INTRODUÇÃO
O aumento da esperança de vida em todo o mundo tem suscitado debates na comunidade científica, desafiando a prerrogativa de viver mais tempo, porém com qualidade de vida, apontando formas de promover um envelhecimento mais ativo e saudável. A Organização Mundial de Saúde (OMS) define qualidade de vida pela maneira como o indivíduo percebe sua posição na vida, no contexto da cultura e sistemas de valores nos quais vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações1 .
O desafio do século XXI será melhorar a prestação de cuidados de vida e saúde da crescente população idosa. Na América Latina e Caribe, o número de pessoas muito idosas (≥ 85 anos) passou de 6,5% da população geral em 1950 para 11,1% em 2000, com projeção de 18,1% para 20502 .
No Brasil, em 2010 os idosos representavam 8,6% da população geral, podendo em 2020 atingir 20%. Prevê-se que em 2050 que a população jovem com idade entre 0 e 14 anos representem 13,1% da população total, enquanto o estrato idoso (≥ 60 anos) atingirá 22,7%, justificando a inversão da pirâmide populacional3 , 4 , 5 .
Em Portugal, no ano de 2010, os idosos (≥65 anos) representavam 19 % da população geral, com esperança média de vida de 79,8 anos. O índice de envelhecimento passou de 27,5% em 1961 para 144% em 2015. O fenômeno de envelhecimento é mais acentuado nas mulheres, o que se repete no grupo dos idosos mais idosos (idade ≥ 85 anos), com uma taxa de 12,0% da população geral, índice de países desenvolvidos 6 .
A atenção primária em saúde é a ordenadora de redes de atenção em países desenvolvidos e em desenvolvimento. Na presente análise, o Brasil, liderado pelo Ministério da Saúde, considera o trabalho em equipe multidisciplinar como elemento central na atenção primária. Portugal, por sua vez, além de contar com o trabalho multidisciplinar, é um dos países que mais desenvolvem instrumentos de avaliação para serem adotados nos Cuidados de Saúde Primários (CSP)7 .
Em ambos os países, os sistemas de saúde se guiam por ideais comuns, pois ambos defendem estratégias que fortaleçam a atenção primária. Estudos revelam que Brasil e Portugal discutem práticas que facilitam o desempenho dos profissionais com vistas a melhorar a coordenação dos serviços de saúde8 - 10 ,sendo também relevante estudar a qualidade de vida dos idosos desses países para encontrar linhas orientadoras para o desenvolvimento de programas e ações que beneficiem a população idosa, com políticas públicas e programas promotores de envelhecimento ativo e saudável.
Nesse contexto, a avaliação da qualidade de vida da pessoa idosa abrange alguns aspectos, tais como: capacidade funcional; nível socioeconômico; estado psicológico; interação social; atividade intelectual; autocuidado; apoio familiar; valores socioculturais, éticos e religiosos; processo de morte e morrer; estilo de vida; satisfação com o emprego e/ou atividades de vida diárias e, o ambiente em que se vive/frequenta. Sabe-se que, as alterações ocasionadas pelo processo fisiológico e patológico do envelhecimento corroboram para uma queda na qualidade de vida do idoso, justificando a relevância de estudos que suportem estratégias e ações voltadas à prevenção e manutenção de um processo de envelhecimento ativo e saudável11 .
Neste contexto, vários instrumentos são utilizados com o intuito de avaliar a qualidade de vida, entre eles, o World Health Organization Questionnaire of Quality of Life (WHOQOL-Bref), forma abreviada do WHOQOL-100, composto por 26 questões, sendo duas gerais, relacionadas à qualidade de vida e à saúde global e, 24 que compõem os quatros domínios: Físico; Psicológico; Relações Sociais e Meio Ambiente12 .
Assim, o presente estudo teve como objetivo comparar a qualidade de vida de idosos brasileiros e portugueses usuários da atenção primária à saúde.
MATERIAIS E MÉTODOS
Estudo com abordagem quantitativa, transversal e comparativo13 aplicado a amostra probabilística, e desenvolvido com idosos atendidos em unidades de atenção primária de saúde de dois países, Brasil e Portugal: respectivamente um na unidade de saúde da família do Município de Benevides, Pará, Brasil, e outro na unidade de saúde familiar do Concelho de Coimbra, Portugal. O estudo foi realizado em dois momentos: inicialmente em Benevides (Pará, Brasil) no período de julho de 2015 a fevereiro de 2016; e em Coimbra (Portugal), no período de abril a maio de 2017.
