros estudos com a finalidade de ampliar informações sobre o assunto.


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