A população geral de Benevides é de 51.651 habitantes, com população idosa de 4.856 indivíduos cadastrados na unidade de saúde em estudo14 . Em Coimbra, da população de 105.842 habitantes, o estrato de idosos é de 6.825 indivíduos cadastrados na unidade em estudo15 .
A pesquisa foi realizada com 294 idosos (130 idosos brasileiros e 164 idosos portugueses) de ambos os sexos, sendo 55 homens e 75 mulheres brasileiros e 75 homens e 89 mulheres portugueses, após realizado o sorteio. A amostra foi calculada pela técnica de amostragem aleatória estratificada por unidade de saúde e sexo conforme expressão16:
Adotou-se como critério de inclusão dos idosos para ambos os países: ser residente e/ou atendido na área adstrita às unidades de saúde selecionadas para o estudo; no caso de idosos brasileiros, ter idade igual ou superior a 60 anos, enquanto em Portugal ter idade igual ou superior a 65 anos, segundo o critério da OMS1 . O critério de exclusão: foi não encontrar os idosos no seu domicílio.
Para avaliar a qualidade de vida aplicou-se o World Health Organization Questionnaire of Quality of Life (WHOQOL-bref) em sua versão abreviada e validada no idioma português de cada país, além da aplicação de um instrumento contendo dados sociodemográficos (sexo, faixa etária, estado conjugal, escolaridade e ocupação).
O WHOQOL-bref é um instrumento composto de 26 questões: duas gerais acerca de percepção de qualidade de vida e de estado de saúde; e 24 questões distribuídas em quatro domínios: físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente, como se discrimina a seguir: a) Domínio físico (1), com sete questões, avalia dor e desconforto, energia/fadiga, sono/repouso, mobilidade, atividades da vida cotidiana, dependência de medicação ou de tratamentos e capacidade de trabalho. b) Domínio psicológico (2), com seis questões, focaliza sentimentos positivos e negativos, como: pensar, aprender, memória/concentração, autoestima, imagem corporal e aparência; espiritualidade, religião/crenças pessoais. c) Domínio relações sociais (3), com três questões, aborda as relações pessoais, suporte (apoio) social, atividade sexual. d) Domínio meio ambiente (4), com oito questões, inclui aspectos como segurança física/proteção, ambiente no lar, recursos financeiros; cuidados de saúde e sociais: disponibilidade/qualidade, oportunidade de adquirir novas informações e habilidades, participação em oportunidades de recreação/lazer; ambiente físico: poluição, ruído, trânsito, clima e transporte. No WHOQOL-bref, a qualidade de vida é avaliada por meio da escala Likert, cujas respostas às questões em escores variam de 1 a 5, assinalando para condições piores o escore 1, e para as melhores o escore 5. O resultado de uma avaliação por esse instrumento é convertido em escala centesimal de 0 a 100, sendo o maior valor correspondente a melhor percepção da qualidade de vida17 .
As características psicométricas do instrumento validado no Brasil preenchem os critérios de validade discriminante, concorrente e de conteúdo, e de confiabilidade por consistência interna de valor Alfa de Cronbach de α>0,80 17 .A versão validada em português de Portugal, utilizada com idosos de Coimbra, também teve sua validade conferida semelhantemente ao procedimento adotado na versão brasileira, incluindo a confiabilidade por consistência interna de valor Alfa de Cronbach de α>0,9218 .
A escolha pelo WHOQOL-bref 19 se deu pelas boas características psicométricas e também pela extensão do instrumento com 26 questões, adequado para ser usado com idosos sem exauri-los. O instrumento foi aplicado com assessoramento da pesquisadora por haver na amostra pessoas não alfabetizadas ou semianalfabetas.
Iniciava-se a coleta de dados com a leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, prestando os esclarecimentos necessários; após a assinatura do termo, passava-se a coletar os dados de identificação e de qualidade de vida. A entrevista se dava nos consultórios de enfermagem das unidades de saúde, ou nos domicílios, conciliando o interesse dos idosos com a conveniência para a pesquisadora.
Os dados coletados foram transcritos com dupla digitação independente utilizando o programa Microsoft Office Excel 2010 , e depois analisados por meio do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 20.0 para Windows. Na avaliação dos escores dos domínios de qualidade de vida segundo o WHOQOL-bref, para comparar as variáveis entre os grupos foi utilizado o Teste U de Mann-Whitney (constatada ausência de normalidade dos dados em T=1,08); por estarmos comparando os escores de qualidade de vida entre grupos de idosos de Coimbra e Benevides, foi adotado o nível de significância de p ≤ 0,05.
O estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, que o aprovou no Parecer n° 990.544, CAAE: 41557915.8.0000.5505). Igualmente submetido ao Comitê de Ética em Saúde da Agência Regional em Saúde do Centro (ARSC) de Portugal, foi aprovado no Parecer n° 34/2017. Foram garantidos aos participantes os princípios éticos de respeito à autonomia, beneficência, não maleficência e confidencialidade. Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em duas vias. No caso dos idosos não alfabetizados foi utilizada a impressão digital no lugar da assinatura.
RESULTADOS
Quanto à caracterização dos idosos amostrados nos grupos, houve predomínio do sexo feminino, de casados, aposentados e com baixo grau de escolaridade. Em termos de distribuição etária, prevaleceu a faixa etária de 60 a 64 anos entre brasileiros, enquanto entre os portugueses a maioria estava na faixa acima de 80 anos ( Tabela 1 ).
Variáveis | Coimbra (Portugal) | Benevides (Brasil) | Valor de p* | ||
---|---|---|---|---|---|
n (164) | % | n (130) | % | ||
Sexo | 0,32 | ||||
Masculino | 75 | 45,8 | 55 | 42,3 | |
Feminino | 89 | 54,2 | 75 | 57,7 | |
Faixa Etária | 0,08 | ||||
60 ┤64 anos | - | - | 50 | 38.4 | |
65 ┤69 anos | 45 | 29,2 | 23 | 17,6 | |
70 ┤79 anos | 38 | 24,7 | 37 | 28,0 | |
≥ 80 anos | 81 | 46,1 | 21 | 16,0 | |
Média ± Desvio Padrão | 76,7 ± 7,9 anos | 70,5 ± 8,9 anos | |||
Estado conjugal | <0,01 | ||||
Casado | 97 | 59,0 | 25 | 31,0 | |
Viúvo | 60 | 36,5 | 33 | 41,0 | |
Divorciado/Separado | - | - | 10 | 12,0 | |
Solteiro | 07 | 4,5 | 13 | 16,0 | |
Escolaridade | <0,03 | ||||
Nenhuma | 10 | 6,4 | 23 | 28,0 | |
Primário incompleto (1 a 4 anos) | 103 | 66,9 | 43 | 53,0 | |
Primário completo (5 a 6 anos) | 10 | 6,4 | 09 | 11,0 | |
Ginásio completo (7 a 9 anos) | 07 | 4,5 | 01 | 2,0 | |
Ensino médio (10 a 12 anos) | 16 | 10,4 | 03 | 4,0 | |
Ensino superior/Pós-graduação | 18 | 11,8 | 03 | 4,0 | |
Ocupação | <0,47 | ||||
Aposentado | 116 | 70,7 | 66 | 81,0 | |
Pensionista | 0 | 0 | 11 | 14,0 | |
Do lar /Doméstica | 30 | 19,5 | 01 | 1,0 | |
Trabalhador de serviços/administração pública | 08 | 6,2 | 02 | 2,0 | |
Trabalhador nível superior | 10 | 6,2 | 01 | 1,0 |
Fonte: Elaboração dos autores
*Teste Qui-quadrado
Os resultados da comparação entre grupos de idosos e seus respectivos escores médios nos diferentes domínios da qualidade de vida demonstraram significância estatística (p≤ 0,005). O grupo de Coimbra teve melhor escore no domínio 4 (Meio ambiente) (65,6 ±12,5; p‹0,001), enquanto Benevides teve os melhores escores nos domínios: 2 (Psicológico) (79,1±16,7; p‹0,001) e 3 (Relações sociais) (75± 16,7; p‹0,001). Em Coimbra, o domínio com escore médio mais baixo foi o domínio 1 (Físico) (60,7 ± 21,4; p‹0,116), enquanto em Benevides foi o domínio 4 (Ambiente) (56,3 ±18,7; p‹0,001) ( Figura 1 ).
A descrição da qualidade de vida dos idosos, mensurada pelo WHOQOL-Bref, evidenciou entre os domínios valores de mediana superiores a 56,3 ( Tabela 2 ).
Concelho /Município | Domínios | Freq. | Mediana | Desvio- Quartílico | Valor de p |
---|---|---|---|---|---|
Coimbra | Geral** | 164 | 57,1 | 12,6 | < 0,0004 |
Benevides | Geral** | 130 | 67,6 | 18,8 | < 0,0001 |
Coimbra | Físico | 164 | 60,7 | 21,4 | < 0,0001 |
Benevides | Físico | 130 | 67,9 | 28,6 | < 0,0001 |
Coimbra | Psicológico | 164 | 62,5 | 12,5 | < 0,0001 |
Benevides | Psicológico | 130 | 79,1 | 16,7 | < 0,0001 |
Coimbra | Relações Sociais | 164 | 66,6 | 25,0 | < 0,0001 |
Benevides | Relações Sociais | 130 | 75,0 | 16,7 | < 0,0001 |
Coimbra | Meio Ambiente | 164 | 65,6 | 12,5 | < 0,0001 |
Benevides | Meio Ambiente | 130 | 56,3 | 18,7 | < 0,0001 |
Fonte: Elaboração dos autores
*Teste de U Mann-Whitney
**Domínio Geral é composto: Questão 1(Q1) do WHOQOL-Bref: Como você avaliaria sua qualidade de vida? e, Questão 2 (Q2) do WHOQOL-Bref: Quão satisfeito você está com a sua saúde ?
DISCUSSÃO
A qualidade de vida é um dos fatores diretamente ligados ao processo de envelhecimento da população20 ,devendo ser considerada em programas e políticas sociais e de saúde com vistas à integralidade do cuidado prestado à população idosa21 .
Entre os idosos que participaram no estudo predominou o sexo feminino em ambos os países, corroborando dados da literatura mundial que revelam a feminização da velhice, tendo a mulher maior sobrevida e cuidar mais de sua saúde.Além de fatores biológicos, é possível que a longevidade maior da mulher se deva aos programas de saúde mais voltados para esse segmento, facilitando-lhe acesso aos serviços de saúde 22 , 23 .
No tocante à estrutura etária dos idosos brasileiros, são mais jovens, grande parte encontra- se na faixa dos 60 a 69 anos, enquanto os idosos portugueses, mais velhos, na faixa etária octogenária, resultados que corroboram achados internacionais de relacionar cuidados de saúde com aumento da longevidade. Essa maior longevidade pode resultar na incapacidade funcional, afetando a autonomia e, consequentemente, sua qualidade de vida. Entretanto, estudos evidenciam que a percepção da qualidade de vida aumenta com o envelhecimento, podendo indicar maior aceitação diante da inexorabilidade do processo23 - 26 .
Quanto ao estado conjugal, os resultados do estudo mostraram similaridades entre Brasil e Portugal. Em ambos os países, a viuvez revelou-se importante por aprofundar o isolamento do idoso, devendo ser interpretada com cuidado no domínio referente às relações sociais na qualidade de vida22 , 27 , 28 .
Na análise da escolaridade observou-se que tanto entre os idosos brasileiros quanto entre os idosos portugueses prevaleceu o índice de baixa escolaridade. Tal resultado corrobora dados da literatura mundial, mostrando a baixa escolaridade da população idosa, provavelmente fruto da realidade sociocultural de ambos os países num tempo em que a mulher era educada para ser do lar, enquanto os homens eram responsáveis por trabalhar fora para sustentar a família 25 , 26 , 29 , 30 .
A ocupação revelou similaridade com outros resultados, como maioria de idosos aposentados em ambos os países, o que se equipara aos dados de estudo realizado em Portugal, onde 68,9% dos idosos vivem de aposentadoria, ou pensão, no caso das viúvas28 , 31 ,e os de outro estudo realizado no Brasil, onde 88,3% dos idosos entrevistados eram aposentados26 .
Comparando os grupos nos quatro domínios da qualidade de vida, os resultados evidenciaram que entre os idosos portugueses o melhor escore incide no domínio Meio ambiente; os investimentos nas áreas da saúde com qualidade, transportes, oportunidades de lazer e recreação, entre outros, são valorizados e disponibilizados à população idosa portuguesa; o pior escore refere- se ao domínio físico. Cabe enfatizar que o avanço da idade pode reduzir a autonomia e a independência funcional desses idosos mais idosos.
Por sua vez, Portugal tem melhor escore no domínio Meio Ambiente. Estudos mostram que os cuidados de saúde primários (CSP) daquele país passam por extensa reforma organizacional, tendo a unidade de saúde familiar (USF) como base da prestação de cuidados de saúde com autonomia assistencial e funcional, trabalhando em rede e próxima do cidadão, destacando-se o trabalho em equipe como elemento central21 , 29 , 31 .Esse resultado assemelha-se ao de estudo realizado com idosos no Concelho de Viana do Castelo31 ,que apresentou melhor escore no domínio Psicológico (revelando a importância das relações sociais e do apoio social), enquanto o pior escore foi no domínio Meio Ambiente, decorrente das condições ambientais.
Os idosos brasileiros tiveram melhores escores nos domínios: Psicológico e Relações Sociais, e pior escore no domínio Meio Ambiente. Desse resultado se infere que os valores maiores nos domínios Psicológico e Relações Sociais significam que a socialização dos idosos pode contribuir nas suas relações sociais, melhorando-lhes a qualidade de vida. O Meio Ambiente apresentou valor baixo, talvez por várias condições ambientais, inclusive dificuldade de acesso aos serviços de saúde32 .
Em relação às duas questões gerais do WHOQOL-bref, verificou-se que a maioria dos idosos, tanto brasileiros quanto portugueses, estavam satisfeitos com a sua saúde, apresentando também boa percepção de qualidade de vida geral. Esse resultado corrobora com outros estudos internacionais 11 ,33que evidenciam que grande parte dos idosos possuem uma percepção positiva de sua qualidade de vida.
A qualidade de vida na velhice é hoje um conceito importante no âmbito mundial, uma vez que existe uma nova sensibilidade social para com a velhice, sendo considerada tanto como problema, quanto como desafio para os indivíduos e para a sociedade25 .Nesse contexto, é relevante esclarecer que, no Brasil, estudo realizado com idosos apontou que as redes de apoio social exercem influência na qualidade de vida dos idosos no tocante a sentimentos positivos ou negativos (domínio psicológico – valores do escore entre 58 e 70 pontos), relações pessoais (domínio relações sociais – valores do escore entre 64 e 71 pontos) e lazer ou recreação (domínio ambiente – valores do escore entre 47 e 62 pontos)29 .
O resultado do presente estudo mostrou ser necessário privilegiar ações que melhorem o domínio Meio Ambiente no Brasil, cabendo salientar que, rotineiramente, os idosos brasileiros convivem com medo de violência, falta de assistência médica e de hospitais e escassas atividades de lazer, além de angústia constante, com os baixos valores das aposentadorias e/ou pensões25 .
No caso de Portugal, o resultado mostrou que o domínio físico deve merecer maior atenção; estudo com idosos naquele país evidenciou que as capacidades de adaptação vão diminuindo à medida que se envelhece26 . No Brasil, ainda prepondera a assistência fragmentada do cuidado prestado à pessoa idosa, como a consulta motivada basicamente pela necessidade de receber medicamentos, procura de atendimento na agudização da doença e dificuldade no acesso aos serviços de saúde.
Já Portugal presta um cuidado integral ao idoso, com medidas que promovem seu acompanhamento, prevenindo a agudização das doenças. E com base no conhecimento da qualidade de vida da população idosa, os profissionais de saúde podem desenvolver ações que promovam o envelhecimento ativo e saudável.
O processo de envelhecimento inicia-se no nascimento e envolve aspectos individuais e coletivos, influenciando as condições de saúde do idoso21 .O estudo contribui para que profissionais da saúde, principalmente enfermeiros, reflitam sobre a qualidade de vida, pois promovê-la proporciona maior autonomia à pessoa idosa no seu cotidiano.
Entre as limitações do estudo, destaca-se o fato de ser transversal e realizado apenas numa unidade de saúde em cada um dos países, dificultando a generalização dos achados. Por isso, é de suma importância realizar outros estudos, do tipo longitudinal, com maior ênfase na atenção primária à saúde, com o intuito de apresentar novas contribuições para promover o envelhecimento ativo, melhorando a qualidade de vida de idosos. É necessário ainda realizar novos estudos e aprofundá-los no tocante à qualidade de vida, pois o domínio Ambiente mostrou resultado relevante na comparação entre os dois países economicamente tão diferentes na geopolítica mundial: um país desenvolvido, como Portugal, e outro em desenvolvimento, como o Brasil.
CONCLUSÕES
O presente estudo comparou a qualidade de vida dos idosos brasileiros e portugueses utilizando o instrumento WHOQOL-bref. Enquanto no Brasil a população idosa é majoritariamente de idosos mais jovens, em Portugal predomina o idoso octogenário, apesar de haver similaridades entre os países no aumento da viuvez e feminização da velhice. A comparação entre os domínios de qualidade de vida mostrou que os idosos brasileiros apresentam melhor escore no domínio Psicológico, enquanto os idosos portugueses lograram melhor desempenho no domínio Meio Ambiente.
Considerando que os demais domínios tiveram escores inferiores, a presente avaliação reúne subsídios essenciais para readequar programas de atenção primária de saúde levando em conta as especificidades de cada região.
Em Portugal, o fortalecimento e o incentivo aos serviços de saúde promoveram maior acesso dos idosos aos serviços de saúde e melhor qualidade do serviço prestado pelos profissionais de saúde na atenção primária. No Brasil, apesar de estar em andamento a reestruturação da atenção primária com base em novo modelo para monitorar os serviços – o “e-saúde” – salienta-se a necessidade de fortalecer a atenção primária como elemento central nessa mudança.